Pavel Groudinine, candidato do PCFR às presidenciais de 2018
Dirigente do kolkhoze Lenine, líder da agricultura
biológica
O movimento comunista russo revive o seu legado pre-khroutcheviano da
agroecologia ao lançar um agrónomo, filho de camponeses e
dirigente do célebre e ultramoderno Sovkhoze Lenine nos subúrbios
de Moscovo, ponta de lança da agricultura biológica russa.
O Congresso do Partido Comunista da Federação Russa (PCFR) acaba
de designá-lo candidato às próximas eleições
presidenciais, mas muitos talvez já o conhecessem como kolkhoziano
líder da famosa herdade coletiva Lenine nos arredores de Moscovo, uma
"
uma ilha de socialismo no meio da selva capitalista"
, como ele diz do seu trabalho.
Pavel Groudinine é também Vice-Presidente da Comissão de
Agricultura da Câmara de Comércio e Indústria Russa,
promovendo a agricultura biológica, cujos benefícios são
conhecidos desde sempre em Moscovo pelos adeptos do famoso Sovkhoze Lenine:
aí se colhem morangos e muitas outras frutas sazonais e legumes;
são vendidos produtos lácteos através dos agora designados
"circuitos curtos", garantia de frescura e de respeito pelo meio
ambiente.
Paradoxalmente, esta herdade coletiva, antes um sovkhoze (herdade do Estado)
tornada à força uma cooperativa, um kolkhoze gigante, após
o fim da União Soviética, continua a ser hoje a maior herdade da
Rússia e mantém, como muitos outras herdades onde os
trabalhadores recusaram a privatização ou a venda a promotores
imobiliários sedentos de lucro fácil, mantendo as técnicas
agora centenárias do trabalho coletivo, coletivização dos
meios de produção, reinvestimento total na
produção, partilha equitativa das receitas, divisão de
trabalho, permitindo aos agricultores tirar férias e aos filhos irem
à escola.
É sem dúvida uma dimensão ignorada do público em
geral no Ocidente: muitos kolkhozes e sovkhozes soviéticos mantiveram-se
relutantes em relação à agricultura intensiva, conduzida
por Khrushchev e desenvolveram o modelo "sem pesticidas e fertilizantes
químicos até a estes anos, prova de que se pode conciliar
agroecologia e grandes produções para além do modelo
"familiar" promovido pelas teorias "ecosocialistas". Como
testemunha um outro exemplo de agricultura biológica na herdade coletiva
ucraniana em Stavkovie, filmado por Coline Serreau no seu documentário
de 2010
"Solutions locales pour un désordre global"
(ver vídeo com extrato do filme).
A candidatura de Pavel Groudinine, votada por unanimidade em 23 de dezembro,
sucedendo à do camarada Guennadi Ziouganov (73 anos), tem para
nós, "ocidentais", dois significados importantes:
A agricultura biológica desenvolve-se na Rússia de forma
fulgurante, especialmente desde o embargo ocidental de produtos
agrícolas em 2014, forçando o país a desenvolver suas
produções locais. Sinal de que a agroecologia é
indissociável de uma política de independência e
auto-suficiência nacional.
A candidatura do PCFR de um kolkhoziano líder do biológico
é uma maneira de o movimento comunista russo voltar a ligar-se à
sua história profunda e soviética. De facto, foi na União
Soviética que foram inventados os primeiros conceitos ecologistas
(nomeadamente a noção de Biosfera do célebre
Vernadsky
) e a ciência dos solos tão ricos no imenso
território da União Soviética viu a luz do dia,
(Dokoutchaiev, Williams foram os primeiros protagonistas). Os primeiros e
principais planos de agroecologia (o famoso "grande plano de
transformação da natureza" de 1948), o desenvolvimento de
tecnologias contrárias ao uso de pesticidas e fertilizantes
químicos, foram a base da agricultura soviética coletivizada
até ao período de Khrushchev, início do seu
declínio, alinhando com o modelo intensivo americano
(ver
brochura do Cercle Barbusse intitulée L'Ecologie à la lumière du marxisme léninisme
).
É este legado "ecologista" do comunismo russo que explica o
grande êxito da agricultura biológica na Rússia de hoje,
simultaneamente com uma preocupação pelo respeito do ambiente,
marcado por exemplo pela multiplicação de
zapovedniki
no território, grandes reservas naturais interditas aos seres humanos
(fora alguns cientistas) criadas por decreto em 1921, e que continuaram a
desenvolver-se na URSS (com uma queda pontual significativa durante a era de
Khrushchev, vinculado ao alinhamento na monocultura intensiva americana chamada
"produtivista" (Ver
La première opposition à l'agriculture intensive court-termiste était soviétique
de Guillaume Suing)
.
