Teses ao XIV Congresso do Partido Comunista Brasileiro (PCB)
A Estratégia e a Tática da Revolução Socialista no
Brasil
Introdução
1) A estratégia do partido revolucionário condensa em suas
formulações os objetivos de longo prazo da
revolução brasileira, os caminhos que deverão ser
percorridos, a caracterização do Estado, da estrutura de classe
da sociedade e de sua formação sócio-econômica, de
forma a identificar quem são os inimigos fundamentais e os aliados
estratégicos, bem como as vias do processo de
transformação social e as formas de luta que serão
desenvolvidas pelas massas ao longo do período estratégico.
Portanto, a estratégia revolucionária define o rumo principal que
o proletariado deve adotar para derrotar o bloco hegemônico da burguesia
e do imperialismo, o caráter da revolução, as tarefas
fundamentais do bloco histórico do proletariado e a
orientação, o controle e a supervisão das
ações práticas ao longo deste processo histórico.
2) O objetivo estratégico do Partido Comunista Brasileiro é a
conquista do poder político pela classe operária e seus aliados
fundamentais, organizados no bloco histórico do proletariado, cujo
objetivo central é a construção da sociedade socialista,
período transitório para a emancipação do
proletariado na sociedade comunista. Para os comunistas, a conquista do poder
político envolve dois aspectos fundamentais: a) o envolvimento das
massas populares como sujeitos da ação histórica para as
transformações sociais e políticas; b) a
organização e fortalecimento do instrumento político
revolucionário capaz de dirigir a disputa pela hegemonia na sociedade,
baseado nos princípios do marxismo-leninismo. O Partido Comunista
Brasileiro deverá ser consolidado no terreno da luta de classe, com uma
plataforma capaz de construir uma alternativa real de poder para os
trabalhadores.
3) Isso significa que o partido trabalhará incansavelmente pela derrota
da hegemonia burguesa no Brasil, pela expropriação dos meios de
produção capitalista e a construção de uma nova
hegemonia do proletariado, num processo histórico no qual será
construído pelas forças sociais e políticas o bloco
histórico do proletariado, a ferramenta fundamental para a conquista do
poder político no Brasil. O Partido se apresenta nesse processo como
portador da radicalidade da transformação socialista, como
instrumento de unidade de ação de todas as forças do bloco
histórico, como formulador de uma política de classe,
avançada e independente, que dirija as forças anticapitalistas
para a revolução brasileira.
As estratégias revolucionárias ao longo da história
4) A história do PCB se confunde com a busca de uma estratégia
para a revolução brasileira. Desde sua fundação, em
1922, nosso Partido tem procurado compreender a formação social
brasileira e responder às questões essenciais que nos levariam a
formular os caminhos pelos quais poderia passar a revolução
socialista. Apesar de inúmeras variações no que diz
respeito à via pela qual se desenvolveu a estratégia
revolucionária, passando por formas insurrecionais, de acúmulo
pacífico de forças de massas, luta sindical, luta armada,
resistência democrática e outras, podemos afirmar que predominou
em uma primeira fase da história do PCB uma estratégia
democrática nacional.
5) A estratégia democrática nacional partia do pressuposto de que
a formação social brasileira trazia ainda aspectos não
capitalistas, entraves ao pleno desenvolvimento do modo de
produção capitalista que impediam ou dificultavam o advento das
condições que tornariam possível uma
revolução socialista. Em um primeiro momento, estes entraves
foram identificados como "feudais" ou
"pré-capitalistas", devido à grande prevalência
da economia agrária baseada em latifúndios e ao tipo de
relações sociais no campo, que transitaram do escravismo sem que
passassem de imediato para relações assalariadas capitalistas,
permanecendo em formas híbridas como a parceria, o colonato e outras. O
segundo entrave detectado seria a dependência do Brasil em
relação ao centro dinâmico do capitalismo mundial,
inicialmente a Inglaterra e depois os EUA. Tal caracterização
levaria a definir uma estrutura de classes na qual o bloco dominante seria
composto pelas "elites agrárias" tradicionais, em
aliança com o imperialismo, e o bloco popular seria formado pelo
proletariado urbano, ainda pequeno, os camponeses, os setores médios e a
burguesia nacional com vocação industrial contra a
tradição agrária.
6) Houve alterações significativas de ênfase na
centralidade operária, o que levou ao período do obreirismo. Em
outros momentos, a ênfase recaia nos setores médios ou na
importância da aliança com a suposta burguesia nacional
progressista. No entanto, mesmo nos momentos de maior radicalidade, como na
definição da via insurrecional (1935) ou da luta armada (1950),
não se rompeu o caráter democrático burguês da
Revolução Brasileira, ou seja, a definição segundo
a qual a revolução socialista exigia uma "etapa"
democrática que permitiria o desenvolvimento de um capitalismo
autônomo e de um numeroso proletariado urbano capaz de levar adiante as
tarefas de uma revolução proletária.
7) O ponto culminante desta estratégia ocorreu na década de 1950
e início dos anos 60, quando o PCB jogou papel decisivo como Partido que
hegemonizou a direção das lutas proletárias no Brasil. Com
o golpe militar de 1964 que contou com o apoio majoritário da
burguesia nacional , os elementos centrais da estratégia da
revolução democrática nacional foram colocados em cheque.
A forma particular do capitalismo brasileiro havia produzido uma estrutura de
classes na qual a burguesia brasileira mantinha simultaneamente seu
caráter dependente e associado, temendo muito mais uma
revolução proletária do que uma existência
subordinada ao imperialismo. Ao contrário de antagônico à
estrutura agrária tradicional e latifundiária, o capitalismo
brasileiro submetido às demandas do capital monopolista internacional,
tornava possível uma aliança estratégica entre a burguesia
nacional, o latifúndio mono-exportador e o imperialismo.
8) O Estado brasileiro desenvolveu-se neste quadro buscando uma forma adequada
às exigências do modo de produção capitalista.
É necessário diferenciar a forma e o conteúdo do Estado. A
forma depende diretamente da composição histórica das
classes e da dinâmica da luta política, ao passo que o
conteúdo do Estado se determina pelas relações sociais de
produção, formas de propriedade e interesses de classe que em
última instância acabam por se impor. Neste sentido, o Estado
brasileiro foi assumindo um caráter burguês, na medida em que as
relações assalariadas foram amadurecendo e se impondo como
determinantes, ainda que mantendo relações
pré-capitalistas que se tornavam cada vez mais subordinadas à
dinâmica da produção do capital.
9) Entretanto, a forma do Estado brasileiro acabou determinada pela
correlação de forças entre a elite agrária
tradicional, a nascente burguesia nacional - desde o início subordinada
ao desenvolvimento capitalista internacional - e o imperialismo. Desta forma, a
formação do Estado burguês no Brasil assumiu a forma de uma
ditadura no
Estado Novo,
de uma incipiente e limitada democracia burguesa nas décadas de 1940 e
1950 e novamente uma ditadura a partir de 1964. As tensões entre os
setores do bloco dominante, ainda que importantes na luta política
tática, não se traduziram em contradições
estratégicas, levando à formação do bloco
hegemônico e dominante que se consolidou com a ditadura militar.
10) Os anos de resistência contra a ditadura militar não superaram
os impasses estratégicos da esquerda brasileira. Independente
da opção pela luta armada ou pela resistência
democrática, o horizonte estratégico, na quase totalidade das
forças de esquerda, permaneceu nos marcos de uma estratégia
democrática nacional. Se observarmos os programas das
organizações que optaram pela luta armada, poderemos observar que
a radicalidade da forma de luta não correspondia a uma estratégia
de revolução socialista para o Brasil. Pode-se dizer que a
maioria absoluta das organizações revolucionárias
brasileiras não chegou a uma formulação estratégica
da revolução socialista para o Brasil.
11) Com a crise da ditadura, no final da década de 1970, reapresentou-se
a mesma polêmica na forma de uma frente democrática nacional ou
frente popular. Mas mesmo neste quadro, que colocaria em campos opostos o PCB e
o nascente PT, no período que se seguiria, a esquerda brasileira operava
nos marcos de uma formulação democrática, diferenciada
apenas na ênfase da política de alianças como
democrática nacional
(supondo ainda uma aliança com setores progressistas da burguesia
nacional) ou
democrática popular,
na qual a aliança seria prioritariamente com setores explorados pelo
capitalismo, como os trabalhadores assalariados urbanos e rurais e o
campesinato, chegando no máximo a admitir alianças com setores
médios e a pequena burguesia.
12) A estratégia democrática popular proposta pelo PT, que
hegemonizou as lutas nas décadas de 1980 e 1990, resultou em um impasse
que bem se representa nas contradições do atual governo. A
formulação democrática popular se fundamentava na
suposição de que havia "tarefas democráticas em
atraso", mas que a subordinação estratégica da
burguesia nacional impedia que elas pudessem ser resolvidas no âmbito de
uma revolução socialista hegemonizada pelo proletariado. Ocorre
que essa estratégia, ao optar pela via prioritária do
acúmulo de forças nos espaços institucionais, foi se
transformando pouco a pouco naquilo que queria inicialmente negar, ou seja,
assumiu primeiro a forma de uma estratégia democrática que
ampliou as alianças para setores da burguesia, inclusive monopolista.
Posteriormente, abandonou a própria visão estratégica, ou
seja, os acúmulos democráticos no interior da institucionalidade
burguesa acabaram por se transformar no próprio objetivo a ser
alcançado e não um meio para uma suposta ruptura de
caráter socialista.
13) Desta maneira, com a vitória dos setores moderados que passaram a
controlar a direção do PT, a estratégia adotada se
transformou em uma proposta política fora do campo do socialismo,
aproximando-se de uma política pequeno burguesa de caráter
formalmente democrática, aquém mesmo de uma versão tardia
de social-democracia, uma vez que passou a operar os interesses do grande
capital monopolista em detrimento do patamar de direitos conquistados,
precarizando as relações de trabalho e os serviços
públicos, rendendo-se à lógica do mercado e da
institucionalidade liberal burguesa como forma de harmonizar o capital e o
trabalho nos marcos de um social liberalismo, no qual a economia de mercado e a
propriedade privada burguesa deveriam desenvolver a economia enquanto que o
Estado, depois de manter como prioridade as condições de
desenvolvimento capitalista, age sobre as demandas sociais focalizando-as
segundo a cartilha do Banco Mundial.
