Caros leitores:
Este estudo é o último deste ano. Por isso, quero aproveitar a
ocasião para agradecer a todos aqueles que, ao longo dele, nos têm
apoiado, não só pelas mensagens que nos têm enviado,
nomeadamente no período de Natal, que agradecemos, mas também
pelas palavras de apoio que nos manifestam quando os acasos da vinda nos juntam
e, fundamentalmente, divulgando os nossos escritos entre amigos e conhecidos,
já que um dos objectivos mais importantes do nosso esforço
é ultrapassar a barreira da censura imposta pelo poder dominante a tudo
aquilo que não sirva os seus interesses e se afaste do pensamento
único dominante de cariz neoliberal. Esse esforço de
divulgação é, para mim, a melhor recompensa pelas centenas
de horas de trabalho que utilizamos na sua elaboração e envio.
Quero aproveitar o facto deste ser o nosso último contacto deste ano,
para lhes desejar Boas Entradas, um Bom Ano Novo, e que 2009 seja melhor do que
2008, que já foi muito difícil para a maioria dos portugueses, o
que não vai ser fácil.
Este estudo é 47º que divulgamos este ano. Temos procurado
diversificar as análises que fazemos, não as reduzindo apenas a
problemas económicos, porque a economia, embora seja importante para
compreender muito daquilo que nos acontece no nosso dia a dia, no entanto
há mais vida para além da economia, e também porque as
áreas de interesse dos nossos eventuais leitores naturalmente variam
muito. Para procurar responder a esses interesses tão diversos temos
procurado variar as matérias analisadas, embora tenha plena
consciência de que nunca conseguirei plenamente por
limitações de tempo e de conhecimentos.
Este estudo, por ex., é sobre uma área importante para todos os
portugueses a Administração Pública
tão atacada por este governo. E embora seja importante para todos os
portugueses, pois sem uma Administração Pública de
qualidade e eficiente os portugueses não terão bons
serviços públicos, nomeadamente saúde,
educação e segurança social, no entanto é natural
que ele interesse mais aos trabalhadores da Administração
Pública.
Este governo substitui o "slogan" neoliberal de "Menos Estado,
melhor Estado" por um outro, com idêntico objectivo e resultados,
que foi "Menos défice, menos Estado, mais mercado". E com base
nele desencadeou um forte ataque à Administração
Pública, que vai continuar em 2009, que procuro também tornar
claro neste estudo, e cujos resultados são a
desorganização dos serviços públicos e a
prestação de menos serviços e de pior qualidade a todos os
portugueses, cujos efeitos se farão também sentir no
próximo ano, o que é ainda mais grave pelo facto de 2009 ser um
ano em que a crise social será ainda mais grave. Contrariamente à
mensagem que o governo tem procurado fazer passar, o Estado encontra-se
bastante fragilizado para enfrentar a crise económica e social
previsível.
Como temos referido, mas não é demais repetir, o objectivo dos
estudos que divulgamos ao longo deste ano não foi o de tentar substituir
a "verdade" do pensamento único de cariz neoliberal dominante
por outra "verdade", mas apenas dar aqueles que nos lêem uma
outra interpretação dos problemas da economia e da nossa
sociedade, contribuindo para uma reflexão própria e
autónoma, que ajudasse os leitores a formular a sua própria
opinião que, em muitos casos, até poderá ser diferente da
nossa, o que não nos incomoda, pois a democracia passa precisamente pela
aceitação de ideias diferentes, mas o importante é que
essa opinião resulte do confronto democrático de ideias
diferentes, e não condicionado pelo pensamento dominante de cariz
neoliberal que nos pretendem impor...
No passado, durante muito tempo, muita gente acreditava que era o sol que
girava em volta da terra. Mas não era pelo facto de muita gente ter essa
crença que isso era verdade. O mesmo se pode dizer com o neoliberalismo
dominante nestes últimos tempos.
