Sobre o 15º Encontro internacional de Partidos Comunistas e
Operários em Lisboa
Depois do Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários
realizado em Lisboa nos dias 8,9,10 de Novembro, organizado pelo Partido
Comunista Português, verificou-se alguma actividade, e representantes de
vários partidos comunistas estão a tentar analisar o que se
passou na perspectiva da sua própria análise
ideológico-política.
O KKE participa nesse debate com o objectivo de salientar os assuntos que o
movimento comunista enfrenta e informar os comunistas a nível
internacional sobre os acontecimentos reais e as posições dos
partidos.
1.
O KKE imediatamente depois da contra-revolução deu uma
atenção especial ao reagrupamento do movimento comunista.
Contribuiu para a concentração de forças e a
realização dos Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e
Operários, combatendo pela superação de grandes
dificuldades, particularmente de posições que rejeitavam a
presença identitária dos partidos comunistas e aspiravam
misturar-se com forças oportunistas, tradicionais ou
"novas"-mutadas, em nome da actividade conjunta da
"esquerda".
O nosso partido deu particular importância e destaque a objectivos comuns
e ao desenvolvimento de actividade conjunta apesar das diferenças
ideológico-políticas e tratou, com a contribuição
de outros partidos comunistas, de estabelecer os Encontros Internacionais que
tiveram lugar em Atenas desde 1998 até 2004 e posteriormente se
realizaram noutros países.
O nosso partido insiste particularmente na unidade do movimento comunista.
Trata-se de um problema difícil e complexo, que só pode
resolver-se através da criação de bases sólidas
apoiadas na cosmovisão marxista-leninista, nos princípios da luta
de classes, na estratégia revolucionária. Sobre esta base pode
fortalecer-se o verdadeiro carácter comunista dos partidos comunistas,
pode conquistar-se a unidade de classe da classe operária e a
aliança com os sectores populares pelo derrube da barbárie
capitalista, pelo socialismo-comunismo.
É óbvio que a unidade revolucionária do movimento
comunista tem condições de maior exigência; não se
pode atingir sem um eixo estratégico, sem a combinação da
teoria e da prática revolucionária que coloca como tarefa
diária a preparação dos próprios partidos
comunistas e da classe operária para a resposta às necessidades
do conflito contra o sistema de exploração capitalista, o capital
e os seus representantes políticos, o oportunismo, que é um
cancro nas fileiras do movimento comunista.
O ponto de vista que liga a unidade do movimento comunista com a
posição simplista de "unidade à volta do que estamos
de acordo", impede o debate, omite a necessidade de elaborar uma
estratégia revolucionária e de adaptar os partidos comunistas
às grandes exigências da luta de classes, pela
abolição da exploração do homem pelo homem.
Deixa-os indefesos perante o labor corrosivo das forças burguesas e
oportunistas que trabalham para assimilar os partidos comunistas ao
parlamentarismo, castrá-los e convertê-los em parte do sistema
político burguês, com colaborações sem
princípios, participação em governos de gestão
burguesa com o rótulo de "esquerda"-"progressista",
comprometidos com a lógica da colaboração de classes,
apoio às uniões imperialistas, como sucede com os partidos
comunistas do chamado Partido da Esquerda Europeia, tal como com outros
partidos que seguem pelo mesmo caminho.
2.
O KKE, apesar das dificuldades contribuiu para a emissão de comunicados
comuns nos Encontros Internacionais e para outros textos dos partidos
comunistas. No entanto, o nosso partido deixou claro que o compromisso em temas
de importância estratégica e na procura de
formulações que mitiguem os desacordos em nome do acordo sobre um
comunicado comum não contribui para a informação correcta
e objectiva dos comunistas, da classe operária, dos povos.
Isso cria a confusão, não permite a compreensão da
situação real e impede o desenvolvimento da reflexão sobre
as causas dos problemas, a necessidade de uma estratégia
revolucionária única que fortaleça a luta distintiva do
movimento comunista pelos interesses da classe operária e dos sectores
populares em todo o mundo.
No 15º Encontro Internacional em Lisboa não foi possível
emitir um comunicado comum devido às diferentes abordagens sobre
questões muito importantes. Dado que se têm expressado
opiniões que "turvam as águas" e distorcem os
acontecimentos, queremos referir alguns temas.