14) A versão democrática popular apontava inicialmente como bloco
inimigo o capital monopolista, o latifúndio e o imperialismo. Com a
inflexão política verificada, abandona-se a perspectiva de
reformas profundas e a estratégia se metamorfoseia na proposta de um
novo pacto social que aglutine todo os setores da
"Nação" para buscar um crescimento econômico
responsável que fosse capaz de atender todos os interesses das classes
aliadas, ou seja, um crescimento econômico sustentável capaz de
gerar empregos, renda e manter os patamares de lucro e acumulação
privada de capitais para os monopólios nacionais e internacionais. Como
se vê, apesar de retomar os elementos de uma estratégia
democrática nacional, a degeneração da força
política que hegemonizou as ações no período,
degrada esta formulação de maneira que o caráter
"nacional" implica apenas na aliança de todos os setores e
classes sociais para o desenvolvimento do capitalismo monopolista, abrindo
mão mesmo de qualquer elemento de resistência ou contraponto aos
interesses imperialistas.
15) Desta forma, o PCB, em seu XIII Congresso (março de 2005), rompeu
com o governo Lula e reafirmou uma estratégia socialista para o Brasil,
que já vinha sendo formulada desde 1992, cujos elementos essenciais se
fundamentam em um novo bloco histórico do proletariado e seus aliados
contra o bloco
dominante, formado hoje pela burguesia monopolista, pelo monopólio
capitalista da terra, pelo imperialismo e pelos aliados da pequena burguesia
política oriunda das burocracias partidárias e sindicais que
hegemonizam setores do proletariado. A orientação central da
estratégia do PCB, definida no XIII Congresso, pode ser assim resumida:
"uma vez constatado que o capitalismo no Brasil já atingiu a etapa
monopolista, fica claro que o processo revolucionário brasileiro
é de caráter socialista".
A definição do caráter socialista da
Revolução Brasileira nos leva à necessidade de tirar todas
as implicações, estratégicas e táticas, para a luta
política em nosso país e, para isso, passamos à
caracterização da formação social brasileira.
Caracterização da Formação Social Brasileira
16) A construção de uma formulação
estratégia para a Revolução Socialista Brasileira exige o
esforço de caracterizar a formação social brasileira. Um
dos grandes problemas da esquerda brasileira, principalmente do PCB, como
partido mais antigo e que passou pelos principais momentos de nossa
história, tem sido a busca de "modelos" estratégicos
fundados nas grandes experiências revolucionárias vitoriosas do
século XX.
Assim, ora se buscou uma estratégia insurrecional inspirada no modelo
soviético, centrada na organização proletária nos
grandes centros industriais, ora realizou-se uma estratégia de guerra de
guerrilhas camponesas, como em Trombas e Formoso, ora uma disputa institucional
quase exclusivamente eleitoral.
17) No entanto, toda verdadeira estratégia só pode ser
construída a partir de uma correta leitura das características de
uma formação social concreta, suas relações sociais
de produção, sua estrutura de classes, suas formas
políticas e a dinâmica histórica da luta de classes que
resultam em determinadas formas de Estado. Somente com o estudo
histórico e preciso da sociedade que se pretende transformar poderemos
definir o campo inimigo e a possibilidade de alianças, as formas de
luta, as vias estratégicas e o plano tático-estratégico a
ser desenvolvido.
18) Afirmamos, portanto, que os equívocos das estratégias
até então formuladas encontram-se, em grande medida, na
inadequada leitura de nossa sociedade. Uma formulação pode estar
correta e fracassar pela correlação de forças, pela
dinâmica da luta de classes ou por erros em sua condução.
No entanto, acreditamos que a estratégia democrática nacional,
assim como a democrática popular, nos levaram aos impasses conhecidos,
não pela forma como foram aplicadas e desenvolvidas, mas porque estavam
incorretas em algumas de suas suposições básicas, por
não compreenderem o caráter de nossa formação
social e a particularidade do desenvolvimento do capitalismo brasileiro.
19) Nossa primeira constatação é a de que o Brasil se
tornou um país capitalista completo, ou seja, trata-se de uma
formação social capitalista na qual predominam as
relações assalariadas, a propriedade privada burguesa dos meios
de produção, as formas de produção e
acumulação ampliada de capitais que completaram seu caminho
até a formação do monopólio, chegando a agir de
maneira interligada e inseparável da forma imperialista que hoje
determina as relações econômicas mundiais. Mais do que um
ponto através do qual o imperialismo opera sua reprodução
ampliada da acumulação capitalista, o Brasil desenvolveu um
parque industrial monopolista, setores de infra-estrutura de
mineração, energia, armazenagem, transporte, portos e aeroportos,
malhas urbanas, um comércio nacional e internacional, capitalizou o
campo, gerou o monopólio moderno da agricultura, um sistema financeiro
moderno e interligado ao mercado financeiro mundial, estruturou uma malha
logística de serviços e ações públicas
necessárias à reprodução das relações
burguesas de produção.
20) O capitalismo brasileiro é monopolista porque os principais ramos da
economia são dominados pelos monopólios estrangeiros. Além
disso, há pelo menos 50 empresas monopolistas brasileiras com elevado
grau de internacionalização as chamadas
multinacionais brasileiras
e um grande índice de concentração empresarial. As
500 maiores companhias em operação no Brasil obtiveram, em 2007,
um faturamento de US$ 970 bilhões (câmbio de 2007), 67% do PIB
daquele ano, o que representa um grau de concentração empresarial
expressivo. Se observarmos pelo lado do controle acionário, 52% do
capital dessas empresas são controlados por capitais estrangeiros e
brasileiros, 40% por capital nacional e 8% por capital estatal. Ressalte-se
ainda que, em 2007, 12 dessas empresas registraram vendas superiores a US$ 10
bilhões cada; 221 delas faturaram acima de US$ um bilhão cada.
21) Um fato importante a ser observado na conformação industrial
do país é que vem ocorrendo uma descentralização
industrial e uma contínua desnacionalização das empresas.
Em 1973, 56% das 500 maiores empresas estavam localizadas no Estado de
São Paulo, percentual que caiu para 39%, em 2007. Do pelotão das
500 maiores empresas, 32% estavam localizadas no Rio de janeiro, percentual que
caiu para 29%. No entanto, os outros Estados aumentam sua
participação entre as 500 maiores empresas de 12%, em 1973, para
32%, em 2007. Já a participação do Estado no controle
acionário das 500 maiores caiu de 33%, em 1973, para 8%, em 2007.
22) Uma economia capitalista completa, ainda que se mantenha subordinada ao
imperialismo, não pode ser caracterizada como "dependente", ou
seja, uma economia que não atinge a forma madura por estar constrangida
por qualquer tipo de dominação externa. Pelo contrário, o
dinamismo da economia brasileira e sua forma derivam exatamente de seus
vínculos e subordinação à lógica do capital
monopolista internacional, sendo parte integrante de seu funcionamento. A
economia brasileira integra, desta forma, o sistema capitalista/imperialista
mundial a tal ponto que o próprio desenvolvimento dos grandes
monopólios brasileiros acaba operando no campo do imperialismo. Isto
implica que a economia monopolista desenvolvida no Brasil gerou uma sociedade
de classes tipicamente burguesa, na qual o eixo central da luta de classes
passa pelo confronto de interesses entre o proletariado e a burguesia.
a) Estrutura de Classes no Brasil
23) A estrutura de classes no Brasil se caracteriza pela formação
de uma burguesia monopolista e suas diversas facções: a burguesia
industrial, a burguesia bancária/financeira, a burguesia comercial, a
burguesia agrária, a burguesia do setor de transportes e um setor que
controla serviços diversos formados pela mercantilização
crescente de setores como o da saúde, educação e outros.
Com o crescimento e consolidação da moderna economia industrial
monopolista, generalizou-se o assalariamento e formou-se um numeroso
proletariado que, da mesma forma, se divide entre os vários setores da
economia. Ressalte-se que hoje o proletariado urbano corresponde a mais de 80%
da população economicamente ativa, enquanto o proletariado rural
a menos de 20%. Ainda existem setores residuais camponeses, tais como pequenos
proprietários de terra com produção para seu consumo e a
agricultura familiar, além de outras formas como cooperados e assentados.
No entanto, mesmo estes se encontram cada vez mais subordinados ao mercado
capitalista e à lógica mercantil. O que já predomina no
campo é a proletarização e a
subproletarização, combinadas ou não com formas de pequena
propriedade ou outra forma de propriedade rural (assentamentos, cooperativas,
etc.).
24) A urbanização crescente e a criação de uma
infraestrutura para o desenvolvimento da acumulação capitalista
geraram camadas urbanas intermediárias que vão desde setores
gerenciais, profissionais assalariados, pequenos e médios comerciantes,
técnicos especializados, professores, pesquisadores, médicos,
advogados e outros profissionais que formam uma numerosa camada média.
Parte destes setores médios passou nos últimos anos por uma
intensa proletarização, transformando-se em assalariados do
capital, que passou a monopolizar setores que antes constituíam o campo
de trabalho das camadas médias, tais como medicina,
educação, psicologia, odontologia, serviços
jurídicos, entretenimento e cultura, entre outros. Ao lado destes
profissionais proletarizados, somam-se funcionários públicos nos
diferentes setores de ação do Estado, no âmbito Federal,
Estadual e Municipal, nas esferas do Executivo, Legislativo e
Judiciário, que compõem uma camada heterogênea, numerosa e
com condições de trabalho e remuneração muito
diversas, ainda que na maioria tenham sofrido uma precarização
crescente nos últimos governos neoliberais.
25) O conjunto dos assalariados urbanos conta com um setor operário,
formado concomitante ao monopólio industrial moderno e que passou por
grandes transformações a partir dos anos 1990. Ao
contrário do que se apregoou com o suposto "fim do trabalho"
devido à reestruturação produtiva e à
aplicação de novas tecnologias, o operariado industrial
brasileiro cresceu em números absolutos (em 1981, eram 6,9
milhões de trabalhadores manuais na indústria e, em 1996,
já eram 9,5 milhões) e desconcentrou-se, passando a formar novos
pólos em outras regiões do território nacional.
Além disso, fragmentou-se bastante com a terceirização e a
precarização e perdeu, em parte, sua unidade e identidade
política pela inflexão moderada de grande parte dos dirigentes
sindicais burocratizados. Mas o operariado continua o setor da classe
trabalhadora melhor posicionado estrategicamente no coração da
economia capitalista, do ponto de vista da luta de classe. Caracterizamos o
proletariado brasileiro como o conjunto dos trabalhadores que só podem
viver mediante a venda de sua força de trabalho, tendo em seu
núcleo a parte dos assalariados que vendem sua força de trabalho
ao capital e são considerados trabalhadores produtivos.
26) Ao mesmo tempo, o capital subordina ao mercado e ao processo ampliado de
acumulação de capitais todos os setores que mantêm,
residualmente, relações não capitalistas. É o que
ocorre no campo. Ao mesmo tempo em que a grande produção
agrária monopolista - eufemisticamente chamada de
"agro-negócio" - assalaria seus trabalhadores. Outra parte dos
trabalhadores rurais, sejam propriamente camponeses, sejam ligados a outras
formas, como trabalhadores coletivos de cooperativas ou assentamentos, se
vê diante do fato de que precisam se vincular ao mercado e à
lógica do capital, como ocorre com a produção familiar,
tomada de assalto pelos monopólios da produção de frango
ou tabaco, ou ainda pressionados pela produção do
agro-combustível.