O colapso do sistema financeiro do capitalismo, que só foi
possível de evitar totalmente através de uma
intervenção maciça do Estado, intervenção
essa no passado tão repudiada por esse mesmo neoliberalismo, utilizando
para isso sem qualquer vergonha gigantescos fundos públicos para salvar
o pilar fundamental de todo o sistema capitalista, que é o seu sistema
financeiro, tornou claro para muita gente a falsidade e a falta de fundamento
técnico e cientifico do neoliberalismo dominante. Para além disso
a falta de escrúpulos, de ilegalidades, de não olhar a meios para
obter elevados lucros que caracteriza a gestão capitalista de muitos
grupos económicos ficou também a nu.
Contrariamente à mensagem que este governo tem procurado agora fazer
passar, utilizando o pretexto de defesa do sistema financeiro e do emprego,
não é admissível continuar a canalizar milhões e
milhões de euros de fundos públicos e de impostos cobrados a
todos os portugueses para salvar grandes empresas que, no tempo das "vacas
gordas", canalizaram para os bolsos dos accionistas elevados lucros e que
agora, em período de crise, pretendem que seja o Estado, ou seja, todos
nós, a suportar os prejuízos. É um autêntico
escândalo que seja o Estado a ter de suportar os quase 1000
milhões de euros de prejuízos de uma gestão mafiosa no BPN
e que intervenha no BPP, um banco que geria grandes fortunas, e que tenha
aprovado 24 mil milhões de euros para apoiar a banca; e que, ao mesmo
tempo esse mesmo governo, recuse devolver 28 milhões de euros que
espoliou a 40 mil reformados com pensões inferiores a 400 euros (
nosso estudo nº 40
), que aumenta em 2009 as pensões médias da
Segurança Social em apenas 37 cêntimos por dia (
nosso estudo nº 44
), que reduz o apoio aos desempregados (nossos estudos
nº 20
e
nº 45
) e que aprova medidas de apoio insuficientes às PMEs que, para
além disso, só abrangem menos de 1% delas.
Desculpem esta mensagem mais longa. Estamos nos últimos dias de 2008, e
ela é ao mesmo tempo uma mensagem de despedida de ano e de
reflexão.
Até ao próximo ano.
Eugénio Rosa
O que era necessário que o governo esclarecesse sobre a
"reforma" da administração pública
RESUMO DESTE ESTUDO
O secretário de Estado da Administração Pública
anda a percorrer os distritos do País com o objectivo, diz ele, de
esclarecer e tranquilizar os trabalhadores sobre a "reforma"
governamental da Administração Pública. Esteve no dia 12
de Dezembro de 2008 em Braga, e já anunciou que estará no dia 9
de Janeiro de 2009 em Lisboa, 21 em Viseu, 28 em Setúbal, 6 de
Fevereiro no Porto, 18 em Coimbra, 4 de Março em Faro, 13 em Beja, e 3
de Abril em Évora. Há questões graves que o governo tem-se
recusado a esclarecer e que era importante que o secretário de Estado o
fizesse nessas reuniões e não as transformasse em sessões
de propaganda do governo.
Era importante que o secretário de Estado da Administração
Pública esclarecesse como se compatibiliza a disposição
constante do artº 88º da Lei 12-A/2008, que pretende liquidar o
vínculo de nomeação na Administração
Pública, com o texto constitucional, pois como escreveram Paulo Veiga e
Moura e Cátia Arrimar "esta alteração unilateral de
regime de vinculação não é compatível com o
texto constitucional, violando frontalmente o principio constitucional da
protecção da confiança e o direito fundamental de acesso
à função pública".
Era importante que o secretário de Estado esclarecesse que medidas o
governo tenciona tomar para que a insegurança e precariedade provocada
pelas eventuais alterações anuais nos quadros de pessoal dos
serviços previstas no artº 5º da Lei 12-A/2008, não
determinem que muitos trabalhadores sejam considerados em excesso e colocados
na situação de mobilidade especial ou mesmo despedidos como
prevê o artº 6º da mesma lei?
