Sair do euro é preciso
Parece haver quem pense que a saída de Portugal do euro é uma
opção política entre várias alternativas.
Não o é. A saída do euro é uma necessidade
objectiva para a viabilização do País.
A evolução da economia portuguesa, das contas externas e do
desemprego desde a integração na zona euro é elucidativa:
a partir de 2003, a partir do momento em que o euro entrou numa linha de
revalorização face ao dólar, os resultados para nós
foram desastrosos.
Nos últimos dez anos, a sobrevalorização do euro face ao
que seria a taxa de equilíbrio para a economia portuguesa tem variado
permanentemente entre os 30 e os 40%. Nenhum país do mundo aguenta uma
situação destas. Por isso o que está em jogo com a
necessidade de saída do euro, e subsequente desvalorização
do «novo escudo», não é uma mera e conjuntural melhoria
da competitividade da produção nacional. É a
reposição de equilíbrios estruturais da economia, a
adequação do preço da moeda à realidade e estrutura
económicas do País.
O aumento da produção nacional é a única forma de
resolver os problemas económicos, sociais e financeiros do País,
ninguém duvida. Tal como a renegociação da dívida
é essencial para reduzir os desequilíbrios orçamentais e
da conta de rendimentos com o exterior. Mas isso implica criar
condições objectivas para que o aumento da produção
possa ocorrer e para que os efeitos da renegociação da
dívida não sejam meramente conjunturais. O que só
será conseguido com a desvalorização estrutural da moeda,
o que implica a saída do euro e a recuperação da soberania
monetária.
A desvalorização da moeda é uma condição
(absolutamente) necessária mas não é uma
condição suficiente. Os seus efeitos positivos terão de
ser complementados com uma estratégia de
reindustrialização do País e de uma política mais
justa e adequada de distribuição do rendimento. E a
desvalorização é ela própria um elemento essencial
para desenvolver essa estratégia, porque o aumento da
produção e a reindustrialização não se
conseguem por decreto.
É certo que a desvalorização tem custos, que o
espaço não me permite desenvolver. Mas muito menores do que
alguns pensam, ou dizem. Nomeadamente no que respeita aos salários: uma
desvalorização de 30% geraria uma inflação da ordem
dos 8/9% (reflectindo o efeito do peso das importações na
produção e no consumo) o que significaria, embora não
necessariamente, idêntica quebra nos salários reais. Mas a
redução real dos salários este ano e no próximo
é já superior a esse custo. Com a desvantagem de não
acender nenhuma luz ao fundo do túnel, antes pelo contrário.
E a competitividade pelos preços da produção nacional
aumentaria cerca de 24%, já descontado o efeito do aumento do
preço dos inputs importados incorporados na produção
nacional. E é evidente que o aumento da competitividade por esta via,
quer a nível das exportações como da
substituição de importações, é praticamente
imediato com rápidos efeitos positivos no emprego. E é a partir
daí que se pode avançar para a reindustrialização e
para o aumento da produção. (Para que não haja
dúvidas, todos estes cálculos se suportam nas matrizes
input-output divulgadas pelo INE, não são meros palpites ou
ilusões).
Importa ainda sublinhar que a saída do euro é politicamente mais
viável que qualquer proteccionismo selectivo ou a saída da UEM,
porque isso significaria sair da União Europeia e não apenas da
zona euro. E na União existem dez países que não pertencem
à zona (e parece que não se dão muito mal).
Mantendo-se no euro, Portugal e os portugueses não terão futuro.
E é melhor sairmos a tempo pelo nosso pé, do que mais tarde
sermos escorraçados.
[*]
Economista. Intervenção na tribuna de debates do XIX Congresso do
PCP.
O original encontra-se em
http://www.avante.pt/pt/2032//122554/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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