27) A formação de grandes metrópoles e a
concentração do parque industrial criaram uma realidade urbana
que se caracteriza, ainda, pela formação de uma ampla
superpopulação relativa. Esta superpopulação, em
parte, compõe o exército industrial de reserva, sendo que uma
parcela acabará por se transformar em um subproletariado submetido a
relações de trabalho precárias e incertas; outra parte
sobreviverá associada à economia política da criminalidade
ou do assistencialismo à pobreza. Não são os
"excluídos", ou mesmo o lupemproletariado, pois acabam por se
inserir nas condições gerais da orgia da acumulação
de capitais, como força de trabalho abundante e barata, como operadores
da economia "informal", como consumidores e agentes de uma economia
política da criminalidade ou base de massa e objeto de
ação de uma rede de assistencialismo filantropizado pelo chamado
terceiro setor.
28) Parte desta superpopulação relativa mantém
vínculos políticos e culturais com o proletariado, uma vez que se
forma constantemente por expropriados, jogados fora do mercado de trabalho,
adoecidos e sequelados pela brutalidade da produção capitalista,
acabando por formar parte de movimentos sociais e populares em luta por
emprego, terra, moradia, melhoria das condições de vida em
bairros periféricos, resistindo à opressão de
gênero, ao preconceito étnico e outros (como o de regionalidade ou
opção sexual), funcionalmente utilizados pelo capital como forma
de manter o valor da força de trabalho em níveis
aceitáveis para a acumulação de capitais.
29) Assim, a estrutura de classes no Brasil apresenta um pólo
burguês, hegemonizado pela grande burguesia monopolista (nacional e
internacional, que não mais se distinguem), setores médios que
tendem ao assalariamento e à proletarização, um
proletariado composto por uma imensa massa de assalariados em geral (urbanos e
rurais), um subproletariado imerso em uma grande superpopulação
relativa inserida de maneira precária e brutal nas
condições do mercado capitalista e, residualmente, um campesinato
heterogeneamente formado pela agricultura familiar, cooperados, assentados e
pequenos proprietários que combinam sua atividade com períodos de
proletarização.
b) A Superestrutura Política e o Estado
30) A formação da sociedade brasileira, em seu aspecto
político, deve ser compreendida pelo seu desenvolvimento
histórico mais recente. A construção do Estado
burguês no Brasil pelo alto, ou seja, não como fruto de uma
revolução burguesa clássica, mas pela ação
do Estado, muitas vezes controlado por setores não especificamente
burgueses (como no caso do período getulista), marcou a
formação de um tipo de sociedade civil burguesa e uma forma
particular de formação da hegemonia capitalista.
31) As instituições do Estado, em que pesem as diferentes formas
assumidas, sempre foram espaços de organização do poder da
classe dominante, com predominância dos aspectos repressivos e
coercitivos. Prova disso são as constantes interrupções do
processo político brasileiro por golpes e intervenções
armadas que marcaram a história, desde a proclamação da
República até a ditadura militar. O período militar marcou
a consolidação de um bloco dominante, formado pela aliança
de classes entre a burguesia monopolista, o latifúndio tradicional e o
imperialismo, que abriu espaço para consolidação de um
Estado burguês no Brasil.
32) O ápice
deste processo só se deu com a abertura política e a
incorporação das massas urbanas, setores amplos do proletariado e
do operariado no jogo político do Estado burguês, que
alcança sua maturidade com a Constituição de 1988. Estamos
diante de um Estado fundado em um ordenamento jurídico estabelecido,
reconhecido e legitimado, com instituições igualmente
consolidadas nos diferentes campos de ação do Estado: Executivo,
Legislativo e Judiciário. Além disso, várias
instituições, como o Ministério Publico, fazem a
mediação entre a sociedade e suas demandas e os
órgãos do Estado como expressão institucional e
política. Formou-se assim uma sociedade civil/burguesa com um conjunto
de instituições enraizadas e, em parte, legitimadas no corpo da
sociedade que consolidou uma hegemonia liberal burguesa e democrática,
processo que se completa com um poderoso monopólio capitalista nas
telecomunicações, na informação e na
organização da cultura, que aprimora e fortalece a
dominação ideológica em nosso país.
33) O processo de lutas sociais que marcou a história do Brasil nos anos
1980 e 90, tendo como centro a entrada em cena do proletariado industrial no
final dos anos 70, produziu uma passagem da alienação serializada
até uma inicial consciência de classe em si, que levou à
formação de grandes organizações de trabalhadores
em âmbito nacional, seja na luta sindical, na luta estudantil, na luta
política e na luta pela terra. Como resultado deste processo,
formaram-se na década de 1980 a CUT, o PT, o MST, além da
UNE retomar sua organização e influência na política.
Além de expressar a formação de uma dimensão de
classe nacional, que se alastrou por todo o território, este
período de luta foi marcado, inicialmente, por uma consciência
classista e embrionariamente anticapitalista e que apontava para metas de
caráter socialista. No entanto, não se completou o processo no
sentido de uma consciência para si, ou seja, não se constituiu,
com autonomia histórica, uma ação independente de classe,
acabando por amoldar as organizações à lógica
institucional burguesa.
34) A luta entre a hegemonia burguesa dominante e a contra-hegemonia
proletária resolveu-se, na
última década do século XX, em favor da ideologia liberal
burguesa. Tal processo não se deu sem resistências, mas o
resultado geral foi o amoldamento das instituições que se
formaram no bojo do ascenso de massas à ordem que inicialmente negavam.
Nos casos do PT e da CUT, esse amoldamento parece ser mais completo, uma vez
que as tendências majoritárias dessas organizações
isolaram os poucos focos de resistência, limitando-lhes o espaço a
meras proclamações formais, sem capacidade de reverter a
inflexão realizada. No caso particular do MST, a
contradição parece ser mais ativa e existe uma saudável
resistência ao amoldamento, o que permite a essa
organização insistir no horizonte estratégico socialista.
Esta situação se explica em parte pelo fato de que o amoldamento
se dá pela formação de uma burocracia que encontra um
ponto de existência e privilégio no qual se acomodar, seja pela
própria estrutura burocrática partidária, estudantil ou
sindical, seja em espaços na institucionalidade do Estado Burguês.
A luta pela terra e, dentro dela, seu fundamento que é a Reforma
Agrária, é uma tarefa que ficou para trás na pauta
burguesa e passa a ser incompatível com o monopólio capitalista
na agricultura.
35) O mesmo ocorre com parte dos movimentos sociais e populares e a base do
movimento sindical, uma vez que o preço pago pela
acomodação burocrática das organizações dos
trabalhadores é o adiamento ou abandono das reais demandas desta classe.
Apesar deste fato, as burocracias partidárias e sindicais com a
força potencializada pela ocupação de parte de
espaços governamentais, acabam por manter uma hegemonia passiva em
amplos setores da classe trabalhadora, ajudando a consolidar o domínio
burguês e a reverter o processo político de
constituição da autonomia de classe que se iniciou no ciclo
passado. Desta forma, a sociedade civil/burguesa captura
organizações inicialmente criadas no campo da contra-hegemonia e
se fortalece, desarmando os trabalhadores e enfraquecendo sua
organização própria.
36) A institucionalidade burguesa logrou deslocar o eixo da luta para a
representação política e a
jurisdicionalização das demandas políticas, de maneira que
as demandas são vistas como possíveis de ser alcançadas
apenas dentro do processo político instituído por meio de
ações de governo, iniciativa legislativa ou
resoluções judiciais. Rouba-se a iniciativa autônoma dos
movimentos sociais e sindicais e captura-se a militância política,
convertendo-a em um exército de cabos eleitorais na
operação de máquinas profissionais de busca de
financiamento de campanhas e controle e manipulação de bases
eleitorais. A violência contra a mulher se resolve pela Lei Maria da
Penha; a demarcação das terras indígenas, pelo Supremo
Tribunal Federal; a garantia de direitos, pela boa vontade do legislativo em
adiar a Reforma Trabalhista; a violação renitente dos direitos
humanos, pela ação fiscalizadora de entidades internacionais ou
secretarias especiais do governo; os mais elementares direitos à
moradia, saúde, educação e outros só podem ser
resolvidos pela mágica orçamentária e por políticas
públicas focalizadas segundo a receita do Banco Mundial. Em suma:
quebrou-se o protagonismo dos trabalhadores e seus movimentos autônomos,
substituindo-o pela ação do Estado e da institucionalidade da
sociedade civil-burguesa, o que consolidou a hegemonia do bloco conservador e
dominante.
37) A combinação eficiente de consenso e coerção
garante a reprodução do domínio da ordem monopolista
burguesa. A cooptação dos trabalhadores pela ordem institucional
burguesa, que os mantêm nos limites da ordem do capital, controlados
pelos mecanismos de mercado, se processa por um conjunto de mecanismos que
envolvem desde manipulação dos corações e mentes
pelos meios de comunicação, ações permanentes no
interior da empresa para a colaboração de classe,
promoção da cultura do individualismo, incentivos materiais como
participação nos lucros e resultados até a
cooptação pura e simples das lideranças sindicais. Quando
esses métodos não funcionam, as classes dominantes apelam para a
repressão contra todos aqueles que se levantam contra essa ordem. Isso
explica a criminalização dos movimentos sociais, da
militância anticapitalista e da pobreza.
38) A cultura socialista resiste nas manifestações de
dissidência que se mantêm em luta contra a ordem e na defesa das
conquistas e direitos dos trabalhadores; nas lutas reivindicatórias por
melhores condições de trabalho; na luta popular por melhores
condições de vida nos bairros pobres; na luta das mulheres contra
a discriminação e por seus direitos; na juventude que não
vende sua rebeldia pela acomodação burocrática; na luta
pela terra no campo;
e naqueles que fizeram da luta socialista um compromisso de vida.
39) Por isso, acreditamos que, diante da consolidação do bloco
hegemônico dominante, resiste e se forma um bloco proletário que
é o ponto de partida para constituição de uma
contra-hegemonia. A força deste bloco está diretamente ligada
à capacidade da classe trabalhadora entrar em cena novamente com
independência e autonomia histórica, mas depende da mesma forma da
iniciativa de vanguardas que resistiram à acomodação,
mantiveram-se em luta contra a ofensiva do capital monopolista e seus aliados
da pequena burguesia. São expressões desta resistência
movimentos
sociais como o MST, a INTERSINDICAL, a CONLUTAS, movimentos pela moradia e
culturais, parte das pastorais operárias, movimentos populares e
partidos políticos que se colocam contra o governo e seu pacto
antipopular, como o PCB, o PSOL, o PSTU, além de
organizações de esquerda das mais diversas vertentes. A
fragmentação atual do bloco popular expressa a
fragmentação da própria classe trabalhadora, derrotada
pela inflexão política das vanguardas que a hegemonizaram neste
ciclo que se encerra. A unidade do bloco proletário deve ser buscada
fundamentalmente na capacidade de organização e luta dos
trabalhadores contra a hegemonia liberal burguesa.