Era igualmente importante que o secretário de Estado esclarecesse que
medidas o governo tenciona tomar para que se não verifique também
em 2009 o congelamento de facto das carreiras da esmagadora maioria dos
trabalhadores da Administração Pública? E qual a
dotação que existe no OE2009 para mudanças de
posições remuneratórias e quantos trabalhadores
poderão beneficiar de mudanças de posições
remuneratórias em 2009 com essa verba, quando o artº 2º da Lei
do OE2009 cativa, à partida, 25% das "verbas afectas às
alterações facultativas de posicionamento
remuneratório"? E tudo isto porque o nº4 do artº 47º
da Lei 12-A/2008 permite aos responsáveis dos serviços não
afectar qualquer dotação para alteração de
posições remuneratórias dos trabalhadores e, se isso
acontecer, mesmo que os trabalhadores tenham as avaliações
necessárias para poder mudar de posição
remuneratória ela não terá lugar com
excepção da situação prevista no nº 6 do mesmo
artigo (o trabalhador ter somado 10 pontos). E mais quando o governo criou um
novo encargo a ser suportado pelos orçamentos dos serviços
contribuição de 7,5% para a CGA que vai custar aos
serviços 585 milhões de euros em 2009.
Seria também importante que o secretário de Estado esclarecesse
que medidas o governo tenciona tomar para que não se criem desigualdade
remuneratórias entre os trabalhadores de serviços diferentes e,
no interior do mesmo serviço, entre os diferentes trabalhadores o que
é permitido pelos nº1 e 2 do artº 46 da Lei 12-A/2008?
Seria igualmente importante que o secretário de Estado esclarecesse que
medidas o governo tenciona tomar para que não se criem desigualdades
entre os trabalhadores que já estão na
Administração Publica e os que entrarem no futuro para
Administração Pública permitidas pelo artº 55 da Lei
12-A/2008, já que futuramente as remunerações de entrada
serão negociadas individualmente entre o trabalhador e o
responsável máximo do serviço ou da unidade orgânica.
Seria importante que o secretário de Estado da
Administração Pública nas reuniões distritais que
fizesse clarificasse a posição do governo sobre as
disposições graves das leis publicadas que criam
insegurança e precariedade no emprego, que introduzem o arbítrio
das chefias, que procuram instalar a psicologia do medo e do compadrio na
Administração Publica, incompatível com um Estado
democrático e com uma Administração Pública ao
serviço de todos os cidadãos.
|
Este governo publicou um conjunto numeroso de diplomas que alterou quase todas
as leis da Administração Pública, e é a isso que
Sócrates e o seu governo designam por "reforma" da
Administração Publica. Muitas dessas leis mesmo antes de entrarem
em vigor foram várias vezes alteradas pelo próprio governo, de
que são exemplo as relativas ao Estatuto da Aposentação, e
mesmo na Lei do OE2009, que ainda não entrou em vigor, o governo altera
disposições de leis que antes publicara. Tudo isto mostra que
essas leis foram elaboradas e aprovadas à pressa e sem se analisar as
consequências da sua aplicação, criando assim uma grande
insegurança e instabilidade em toda a Administração
Pública, o que está também a provocar a
desorganização de serviços públicos com
consequências negativas para a população.
O secretário de Estado da Administração Pública
anda a percorrer os distritos do País com o objectivo, diz ele, de
esclarecer e tranquilizar os trabalhadores sobre a reforma da
Administração Pública. A mensagem que o secretário
de Estado procura fazer passar nessas reuniões é de que tudo
está e vai correr bem com a "reforma" governamental da
Administração Pública. No entanto, isso não
é verdade, pois existem muitas questões importantes e graves que
o governo nunca esclareceu e era importante que o fizesse nessas
reuniões.
A MUDANÇA DE VÍNCULO IMPOSTA UNILATERALMENTE É
INCONSTITUCIONAL
O artº 88 da lei 12-A 2008 estabelece que todos os trabalhadores
actualmente com vínculo de nomeação, que não
exerçam as funções de soberania enumeradas no artº
10º da mesma lei (nas embaixadas, forças armadas,
informações de segurança, investigação
criminal, segurança pública e inspecção)
"transitam, sem outras formalidades, para a modalidade de contrato por
tempo indeterminado", que são a esmagadora maioria dos
trabalhadores da Administração Pública.
