Opinião de um economista conservador
Euro, a máquina de engendrar estagnação
Estou estupefacto pelo grau de incompetência das nossas elites
económicas ou financeiras. Como no poema de du Bellay sobre os cardeais
em Roma, se os vê deambular "com um passo solene e um semblante
carregado" a repetirem como Diafórios
[1]
"o fígado, eu vos digo, o fígado". E por nos
apresentarem o problema dos países europeus como provenientes de um
excesso de dívidas que conduzem a défices orçamentais
insustentáveis e que devem, naturalmente, ser corrigidos por altas dos
impostos acompanhadas de uma baixa do nível de vida, ai de nós,
inelutável... na qual todo o mundo sofrerá, salvo eles bem
entendido.
Se me permitem, eis uma magnífica asneirada de qualidade conceptual
equivalente ao célebre "para reduzir o desemprego diminuamos o
tempo de trabalho".
A realidade é muito diferente. Como não cesso de explicar nestas
crónicas, o Euro é uma máquina de engendrar a
estagnação nos países menos competitivos, ou seja, todos
aqueles que têm uma produtividade do trabalho inferior à da
Alemanha. Se a produtividade sobe 3% ao ano na Alemanha e 0% na Itália,
ao fim de um certo número de anos todos os produtores italianos
estarão em falência se a taxa de câmbio entre os dois
países permanecer fixa. A prova é que a taxa de cobertura das
exportações pelas importações
(exportações/importações) que era superior a 1 no
ano 2000 para o comércio exterior italiano (em excedente comercial
portanto) caiu brutalmente para 0,85 em 10 anos, verificando-se a mesma
evolução em França. Uma deterioração
tão ampla como esta, quando houve um crescimento do PNB italiano muito
fraco no mesmo período (0,5% ao ano em volume) é um sinal CERTO
de que a economia italiana já não é competitiva. Outrora,
a Itália teria desvalorizado um bocado para repor os pêndulos na
hora, hoje isto é impossível...
Neste ponto do raciocínio o leitor deve colocar-se a questão:
"mas o que é que vai acontecer?" A resposta requer um pouco de
reflexão económica e felizmente está ao alcance de uma
inteligência média mas lamentavelmente é
incompreensível para as inteligências superiores que nos governam.
Como o crescimento da França, da Itália, etc ... baixa
estruturalmente pelas razões mencionadas acima, as receitas fiscais
são mais fracas e as despesas mais fortes do que o previsto. Deste facto
decorre que os défices orçamentais aumentam ao mesmo tempo que os
défices externos. Muito logicamente, a dívida explode. Chega
sempre um momento, e nós estamos nele (para mais pormenores ver
L'Etat est mort vive l'état
, Bourin éditeur, do autor) em que os mercados obrigacionistas
começam a integrar a probabilidade de um não reembolso da
dívida estatal.
Então, nesse momento, as taxas de juro se põem a subir acima da
taxa de crescimento da economia e o país entra no que Keynes chamava uma
"armadilha da dívida" que se caracteriza por uma realidade
muito simples: se voce toma emprestado a um custo de 5% e investe com uma
rentabilidade de 2% e isso dura bastante tempo, a questão não
é de saber se vai entrar em falência mas sim QUANDO
vai passar no alçapão. É aí que estão
Portugal, a Itália, a Grécia, a Espanha e em breve a
França.
Portanto a crise actual não é absolutamente uma "crise da
dívida" mas uma crise decorrente da sub competitividade de uma
parte importante da Europa em relação ao resto do mundo em geral
e do resto da Europa em particular.
A crise actual é portanto uma consequência INELUTÁVEL do
Euro.
Não podia ser de outra forma.
As soluções propostas são sempre executada por
contabilistas que não compreendendo nada desta dinâmica visam
reduzir o défice orçamental aumentando os impostos (sobre os mais
ricos, não é preciso dizer). Como uma alta do imposto implica uma
baixa da poupança e como no longo prazo a poupança é igual
ao investimento, o investimento que é a única maneira de
tornar a economia novamente competitiva baixa igualmente e o país
torna-se ainda menos competitivo.
O fim lógico do processo é simples: de facto, o Euro substitui a
possibilidade de uma desvalorização da Lira pela CERTEZA de uma
falência do Estado italiano.
Não estou seguro de que isto seja um grande progresso. Para dizer
verdade, estou seguro do contrário.
A alternativa, naturalmente, é o credor tomar o controle do devedor, ou
seja, a Alemanha enviar seus funcionários para dar ordens a Bercy
[2]
por exemplo. É a isto que se convencionou chamar pudicamente "a
solução federal". Proveniente de uma velha família
alsaciana que deixou a Alsácia em 1870 para permanecer francesa, isso
tão pouco me entusiasma.
Continuar a evitar tudo o que de perto ou de longe se refere ao Estado, ou
à necessidade do Estado, ou faz uma grande parte do seu volume de
negócios com este monstro obeso, foi e permanece minha estratégia.
Não há razão para alterá-la.
28/Julho/2011
[1] Thomas Diafoirus: personagem da peça "O doente
imaginário", de Molière. É um médico retratado
como pedante que gosta de usar uma terminologia científica rebuscada mas
não se preocupa muito com a saúde real dos seus pacientes.
[2] Bercy: local do Ministério das Finanças francês.
[*]
Economista e financeiro francês, anti-estatista, defensor do
liberalismo. V.
Wikipedia
Ver também:
Sair do euro e depois?
, de Rudo de Ruijter
O original encontra-se em
http://lafaillitedeletat.com/2011/07/28/les-medecins-de-moliere/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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