O KKE, inclusive antes do Encontro Internacional, tomou uma
posição concreta face ao primeiro projecto de comunicado comum e
defendeu que não podia ser a base de discussão se não se
fizessem alterações significativas. Colocou uma série de
observações e propostas, tal como outros partidos comunistas.
Infelizmente, as propostas básicas do nosso partido não foram
tidas em conta.
As observações do KKE incluíam, entre outros assuntos, os
seguintes temas:
Em relação ao conceito de imperialismo:
O KKE trata este tema tal como foi estabelecido por Lenine, como a
última e superior fase do capitalismo. Lamentavelmente, no projecto de
Comunicado Comum, este tema crucial não é correctamente colocado,
e vários pontos dão azo a uma má
interpretação deste conceito, que se limita e se trata como uma
mera política externa agressiva.
A causa e a natureza da crise capitalista:
Hoje enfrentamos uma profunda crise económica capitalista de
sobreprodução e sobre-acumulação de capital, cuja
causa radica na contradição básica entre capital e
trabalho, rejeitando caracterizações como crise
"financeira", "estrutural" que obscurecem o carácter
da crise capitalista e das suas causas.
O tema das alianças sociais:
O KKE apoia uma linha política de alianças da classe
operária com os outros sectores populares pobres, como são o
campesinato pobre, as camadas pequeno-burguesas pobres urbanas e rurais. Em
nenhum caso pode estar de acordo com alianças com sectores da burguesia
denominados de "camadas antimonopolistas".
A posição sobre os chamados países "emergentes":
Os problemas que hoje em dia estes países onde predominam as
relações de produção capitalistas enfrentam
não são importados do estrangeiro, como assinalava o projecto de
Comunicado Comum, mas são o resultado do próprio modo de
produção capitalista destes países.
O mesmo se pode dizer acerca dos acontecimentos da América Latina. O KKE
segue atentamente os desenvolvimentos e os processos, expressa a sua
solidariedade com a luta dos partidos comunistas e com os povos, mas critica a
política que se aplica em países capitalistas com uma forte base
monopolista que jogam um papel especial no antagonismo interimperialista, e
onde se põe em prática uma estratégia que serve os
interesses e a rentabilidade do capital à custa da classe
operária e dos sectores populares que vivem em condições
de exploração.
As reformas no âmbito do capitalismo:
O KKE luta no nosso país para que se alcancem as conquistas a favor
dos trabalhadores, como por exemplo sobre a questão da luta por um
sistema de educação, de saúde e de bem-estar
exclusivamente públicos e gratuitos, pelo aumento dos salários e
das pensões, etc.. Liga esta luta com alteração radical da
sociedade, com o poder operário e a socialização dos
monopólios. É prejudicial semear ilusões de que em
capitalismo o sistema de exploração pode ser
"corrigido" através de reformas.
A questão das uniões capitalistas interestatais:
A União Europeia é uma união interestatal capitalista,
reaccionária devido ao seu carácter de representante dos
monopólios europeus, e cuja agressividade contra os povos não se
deve somente ao aprofundamento da unificação capitalista
(integração). O mesmo sucede com as restantes uniões
interestatais, que aparecem no terreno do capitalismo na Ásia,
Eurásia, América Latina, etc.. Estão ao serviço de
grandes grupos empresariais e os trabalhadores não devem escolher entre
imperialistas e "centros" imperialistas.
As contradições entre os países capitalistas:
A concorrência entre potências capitalistas "velhas" e
novas, emergentes, tem que ver com as quotas de mercado, o controlo dos
recursos naturais, as rotas de transporte de produtos, oleodutos, etc. Cada
classe burguesa, na base do seu poder (económico, político,
militar) é um "predador", maior ou mais pequeno, que explora a
força de trabalho e, além disso, pretende fortalecer o seu papel
nos assuntos internacionais.
Portanto, consideramos que a classe operária não pode
pôr-se ao lado de nenhuma classe burguesa, ao contrário de
diversas formulações que estavam no projecto de Comunicado Comum.
Particularmente no tema da América Latina, o projecto de Comunicado
Comum chegava ao ponto de considerar que alguns governos burgueses de
potências capitalistas fortes, alguns países imperialistas que
pertencem ao G20 dão impulso
à luta anti-imperialista.
Passa-se facilmente por alto o facto de estes governos administrarem o poder
estatal burguês a fim de fortalecer os monopólios que predominam
nas suas economias.