No entanto, como escreveram Paulo Veiga e Moura e Cátia Arrimar, no seu
livro "Os novos Regimes de vinculação e de
remunerações dos trabalhadores da Administração
Pública", Coimbra Editora, 2008, "esta alteração
unilateral de regime de vinculação não é
compatível com o texto constitucional, violando frontalmente o principio
constitucional da protecção da confiança e o direito
fundamental de acesso à função pública, podendo-se
dizer sumariamente que se "expropria" o trabalhador de uma qualidade,
de um regime e de uma identidade que constitucionalmente lhe é
assegurada a de funcionário público que fazia parte
integrante do seu núcleo dos seus direitos adquiridos"(pág.
174). E acrescentam: "O próprio Tribunal Constitucional já
teve a oportunidade de salientar que a garantia de estabilidade de emprego
público impossibilita que, sem o consentimento do interessado, possa
haver uma alteração substancial do regime jurídico
disciplinador e do estatuto especifico dos funcionários"
(Acórdão nº 154/86, Diário da República, I
Série, de 12 de Julho de 1986).
Portanto, era necessário que o secretário de Estado da
Administração Pública esclarecesse nas reuniões
distritais como se compatibiliza a disposição constante do
artº 88º da Lei 12-A/2008 com o texto constitucional.
Para além disso, o parecer daqueles dois juristas assim como o
acórdão do Tribunal Constitucional referidos reforçam a
posição dos sindicatos da função pública
para protestaram contra tal norma assim como a necessidade de todos os
trabalhadores da Administração Pública actualmente com
vínculo de nomeação reclamarem quando, de acordo com o
artº 109 da mesma lei, tal transição for executada,
"em cada órgão ou serviço, através de lista
notificada a cada um dos trabalhadores e tornada pública por
afixação no órgão ou serviço e
inserção em página electrónica". E esta
divulgação deverá ter lugar com efeitos a partir da data
de entrada em vigor do Regime de Contrato de Trabalho em Funções
Públicas, ou seja, a partir de 1 de Janeiro de 2009.
OS MAPAS DE PESSOAL, UM INSTRUMENTO GERADOR DE INSEGURANÇA E PRECARIEDADE
O nº3 do artº 5º da Lei 12-A/2008 estabelece que "os mapas
de pessoal de cada órgão ou serviço são aprovados,
mantidos ou alterados pela entidade competente para a aprovação
da proposta de orçamento". Portanto, a alteração do
mapa de pessoal poderá acontecer todos os anos, pois todos os anos o
responsável pelo serviço terá de apresentar uma proposta
de orçamento aquando da elaboração do Orçamento do
Estado.
E segundo o nº1 do artº 6º da mesma lei, "face aos mapas de
pessoal, o órgão ou serviço verifica se se encontram em
funções trabalhadores em número suficiente, insuficiente
ou
excessivo
". E se o responsável pelo serviço considerar que o
número de trabalhadores em funções é excessivo, o
que é que acontece a esses trabalhadores? Segundo o nº 8 do
artº 6º da Lei 12-A/2008, aos trabalhadores que o responsável
considere que estão em excesso, se forem ex-nomeados são
colocados na situação de mobilidade especial; se tiverem um
contrato de trabalho de emprego público, seja sem termo ou a termo,
são despedidos ou imediatamente ou eventualmente ao fim de um ano. E
isto porque o artº 33º da mesma lei (nº 5 a 8), dispõe
que aos trabalhadores a despedir é apenas dada a possibilidade de serem
colocados, durante um ano, na situação de mobilidade especial e,
se nesse período de tempo, não conseguirem arranjar emprego na
Administração Pública, serão então
definitivamente despedidos.
As questões que o secretário de Estado da
Administração Pública devia esclarecer nessas
reuniões distritais eram as seguintes: Como poderá haver
tranquilidade e normalidade na Administração Pública com a
insegurança e precariedade que é criada todos os anos com a
aprovação dos mapas de pessoal? Como é que o trabalhador
da Administração Pública sabendo que o chefe, por qualquer
razão, o poderá colocar na lista de trabalhadores em excesso se
sentirá tranquilo? Que medidas o governo tenciona tomar para acabar com
tal ameaça e insegurança?
