Outro caminho de desenvolvimento: conduzido pelo salário

O rendimento salarial estagnado do trabalhador leva à super-capacidade (parte I)

por Henry C.K. Liu [*]

Na teoria económica do desenvolvimento há a regra rígida de que "rendimento é tudo". A regra declara que a efectividade das políticas, programas e medidas de desenvolvimento deveria ser medida pelo seu efeito na elevação do rendimento salarial dos trabalhadores e que uma economia de baixos salários é uma economia subdesenvolvidas porque ela mantém a procura agregada do consumidor abaixo do seu nível óptimo, provocando portanto super-capacidade na economia que precisa ser absorvida pela exportação.

O rendimento dos trabalhadores é o factor chave na geração da riqueza nacional de um país. A exportação através da produção com baixos salários está simplesmente despachando riqueza nacional a baixo preço para fora das fronteiras nacionais sem compensação adequada, pelo sub-apreçamento do trabalho dentro do país. Durante a era do imperialismo industrial, a exportação de bens manufacturados era promovida pelas economias de baixos salários para colónias de baixos salários em troca de ouro monetário, de modo que mais investimento podia ser efectuado para proporcionar mais empregos para trabalhadores de altos salários internamente. Nas economias financeiras pós-industriais, a arbitragem salarial transfronteiriça no comércio global não regulamentado explora trabalhadores em economias de baixos salários para produzir para consumidores em economias de salários mais altos.

A globalização do comércio ocupa o lugar do desenvolvimento interno em todos os países

Esta regra do "rendimento é tudo" geralmente foi obscurecida nas últimas décadas durante as quais o comércio externo globalizado promovido pelos neoliberais tomou o lugar do desenvolvimento interno como o motor do crescimento económico em todas as economias de mercado por todo o mundo. No jogo de hoje do comércio internacional globalizado, a nova regra operacional é que "lucro é tudo" e que lucro elevado na exportação comercial competitiva exige baixos salários internos, mesmo se baixos salários locais retardam o desenvolvimento económico interno ao reduzir o poder de compra agregado no mercado interno para provocar super-capacidade que apoie a exportação. Quando salários de trabalhadores não são suficientes para comprar os bens que eles produzem, os mercados internos caem no subdesenvolvimento e é necessária a exportação para economias de altos salários a fim de produzir lucro para as empresas.

Lucro corporativo excessivo originado de baixos salários leva à super-capacidade

Esta nova regra do comércio globalizado é concebida para produzir a maximização a curto prazo de lucro corporativo para um sector exportador. Mas na economia financeira pós-industrial, os sectores de exportação em economias de baixos salários são em grande medida possuídos ou financiados pelo capital internacional transfronteiriço. Este tipo de comércio internacional incorre na inevitável estagnação a longo prazo das economias internas de todos os países que comerciam porque os baixos salários pagos pelo capital internacional levam a insuficiente procura agregada do consumidor interno. Salários estagnados por toda a parte por sua vez reduzem o poder de compra global agregado necessário para a expansão do comércio internacional. É um caso claro que sub-optimização económica desequilibrada.

O capital estrangeiro investido no comércio internacional não tem incentivo para elevar salários locais

O sector exportador do comércio exterior em qualquer economia não considera, naturalmente, o poder de compra dos trabalhadores locais como tendo qualquer consequência porque os bens e serviços produzidos pelos trabalhadores locais nos sector exportador são vendidos em mercados externos de altos salários por lucros denominados na divisa de reserva geralmente aceite no comércio internacional, a qual desde o fim da II Guerra Mundial tem sido o US dólar.

Em resultado, o sector importador no comércio externo de todos as economias também tem um fraco desempenho devido ao insuficiente poder de compra interno tanto de produtos internos como das importações necessárias. Isto é verdadeiro em variados graus para todas as economias que participam no comércio internacional. A única excepção é a economia dos EUA cuja divisa apoiada por ouro geralmente tem sido aceite como a divisa de reserva para o comércio internacional desde o fim da II Guerra Mundial. Mas o dólar tem sido uma divisa fiduciária desde 1971 quando foi desligado do ouro.

Nas economias financeiras avançadas, a dívida do consumidor é utilizada para ultrapassar o poder de compra estagnado do consumidor causado pelos baixos salários. Os baixos salários têm sido a causa fundamental das bolhas de dívidas recorrentes nas economias avançadas. Mesmo para os EUA, a arbitragem salarial transfronteiriça também manteve os salários estado-unidenses estagnados, os quais os decisores políticos dos EUA compensaram com uma política de alta dívida do consumidor que era insustentável com salários estagnados. O ítem principal na dívida do consumidor é a hipoteca habitacional. Esta dívida excessiva em relação ao rendimento salarial tem sido a causa real por trás da actual crise financeira global.

Morte da arquitectura financeira internacional de Bretton Woods

No fim da II Guerra Mundial, uma conferência internacional dos aliados vitoriosos foi efectuada nos EUA em Bretton Woods, New Hapshire, em 1944, para moldar uma arquitectura financeira internacional do pós-guerra na qual o regime monetário seria baseado no dólar como divisa de reserva do comércio internacional, preso ao ouro a US$35 por onça [NT 1] . As taxas de câmbio de divisas emitidas pelos governos participantes eram fixadas e relativamente estáveis. Os pagamentos de divisas cambiais eram efectuados apenas entre bancos centrais. Não havia qualquer mercado aberto do comércio de divisas pois a maior parte dos países exercia o controle de capitais dentro das suas fronteiras. As economias que incorressem em défices comerciais persistentes não poderiam desvalorizar as suas divisas para conseguir excedentes comerciais. A teoria económica naquele tempo não via o fluxo transfronteiriço de capitais como necessário ou benéfico para o desenvolvimento interno.