A Revolução Brasileira é uma Revolução
Socialista
40) Afirmamos que a revolução brasileira é uma
Revolução Socialista, considerando que o Brasil é uma
formação social capitalista desenvolvida e monopolista, que a
burguesia monopolista nacional/internacional constituiu-se em classe
hegemônica e dominante; que o Estado brasileiro é um Estado
burguês e que o processo político da luta de classes no ciclo
recente produziu um bloco liberal burguês hegemônico e dominante,
formado pela aliança entre a grande burguesia monopolista, o
monopólio capitalista da terra, o imperialismo e um setor
político da pequena burguesia política que, através de
burocracias partidárias e sindicais e o controle de mecanismos de
governo, cooptaram e buscam neutralizar o proletariado; considerando que um
bloco proletário procura resistir na direção de uma
contra-hegemonia que aponta para uma meta de superação do
capitalismo e da necessidade de uma sociedade socialista;
41) Afirmar o caráter socialista da Revolução Brasileira
implica em afirmar que as tarefas colocadas ao conjunto da classe trabalhadora,
e do proletariado em especial, não podem se realizar nos limites de uma
sociedade capitalista. O grau de desenvolvimento das forças produtivas
materiais, no Brasil e no mundo, já se coloca em
contradição com a atual forma capitalista das
relações sociais de produção, que ameaçam a
produção social e a própria existência das
condições que permitem a vida humana no planeta.
42) O sentido de uma suposta "etapa" democrática só se
justificou no passado, no interior da concepção marxista,
considerando uma situação muito particular de desenvolvimento
histórico no qual a burguesia representava politicamente a necessidade
de avanço de forças produtivas que se encontravam obstaculizadas
por relações de tipo feudal, mantidas política,
jurídica e ideologicamente por estratos e camadas nobres comprometidas
com a manutenção de seus privilégios. Mesmo neste quadro,
Marx e Engels apontavam para a necessidade da estratégia
revolucionária se dar na forma de uma Revolução
Permanente, ou seja, ainda que em aliança com a burguesia contra os
setores feudais, o proletariado deveria manter sua independência e
autonomia histórica transformando a luta democrática em luta
socialista através da formação de um duplo poder.
43) A sobrevivência da tese da "etapa democrática" em
países como o Brasil se deu pela sobrevivência dos chamados
resquícios coloniais escravistas, pelo caráter tardio ou
dependente de nossas formações sociais inseridas em um mundo
capitalista que passava da fase monopolista ao imperialismo e que impunha,
entre outras coisas, a permanência de uma estrutura agrária
tradicional latifundiária e a monocultura. Tal situação
levou os revolucionários a supor uma luta em aliança do
proletariado com a burguesia nacional contra o imperialismo e o
latifúndio. A "etapa" democrática teria ainda a
missão de realizar as tarefas em atraso de uma revolução
burguesa inacabada, ou seja, uma reforma agrária, o desenvolvimento de
relações plenamente capitalistas através da
industrialização e a democratização do Estado e da
sociedade, de forma a superar as formas tradicionais de patrimonialismo,
autocracias e ditaduras, chegando ao chamado "Estado de Direito".
44) Ora, o Brasil, sob todos os aspectos, já cumpriu o ciclo
burguês. Desenvolveu uma economia capitalista até o estágio
monopolista, constituiu uma sociedade civil/burguesa e um "Estado de
Direito". O capitalismo brasileiro é parte do processo de
acumulação mundial e parte constitutiva do sistema de poder
imperialista no mundo, e as classes dominantes brasileiras estão
associadas umbilicalmente ao capital internacional.
A burguesia não disputa sua hegemonia contra nenhum setor
pré-capitalista; pelo contrário, a luta burguesa se volta contra
a possibilidade de uma revolução proletária. As
"tarefas em atraso" como a reforma agrária, não
são mais tarefas em atraso, mas tarefas deixadas para trás e que
não serão mais realizadas plenamente nos limites de uma sociedade
capitalista.
45) As contradições objetivas que estão na base das
demandas imediatas das massas trabalhadoras não se devem ao baixo
desenvolvimento de forças produtivas capitalistas, mas exatamente pelo
próprio desenvolvimento e natureza de uma sociedade hegemonizada pelo
capital. A luta pela terra não encontra mais como adversário o
latifúndio tradicional, mas o monopólio capitalista da terra; a
luta dos trabalhadores assalariados se vê diante não da falta de
empregos pelo baixo desenvolvimento industrial, mas exatamente pela crise de
superprodução e superacumulação de capitais que
leva à crise cíclica do capital e a queda das taxas de lucro,
exigindo a contínua expropriação e mantendo permanente a
acumulação primitiva, ou seja, a expropriação dos
trabalhadores para formar massas de despossuídos a se venderem a
preços que permitam a lucratividade do capital; as mulheres, os jovens,
os negros, os índios, os imigrantes e migrantes, se vêem diante da
violência do mercado e da sociedade do capital, seja na desigualdade de
rendimentos, no acesso aos serviços elementares, à cultura e ao
ensino, porque tudo precisa ser transformado em mercadoria para manter a orgia
da acumulação privada. A partir de agora, qualquer luta
específica se choca com a lógica do capital: a luta pela terra, a
luta ecológica, a luta sindical, a luta política, as lutas por
demandas populares, as lutas de gênero, a luta por identidade
étnica e, especialmente, a luta dos trabalhadores.
46) A Revolução Brasileira é Socialista porque o entrave
universal é a forma capitalista da sociedade. A Revolução
Brasileira é Socialista porque é a burguesia e seu bloco
conservador que se tornaram a classe dominante e hegemônica que tem por
interesse estratégico a manutenção das
relações sociais de produção capitalista no
País. A Revolução Brasileira é Socialista porque
é contra a dominação burguesa e representa a necessidade
histórica de superação das atuais relações
burguesas de produção. A revolução Brasileira
é Socialista porque o proletariado deve constituir em torno de si um
novo bloco histórico revolucionário, que crie as
condições políticas para iniciar a
construção de uma nova sociedade, a sociedade socialista. A
Revolução Brasileira é Socialista porque é a
principal condição política para iniciar a
transição socialista e a formação de um Estado
Proletário que garanta a existência de novas formas de propriedade
e de relações sociais, única maneira de livrar os
trabalhadores das mazelas que hoje os afligem e salvar o mundo do desastre
ambiental e social que a ordem capitalista mundial impõe.
47) A Revolução Brasileira é Socialista, finalmente,
porque toda a experiência histórica dos trabalhadores demonstrou
que qualquer forma de pacto com a burguesia é uma miragem que confunde
os trabalhadores, desorienta a luta de classe e joga o horizonte socialista
para as calendas. Seja a clássica social-democracia, que após a
Segunda Guerra Mundial garantiu, sob pressão da luta organizada dos
trabalhadores, direitos e políticas públicas, mas que se
domesticou diante do capital; seja a atual versão do social-liberalismo
ou "social-democracia tardia", adoradora do mercado, que passou a
gerir o neoliberalismo, refilantropizar a questão social e aplicar com
mão de ferro as políticas mais regressivas do grande capital,
conforme pudemos verificar nos últimos 30 anos. Esses pactos não
nos levarão a conquistas parciais que cumulativamente poderiam
desembocar em uma sociedade justa e igualitária. Pelo contrário,
fortalecerão ainda mais o capital e seu sistema de poder mundial.
Toda experiência, histórica e presente, nos comprova que o capital
e a propriedade privada capitalista, ao se perpetuarem, concentram riquezas,
acumulam desigualdades e geram periodicamente as crises que terão que
ser pagas pelos trabalhadores para salvar o lucro dos grandes capitalistas. Por
tudo isso, o PCB reafirma que a estratégia da Revolução
Brasileira é Socialista.
Política de alianças no quadro de uma estratégia socialista
48) A definição da etapa socialista da Revolução
Brasileira não implica ausência de mediações
políticas na luta concreta para enfrentamento das conjunturas que se
apresentam na dinâmica da luta de classes imediata. No entanto, a
estratégia socialista determina o caráter da luta imediata, ou
seja, a estratégia subordina a tática e não o inverso como
temos visto em várias oportunidades. Nenhuma ação
política que reforce a ordem do capital e sua expressão
política - seja puramente liberal, seja nas versões amenizadas de
liberalismo social - pode nos ajudar em nosso caminho de defesa de uma
alternativa socialista.
49) A estratégia socialista não é incompatível com
as demandas imediatas da classe trabalhadora por empregos, salários,
contra a perda de direitos e precarização de
condições de trabalho e vida, assim como não se antagoniza
com as demandas populares por terra, contra a discriminação de
gênero e étnica, contra o preconceito devido a regionalidade e
opção sexual, contra a criminalização da pobreza e
a violência policial. Pelo contrário, estes problemas são
manifestações da contradição entre a forma
capitalista de organização da sociedade e as necessidades da
produção e reprodução da vida em um novo patamar. A
estratégia socialista não nega as lutas imediatas, mas não
aceita a forma atual de sociabilidade como capaz de dar soluções
estruturais e duradouras a estas questões, e aponta para a necessidade
de uma nova forma de organização social: o socialismo. Este
princípio deve moldar nossas ações táticas e nossa
política de alianças. A definição de uma
política de alianças supõe que compreendamos o
caráter das alianças práticas que se formam no sentido dos
projetos históricos em disputa, para que depois possamos entender como
as diferentes forças políticas concretas que agem no
cenário imediato das lutas se posicionam no quadro dos cenários
estratégicos.
50) No Brasil, o capital monopolista, diante do esgotamento do modelo
econômico que vigorou desde a década de 1950 e que foi garantido e
desenvolvido pela ditadura militar, sentiu a necessidade de reformar o Estado e
realizar um chamado "ajuste estrutural" para se manter integrado nas
novas condições da globalização neoliberal. A crise
dos anos 80 reforçou a exigência deste ajuste. A
solução para o impasse foi apresentada no chamado Consenso de
Washington, cujo objetivo era implementar as políticas neoliberais
orientadas pelo Fundo Monetário Internacional.
51) O caminho escolhido pelo governo brasileiro foi o de reorientar a
política econômica no sentido do mercado, desenvolver uma
política de confisco dos salários, reduzir os gastos
públicos, realizar a desregulamentação e a retirada do
Estado da economia, as privatizações, uma radical abertura de
mercados ao capital imperialista, a livre circulação do capital
financeiro, além de buscar a recuperação da capacidade do
Estado de continuar pagando o serviço da dívida externa.