Pelo seu lado, os trabalhadores para reduzir essa ameaça contínua
poderão utilizar disposições constantes do Regime de
Contrato de Trabalho em Funções Públicas. Assim, de acordo
com os artigos 337 do Anexo I à Lei 59/2008 (os delegados sindicais) e
com os artº 234 e 235 do Anexo II da mesma lei (a comissão de
trabalhadores) têm direito a ser informados e consultados sobre os mapas
de pessoal. E isto até porque o artº 337, nº2, alínea
b) dispõe especificamente que o direito a informação e
consulta abrange "a informação e consulta sobre a
situação, a estrutura e a evolução provável
do emprego no órgão e serviço e sobre eventuais medidas de
antecipação previstas, nomeadamente em caso de ameaça para
o emprego". Mas para que isso suceda terão de requerer por escrito
informações sobre os mapas de pessoal, as quais terão de
ser prestadas num prazo máximo de 10 dias pelo responsável pelo
serviço (artº 337 do Anexo I e artº 235 do Anexo II).
Também o nº1 do artº 235 estabelece que têm de ser
obrigatoriamente precedidos de parecer "quaisquer medidas de que resulte
uma diminuição substancial de trabalhadores do
órgão e serviço ou o agravamento substancial das suas
condições de trabalho e, ainda, as decisões
susceptíveis de desencadear mudanças substanciais no plano da
organização de trabalho ou dos contratos". Com base na
informação assim obtida poderão contestar qualquer
tentativa para colocar trabalhadores na situação de mobilidade
especial ou para despedir trabalhadores. Para além disso, e como referem
também Paulo Moura e Cátia Arrimar, quando o mapa de pessoal
determine a cessação ou modificação de uma
relação de emprego público, esse "acto será
passível de ser objecto de controlo judicial" (pág. 16, obra
citada).
AS CATEGORIAS DOS QUADROS DE PESSOAL DEVERÃO SER OBJECTO DE
NEGOCIAÇÃO COM OS SINDICATOS
O nº1 do artº 5º da Lei 12-A/2008, dispõe que os mapas de
pessoal contêm a indicação do número de postos de
trabalho de cada órgão ou serviço com a
indicação da atribuição, competência ou
actividade; do cargo ou da carreira e categoria; e dentro de cada carreira e,
ou, categoria, quando imprescindível, da área de
formação académica ou profissional de que o seu ocupante
deva ser titular". Portanto, é a nível de quadros pessoal
que poderão ser definidas categorias profissionais e estabelecidas com
maior clareza as competências e, naturalmente, as respectivas
funções dos trabalhadores. Esta matéria, no entanto,
é específica da contratação colectiva, e o governo
teima em não reconhecer esse direito constitucional.
Também em relação a esta matéria os trabalhadores
podem exigir o respeito pelo direito à informação e
consulta constantes nos artº 337 do Anexo I da Lei 59/2008 e nos artº
234 e 235 do Anexo II da mesma lei. E isto até porque o artº 234
dispõe especificamente que esse direito abrange "a gestão
dos recursos humanos, em função dos mapas de pessoal".
OS TRABALHADORES NÃO TÊM QUALQUER GARANTIA DE PROGRESSÃO NA
CARREIRA
O nº1 do artº 47 da Lei 12-A/2008 começa por estabelecer que o
trabalhador poderá mudar de posição remuneratório,
ou seja, passar a receber uma remuneração mais elevada, se
obtiver, através da avaliação: (a) Duas
menções máximas consecutivas; (b) Três
menções imediatamente inferiores às referidas na
alínea anterior; (c) Cinco menções referidas na
alínea anterior, desde que consubstanciam desempenho positivo,
consecutivas.
No entanto, o nº4 do mesmo artigo, dá o dito por não dito,
pois dispõe o seguinte: "Não há lugar a
alteração de posição remuneratória quando a
dotação orçamental para o universo de trabalhadores em
causa fixada pelo respectivo responsável com esse objectivo se tenha
previsivelmente esgotado". Portanto, os trabalhadores de um serviço
poderão ter obtido as avaliações necessárias para
mudar de posição remuneratória, mas se o
responsável decidir num ano não afectar qualquer
dotação orçamental para esse fim, os trabalhadores
não poderão mudar de posição remuneratória.