Mas mesmo depois de os EUA suspenderem a ligação do dólar ao ouro em 1971, em resposta ao esgotamento do montante de ouro mantido pelo Federal Reserve, o banco central dos EUA, devido a persistentes défices comerciais e fiscais do país, o dólar continuou a ser aceite pelos países que comerciavam como a divisa de reserva dominante para o comércio internacional por falta de outra opção, por falta de uma divisa de reserva dominante e porque a perícia geopolítica estado-unidense havia feito com que o comércio de commodities básicas, principalmente o petróleo, fosse denominado em dólares depois de 1973.

Hoje, cerca de 60% das reservas de divisas do mundo são denominadas em dólares, a ser comparado com o seu principal competidor, o Euro, no qual são denominadas apenas cerca de 24% das reservas mundiais. Esta é a única distinção técnicas pois todas as outras divisas fiduciárias livremente convertíveis são essencialmente derivativos do dólar pois os preços de todas as commodities básicas são denominados em dólares.

O dólar agora é uma divisa fiduciária emitida pelo país mais endividado do mundo

O valor cambial de qualquer divisa fiduciárias é uma função do nível da dívida pública pendente e da quantidade de moeda emitida pelo seu governo. O dólar, a divisa de reserva dominante do mundo para o comércio, é a divisa fiduciária do país mais endividado do mundo. Isto acontece porque a dívida soberana dos EUA é denominada em dólares, não em divisas estrangeiras. Os EUA não tem dívida externa, apenas dívida soberana denominada na sua própria divisa mantida por estrangeiros.

A dívida pública pendente dos EUA, ou dívida contraída pelo público colectivamente, está num excesso de US$13 milhões de milhões (trillion) em relação a um PIB de US$14,6 milhões de milhões. A dívida pública dos EUA continua a crescer a uma taxa de cerca de US$3,83 mil milhões por dia, ou US$1,4 milhão de milhões por ano. O crescimento anual da dívida pública estado-unidense a 10% excede o crescimento do seu PIB que cresce a menos de 2%. A dívida pública dos EUA de 100% do PIB em 2010 excede o nível geralmente aceite de um rácio de 60% de dívida em relação ao PIB. Mas o status de divisa de reserva do dólar para o comércio internacional permanece firmemente garantido, embora a taxa de câmbio dos dólares contra outras divisas tenha estado a declinar constantemente desde 2002.

A dívida total dos EUA é insustentavelmente alta

O total da dívida pública dos EUA (devida colectivamente por todos os cidadãos) e da dívida privada (devida privadamente por indivíduos e entidades privadas) era de US$50,2 milhões de milhões no fim do 1º trimestre de 2010 ou 3,5 vezes o PIB desse mesmo ano. O que torna a dívida pública e privada dos EUA diferente daquelas mantidas por outros países é que todas as dívidas estado-unidenses são denominadas na sua própria divisa a qual os EUA podem emitir à vontade com pouca penalização além da possível desvalorização cambial do dólar.

O valor total líquido dos EUA como país alcançava os US$44,2 milhões de milhões no fim do primeiro trimestre de 2010, cerca de 3,02 vezes o PIB do ano. Os activos financeiros internos dos EUA totalizavam US$131 milhões de milhões e os passivos financeiros internos totalizavam US$106 milhões de milhões, deixando um valor líquido de US$25 milhões de milhões, ou 1,42 vezes o PIB. O valor líquido dos activos não financeiros totalizava US$19,2 milhões de milhões, ou 1,32 vezes o PIB.

De acordo com dados do Federal Reserve, o valor total líquido dos Estados Unidos permaneceu entre 4,5 e 6 vezes do PIB anual da década de 1960 até os anos 2000, quando em 20006 ascendeu a uma altura de 6,64 vezes do PIB, devido principalmente a um aumento no valor líquido das famílias estado-unidenses com o efeito riqueza da bolha habitacional. Contudo, no fim de 2008 o valor líquido dos Estados Unidos havia declinado drasticamente de 6,64 vezes para 5,2 vez o PIB anual devido ao declínio agudo no valor de mercado de acções corporativas e no imobiliário na sequência do colapso do mercado hipotecário sub-prime titularizado e da resultante crise financeira global. Só o valor líquido habitacional montava a apenas 3,55 vezes o PIB anual.

Entre 2008 e 2009, o valor líquido das famílias dos EUA havia recuperado ligeiramente de uma baixa de 3,55 vezes o PIB anual para 3,75 vezes o PIB anual em consequência da intervenção do governo para transferir a dívida privada para dentro da dívida pública através do salvamento do Tesouro a instituições financeiras demasiado grandes para falirem e com a expansão pelo Federal Reserve do seu balanço apesar da facilidade quantitativa. O preço mediano de venda de casas existentes em Setembro de 2010 ainda é mais baixo que há cinco anos atrás. Antes da actual recessão, os preços das casas aumentavam sempre a uma taxa de pelo menos 2,5% ao ano ao longo de períodos de cinco anos, o que significava que o preço de mercado da casa duplicou a cada quatro anos durante aquele período de bolha da dívida.

O valor líquido dos negócios não-financeiros nos EUA em 2008 caiu de 1,37 vezes o PIB anual para 1,22 vezes em 2010 à medida em que a economia continuou a contrair-se. Como uma recessão em W ou uma estagnação persistente parece provável em 2011 devido à ineficácia das medidas de estímulo, pode-se esperar que o valor líquido total decline outra vez em relação à baixa histórica de 3,02 vezes o PIB no fim do primeiro trimestre de 2010.