Tratava-se de uma radical inflexão do Estado brasileiro no sentido de
romper o modelo construído no último meio século.
52) O governo FHC, depois de derrotar a alternativa democrática popular,
implantou à risca este caminho e logrou um pacto com o empresariado
(manipulando o medo de uma alternativa radical) e os setores
fisiológicos (principalmente pela aliança estratégica com
o PFL). As iniciativas de cooptar as organizações de
cúpulas dos trabalhadores esbarraram, em parte, na falta de
representatividade das centrais escolhidas (principalmente a Força
Sindical), mas principalmente pelo elevado custo social das medidas que
enfrentavam a resistência de setores dos trabalhadores, neste momento,
organizados em torno da CUT. A disputa política também impedia a
plena incorporação das organizações de
cúpula dos trabalhadores, uma vez que o PT ainda se apresentava como
opositor e capitalizava politicamente o desgaste da aplicação da
política neoliberal.
53) Com a eleição de Lula, em 2002, moderada pela
Carta aos Brasileiros
em que se garantiam o respeito aos contratos e a responsabilidade em
manter
os marcos da política macro-econômica do governo anterior ,
descartava-se a alternativa democrática popular antimonopolista,
antilatifundiária e antiimperialista, substituindo-a pela
noção de um "novo contrato social", capaz de unificar
todos os setores sociais em torno de uma política de crescimento
econômico capitalista, e abria-se a possibilidade de completar a
"governança" em torno dos ajustes.
54) Com o pacto envolvendo organizações de cúpula dos
trabalhadores, essencialmente o PT e a CUT, operou-se a política de
ajustes garantida pelo pacto de cooptação popular. Realizaram-se
a reforma da previdência, o corte de direitos trabalhistas, a
precarização dos serviços públicos, a
aprovação das parcerias públicas-privadas, a continuidade
e garantia das privatizações realizadas no governo anterior, a
política agrária concentradora que privilegia o
agro-negócio, a política de favorecimento das transnacionais de
sementes transgênicas, a política de juros que garante os
interesses do capital financeiro (inicialmente identificado como único
setor que não se beneficiaria do novo "contrato social"),
entre tantos outros exemplos.
55) Este desenvolvimento, no terreno prático no qual se produziu, uniu o
bloco de alianças de classe entre o setor conservador e uma força
política que, saindo das classes trabalhadoras, sofreu uma
inflexão política em direção ao projeto centrista
(portanto, pequeno burguês). A existência de setores de esquerda no
PT que resistem a esta inflexão nos limites de uma defesa do
"autêntico projeto democrático popular", não foi
capaz de fazer frente à hegemonia centrista da direção do
PT e tem chances quase nulas de mudanças, a partir do interior desse
partido.
Apesar de o PT originariamente ter se constituído como um partido
à esquerda, acabou por fazer alianças eleitorais que o conduziram
inicialmente a uma posição de centro-esquerda mas, ao chegar ao
poder, construiu sua governabilidade com uma aliança ao centro e
à direita, não só partidariamente, com partidos como PL,
PMDB, PTB, PP e outros, mas com setores diretamente ligados à burguesia
monopolista, representados, entre outros, pelos ministros da Agricultura, do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio e o presidente do Banco
Central.
56) A disputa política institucional principal no Brasil de hoje se
dá entre duas alternativas do capital: uma de pela aliança
PSDB-DEM-PPS, e outra representada pela aliança
PT-PCdoB-PDT-PSB-PMBD-PTB-PP. Esta disputa se faz dentro dos limites de um
grande consenso burguês, que tem por base a manutenção da
macro-política econômica, a manutenção e
aprofundamento da lógica de mercado, o papel do Estado como garantidor
dos interesses do capital monopolista e o abandono de qualquer alternativa,
mesmo reformista, que possa implicar em mudança dos marcos do "novo
pacto social".
57) Em outras palavras, em que pesem algumas diferenças, o bloco liberal
burguês encontra uma unidade estratégica em forças
políticas que divergem na tática. PSDB e PT, como pólos
dessas alternativas, disputam o controle da máquina de governo - e, a
partir daí, a ocupação de cargos e o manejo do jogo
político tradicional que se perpetua - não como dois projetos
essencialmente antagônicos, mas como forças políticas
diferentes de um mesmo projeto, que têm por base a
manutenção das relações capitalistas de
produção, a propriedade privada, a economia de mercado e a
integração do capitalismo brasileiro ao sistema imperialista.
58) Há duas diferenças entre essas duas alternativas que
não devem nem ser superestimadas a ponto de justificar um apoio
"pela esquerda" ao governo - nem subestimadas, sob pena de cairmos no
maniqueísmo esquerdista. Uma delas é o grau e o tom da
competitividade e autonomia frente ao imperialismo, sobretudo o estadunidense,
na integração do Brasil a este sistema. A outra é o grau
das liberdades democráticas, ou seja, a forma e os meios para cooptar,
conter, criminalizar e reprimir movimentos sociais e políticos que se
insurgem contra a ordem burguesa. Esta compreensão levou o PCB,
corretamente, a não apoiar Lula no primeiro turno, mas fazê-lo no
segundo, com um discurso firme de oposição a seu governo,
expresso na consigna
"Derrotar Alckmin e continuar em oposição ao governo
Lula!".
59) Por trás destas expressões políticas, formou-se um
bloco de classes que, mesmo com disputas internas, mantém a hegemonia
conservadora: a burguesia monopolista, a nova burguesia monopolista
agrária, o capital financeiro e a pequena burguesia política
recrutada nas burocracias partidárias e sindicais e que tem por
função essencial garantir a "governança" de um
modelo que precariza aqueles que vivem de salário, que precisam utilizar
os serviços públicos, que sofrem as condições da
urbanização ordenada pelo capital, com seus conhecidos efeitos
sobre a insegurança diante da criminalidade monopolizada pela economia
política do crime organizado, a falta de moradia, as precárias
condições de transporte, o caos na saúde pública, o
descaso com a educação, o desemprego, o abandono da Reforma
Agrária, a ausência de uma política agrícola
inovadora que incorpore os assentados e cooperativas de trabalhadores
agrícolas, bem como a agricultura familiar.
60) O interesse maior deste bloco se expressa na garantia das
condições essenciais para a continuidade e crescimento da
acumulação de capitais com base em uma economia de mercado,
aberta e integrada à economia capitalista mundial. Como parte deste
interesse central, estas classes esperam que o Estado possa gerir com
segurança as condições de domínio da
superpopulação relativa através de políticas
públicas focalizadas e da refilantropização da
questão social, mantendo a legalidade institucional, judicializando e
criminalizando qualquer forma de dissidência. No momento da crise, fica
evidente a natureza de classe do projeto deste bloco liberal burguês, uma
vez que se coloca toda a máquina do Estado a serviço das
garantias para o capital, ainda que a contrapartida seja o aumento do
desemprego e a precarização do trabalho.
61) Não há nenhuma possibilidade, na concepção do
PCB, de estas classes participarem de uma aliança que vá
além deste horizonte burguês e capitalista. Nenhuma das classes e
setores envolvidos, mesmo a pequena burguesia política, aceita a tese da
necessidade de superação da ordem capitalista. Isto nos leva a
afirmar que não há possibilidade de alianças
estratégicas com nenhum destes setores sociais.
62) Isto implica que nossa política de alianças deve se
materializar no campo proletário e popular. A aliança de classes
capaz de formar o
Bloco Histórico do Proletariado
deve ser fundamentalmente estruturada entre os trabalhadores urbanos e rurais,
os setores médios proletarizados e as massas subproletárias que
compõem a superpopulação relativa.
63) O que tem unificado parte deste bloco, ainda tão fragmentado e
heterogêneo, é a oposição, às vezes passiva,
às vezes ativa, ao governo federal ou aos efeitos da política
antipopular adotada. Parte das classes trabalhadoras está em uma
posição passiva ou por um momentâneo efeito de crescimento
de consumo via ampliação do crédito ou por
políticas distributivas precárias que, devido ao tamanho do
abismo social brasileiro, acabam tendo impacto positivo na renda e no consumo
das camadas mais empobrecidas. Parte da superpopulação relativa
encontra um ponto de controle na ação assistencialista de
programas como o
Bolsa Família ou na ação do chamado terceiro setor,
não como forma de resolução dos graves problemas sociais,
mas como maneira de manipular as condições de vida das massas.
A economia política do capital, a economia política da
criminalidade e a economia política da refilantropização
da questão social encontram sua unidade na manutenção da
economia de mercado capitalista, ou seja, a economia privada deve dar lucros, o
Estado arrecadar e, depois de garantir os prioritários interesses do
grande capital, deve chegar, de maneira focalizada, até pontos da
miserabilidade, para amortecer a explosividade da miséria.
64) Este bloco é, portanto, um projeto político a ser
construído. Os elementos dispersos e fragmentados não constituem
nem econômica nem politicamente uma classe. Apresentam-se como
indivíduos em disputa no mercado de trabalho, espaço no qual seu
adversário imediato às vezes é outro proletário e
não a burguesia. A fusão de classe exige que estes setores
sociais se coloquem em luta e sejam capazes de ver por trás das
expressões fenomênicas as causas comuns de seus problemas e a
solução como conseqüência direta de sua
ação independente e constituição enquanto classe
portadora de um projeto histórico próprio: o socialismo. Nossa
política de alianças deve ser firme e ampla. Ao mesmo tempo em
que não há alianças estratégicas com a burguesia e
seus aliados, todo aquele que na luta concreta se colocar em movimento contra a
ordem do capital, se contrapondo aos interesses do bloco liberal burguês,
é um aliado em nossa luta.
65) É preciso não confundir a necessidade de unidade dos
trabalhadores e sua fusão em classe social com a unidade das
forças políticas que representam ou dizem representar os
trabalhadores. Enquanto militantes da classe trabalhadora em suas lutas
imediatas e concretas, devemos apresentar o ponto de vista do proletariado,
apontando as causas dos problemas imediatos e relacionando-as com a
lógica do capital, defendendo uma alternativa socialista. É de se
esperar que, no acirrar das lutas sociais sobretudo com o agravamento da
crise do capitalismo e a rendição do governo Lula às
receitas do capital para combater seus efeitos - setores hoje hegemonizados
pelas organizações reformistas e burocráticas possam vir a
se deslocar para o bloco proletário e devem ser considerados como
aliados, no momento em que se contraponham, na prática, às
iniciativas e políticas antipopulares do bloco burguês liberal e
de seu governo.
66) No entanto, nos parece pouco provável que a pequena burguesia
burocrática que hoje constitui a direção do pacto social
venha a romper com esta trajetória e retorne a uma posição
de defesa dos trabalhadores. Uma vez centralizadas pelo bloco conservador e
pelas necessidades de sobrevivência, se tornarão nossos inimigos e
devem ser tratados como tal.