A única excepção a esta situação é a
prevista no nº 6 do artº 47 da mesma lei que estabelece que o
trabalhador mudará obrigatoriamente de posição
remuneratória desde que tenha acumulado 10 pontos na
avaliação de desempenho. No entanto, para mais 75% dos
trabalhadores Administração Publica (por imposição
do artº 75 da Lei 66-B/2007, 75% não poderão ter a
classificação de "desempenho relevante" e
"desempenho excelente") serão necessários para
conseguir isso muito mais de 10 anos, o que significa o congelamento de facto
da sua carreira profissional (necessitarão, na melhor das
hipóteses, de 40 anos para subir 4 posições
remuneratórias, e a carreira de Técnico Superior tem 14
posições remuneratórias; a de Assistente Técnico
também 14 posições remuneratórias; e a de
Assistente Operacional 8 posições remuneratórias;
portanto, seriam necessárias várias vidas activas para
alcançar o topo da carreira)
Seria importante também que o secretário de Estado esclarecesse o
seguinte: Que medidas o governo tenciona tomar para que se não
verifique, também em 2009, o congelamento de facto das carreiras da
esmagadora maioria os trabalhadores? Qual é o montante da
dotação que existe no OE2009 para mudanças de
posições remuneratórias e quantos trabalhadores
poderão beneficiar de mudanças de posições
remuneratórias em 2009 com a verba que foi afecta para esse fim?
O AGRAVAMENTO INEVITÁVEL DE DESIGUALDADES REMUNERATÓRIAS ENTRE
TRABALHADORES
O nº 1 do artº 46 da Lei 12-A/2008 dispõe que é da
competência do dirigente máximo do órgão ou
serviço, tendo em consideração as verbas
orçamentais destinadas a mudanças de posições
remuneratórias que ele próprio decidiu nos termos do artº
7º desta mesma lei, decidir "se, em que medida, este se propõe
suportar encargos decorrentes de alterações do posicionamento
remuneratório na categoria dos trabalhadores do órgão ou
serviço". Portanto, num mesmo ano, pois nada impede isso, pode
acontecer que o dirigente máximo de um serviço decida suportar
encargos decorrentes de alterações do posicionamento
remuneratório, e o dirigente de outro órgão ou
serviço decida não suportar encargos com alterações
de posições remuneratórias, o que determinará que
os trabalhadores do primeiro serviço terão progressão na
sua carreira, enquanto os trabalhadores do segundo serviço
ficarão, nesse ano, com a sua carreira congelada. É evidente, que
uma situação destas, que é possível acontecer com
esta lei do governo, determinará a criação de
desigualdades remuneratórias entre os trabalhadores dos diferentes
serviços.
Mas as desigualdades remuneratórias poderão ser criadas dentro do
mesmo serviço. E isto porque, de acordo o nº4 do mesmo artigo, as
alterações de posições remuneratórias
"podem não ter lugar em todas as carreiras, ou em todas as
categorias de uma mesma carreira ou ainda relativamente a todos os
trabalhadores integrados em determinada carreira ou titulares da mesma
categoria". Portanto, a própria lei dá cobertura à
criação de desigualdades dentro do mesmo serviço ou
órgão, pois permite ao responsável máximo excluir
determinadas carreiras ou categorias de mudança de
posições remuneratórias.
E tudo isto é ainda agravado por uma outra disposição
contida no artº 48 da Lei 12-A/2008, denominada
"Alteração do posicionamento remuneratório
Excepção", que permite ao dirigente máximo, mesmo que
um trabalhador não tenha as avaliações necessárias
para poder mudar de posição remuneratória, decidir que ele
passe à frente dos restantes trabalhadores, "para qualquer outra
posição remuneratória seguinte àquela em que se
encontra" (nº2).
Seria importante também que o secretário de Estado da
Administração Pública esclarecesse se está de
acordo com a criação de desigualdades de tratamento
remuneratórios entre os trabalhadores dos diferentes serviços e
se, relativamente a cada serviço, está de acordo com a
criação de desigualdades de tratamento remuneratório entre
os trabalhadores do mesmo serviço ou órgão? E se
não está que medidas o governo tenciona tomar para que isso
não aconteça?