O valor líquido das famílias e instituições não lucrativas nos EUA representou 3,5 vezes do PIB anual desde 1980 e constituiu três quartos do valor total líquido estado-unidense. Desde 1960, até 2008, as famílias mantiveram sistematicamente esta posição no valor líquido, seguidas pelos negócios não financeiros (137% do PIB em 2008) e pelos governos estaduais e locais (50% do PIB em 2008).

O sector financeiro dos EUA, onde foi criada a maior parte da riqueza nas últimas décadas, tem pairado em torno do valor líquido zero desde 1960, reflectindo a sua alta alavancagem, ao passo que o governo federal tem flutuado de um valor líquido negativo de (-7%) do PIB em 1946, para uma altura de 6% do PIB em 1974 e para -32% do PIB em 2008. Se bem que o governo federal não possa ir à bancarrota, o sector financeiro dos EUA estava tecnicamente insolvente durante o primeiro quadrimestre de 2008. Estes fracos fundamentos económicos tornarão a recuperação económica difícil mesmo sem considerar a já excessivamente alta alavancagem financeira na economia dos EUA.

O preço das acções agora afecta mais a riqueza familiar do que há três décadas atrás

Houve um período prolongado semelhante de preço baixos de acções nos EUA na década de 1970, mas naquele tempo as acções eram um componente menos importante da maior parte da riqueza familiar. Agora as acções são um componente mais importante da riqueza familiar estado-unidense porque mais pessoas estão a ver a sua aposentadoria como dependente dos seus próprios investimentos no mercado de acções. Esta mudança no planeamento financeiro pessoal ocorreu gradualmente nas últimas décadas quando cada vez menos companhias ofereciam planos de pensão com benefício definido e mais pessoas tinham planos de contribuição 401(k) [NT 2] definidos, os quais eram frequentemente investidos em fundos mútuos de acções. No princípio de 2000 – quando o mercado de acções estava a atingir o pico no seu caminho para uma correcção drástica – 43% dos activos financeiros familiares eram em acções, o triplo da proporção nos meados da década de 1980. Esta é a razão porque um colapso no mercado estado-unidense de acções foi uma grande pancada para as famílias dos EUA, juntamente com o colapso do mercado habitacional.

A riqueza das famílias dos EUA afundou aproximadamente 18% em 2008, apagando anos de ganhos sustentados na habitação e nas acções e assinalando a maior perda desde que o Federal Reserve começou a efectuar registos após a II Guerra Mundial. A riqueza líquida familiar estado-unidense caiu em US$11 milhões de milhões – um declínio num único ano que equivale ao produto anual somado da Alemanha, Japão e Reino Unido. Os dados assinalam o fim de uma época definida pela propriedade generalizada de casas secundárias, além da principal, aumento de fundos de aposentação e portfólios sempre gordos.

As baixas passadas foram meros incidentes quando comparadas com as perdas que os americanos enfrentaram em 2008, as quais remeteram-nos para níveis abaixo de 2004. O declínio no valor líquido, o qual foi o primeiro em seis anos, seguiu-se um boom extraordinário. Não contando com a inflação, a riqueza familiar mais do que duplicou de 1990 a 2000 e então, após um pausa, ascendeu 50% antes da quebra de 2008.

Enquanto o valor de mercado dos seus activos estava a cair, o total da dívida privada dos EUA permaneceu aproximadamente constante. A dívida familiar total aumentou meio ponto percentual em 2008 quando as famílias enfrentaram padrões de concessão de empréstimo mais duros e muitas começaram a tentar mais arduamente viver dentro dos seus meios. Depois de ostentarem por anos os seus activos elevados, aquele fenómeno, conhecido como o efeito riqueza, agora toma o outro caminho, incentivando a frugalidade.

Colectivamente, os proprietários de casas estado-unidenses têm uma proporção de 43% das suas casas – o nível mais baixo desde que há registos. Em meio a arrestos e condições para a concessão de empréstimos mais apertadas, o montante total de crédito hipotecário no ano passado caiu pela primeira vez desde que o Fed começou a efectuar o registo em 1945.

A recessão que começou em Dezembro de 2007 reverteu um boom particularmente longo.

O Federal Reserve estima que os cidadãos e residentes nos EUA tinham US$43,8 milhões de milhões em activos financeiros no fim de Junho de 2010, 15% abaixo do número de Junho de 2007, pouco antes de a recessão ter começado. O índice Standard & Poor's de 500 acções em Junho de 2010 permanecia abaixo de onde estava em 2005, cinco anos antes e dois anos antes de o mercado ter atingido o pico no 2º trimestre de 2007.

Mercado de títulos a taxas leiloadas ainda congelado

O Wall Street Journal de 30 de Outubro de 2010 informa que mais de dois anos após o congelamento do mercado de US$330 mil milhões de títulos por taxas leiloadas – aprofundado a mais grave crise económica desde a Grande Depressão – centenas ou possivelmente milhares de investidores individuais estão presos aos títulos que detêm.

Cerca de US$130 mil milhões do dinheiro de investidores a retalho e institucionais permanecem encalhados em títulos a taxa leiloadas em perturbação, segundo SecondMarket, um corrector-vendedor e mercado secundários para activos ilíquidos, e eles continuam a ser um lastro nos resultados finais das companhias.