67) Há, entretanto, alguns setores reformistas que parecem
começar finalmente a entender que não há mais
espaço para ilusões de disputas "à esquerda" no
governo Lula. Afinal de contas, Lula já está no meio de seu
segundo mandato, tendo chegado ao fundo do poço da sua submissão
à governabilidade institucional burguesa. Hoje, com o fortalecimento do
PMDB nas eleições municipais passadas e no ministério e
com a inacreditável eleição de Sarney para a
presidência do Senado e Michel Temer da Câmara, Lula transformou-se
em refém do PMDB, do qual depende não só para adotar
iniciativas legislativas como para eleger seu sucessor. Instalou-se no Brasil
um parlamentarismo de fato.
68) Por isso, não podemos descartar, a partir de agora, alguma forma de
unidade de ação, em questões pontuais, com setores da
esquerda reformista que ainda fazem equivocadamente parte do campo
político social liberal hegemonizado pelo PT.
69) A independência política com que o PCB se coloca em
oposição ao governo Lula comporta esta unidade de
ação pontual. Há temas, como a questão da unicidade
sindical e aspectos da conjuntura mundial, em que nossas opiniões
convergem com partidos da esquerda reformista que apóiam Lula.
70) Mas é preciso ficar claro que independência política
não significa equidistância, ou seja, temos mais afinidade e
unidade de ação com os partidos e organizações de
esquerda que se opõem a Lula do que com aqueles que o sustentam.
A via estratégica da revolução Socialista no Brasil:
hegemonia e contra-hegemonia.
71) A definição de uma estratégia socialista não
significa uma postura mecânica sobre a via revolucionária.
Não há vinculação mecânica entre a
estratégia e a via revolucionária. A via revolucionária
deve ser definida pelas condições imediatas de luta, de
correlação de força, levando-se em conta a história
e a cultura política da classe trabalhadora, as ações do
inimigo e seus instrumentos de luta e de poder.
72) Na história dos trabalhadores brasileiros foram utilizadas
diferentes formas de luta, desde a greve geral revolucionária (1917), a
insurreição (1935), a guerrilha camponesa vitoriosa em Trombas e
Formoso (meados da década de 50), a guerrilha do Araguaia (1969-74), a
luta de massas (1955/1964), a resistência através de frente
democrática (1964 a 1986), a luta armada (1968/1972), a luta de massas
voltada a acúmulos eleitorais (1980/2002) entre outras. A via
revolucionária não se resume à exclusividade de uma das
formas de luta, mas é a combinação efetiva de todas as
formas de ação em um plano geral que seja capaz de viabilizar,
com coerência e unidade, a efetivação do objetivo
estratégico. Como dizia Che Guevara, a qualidade de um
revolucionário se mede por sua capacidade de aplicar todos os meios
possíveis de luta e explorá-los ao máximo, sem perder a
coerência de sua estratégia, ou como dizia Lênin: devemos
combinar a flexibilidade tática com a firmeza estratégica.
73) Nas condições históricas do Brasil e conhecendo a
trajetória da luta de classes no país, acreditamos que a
libertação de nosso povo só será possível
através da revolução, na qual os trabalhadores derrotem a
burguesia, conquistem o poder político, e iniciem a
construção de uma sociedade socialista. A tarefa fundamental do
proletariado, no poder político, consiste em destruir o Estado
burguês e assentar as bases do Estado de todos os trabalhadores. Nesta
tarefa, o Estado proletário converte os meios de produção
em propriedade do Estado. Com o desenvolvimento da produção e das
relações sociais, num ambiente onde não há mais a
propriedade privada, o Estado vai perdendo a sua necessidade de existir, mas
isso só acontecerá quando a correlação de
forças em nível mundial estiver definitivamente favorável
aos trabalhadores.
74) Em nossas condições particulares, há a necessidade de
uma efetiva combinação de lutas simultaneamente dentro e fora da
ordem, ou seja, a plena combinação de formas de luta legais com
formas legítimas, mas não institucionais, fora dos limites da
ordem burguesa. Ou seja, a luta política pode ser realizada de diversas
formas. O Partido Comunista, para ser vanguarda do proletariado, não
pode descartar nenhuma forma de luta. Ou melhor, em sua longa caminhada rumo ao
poder deve combinar todas as formas de luta, desde as mais embrionárias
até a luta aberta contra o regime capitalista. Deve ter a
compreensão de que até hoje não se fez nenhuma
revolução sem o uso de alguma forma de violência.
Não porque o proletariado seja adepto da violência, mas porque a
burguesia sempre apela à violência para manter seus
privilégios seculares. Portanto, é importante que o partido seja
educado nessa perspectiva para não sofrermos derrotas como sofremos no
passado, exatamente por não termos organizado nossa militância e
as massas para atuarem em qualquer situação.
75) A burguesia também organiza seu poder combinando instrumentos de
participação política com a coerção,
inclusive com o uso da violência, quando seus interesses são
contestados. Ao mesmo tempo em que abre espaços para a
atuação política - meio pelo qual inclusive se opera a
cooptação essencial à manutenção da
hegemonia burguesa - coloca a defesa da ordem e de seus interesses de tal forma
truculenta que qualquer transformação social no sentido
anticapitalista pressupõe, em algum momento, um processo de ruptura. No
entanto, estamos convencidos de que não há ruptura sem um grande
processo político de acúmulo de forças e
ação de massas revolucionária, assim como não
há acúmulo político que chegue a
transformações sociais significativas sem ruptura. A
dimensão territorial de nosso país, a unidade do bloco
conservador e seu poder econômico, político, militar e
ideológico e sua consolidação num quadro
institucional/legal legitimado de uma sociedade civil/burguesa, determina que a
ação revolucionária deve ser realizada de várias
formas, de acordo com as condições objetivas da realidade
concreta da luta de classes em cada região.
76) A institucionalidade política nos marcos da hegemonia liberal
burguesa cercou-se de uma legitimidade oriunda das lutas democráticas e
sociais contra a ditadura e pela participação de
organizações que surgiram respaldadas por grandes setores de
massa da própria classe trabalhadora. No entanto, o resultado deste
longo processo de institucionalização da luta política se
apresenta hoje como a rendição a formas viciadas e tradicionais
do fazer político, cercada de fisiologismo, manipulação da
base de massas para fins eleitorais, controle autoritário das
máquinas políticas, personalismo e caciquismo, simbiose com o
capital para financiar as campanhas, comprometimento dos candidatos com os
esquemas que os financiaram e desvios burocráticos no controle dos
mandatos e cargos governamentais.
77) Esse processo também consolidou uma cultura passiva da maioria dos
trabalhadores em relação às eleições, uma
divisão social e técnica do trabalho político-eleitoral na
qual cabe a militantes profissionais a condução das campanhas,
apenas para certas lideranças o papel de candidatos e aos trabalhadores
resta o papel de eleitores. Descaracterizaram-se os programas como
expressão de interesses reais das classes, transformando-os em
peças de marketing político quando não puro oportunismo
eleitoral. Tudo isso nos leva a afirmar que, se por um lado, consolidou-se uma
cultura política institucional voltada ao processo eleitoral e
parlamentar que legitima o domínio burguês, ao mesmo tempo
há um evidente desgaste deste caminho aos olhos da maioria dos
trabalhadores no que se refere à capacidade de conduzir à real
solução de seus problemas.
Por outro lado, a desigualdade das condições de disputa eleitoral
é cada vez mais desfavorável para candidaturas contestadoras da
ordem.
78) O horizonte central de nossa via revolucionária deve ser a
constituição de uma contra-hegemonia, através da
consolidação do
Bloco Histórico do Proletariado,
uma aliança de classe capaz
de contrapor ativa e decididamente ao poder liberal burguês um poder
proletário e popular, organizado e centralizado, capaz de unificar as
diversas demandas particulares em um programa geral de lutas e uma proposta
historicamente independente. Ao mesmo tempo, é necessário ir
construindo a partir de agora, a partir da velha ordem, um duplo poder, uma
ordem institucional e política própria dos trabalhadores, fundada
e fundante numa nova cultura proletária e popular, capaz de dar unidade
ao bloco proletário e colocá-lo em movimento na luta contra a
ordem conservadora.
79) A construção do poder proletário/popular não se
resume à mera negação institucional ou qualquer tipo de
paralelismo autonomista, mas ocupa ativamente todos os poros da
institucionalidade atual guiada por um projeto histórico de
negação da ordem capitalista, portanto, partindo da
afirmação revolucionária segundo a qual os meios
necessários à vida não podem ser apropriados privadamente,
que nenhum ser humano pode se apropriar de outro para transformá-lo em
mercadoria, que os bens de primeira necessidade e os serviços
necessários à produção e reprodução
social da vida são patrimônio de toda a humanidade e não
podem ser apropriados privadamente. Portanto, é preciso criar uma nova
forma de associação e sociabilidade através das
manifestações de resistência da classe trabalhadora,
dotando-a de dimensão política pela compreensão das
raízes e determinações de cada problema particular e
relacioná-los com a totalidade da ordem capitalista a ser negada e dotar
as ações políticas de dimensão organizativa e
disciplinada, culturalmente solidificada e somar na construção de
um grande movimento político de massas que tenha por bandeira a
implantação do socialismo no Brasil.
80) Para tanto, propomos a construção de órgãos de
poder proletário e popular que exercitem o processo de gestão e
deliberação a respeito dos assuntos que dizem respeito
diretamente às massas trabalhadoras, além de ações
diretas para solucioná-los. Em todas as instâncias da sociedade,
é necessário organizar a resistência dos trabalhadores: por
locais de trabalho, para fazer frente à arbitrariedade do capital; nos
locais de moradia, para garantir a segurança e melhores
condições de vida; onde for preciso, tomar iniciativas de
trabalho e produção cooperativadas, lutar por acesso à
saúde, educação e serviços fundamentais não
apenas como ampliação de serviços públicos, mas
pelo controle do processo e da qualidade da execução das
políticas públicas.
81) Organizar formas de abastecimento e controle popular de
distribuição, potencializar as formas autônomas de trabalho
e vida e vinculá-las aos trabalhadores de diferentes campos e
profissões, desenvolver uma solidariedade ativa entre as categorias e
setores sociais e fomentar interesses comuns e a necessidade de uma nova forma
de organização da produção social da vida para
além do mercado e da lógica do capital. Organizar a cultura
proletária e popular como acesso e produção universal de
bens culturais, formação política, conhecimento da
história, do funcionamento da sociedade e da luta internacional dos
trabalhadores, e como capacitação técnica e profissional.