A CRIAÇÃO DE DESIGUALDADES REMUNERATÓRIAS ENTRE OS
TRABALHADORES QUE JÁ ESTÃO NA ADMINISTRAÇÃO
PÙBLICA E OS QUE ENTRAREM NO FUTURO
De acordo com o nº1 do artº 55º da Lei 12-A/2008, "o
posicionamento do trabalhador recrutado numa das posições
remuneratórias de categoria é objecto de negociação
com a entidade empregadora". Contrariamente ao que sucedia, em que existia
uma remuneração de acesso à carreira, segundo esta nova
disposição passa a não existir, sendo negociada a
remuneração individualmente à entrada, entre o trabalhador
e a entidade empregadora. Como a lei não fixa qualquer limite
máximo, consequentemente qualquer posição
remuneratória das várias existentes em cada carreira
poderá ser atribuída.
È evidente que este arbítrio na fixação da
remuneração de entrada (depende apenas da
negociação entre as duas partes), para além de permitir
que funcione a "cunha" e o cartão partidário,
poderá determinar que um trabalhador, com as mesmas
qualificações do que um que já está na
Administração Públicas há vários anos,
vá ganhar muito mais criando-se assim também desigualdades
remuneratórias entre os trabalhadores.
A pergunta que o secretário de Estado devia esclarecer era a seguinte:
Que medidas o governo tenciona tomar para evitar a criação de
desigualdades remuneratórias entre os novos trabalhadores da
Administração Pública e os que já estão
está nela há vários, já que o artº 55 da Lei
12-2008 dá poder ao responsável máximo para negociar e
fixar, através de negociação individual, com os
trabalhadores que se apresentem nos concursos qualquer posição
remuneratória das várias que existem relativamente a cada
carreira (14 das de Técnico Superior, 14 de Assistente Técnico, e
8 de Assistente Operacional)?
Também os delegados sindicais, ao abrigo do direito de
informação e consulta poderão exigir
informações sobre a "evolução provável
do emprego "do serviço (artº 337, nº2 , alínea b
do Anexo I do RCTFP). O mesmo em relação às
Comissões de Trabalhadores que poderão obter o orçamento
do serviço, e informações sobre a "gestão dos
recursos humanos, em função dos mapas de pessoal"
(artº 234, nº 1, Anexo II do RCTFP).
O SIADAP: um sistema de avaliação que o governo pretende utilizar
contra os trabalhadores
Mesmo sem entrar em conta com o facto de duas avaliações
negativas constituírem motivo suficiente para processo disciplinar e
despedimento (artº 69 da Lei 58/2008), a análise de algumas das
disposições mais importantes da Lei 12-A/2008 mostrou a forma
como o governo tenciona utilizar o SIADAP, que é a seguinte: Se o
trabalhador não obtiver as avaliações necessárias
para poder mudar de posição remuneratória ele não
muda; mas se obtiver, o trabalhador não tem assegurada a
alteração da posição remuneratória. Tudo
depende do arbítrio do responsável máximo ter decidido
afectar ou não, nesse ano, uma parcela do orçamento do
serviço ou órgão para mudanças de
posições remuneratórias dos trabalhadores.
Em relação ao SIADAP, interessa ter presente o seguinte. Segundo
o nº2 do artº 9º da Lei 66-B/2007, os três subsistemas de
avaliação (SIADAP1, SIADAP 2 e SIADAP 3) "funcionam de uma
forma integrada pela coerência entre objectivos fixados no sistema de
planeamento, objectivos do ciclo de gestão do serviços,
objectivos fixados na carta de missão dos dirigentes superiores e
objectivos fixados aos demais dirigentes e trabalhadores". Portanto, se os
subsistemas "funcionam de uma forma integrada" é
necessário que todos eles existam e funcionem para que cada um deles
possa funcionar. No caso concreto do SIADAP 3, que abrange os trabalhadores,
para que ele possa funcionar de uma forma integrada e coerente é
necessário que funcionem simultaneamente o SIADAP 1 e o SIADAP 2, e que
os objectivos a nível de cada um deles sejam conhecidos pelos
trabalhadores para que os objectivos negociados/fixados para cada trabalhador
sejam articulados de uma forma coerente com os objectivos do SIADAP 1 e do
SIADAP2.