Os títulos por taxas leiloadas, os quais foram emitidos por cidades, escolas, hospitais e outras entidades, são instrumentos de dívida a longo prazo que são revendidos com taxas de juro actualizadas em leilões periódicos efectuados pelos bancos. Muitos investidores compram-nos a conselho dos seus correctores, os quais muitas vezes louvam-nos como uma alternativa de rendimento mais alto mas ainda assim segura. Então, no princípio de 2008, vendedores da Wall Street subitamente cessaram de comprar os títulos em leilão quando o mercado de crédito falhou.

Desde então, dúzias de grandes bancos e correctores têm recomprado milhares de milhões de dólares de títulos a taxas leiloadas de investidores em ajustes com reguladores. Mas alguns investidores, tais como aqueles que compraram títulos a taxas leiloadas a uma firma e a seguir mudaram as suas contas para outra, foram deixados fora destes ajustes. E alguns correctores que venderam títulos a taxas leiloadas criados por outras firmas ainda não fizeram o ajuste.

Economias com excedentes comerciais são vítimas da hegemonia do dólar

Quanto às economias exportadores que habitualmente mantêm excedentes comerciais denominados em dólares, tais como a China e o Japão, os dólares do excedente comercial não podem ser gastos na sua economia interna sob pena de provocar inflação porque a riqueza por trás deste excedente já foi despachada para fora do país como exportação. Portanto os dólares do excedente comercial têm então de ser utilizados para comprar dívida soberana dos EUA a qual por sua vez permite aos EUA comprarem mais importações com dólares que recebe da venda de dívida soberana denominada em dólares em com mais novos dólares que pode imprimir à vontade sem incorrer em penalidade monetária imediata. Os EUA podem aumentar da dívida externa denominada em dólar sem medo de inflação durante longos períodos porque a inflação será mantida subjugada pelas importações a baixo preço de economias exportadores de baixos salários, tal como a da China.

O comércio internacional tem sido reduzido nas últimas décadas a um jogo no qual os EUA fabricam dólares por decreto (by fiat) e os países exportadores, tal como a China, fabricam bem com baixos salários e danos ambientais que os dólares fiduciários (fiat dollars) podem comprar. Esta disposição monetária disfuncional no comércio internacional é conhecida como hegemonia do dólar. (Favor ver meu artigo de 2002 sobre a hegemonia do dólar para mais pormenores).

Ascensão do mercado cambial estrangeiro

As regras do regime do Bretton Woods, estabelecidas nos artigos do acordo do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), previam um sistema de taxas de câmbio fixas para todas as divisas que participavam no comércio internacional. As regras procuravam encorajar um sistema aberto ao comprometer os membros com o comércio livre através da convertibilidade das suas respectivas divisas em outras divisas a taxas fixadas (pegged).

Aos países que comerciavam foi exigido o estabelecimento de uma paridade das suas divisas nacionais em termos de ouro (um "vínculo", "peg" ) e que mantivessem taxas de câmbio dentro de uma paridade de mais ou menos 1% (uma "banda") através da intervenção nos seus mercados de câmbios estrangeiros (isto é, comprar ou vender moeda estrangeira) conduzida entre bancos centrais.

Em teoria, a divisa de reserva no regime de Bretton Woods seria o bancor, uma Unidade de Divisa Mundial sugerida por John Maynard Keynes cuja utilização nunca foi feita devido à objecção dos EUA. Ao invés disso, os Estados Unidos tiveram êxito em tornar o dólar a "divisa de reserva" do comércio internacional. Isto significava que outros países ligariam as suas divisas ao US dólar e – uma vez restaurada a convertibilidade – comprariam e venderiam US dólares para manter as taxas do mercado de câmbio dentro da paridade de mais ou menos 1%. Portanto, o US dólar apoiado pelo ouro ocupou o papel que o próprio ouro havia desempenhado sob o gold standard na arquitectura financeira internacional.

O presidente Richard Nixon desligou o dólar do ouro em 1971 fechou o guichet do ouro. Mas ainda se comerciavam dólares entre bancos centrais a US$35 por onça troy de ouro, contudo o dólar já não podia mais ser resgatado em ouro no Federal Reserve. Em Fevereiro de 1973, após um último suspiro com a desvalorização do novo dólar fiduciário de US$35 para US$44 por onça troy de ouro, o regime de Bretton Woods da taxa de câmbio fixada baseada no dólar apoiado por outro mantido pelos bancos centrais de todos os países que comerciavam foi substituído por mercados abertos de divisas com taxas de câmbio flutuantes baseado primariamente em Londres. Começou então um regime comercial de taxa flutuante da divisa para aquelas divisas cujos bancos centrais haviam abandonado o controle de capital transfronteiriço e as taxas de câmbio fixadas.

Este mercado de divisas em 2010 comerciou US$4 milhões de milhões (trillion) por dia, um aumento de 23% em relação aos US$3,3 milhões de milhões em 2007. O comércio envolvendo directamente o dólar representou 84,9% das transacções em 2010, apenas ligeiramente mais baixo do que os 85,6% de 2007 anteriores à crise financeira. O resto das transacções (15,1%) ainda envolve o dólar indirectamente. O mercado de divisas é de longe o maior mercado financeiro do mundo. Ele agora sobrepuja num factor de 15,1 o mercado estado-unidense de acções o qual comerciou US$134 mil milhões por dia em Abril de 2010, uma baixa em relação aos US$248 mil milhões de volume médio diário em 2007. Além do comércio em dólares de US$4 milhões de milhões por dia, o comércio em dívida soberana dos EUA (Treasuries) montou a US$445 mil milhões por dia em Abril de 2010, uma baixa em relação aos US$570 mil milhões de média diária em 2007.