82) Onde os limites da institucionalidade liberal burguesa impedirem a plena
realização da humanidade, é necessário criar
experiências inovadoras de ação; ocupar e recuperar
fábricas e empresas e colocá-las em funcionamento sob o controle
dos trabalhadores; ocupar os latifúndios e colocar a terra a
serviço da produção cooperativada, sob a
direção dos trabalhadores rurais. Trata-se de tomar uma atitude
ativa diante dos diversos problemas concretos que surgirem e radicalizar
soluções, ocupando e tomando para o poder proletário e
popular a tarefa de enfrentar estes problemas, não no sentido de
substituir as políticas públicas e o dever do Estado, mas de
denunciar sua omissão criminosa e construir outra institucionalidade.
83) Centralizar todas as iniciativas em órgãos mais abrangentes
de poder proletário e popular, abarcando realidades regionais,
conglomerados metropolitanos até a dimensão estadual para
finalmente propor a criação de um Poder Popular como duplo poder
de resistência e confronto ativo com o bloco liberal burguês, de
forma a contrapor duas alternativas distintas de organização
societária: a manutenção da ordem capitalista ou a
necessidade de uma nova ordem socialista. Nossa principal meta
estratégica é ir demonstrando a superioridade das formas de
organização popular e criar as condições para que o
debate político se dê em torno desta questão
programática e histórica sobre a forma de sociedade que queremos,
distanciando-se do mero confronto de siglas vazias de conteúdo, de
programas de marketing político que reproduzem uma lista de necessidades
e apresentam soluções milagrosas que logo em seguida serão
abandonadas pelo pragmatismo oportunista.
84) A via estratégica para a Revolução Socialista no
Brasil, considerada como luta pela criação de um Poder Popular,
se propõe a utilizar todos os meios para apresentar sua proposta
política, como expressão de um bloco histórico
hegemonizado pelo proletariado. As classes que hoje disputam a política
brasileira excluíram a questão proletária da pauta,
maquiando uma posição pequeno burguesa rebaixada como sendo a
representante dos trabalhadores. Nossa tarefa é garantir que o projeto
proletário e socialista entre novamente no debate, como expressão
dos interesses reais, imediatos e históricos das classes trabalhadoras
sob seu protagonismo direto.
85) O desfecho da Estratégia Socialista de construção de
um Poder Popular não pode ser definida de antemão, mas é
nosso dever e responsabilidade estar preparado para os diversos cenários
que podem se apresentar. Assim, devemos estar preparados para defender a
alternativa socialista contra a violência da reação
burguesa e seus aliados, inclusive, se necessário, através da
autodefesa e do direito de rebelião.
Eixos fundamentais de um programa de transição:
86) O processo de transição para as transformações
revolucionárias envolve um conjunto de medidas econômicas e
políticas, cujos elementos constitutivos definem o rumo das
transformações e criam as condições objetivas para
que sejam mais profundas. Nesse sentido, colocamos para todas as forças
que poderão vir a constituir o
Bloco Histórico do Proletariado
um conjunto de propostas como marco inicial de um programa de
transição comum de todas as forças anticapitalistas
brasileiras.
Ações políticas na construção do Bloco
Histórico:
-
Constituir, como objetivo central de todas as forças anticapitalistas,
a conformação do
Bloco Histórico do Proletariado,
como instrumento privilegiado para a realização das
transformações sociais no Brasil. O
Bloco Histórico do Proletariado
será o instrumento para construir uma hegemoniapolítica,
econômica, cultural, filosófica e moralna sociedade burguesa,
portanto uma contra-hegemoniaao modo de produção capitalista.
-
Desenvolver esforços, nacionalmente e em todos os Estados, no sentido de
reforçar o trabalho de unidade dos revolucionários brasileiros
para a constituição de uma FRENTE POLÍTICA PERMANENTE DE
CARÁTER ANTICAPITALISTA, sem confundi-la com uma mera
coligação eleitoral, composta por organizações
políticas e sociais, baseada na unidade de ação no
movimento de massa e, através desta Frente, lutar pela
construção de uma rede de organizações sociais e
populares no interior da ordem burguesa, como instrumento de
construção do
Poder Popular
, buscando politizar as representações sociais e de massas e
transformá-las em espaços alternativos de
construção dos elementos embrionários da futura sociedade
socialista, contribuindo assim para a constituição do BLOCO
HISTÓRICO DO PROLETARIADO.
-
Lutar pela construção de um instrumento intersindical nacional,
que reagrupe o sindicalismo classista, de forma a organizar o processo de luta
contra o capital, bem como organizar os trabalhadores pela base a partir das
fábricas, dos campos e dos locais de trabalho em geral.
-
Desenvolver um trabalho ideológico no sentido de reafirmar a necessidade
do socialismo no Brasil. Continuar a luta pelo desmascaramento tanto das
posições social-democratas e social-liberais como das
"esquerdistas" no seio do movimento operário e sindical, da
juventude e da esquerda em geral, e disputar os quadros revolucionários
que estão descontentes com o rumo de suas organizações.
-
Combinar o trabalho nas entidades institucionais dos trabalhadores e do povo,
com a luta não institucional, com criatividade e ousadia, como resposta
organizada dos trabalhadores e do povo em geral contra a ofensiva do capital
neste momento de crise.
-
Continuar na oposição aos governos social-liberais, no
entendimento de que governam para os oligopólios, banqueiros e
latifundiários e tendem a aprofundar essa aliança conservadora
diante da crise, bem como realizar a ofensiva contra salários, direitos
e garantias dos trabalhadores.
-
Lutar pela democratização dos meios de comunicação,
hoje um oligopólio dominado no Brasil por pouquíssimas
famílias, autoritário, manipulador e ferrenho defensor dos
interesses mais reacionários do capital financeiro nacional e
internacional. Desenvolver esforços para a construção de
uma rede de comunicação alternativa, que envolva a internet, TVs
e rádios comunitárias, jornais sindicais e de bairro, bem como
outros instrumentos de luta ideológica contra o capital.
-
Construir e fortalecer os organismos de juventude dos diversos partidos e
organizações que comporão a Frente Anti-Capitalista em
todas as cidades e regiões em que estiverem organizados, de forma a
influir na construção de uma política para a juventude
brasileira, como forma de politizar as lutas juvenis para o campo da
revolução e resgatar as entidades históricas da juventude
para o terreno da combatividade.
-
Desenvolver uma política cultural para o país de resgate da
identidade nacional, de forma a envolver os intelectuais e os artistas numa
produção voltada para os interesses populares, para o incentivo
às manifestações do povo, para a construção
de um amplo movimento cultural com capacidade de inovar estética e
politicamente o panorama cultural brasileiro, buscando romper com os
interesses dominantes dos oligopólios nacionais e internacionais da
cultura e das artes.
Propostas para um programa de transição ao socialismo:
a) Estatização e controle público das
instituições financeiras, dos oligopólios e empresas
estratégicas, passando sua direção para os Conselhos de
Trabalhadores e colocando a espinha dorsal da economia a serviço da
população brasileira.
b) Estruturar uma nova política econômica que construa as bases de
uma nova economia socialista. Essa nova política terá a tarefa de
modernizar o parque industrial brasileiro, desenvolver ou criar setores de
ponta em que tenhamos vantagens comparativas, de forma a suprir o mercado
interno de forma auto-sustentada; desenvolver uma agressiva política de
incentivo à pesquisa e desenvolvimento tecnológico, envolvendo
universidades, institutos de pesquisas governamentais e empresas
públicas, buscando elevar, no médio prazo, o orçamento em
P&D para cerca de 3% do PIB.
c) Instituir o monopólio cambial, com objetivo de resgatar a soberania
nacional, estancar a saída das reservas internacionais do País e
planejar a política cambial de acordo com os interesses nacionais e da
população.
d) Declarar a moratória da dívida interna e instituir uma
auditoria, com imediata suspensão dos pagamentos de todas as formas de
juros dessa dívida, visando estancar a sangria de pagamentos de juros,
cujos montantes vêm sugando crescentemente o orçamento
público e reduzindo as verbas para os serviços básicos da
população.
e) Reforma agrária sobre o controle das entidades dos trabalhadores
rurais, de forma a democratizar a posse da terra, especialmente com a
construção de grandes cooperativas agro-pecuárias para
racionalizar o sistema produtivo e ampliar a oferta de produtos básicos,
e instituir uma nova política agrícola de acordo com os
interesses da população.
f) Instituir a estabilidade no emprego para todos os trabalhadores e realizar
um programa de recuperação do poder de compra dos
salários, discutido com os
sindicatos. Redução da jornada de trabalho sem
redução do salário, visando ampliar o emprego e a renda da
população.
g) Criar uma rede de transporte barato nos grandes centros urbanos, com
ênfase no metrô e veículos leves sobre trilhos para as
grandes metrópoles, bem como uma rede ferroviária e
hidroviária para o transporte de produtos industrializados e mercadorias
em geral.
h) Criar o
Banco dos Trabalhadores,
que passará a controlar os fundos patrimoniais e
previdenciários, dando novas diretrizes, orientações e
prioridades para o extraordinário volume de recursos hoje geridos por
entidades paraestatais, na lógica do capital. Em outras palavras, os
trabalhadores passarão a controlar os fundos patrimoniais e
previdenciários e da seguridade social, para dar-lhes uma nova
dinâmica, com maior eficiência produtiva e justiça social.
i) Realizar a reforma urbana, com a desapropriação de todos os
terrenos vazios para a construção de praças, parques e
cinco milhões de habitações populares nas grandes
metrópoles, de forma a zerar o déficit habitacional nessas
regiões e expandir o programa para todas as cidades do país. Como
se sabe, os gastos em habitação são indutores de outros
setores da economia, como cimento, aço, eletro-eletrônico,
cerâmica, entre outros e, ao mesmo tempo, têm uma
extraordinária capacidade de criação de postos de
trabalho, o que deverá se refletir no emprego, na renda das
famílias e na dinâmica da economia.
j) Estatização do sistema de saúde, com a
recuperação para o setor público dos hospitais privados e
ampliação dos equipamentos já existentes, além da
construção generalizada de hospitais e postos de saúde nos
bairros populares e instituição do médico de
família para atender toda a população, visando garantir o
preceito constitucional de que a saúde é um direito de todos e um
dever do Estado.
k) Estatização de todo o sistema de ensino nacional,
especialmente das universidades privadas e escolas particulares, e
implantação de uma ampla reforma na educação que
possibilite no médio prazo a criação de uma escola de
qualidade para todos, do maternal ao ensino superior, além da
pós-graduação.
l) Erradicar o analfabetismo em todo o país, adaptando, para as
condições brasileiras, o programa cubano "Sim, eu
posso!".
m) Restabelecer o monopólio estatal do petróleo, reestatizar a
Petrobrás, extinguir a Agência Nacional de Petróleo (ANP) e
anular todos os contratos de risco e leilões realizados em
território brasileiro.
n) Realizar uma política ativa de integração soberana e
antiimperialista da América Latina, mediante o fortalecimento dos
instrumentos atualmente existentes, como a ALBA, Banco do Sul e Unasul e criar
outros mecanismos que possibilitem uma integração mais
rápida dos países latino-americanos; devolução do
Arquivo Nacional do Paraguai e renegociação do acordo de Itaipu;
apoio aos processos de mudanças na Bolívia, no Equador, na
Venezuela e em outros países.
o) Estabelecer uma política externa antiimperialista, pela paz entre os
povos e de solidariedade efetiva aos povos e países em luta pela
autodeterminação e soberania; posicionamento do Brasil pelo fim
do bloqueio a Cuba, pelo fim da ocupação militar no Iraque,
Afeganistão e na Palestina;
p) Instituir uma política ambiental que preserve as florestas, a
biodiversidade, os rios e fontes aqüíferas, que recupere o solo, os
diversos biomas nacionais e que desenvolva um sistema de saneamento integrado
à nova política de meio ambiente, capaz de levar esgoto tratado e
água potável para toda a população.
q) Fortalecer o sistema de defesa do País com todos os equipamentos
necessários para que o país tenha condições
efetivas de se defender do imperialismo, enquanto nação soberana,
tanto no que se refere ao território, especialmente a Amazônia,
bem como as águas territoriais brasileiras e as riquezas nelas
encontradas. Reestruturar as Forças Armadas dentro de uma nova doutrina
de segurança popular, cujos elementos centrais serão sua
transformação em instrumento a serviço da
população e do governo popular.
