Ucrânia: derrota e perspectiva
por Jacques Sapir
A situação militar continua a evoluir a favor dos insurrectos,
tal como o descrevem agora múltiplas fontes, tanto ocidentais como dos
insurrectos
. A situação militar pode ser interpretada como se segue:
(a) Ao sul de DONETSK, as forças de Kiev estão evidentemente em
plena derrota. Um cerco considerável está em vias de acontecer.
As unidades cercadas provavelmente não terão outra escolha
senão a destruição ou irem para a Rússia depois de
terem sido desarmadas. Um correspondente estima entre 4000 e 5000 homens as
forças cercadas, com um material considerável. Para o lado do Mar
de Azov, o pânico que atinge as tropas de Kiev levou os insurrectos a
avançarem muito rapidamente e a tomar o controle de Novoazovsk. Contudo,
a falta de efectivos entre os insurrectos limita os ganhos territoriais e
é duvidoso, no momento actual, que tenham forças para tomar
Mariupol, salvo se esta cidade fosse abandonada pelas forças de Kiev.
Entretanto, parecem estar a ser efectuadas operações ao norte de
Volnobakha, na estrada que vai de Donetsk para Mariupol.
Mapa 1
(b) Na parte norte da frente, os insurrectos cercaram várias unidades
que atacavam Lugansk pelo sul e parece terem liquidado pelo menos um dos
"bolsões". Isto teria como efeito reabrir a grande estrada que
vai de Lugansk à fronteira russa, passando por Krasniy Luch e Antracit.
Constituíram-se vários bolsões, com um total de 3000 a
5000 homens. No global, provavelmente são 10 mil soldados de Kiev
(exército regular e Guarda Nacional) que estão cercados e
deverão render-se daqui a alguns dias. Os insurrectos conduzem
actualmente operações ofensiva em direcção a
Lisichansk, a leste mas na altura de Slavyansk.
Mapa 2
No total, entre as forças cercadas e as unidades que foram
destruídas nos combates destes últimos dias, as forças de
Kiev teriam perdido cerca de 12 a 15 mil homens, ou seja, um terço dos
efectivos envolvidos nas operações dos insurrectos. Quantidades
importantes de material militar foram capturadas. É uma grande
vitória para estes últimos, cujas consequências
políticas são consideráveis.
1. Está claro que a insurreição não será
esmagada militarmente. Deste ponto de vista, a insurreição
venceu. Kiev não dispõe mais de reservas suficientes para retomar
a ofensiva. No máximo as forças de Kiev podem esperar estabilizar
a frente em torno de um "semi-quadrado" cujo flanco oeste iria de
Mariupol a Slavyansk e o flanco norte de Slavyansk à fronteira russa.
Entretanto, para isso, eles deverão ultrapassar a grave crise de comando
e de credibilidade que experimentam hoje.
2. A questão de um cessar-fogo coloca-se e este será sem
dúvida tornado possível pelo esgotamento progressivo das
forças insurrectas. Se estas últimas estão hoje na
ofensiva, serão constrangidas a parar por falta de efectivos e falta de
meios daqui ao princípio do mês de Setembro.
3. Se um cessar-fogo se impõe, ainda que não fosse senão
por razões humanitárias, a questão do devir
político da entidade constituída pelos insurrectos
(Novorússia) coloca-se. Após os combates do Verão, e os
ataques sistemáticos de que as populações civis têm
sido objecto, a hipótese federal doravante está obsoleta. A
constituição de uma ou de várias províncias
autónomas, formalmente reconhecendo o governo de Kiev mas, na
prática, estabelecendo por si mesmas suas próprias leis e seus
próprios acordos comerciais, parece agora a solução mais
razoável. Isso não quer dizer, infelizmente, que será o
que prevalecerá.
4. Pode-se recear que se instale uma situação "nem paz, nem
guerra", com incidentes constantes ao longo da linha de contacto entre as
forças de Kiev e as dos insurrectos. Esta situação faria
correr o risco de uma retomada da ofensiva de Kiev ou da parte dos insurrectos.
Seria preciso, então, recorrer a forças de
interposição, que fossem aceitáveis por uma e pela outra
das partes. Considerando o empenhamento dos países da UE em favor de
Kiev, é pouco provável que esta força de
interposição possa ser europeia. Ela deverá ser
encontrada, sob a autoridade das Nações Unidas, entre
países emergentes (Brasil, China, Índia).
5. Uma tal evolução seria uma grande derrota política e
simbólica das autoridades da União Europeia, obrigadas a aceitar
que potências não europeias viessem manter a paz na Europa. Isto
seria um forte símbolo do apagamento político progressivo da UE
sobre o continente europeu.
27/Agosto/2014
Ver também:
As Repúblicas Populares resistem e fortalecem-se no Leste da Ucrânia
Porque o regime ucraniano pode ser caracterizado como fascista
Putin calls on Ukraine militia to let blocked Kiev troops to cross into Russia
(Putin pede à milícia ucraniana para deixar as tropas cercadas de Kiev
refugiarem-se na Rússia)
O original encontra-se em
russeurope.hypotheses.org/2688
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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