A rotina da alta alavancagem no comércio de divisas

A alavancagem astronomicamente alta é a prática padrão no comércio de divisas, mesmo para participantes individuais no mercado. Um trader individual pode habitualmente contrair empréstimos de US$100 por cada dólar de acção do seu corrector, sujeito a margin calls [NT 3] em tempo real. A Commodities Exchange Commission tentou cortou a alavancagem de 100:1 para 10:1 mas após uma onda ruidosa de protestos por parte dos participantes do mercado, estabeleceu um limite de alavancagem de 50:1.

O valor do dólar em ouro

Não é informativo seguir o preço do ouro em dólares. O significativo é seguir o valor do dólar em ouro porque o ouro é o elemento com valor constante. Enquanto os EUA tem estado a enfrentar uma pressão deflacionária geral dos preços a partir da crise financeira global desde meados de 2007, o preço do ouro tem estado a elevar-se para reflectir a verdadeira depreciação do dólar num ambiente deflacionário geral.

O ouro é mais do que uma commodity

Os preços da maior parte das commodities tem estado em queda desde meados de 2007, excepto o ouro. O pânico financeiro global e a desaceleração económica deram um fim pelo menos temporário à euforia do mercado dos setes anos anteriores, remetendo os preços para uma baixa de muitos dos ingredientes básicos da economia mundial. O mercado em baixo de commodities pode bem alongar-se por uma década ou mais.

Desde a Primavera e o princípio do Verão de 2008, depois de os preços de muitas commodities terem atingido o pico em meio à especulação conduzida por temores de uma escassez permanente, o trigo e o milho – dois cereais na base da cadeia alimentar humana – caíram mais de 40%. O petróleo caiu 44%. Metais como alumínio, cobre e níquel declinaram um terço ou mais. Mas o ouro no 3º trimestre de 2010 foi comerciado cerca 1:57 contra o preço da prata, muito afastado da sincronização quando comparado ao rácio histórico ouro-prata de 1:16. Os traders geralmente têm altas expectativas de o ganho da prata exceder amplamente o do ouro. Eles esperam ver a prata não só alinhar-se ao ouro como a ampliar os ganhos do ouro. Uma não confirmação da força do ouro pela prata é geralmente percebida como um sinal de advertência de que o alinhamento do ouro está algo enviesado ou é falso, sendo provável que caia subitamente, uma vez que a prata não seguiu a mesma onda.

O ouro tem ascendido de valor desde 1999 e agora vale mais do que 5 vezes o seu ponto baixo de 11 anos atrás. Isto não é provocado por uma súbita escassez de ouro em relação à prata. Isto é uma indicação da desconfiança do mercado em relação ao dólar. O ouro é uma armazenagem de valor ao invés de ser apenas mais uma commodity. Uma onça de ouro em 2010 armazena US$1350 ao invés dos US$35 de 1970.

Preços das commodities

A baixa rápida de preços das commodities em 2008 foi em si mesma a mais clara notícia económica de um ano terrível para consumidores perturbados, que guardavam mais dinheiro nos bolsos depois de pagar o essencial num momento em que precisavam ansiosamente de dinheiro. Os preços da gasolina nos Estados Unidos caíram precipitadamente, depois de atingirem o pico em Julho de 2008 a US$4,17 por galão [1 galão = 3,785 litros], para um preço médio nacional em Dezembro de US$1,71 por galão.

Os preços para a maior parte das outras commodities mantiveram-se elevados pelos padrões históricos. Mas a tendência do mercado era baixista quando traders ponderaram a perspectiva de quem uma prolongada crise económica global levaria a quedas drásticas na procura. A grande questão era se os preços cairiam o tempo todo para normas a longo prazo ou se o contínuo boom económico da Ásia em meio a uma recessão à escala mundial poderia ser sustentado para estabelecer um piso para as commodities.

O declínio rápido dos preços dos commodities acalmou receios de inflação, uma razão central porque os bancos foram capazes de reduzir taxas de juro por todo o mundo desde 2008 num esforço para salvar o crescimento económico num ambiente deflacionário. Isto representou também uma mudança fundamental do sentimento do mercado em relação àquele orientado por visões excessivamente optimistas que desde 1980estiveram por trás das euforias conduzida pela dívida nos mercados de commodities.

Avanço da incerteza da procura

Até 2008 os consumidores estado-unidenses foram participantes forçados numa guerra de lances com consumidores da classe média emergente nas economias BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China) pelo acervo de commodities à escala mundial. Mas isso foi antes de uma baixa extrema na procura de commodities tão diversas como gasolina e alumínio e da retirada do dinheiro de investimento das commodity a termo para os abrigos mais seguros da dívida soberana.

O afundamento do mercado de commodities começou em 2008 antes do declínio do mercado mais vasto, embora o pânico decorrente exacerbasse a pressão baixista sobre as commodities. O petróleo caiu uns 10% só na segunda semana de Outubro de 2007, mas então recuperou algo daquela perda uma semana mais tarde para estabelecer nos US$81,19 por barril, ainda muito abaixo das alturas do US$145,29 de Julho de 1007, o mês em que os mercados de crédito congelaram.