O modelo de grandes kolkhozes biológicos e coletivistas desafia a falsa
contradição que alguns ambientalistas ocidentais postulam entre o
respeito para com o ambiente, a saúde humana e a produtividade
agrícola. É necessário com efeito garantir uma certa
quantidade de produtos agrícolas, para assegurar a
auto-suficiência, ao mesmo tempo respeitando os solos para garantir essa
auto-suficiência a longo prazo (em grandes culturas a colheita mecanizada
poderia consumir energias renováveis em vez de combustíveis
fósseis).
É visivelmente o caso na Rússia pós-Ieltsine: o peso do
legado coletivista retardou a dissolução dos kolkhozes russos,
tanto os agricultores viam as suas vantagens. Este é também o
caso da agricultura socialista cubana,
hoje líder em matéria de agroecologia
, devido à sua estrutura fundamentalmente socialista, com um Estado que
é capaz de banir pesticidas e dar às massas camponesas os meios
para garantir o êxito destas produções, que implicam custos
de formação agronómica e técnica (ao
contrário da agricultura intensiva muito passiva).
É igualmente o caso hoje em França nos pequenos coletivos de
jovens agricultores que se lançam em projetos de herdades coletivas
biológicas onde a partilha de tarefas e a coletivização
dos meios de produção lhes permite ter tempo para uma vida
pessoal, férias, etc (ver um trecho de vídeo da emissão de
France 5
Le champ des possibles
relativa a uma dessas experiências).
O kolkhoze gigante de Pavel Groudinine é provavelmente um exemplo disto,
com as suas instalações muito "soviéticas" para
facilitar as condições de trabalho do coletivo dos agricultores
que lá vivem.
Como um trabalhador relatou ao
L´Humanité
:
"Nós usamos o sistema capitalista para criar nossa parcela de
comunismo. E se atrai tantas pessoas é que porque este sonho tem futuro.
Espero que a Rússia possa inspirar-se no nosso Sovkhoze (...). O facto
de termos bons salários e um estilo de vida não
desprezável tranquilizam e ajudam na intenção de fundar
uma família."
De facto, a herdade coletiva Lenine, com os enormes reinvestimentos que gera
uma empresa que não especula sobre seus lucros, integralmente
redistribuídos, é quase um microestado no Estado, que se
desenvolve e isto apesar de um apoio quase inexistente quando comparado com os
enormes subsídios que Bruxelas dá para às herdades de
produção intensiva para tentar esmagar o mercado mundial.
[Para mais informações sobre o Sovkhoze Lenin, consultar o artigo
Un petit coin d'URSS dans la banlieue de Moscou
]
Pavel Groudinine explica no mesmo jornal:
"Tudo é reinvestido. Foi assim que pudemos melhorar a
produção, proporcionar bons salários, garantir a
segurança no emprego, permitir que as famílias tenham as suas
casas, um jardim-de-infância, uma escola. Este é o estilo de vida
que permitimos aos nossos 320 trabalhadores. No regresso às aulas vamos
inaugurar uma nova escola, capaz de acomodar 180 crianças".
Centro cultural, complexo, desportivo, parque, piscina, clínica,
áreas de desportos, imóveis: tudo é ultramoderno nesta
imensa herdade, onde a colheita de morangos se tornou quase uma
instituição para os que gostam de fruta fresca em Moscovo.
Já é tempo que o movimento ecologista dos nossos países
perceba que a agricultura intensiva "produtivista" não
é intrínseca ao comunismo, cuja experiência no campo
ecologista foi pioneira de1917 aos nossos dias na Rússia (é
verdade com os primeiros desvios khroutchevianos e os recuos que lhe
estão associados), mas também evidente em Cuba hoje por
razões semelhantes, uma vez que o legado "produtivista"
khroutcheviano foi liquidado na década de 1990.
A candidatura de Pavel Groudinine é um sinal concreto que mostra, se
ainda for necessário, a mais evidente unidade estratégica entre o
movimento social operário e o movimento ecologista "verde"
contra o capitalismo selvagem e destrutivo cujos malefícios são
hoje indiscutíveis.
Algumas fotos do Sovkhoz Lenine dirigido por Pavel Grounidine, que produz
frutas e legumes biológicos segundo o modelo
"soviético", com edifícios deslumbrantemente novos, o
seu estádio, o jardim-de-infância, suas infraestruturas
inteiramente financiadas a partir do rendimento da produção
agrícola para benefício direto de seus trabalhadores.
[*]
Professor agregado de Ciências da Vida e da Terra, autor de
Evolution: La preuve par Marx
(2016), "L'Ecologie réelle, une expérience
soviétique et cubaine" (2018), ed.
Delga
.
O original encontra-se em
germinallejournal.jimdo.com/.... Traduçãode DVC.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|