Desdobramentos táticos da estratégia socialista
87) O fato de apontarmos para uma estratégia socialista não
significa subestimarmos mediações táticas capazes de
colocar em movimento os trabalhadores para a luta imediata. Sabemos que a meta
socialista necessita, em grande medida, ser construída como parte de uma
contra-hegemonia que se oponha ativamente à hegemonia liberal burguesa.
Nossa estratégia tem por objetivo imediato difundir e propagandear a
necessidade do socialismo, mas isso não significa que não seja
possível começar a realizar esta tarefa a partir das lutas
imediatas e da atual conjuntura da luta de classes no Brasil, tendo como eixo
tático central fortalecer espaços de resistência e luta
unitários, como o Fórum Nacional de Lutas. Propomos a
concentração de esforços em torno das seguintes
ações políticas táticas, listadas aqui sem qualquer
ordem de hierarquia:
1 a potencialização das lutas de resistência dos
trabalhadores contra o projeto liberal burguês e seus efeitos mais
imediatos, principalmente no quadro de crise que reverterá as
aparências enganosas do ciclo recente que encobriu a
exploração, mediante a inclusão no mercado de consumo, via
crédito ou auxílios assistencialistas de algumas camadas mais
pobres da população. Esta primeira tarefa tática implica
em tornar visível a invisibilidade da exploração e da
pobreza. A versão idílica governamental e dos fanfarrões
da pequena burguesia política é que o nosso país passou
pelo "melhor período de sua história", nunca se teria
crescido tanto, o emprego aumentou, a miséria diminuiu, os lucros
cresceram, as empresas e o Estado investiram, e tudo ocorreu da melhor forma no
melhor dos mundos.
2 a resistência contra a precarização do trabalho e
a perda de direitos. A bandeira
"nenhum direito a menos"
deve ser ativa e massiva buscando mobilizar os trabalhadores do setor
produtivo, os funcionários públicos e demais trabalhadores para
que não aceitem arcar com o ônus da crise. Além disso,
é fundamental, diante da crise e do desemprego, levarmos a seguinte
palavra de ordem para os trabalhadores: demitiu, parou! Em todos os locais onde
houver demissão, os trabalhadores devem ocupá-los e parar as
atividades. Neste aspecto, torna-se fundamental a construção e
fortalecimento da INTERSINDICAL, na perspectiva de caminhar para a
convocação de um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora
(ENCLAT) que dê passos decisivos para a formação de uma
nova Central Sindical, unitária e combativa.
3 a intensificação da luta estudantil, não apenas
como forma de resistência contra o fortalecimento do ensino privado pela
entrada das Fundações e do Reuni, mas também para dotar o
movimento estudantil de uma ação solidária junto à
luta dos trabalhadores e como ator essencial na generalização de
nossa proposta de Poder Popular. Não apenas na solidariedade concreta
às lutas dos trabalhadores, mas como articulador de iniciativas
concretas de ação cultural, política e organizativa que
dêem formas aos órgãos de poder proletário e popular.
4 a dinamização do movimento popular, articulando-o ao
processo de participação na construção de um
programa revolucionário e socialista para o Brasil. Devido ao seu
caráter, o movimento popular pode assumir um papel decisivo na
construção das iniciativas de uma institucionalidade
proletária e popular que dê conta de passar do papel de objeto
passivo de políticas públicas e da pirataria do terceiro setor
para o protagonismo de políticas concretas de construção
ativa de uma contra-hegemonia, através de iniciativas de
produção, consumo, moradia, educação, cultura,
saúde e formas solidárias de vida e ação
política. O movimento popular é nosso principal meio para
estabelecimento dos órgãos de poder popular nas localidades de
moradia dos trabalhadores e um caminho para chegar aos locais de trabalho.
Outro desafio em relação ao movimento popular é
dotá-lo de unidade programática e política e
contrapô-lo ao atrelamento assistencialista e a cooptação
das políticas governamentais ligadas ao oportunismo eleitoral. A
coexistência, em vários casos, com a economia política da
criminalidade, envolverá também desafios de
organização para autodefesa.
5 o reforço da organização específica das
mulheres. Submetidas à opressão de gênero e de classe, as
mulheres fazem parte da luta geral de emancipação de maneira
particular. A especificidade da questão de gênero exige
políticas de mobilização e organização
próprias que permitam uma radical afirmação de um
feminismo socialista que seja capaz de mobilizar as mulheres não apenas
para buscar suas demandas específicas, mas também conclamar a
organização dos elementos do Poder Popular e de nossas metas
estratégicas socialistas. Neste aspecto, as lutas contra a
discriminação no trabalho, pelo direito ao atendimento de
saúde especializado, contra a violência doméstica,
pelo direito ao aborto,
são meios essenciais para organização e
mobilização das mulheres para o projeto socialista.
6 a intensificação da solidariedade ativa na luta pela
terra. Não apenas na solidariedade concreta com as ações
independentes dos movimentos que lutam por terra no Brasil, mas a
ação de interligação de lutas, auxiliando-os na
organização sindical do proletariado rural. A
vinculação das lutas urbanas com as lutas rurais, seja por terra,
seja pela sobrevivência dos assentamentos como áreas de
construção de relações em dissidência com a
lógica do mercado e do capital, é um ponto estratégico de
construção do Poder Popular e da Revolução
Socialista no Brasil. O PCB deve dar prioridade a esta relação e
se colocar decididamente na construção das
condições que permitiriam o desenvolvimento efetivo da
relação com os movimentos que lutam por terra e que colocam o
socialismo como sua meta estratégia.
7 - a fomentação de um amplo movimento político cultural
em defesa do Socialismo que envolva a solidariedade internacionalista e o
resgate das experiências revolucionárias internacionais, com
especial destaque para a Revolução Soviética e Cubana.
Este campo de ação envolve uma ofensiva radical na
formação política e a combinação com
atividades culturais capazes de se tornar um movimento de massas inovador e
criativo de resgate da cultura revolucionária, seus principais
personagens e ícones, as datas marcantes de nossa história, mas
também de criação de bens culturais, de conjuntos
musicais, de poetas e artistas plásticos capazes de expressar o que
há de mais humano através da arte ao mesmo tempo se antagonizar
com o estranhamento produzido pelo capitalismo e a necessidade de
emancipação humana através da revolução
socialista.
Tática política imediata:
88) O principal desafio do PCB é construir as pontes táticas que
nos permitam criar as condições de desenvolver nosso projeto
estratégico pelo socialismo no Brasil. Neste caminho, a conjuntura
imediata é de grande importância. Enquanto parte das forças
políticas que atuam no cenário brasileiro, inclusive do campo de
esquerda, jogam suas fichas cada vez mais na pauta do processo eleitoral, o PCB
deve afirmar que é essencial que 2009 seja um ano de intensas
mobilizações, resistências, lutas e árduas tarefas
de organização e formação política, capazes
de lançar as bases de um projeto de Poder Popular para o Brasil.
89) O PCB deve incentivar a elaboração de um calendário
nacional de lutas centrado na resistência dos trabalhadores à
ofensiva do capital em função da crise, tendo como lema
nenhum direito a menos
, a defesa do emprego e do salário, pela redução da
jornada de trabalho, pela manutenção e ampliação
das verbas para educação e saúde, assim como visando
atrair para a luta os trabalhadores e os setores mais necessitados da
população, além de combater qualquer forma de
subsídio para o capital monopolista. Devemos propor a
criação de comitês e organismos de
mobilização que sejam germes de Poder Popular e que caminhem para
a proposição de um grande Encontro Nacional, no final do ano, nos
marcos da Frente Anti-Capitalista, envolvendo todas as
organizações e movimentos populares e revolucionários,
para elaboração de um programa estratégico e tático
do Poder Popular. Este Programa deve ser uma plataforma política capaz
de dar unidade a um novo bloco proletário e formar a nossa
ação contra-hegemônica como base para uma alternativa real
de poder para os trabalhadores.
90) Não podemos vincular a elaboração deste programa e a
mobilização social de resistência e luta ao
calendário e a alternativas eleitoral. Não que, em tese,
descartemos a via eleitoral, através da qual surgiram vários
processos de mudanças em diversos países da América
Latina, que podem vir a assumir um caráter socialista, a depender da
correlação de forças e do protagonismo do proletariado.
Mas a vitória eleitoral de forças de esquerda só é
possível de ocorrer e sobretudo de servir de impulso a mudanças
políticas e sociais quando contextualizadas num forte movimento de
massas, o que não é o caso da conjuntura brasileira. No caso
brasileiro, pelo menos nesta quadra, a participação de nosso
Partido no processo eleitoral tem como principal objetivo a denúncia do
capitalismo, a propaganda do socialismo e a contribuição para a
organização popular e para a luta de resistência.
91) É de interesse dos comunistas que tanto a mobilização
e as lutas como a realização do Encontro Nacional para a
constituição da FRENTE PERMANENTE ANTICAPITALISTA e a
elaboração do Programa sejam a mais ampla e unitária
possível no campo da esquerda orientada ao socialismo, com a ruptura do
capitalismo e não com reformas. O mais importante é a
criação e desenvolvimento de um novo pólo político
socialista de massas com disposição de construir as
condições de disputar o poder na perspectiva do socialismo, com a
incorporação de amplos setores de massa desgarrados do projeto
conciliador do pacto social, com prioridade para setores de massa que se tem
mantido em luta contra o governo e suas iniciativas antipopulares, como o MST,
a Consulta Popular e outras organizações do campo anticapitalista.
Índice
O Capitalismo Hoje
Socialismo: Balanço e Perspectivas
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