Se bem que saudando os declínios de preços multi-anuais, a maior parte dos participantes do mercado esperavam que os preços das commodities ainda permanecessem acima das suas normas históricas a longo prazo. Os aumentos de preços das últimas décadas atenderam à sua função de económica de gerar ofertas adicionais de muitas commodities, quando agricultores plantavam cada hectare de terreno ocioso que podiam, companhias mineiras reabriam minas inactivas e companhias de petróleo iam a cantos remotos da terra para furar no offshore profundo. Em muitos casos, preços altos também provocaram declínio da procura mesmo quando a oferta começava a aumentar depois de os investimentos serem atraídos para soluções energéticas alternativas.

O fracasso do mercado alimentar

Os alimentos, em particular, têm sido um problema contínuo a longo prazo porque não há alternativa económica à comida para a sobrevivência humana. Apesar da recessão prolongada, os preços dos alimentos ainda estão demasiado elevados para permitir que grande número de pessoas em economias em desenvolvimento possa ter dietas adequadas. Nem os recentes declínios nos preços alimentares foram transferidos para os consumidores nas economias avançadas. As Nações Unidas fizeram a projecção de que os preços alimentares globais permanecerão elevados durante os próximos anos. Mas o baixo preço da comida necessária para alimentar os pobres do mundo também desencorajará os produtores alimentares na economia do mercado global a produzirem mais. A teoria económica dos alimentos é um caso claro de uma commodity que opera num mercado falhado no qual o lucro da produção alimentar é pago com a fome em massa.

Alimentos como substitutos de combustíveis

Os EUA, com o maior consumo mundial per capita de combustíveis, tem reduzido o consumo de gasolina desde o desencadear da grande recessão em meados de 2007, com um declínio a aproximar-se dos dois dígitos. Os motoristas dos EUA bombearam menos 9,5% de gasolina durante a primeira semana de Outubro de 2007 em relação à mesma semana um ano antes. Um relatório da Agência Internacional de Energia (IEA) corta mais uma vez a sua previsão para o consumo global de petróleo, fazendo a projecção de que 2008 terminaria com o mais lento crescimento da procura em 15 anos.

Por outro lado, grandes aumentos na produção mundial de trigo, devido ao aumento de área plantada nos Estados Unidos, Canadá, Rússia e grande parte da Europa, em Junho de 2010 trouxeram os preços do trigo para U$4,3 por bushel [1 bushel = 36,27 litros] dos quase US$13 em Março. Mas ascendeu outra vez para US$7,4 em Setembro quando agricultores reduziram a produção de trigo para produzir milho. Também havia preocupações acerca das colheitas de trigo na Ucrânia e Rússia, as quais ou haviam imposto quota ou proibido exportações de trigo depois de uma seca ali ter devastado as colheitas no princípio de 2010.

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) apelou a revisão dos subsídios e políticas do biocombustível, notando que haviam contribuído significativamente para a elevação dos preços dos alimentos por todo o mundo e para a fome em países pobres.

Com políticas e subsídios destinados a encorajar a produção de biocombustível em grande parte do mundo desenvolvido, agricultores muitas vezes consideram mais lucrativo plantar culturas destinadas ao combustível ao invés de alimentos, uma mudança que tem ajudado a escassez alimentar global e a ascensão dos preços alimentares.

O relatório da FAO afirma que as políticas agrícolas nacionais deveriam ser "urgentemente revistas a fim de preservar o objectivo da segurança alimentar mundial, proteger agricultores pobres, promover o desenvolvimento rural em sentido amplo e assegurar sustentabilidade ambiental". Ao divulgar o relatório, as Nações Unidas juntaram-se a um certo número de grupos ambientais e especialistas internacionais eminentes que têm apelado ao fim dos subsídios para biocombustíveis, que podem por vezes serem substituídos por gasóleo e gasolina.

Um relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) concluía que o apoio do governo à produção de biocombustíveis em países membros era enormemente cara, que "tinha um impacto limitado na redução de gases com efeito estufa e na melhoria da segurança energética" e que tem "um impacto significativos sobre preços alimentares mundiais" ao pressioná-los para cima. "Os governos nacionais deveriam cessar de dar novas permissões para biocombustíveis e investigar meios para reduzi-las", concluía o relatório da OCDE.

Uma visão contrário é apregoada pela EuropaBio, um grupo de biotecnologia industrial, de que o mundo possui terra e capacidade agrícola para produzir bastante comida e combustível através de programas subsidiados com critérios de alta sustentabilidade, incluindo consideração do facto de que os biocombustíveis podiam ajudar a reduzir a pobreza ao proporcionar novas opções de receitas para agricultores de todo o mundo, incluindo agricultores pobres. Isto pode ser um ponto teoricamente discutível mas o argumento é enfraquecido pelos factos: os preços dos alimentos têm estado a elevar-se mesmo numa recessão grave e prolongada.

Nos últimos oito anos, quando os preços do petróleo e preocupações globais acerca das emissões de carbono aumentaram, países ricos, incluindo os Estados Unidos e estados da União Europeia, puseram em prática subsídios e incentivos para estimular a indústria nascente dos biocombustíveis. Em resultado, a produção de biocombustíveis feitos de culturas que poderiam ter sido utilizadas para alimento aumentou mais de três vezes de 2000 para 2007, segundo a FAO. O apoio para estimular a produção de biocombustíveis nos países da OCDE montou a mais de US$10 mil milhões em 2006.

Mas estudos recentes concluíram que a corrida aos biocombustíveis teve alguns efeitos desastrosos, ainda que não pretendidos, consequências para a segurança alimentar e o ambiente. Menos alimentos acessíveis estão disponíveis em países pobres porque os preços globais dos cereais dispararam e florestas preciosas foram deitadas abaixo quando agricultores criaram campos de plantações para aderirem ao boom dos biocombustíveis.

