A permanência no Euro não é um desastre irreversível
Em boa hora o resistir.info nos brinda com mais um
estudo de Jacques Sapir
que, não haja dúvidas, se tornou como que
"indispensável" no quadro da denuncia sustentada do erro
crasso que foi a criação do Euro e da cada vez mais evidente e
urgente necessidade objectiva de desmantelamento da zona Euro ou do abandono
dessa zona por parte dos países (com Portugal na linha da frente) que
mais lesados têm sido e continuam a ser pela pertença à
moeda única.
Desta feita Jacques Sapir suscita a questão da grande diferença
que existe nas dinâmicas e nos níveis da taxa de
inflação existentes entre os diversos países da Zona e dos
constrangimentos que, em consequência, para eles resultam pelo facto de
estarem sujeitos a uma moeda e taxa cambial únicas, com efeitos nefastos
nos níveis do crescimento económico, da competitividade das suas
economias e da própria dívida.
Essa foi uma das questões suscitadas já nos anos 90 pelos
(poucos) que no nosso país combateram a irresponsável
adesão à moeda única. Primeiro quando os Governos de
Cavaco Silva estabeleceram esse objectivo como prioritário e
privilegiaram a convergência nominal em detrimento da convergência
real, depois quando o governo de António Guterres concretizou a
adesão ao Euro.
Denunciava-se que o objectivo "primordial" de uma taxa de
inflação baixa era intolerável para uma economia pouco
desenvolvida pois arrastaria custos de perda de ritmo de crescimento real e
implicaria aumento da taxa de desemprego. Tal como se declarava que era
irresponsável ignorar que, a prazo, a taxa de juro vigente numa economia
deve estar próxima das taxas de crescimento económico, pelo que
impor uma taxa de juro idêntica para a zona Euro se impediria o
crescimento a ritmos elevados de forma equilibrada e sustentável. Ou,
ainda, que era estúpido olvidar que um mesmo nível quantitativo
de défice orçamental pode ser caracterizado de excessivo ou
não, face a equilíbrios macroeconómicos que devem ser
preservados, consoante decorram essencialmente de um défice corrente ou
seja predominantemente o resultado de despesas de investimento que visem dar
resposta a insuficiências do desenvolvimento de um país. E, mais
globalmente, que seria errado e desastroso criar uma zona monetária num
espaço em que não existia perfeita mobilidade do trabalho, nem
sincronização dos ciclos económicos dos países
membros, nem convergência das respectivas estruturas económicas e
sociais.
Tudo isso foi estultamente ignorado pelos poderes políticos dominantes e
por uma (larga) "elite" de economistas que os integravam ou apoiavam.
Houve mesmo quem (Victor Constâncio) tivesse afirmado peremptoriamente
que a adesão à moeda única significava que Portugal nunca
mais teria problemas de financiamento externo para os défices da
balança de transacções correntes
E quem ainda
glorifique a baixa das taxas de juro que contribuiu decisivamente para o
sobre-endividamento das famílias, das empresas e do Estado.
Hoje é uma evidência que a União Monetária fracassou
(como não poderia deixar de ser) e se transformou num instrumento de
regressão económica e social, que a zona Euro reduz o poder de
compra dos trabalhadores, restringe os seus direitos sociais, promove a
intensificação do trabalho e o desemprego, degrada os
serviços públicos e condena países, como Portugal,
à miséria.
Mas esses erros básicos que há 15 anos atrás eram
denunciados não desapareceram, persistem na actualidade e ameaçam
prolongar-se para o futuro.
"MANTENDO-SE NA ZONA EURO PORTUGAL
ESTARÁ CONDENADO AO DEFINHAMENTO E À POBREZA"
Não me parece haver dúvidas: mantendo-se na zona Euro
Portugal
estará condenado ao definhamento e à pobreza. A permanência
conduz à degradação galopante da nossa estrutura
produtiva, significa mergulhar o país numa depressão estrutural e
terá como consequência um doloroso desastre económico e
social.
A "alternativa" do aprofundamento da integração
não o é de facto. Porque não resolve os problemas
estruturais de base. E porque significa, deixemo-nos de sofismas,
avançar no sentido do federalismo, ou seja, uma transferência
massiva da soberania, do poder político, para a Alemanha. Porque nesse
cenário a "regra de ouro" seria a de que quem dispõe
dos recursos financeiros (quem "paga") é quem decide.
Quem há 15 anos defendeu a entrada na moeda única deveria ter
hoje a humilde seriedade de fazer um
mea culpa
pela asneira em que incorreu e não meter a cabeça na areia
agravando esse disparate com a defesa insana da manutenção na
zona Euro.
E quem então combateu essa adesão deveria hoje tomar
consciência de que os custos associados à
desvalorização da moeda própria recuperada são
bastante inferiores à alternativa da permanente deflação
salarial e aquela tem a grande vantagem de possibilitar a inversão da
situação, a fuga ao abismo. Nem meta hoje a cabeça na
areia objectivamente considerando a participação na zona Euro
como um desastre irreversível.
Para além do mais porque o não é. Permanecer ou não
é uma opção que depende da vontade soberana do povo.
Também aqui "o povo é quem mais ordena".
25/Fevereiro/2013
Do mesmo autor:
Que alternativa à não saída do euro?
, 15/Jan/2013
Sair do euro é preciso
, 12/Nov/2012
[*]
Economista.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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