Os objectivos de cada serviço devem constar do
QUAR
, ou seja, do
Quadro de Avaliação e Responsabilização
. Portanto, antes de serem fixados os seus objectivos, os trabalhadores devem
exigir conhecer o QUAR do seu serviço. E de acordo com a alínea
b) do nº 1 do artº 62º, "
a definição dos objectivos e resultados a atingir pelas unidades
orgânicas deve envolver os respectivos
dirigentes e
trabalhadores
. ". Portanto, os objectivos das unidades orgânicas devem
estar naturalmente articulada com a do serviço, e essa
definição dos objectivos e resultados deve ser prévia e
envolver os trabalhadores.
Por outro lado, o nº 3 do artº 62º da Lei 66-A/2007
dispõe que na fase de planeamento estabelecem-se as
articulações necessárias na aplicação dos
vários subsistemas que constituem o SIADAP (SIADAP 1, 2 e 3 ),
nomeadamente visando o alinhamento dos objectivos do serviço, dos
dirigentes e demais
trabalhadores
". Esta disposição reforça a necessidade de
envolvimento e participação dos trabalhadores quer na
definição dos objectivos a nível de cada um dos seus
subsistemas quer depois na avaliação dos resultados obtidos, ou
seja, na chamada auto-avaliação, e a necessidade dos
trabalhadores conhecerem previamente os objectivos dos serviços e dos
seus responsáveis para poderem fixar os seus objectivos, pois o
cumprimentos dos objectivo a nível dos serviços e chefias
é também feito através do cumprimentos dos objectivos que
se venham a fixar para cada trabalhador.
Se tudo isto não está a ser respeitado a nível dos
serviços e pelos responsáveis, e parece que não
está acontecer na maioria dos casos, seria necessário que os
trabalhadores confrontassem o secretário de Estado com
situações concretas verificadas nos seus serviços,
nomeadamente no caso de se terem verificado a imposição de
objectivos absurdos e ilegais, pois os objectivos não devem ser
impostos, mas sim contratualizados, como dispõe os artº 66 e 67 da
Lei 66-A/2007. Pedimos para que nos enviem para o endereço
edr@mail.telepac.pt
informações sobre a forma como tem sido fixados os objectivos
aos trabalhadores pelos serviços, em que data do ano o foram, e o teor
dos objectivos fixados, nomeadamente os que considerem ilegais ou absurdos. Com
base em casos concretos poder-se-á fazer uma análise objectiva da
forma como o governo está impor a aplicação do SIADAP,
pois apesar de se ter realizado a 2ª reunião do Conselho
Coordenador de Avaliação dos Serviços em 27.11.2008, o
governo foi incapaz de apresentar quaisquer dados sobre a
aplicação do SIADAP..
AS CONSEQUENCIAS PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DA
"REFORMA" DO GOVERNO
A existência na Administração Pública do
vínculo de nomeação e de regras claras na
progressão na carreira defendia os trabalhadores contra o
arbítrio das chefias e do poder político; impedia a chantagem
sobre os trabalhadores para que satisfizessem interesses pessoais ou
partidários; e garantia a prestação de serviços
públicos, em igualdade, a todos os cidadãos. Este governo, ao
pretender acabar com o vínculo de nomeação e ao alterar
profundamente as regras que existiam na Administração
Pública, nomeadamente quanto à admissão e à
progressão na carreira; à fixação de
remunerações, ao direito ao emprego, etc, tornando tudo isto
totalmente dependente do arbítrio das chefias, como se mostrou, cria
condições para o aumento das desigualdades entre os trabalhadores
dos diferentes serviços e mesmo no interior de cada serviço, para
a chantagem dos trabalhadores, para os despedimento de trabalhadores mais
firmes, etc.; em suma, o que se pretende introduzir na
Administração Pública é a desigualdade, a
precariedade, a psicologia do medo e o poder absoluto e arbitrário das
chefias, e acabar, objectivamente, com uma Administração
Pública independente, que sirva, em igualdade, todos os
cidadãos, passando a servir melhor alguns, aqueles que sejam do agrado
das chefias e do poder politico. É contra tudo isto que todos os
portugueses se devem opor.
30/Dezembro/2008
[*]
Economista,
edr@mail.telepac.pt
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|