Pior ainda: é necessária tanta energia para converter plantas em combustível que o processo não resulta numa redução líquida de emissões de carbono [NT 4] . O relatório da OCDE diz que apenas dois combustíveis baseados em alimentos (óleo alimentar usado e açúcar de cana) eram de forma clara ambientalmente melhores do que combustíveis fósseis quando considerando todo o "ciclo de vida" da sua produção. O açúcar de cana é muito mais fácil de converter em biocombustível do que a maior parte das outras culturas.

Em 2010 a União Europeia já havia recuado do seu objectivo de ter 10% do combustível para os transportes na Europa a virem de biocombustíveis ou outros combustíveis renováveis em 2020. O Parlamento Europeu sugeriu que venham apenas 5% das fontes renováveis em 2015 e que 20% venham de novas alternativas "que não entrem em competição com produção alimentar".

Os alimentos como estratégia para o combustível pareciam ter atingido um ponto alto em 2008 quando o Congresso comprometeu-se com um aumento de cinco vezes na utilização de biocombustíveis. Desde então, uma reacção está a ser construída nos EUA e na Europa contra políticas destinadas a promover o etanol e combustíveis semelhantes, com líderes políticos do G20 de países pobres contestando que estes combustíveis substitutos estão a conduzir os preços alimentares para cima e a esfaimar pessoas pobres. Os biocombustíveis estão rapidamente a tornar-se um ponto de ignição na diplomacia global, fazendo pressão sobre políticos do G7 para reconsiderarem suas políticas, mesmo quando eles argumentam que os biocombustíveis são apenas um factor na aparentemente inevitável ascensão dos preços alimentares.

Em alguns países, preços alimentares mais altos estão a levar a tumultos, instabilidade política e preocupações crescentes acerca da alimentação dos povos mais pobres do mundo. Tumultos alimentares contribuíram para a demissão do primeiro-ministro do Haiti em Abril de 2008 e líderes em alguns outros países estão nervosamente a tentar acalmar consumidores ansiosos. Numa conferência em 2008, representantes de países pobres que haviam sido atingidos duramente pela subida dos preços alimentares apelaram à acção urgente para tratar das altas súbitas de preços e vários deles pediram uma revisão das políticas dos biocombustíveis adoptadas recentemente no ocidente.

Muitos especialistas em política alimentar consideram as determinações dos governos em favor dos biocombustíveis pouco recomendáveis, concordando em que a diversão de culturas como o milho para a produção de combustíveis contribuiu para preços alimentares mais elevados. Mas outros factores também têm desempenhado importantes papeis, incluindo secas que têm limitado a produção e crescimento económico global rápido que tem criado procura alimentar mais elevada.

Tal crescimento, muito mais rápido durante os últimos quatro anos do que conforme a norma histórica, está a retirar milhões de pessoas de privações e a dar-lhes acesso a melhores dietas e prolongamento da longevidade. Mas os agricultores estão a ter perturbações para acompanhar o aumento da procura.

Se bem que haja acordo em que o crescimento dos biocombustíveis contribuiu para preços alimentares mais altos, a magnitude é discutida. Um trabalho do International Food Policy Research Institute, de Washington, sugere que a produção de biocombustíveis é responsável por um quarto a um terço do aumento recente nos preços globais das commodities. A FAO previu em 2008 que a produção de biocombustíveis, assumindo que as disposições actuais continuem, aumentaria os custos alimentares em 10 a 15 por cento. Isto pode não ser um aumento significativo para economias desenvolvidas, mas para os pobres nas economias em desenvolvimento que já estão a sofrer de dietas inadequadas, aumentos assim podem empurrar grande número de pessoas para a fome.

Apoiantes do etanol sustentam que qualquer aumento causado pelos biocombustíveis é relativamente pequeno e que os custos da energia e a procura de carne em ascensão nos países em desenvolvimento tiveram um impacto maior. Em Washington, apesar do criticismo externo, o apoio ao etanol permanece sólido. A política está solidamente ancorada, com efeito, no défice comercial dos EUA e na alternativa entre importar menos petróleo e exportar menos alimento.

De acordo com o Banco Mundial, os preços alimentares globais aumentaram 83% nos três anos anteriores a 2008. O arroz, um alimento básico para cerca da metade da população do mundo, tem sido um foco particular de preocupação nos últimos meses, com preços a aumentarem progressivamente levando vários países produtores de arroz a imporem limites drásticos às exportações quando tentam proteger consumidores internos. Enquanto preços de víveres nos Estados Unidos aumentaram cerca de 5% em todo o ano de 2009, alguns ítens essenciais como ovos e leite saltaram muito mais. Espera-se que novos dados acerca dos preços alimentares internos tenham aumentos notáveis.

Preços de commodities em queda aguda após o boom de 2001-08

Os preços das commodities ainda estão no princípio de uma queda drástica pois o Fed ao recorrer à facilidade quantitativa em resposta ao intratável esmagamento do crédito moveria a economia mundial de uma crise em colapso para uma longa e profunda recessão. Mais deflação é aguardada no sector habitacional, nos activos de capital e em commodities mesmo quando a liquidez recém injectada é absorvida pela desalavancagem institucional ao invés de estimular a economia seriamente debilitada.

Se bem que a dinâmica dos preços varie para diferentes commodities, os preços geralmente atingem um ponto baixo para a década posterior aos ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001, então ascender quando a economia global se fortaleceu nos anos posteriores quando o Federal Reserve dirigiu todos os bancos centrais do mundo para políticas de facilidade monetária. Desde fins de 2001 até meados de 2008, o preço do petróleo subiu 800%, o do cobre 700% e o do trigo 400%. Estas subidas em meio a ofertas constantes sugere apenas um efeito no preço de uma depreciação do dólar. Mas os salários não mantiveram um ritmo que acompanhasse a inflação dos activos.

Mas o declínio de preços em 2008 levou a que virtualmente estes retrocedem para cerca da metade do seu preço de 2001, corrigido da inflação. Em 2010 os ganhos da euforia de mercado dos anos 2000 haviam sido inteiramente apagados, mesmo quando o valor do dólar caía contra o ouro. Os salários declinaram drasticamente quando medidos em ouro.

No dia 11 de Julho de 2008 os preços do petróleo ascenderam a um novo recorde de US$147,27, estabelecendo-se em torno dos US$125 por barril em 24 de Julho de 2008. O petróleo era comerciado abaixo dos US$70/barril em 16/Outubro/2008. Em 21/Dezembro/2008 o petróleo estava a ser comerciado a US$33,87 por barril, menos de um quarto do preço de pico atingido cinco meses antes. Os preços do petróleo não recuperaram em 2009. Ao invés disso, depois de inicialmente subirem acima dos US$48, os preços em meados de Fevereiro desceram abaixo de US$34, prejudicado por previsões de novos declínios na procura mundial. Ao longo de Março e Abril de 2009, o petróleo foi comerciado a cerca de US$40/barril. Em Agosto de 2009 os preços retornaram aos US$70/barril. A economia mundial não cresceu durante este período, só o dólar é que caiu de valor.

Os custos de descobrir petróleo em águas profundas ou de minerar areias petrolíferas no Canadá permanecem altos, na amplitude dos US$60 a US$70 por barril – e uma vez que agora são fontes de abastecimento cada vez mais vitais, eles podiam ajudar a colocar um piso sob o preço do petróleo depois de a abundância de petróleo ser absorvida no mercado especulativo. Além disso, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) sempre pode cortar produção para escorar preços, mesmo ao ponto de reduzir receitas brutas com volumes de venda mais baixos. A contínua crise de crédito e a baixa económica inevitavelmente protelarão novos projectos industriais, reduzindo a procura por petróleo e metais à escala mundial, mesmo para a China. A queda de preços também desestimulará nova mineração e perfuração para aumentar a oferta a longo prazo que pressionaria para cima preços de commodities numa eventual recuperação. Esta dinâmica da oferta manterá anémica qualquer eventual recuperação.

O maior factor único a decidir se uma euforia prolongada no mercado de commodities está acabada, ou apenas numa pausa, é o desempenho da economia chinesa. O desenvolvimento industrial da China nos últimos anos foi responsável por grande parte do aumento do consumo mundial de cobre, alumínio e zinco e quase um terço do aumento do consumo de petróleo.

O crescimento chinês arrefeceu desde o começo da crise financeiro global em meados de 2007 mas ainda está a correr próximo dos 10%. A China lançou um pacote de estímulos maciço e espera empreender muitos projectos enormes nos próximos anos como reparar danos de desastres naturais tais como tremores de terra e tempestades e tomar medidas para resolver desafios do desenvolvimento a longo prazo em segurança social, cuidados de saúde, educação, restauração ambiental e protecção, transportes, alimentos e água. A menos que a China tenha êxito em sair da sua excessiva dependência da exportação, a qual actualmente está em 70% do PIB, a fim de desenvolver o seu mercado interno através da elevação agressiva de salários, o pacote de estímulos maciços da China acabará como uma insustentável bolha de activos.

De todas as principais commodities, apenas o petróleo no seu pico de Julho de 2008 foi comerciado a um preço mais alto do que na euforia dos mercados da última década, corrigido da inflação. As anteriores euforias no mercado de commodities das décadas de 1970 e 1080, estimuladas por décadas de alto crescimento económico das bolhas de activos desencadeadas por irresponsáveis facilidades monetárias do banco central e acompanhadas de inflação, foram seguidas por aproximadamente duas décadas de preços fracos que acompanharam a transição nos EUA de uma economia industrial para uma economia financeira pela transferência da produção industrial para fora.

O crescimento económico na China e na Índia na viragem do século XXI, seguido pela economia conduzida pelo petróleo no Brasil e na Rússia e maior gasto do consumidor no Médio Oriente nos últimos cinco anos empurrou os preços das commodities para cima num longo final da euforia que terminou em 2007. Mas estes novos geradores de força económica estão a procurar caminhos para moderar o seu crescimento da quantidade para a qualidade fazendo uma utilização mais eficiente de commodities. Isto significará que mesmo que a taxa de crescimento permaneça alta, a procura de commodities seria moderada.

11/Novembro/2010

[NT 1] 1 onça-troy = 31,103 gramas
[NT 2] Plano 401(k): Plano de aposentação patrocinado pelo empregador nos Estados Unidos. O seu nome deve-se à secção do Internal Code Revenue.
[NT 3] Margin call: Procura de fundos adicionais devido a movimento adverso de preços, exigência de margem de segurança.
[NT 4] As emissões de carbono são um falso problema. O que importa no caso é o rácio EROEI (Energy Returned On Energy Inputed]


[*] Economista, colaborador do Asia Times. Esta é primeira parte de um ensaio. A seguir virá "Gold Keeps Rising as Other Commodities Fall" ("O ouro mantém-se em ascensão quando outras commodities caem").

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    O original encontra-se em http://henryckliu.com/page237.html . Tradução de JF.


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
  • 23/Nov/10