Sobre a questão: revolução ou reforma?
O KKE considera que neste tema os Partidos Comunistas e Operários
só podem dar uma resposta: Revolução! Infelizmente, o
projecto de Comunicado Comum em vários pontos se referia a
"processos de construção da soberania e
soluções alternativas na base do progresso social", ou de
"conquistas de posições nas instituições"
através das quais terão lugar "alterações no
conteúdo de classe do poder".
A experiência dos Partidos Comunistas em relação a
opções de gestão do capitalismo é dolorosa e o
exemplo do "Eurocomunismo" é bem conhecido por todos. Tais
posições criam confusões e ilusões, embelezam o
poder burguês, desarmam o movimento operário e popular. A
experiência do golpe de Estado no Chile, que este ano passa o seu
40º aniversário, é ilustrativa e não permite apoiar
estas posições.
A frente contra o oportunismo:
É necessário destacar as responsabilidades das forças
oportunistas que causaram grandes danos ao movimento comunista, à luta
da classe operária.
As alianças políticas com outras forças:
A aliança da classe operária com os restantes sectores
populares é um tema crucial. A política de alianças, a
concentração e a preparação de forças
são determinadas pelo objectivo estratégico de derrubar a
barbárie capitalista e não se podem, a partir de cima, integrar
em jogos de gestão com a social-democracia e o oportunismo.
Sobre os "modelos" do socialismo:
Destacou-se que por trás da discussão sobre o
"rechaço dos modelos" manifesta-se claramente uma
rejeição das leis científicas da revolução e
da construção socialista, como é a necessidade do poder
operário (a ditadura do proletariado), a socialização dos
meios de produção, a planificação central.
Historicamente, no Movimento Comunista Internacional, por trás do
"modelos nacionais" e da "diversidade dos caminhos para o
socialismo" escondiam-se a revisão da nossa teoria e a
justificação do afastamento dos princípios comunistas.
Neste ponto de vista o nosso partido não pode estar de acordo com
formulações que criam confusões e reproduzem teorias
oportunistas e social-democratas como o chamado "socialismo do
século XXI".
3.
No "Grupo de Trabalho" (tem a responsabilidade de preparar os
Encontros Internacionais), que se reuniu em Lisboa com a
participação de um número significativo de partidos
comunistas, comprovou-se que o projecto de comunicado comum não
constituía uma base de discussão, o que também se repetiu
na sessão plenária dos partidos comunistas. No âmbito das
actividades comuns para os próximos tempos houve um acordo sobre o
desenvolvimento da actividade em relação aos graves problemas
populares para expressão da posição comum dos partidos
comunistas em relação a uma série de assuntos.
Tanto no "Grupo de Trabalho" como na sessão plenária
dos partidos comunistas, a delegação do KKE colocou, de forma
concreta e comprovada, as posições do partido temas
básicos sobre os quais tinha desacordos.
Na sua intervenção na sessão plenária dos partidos
comunistas, a delegação do KKE sublinhou entre outras coisas que:
"O comunicado comum foi desde princípio carregado com temas de
importância estratégica significativa, sobre os quais as
diferentes aproximações do KKE e de outros partidos foram
conhecidas. O texto estava impregnado da percepção de que entre o
capitalismo e o socialismo existe um sistema socio-económico
intermédio, portanto um poder intermédio, o que não tem
qualquer relação com a realidade.
O texto fala de mudanças antimonopolistas revolucionárias dentro
do capitalismo. Trata-se de uma utopia, uma desorientação e
embelezamento do sistema de exploração.
O que é que significa "financeirização" da
economia? Esta é a posição básica da análise
burguesa e oportunista. Esconde a essência da crise capitalista. Remete
para o chamado "capitalismo de casino" e leva à busca de um
capitalismo "saudável", "produtivo".
Apoiamos a revolução cubana, seguimos os acontecimentos,
expressamos a nossa solidariedade.
Discutimos com o Partido Comunista do Vietname mas temos uma opinião
diferente sobre o chamado "socialismo de mercado capitalista". O
socialismo tem regras científicas e há um preço elevado a
pagar pelo seu incumprimento.
Temos discutido sobre o tema China e dizemos, com dados, que ali têm
predominado as relações capitalistas de produção.
Em 2013, 400 capitalistas chineses aumentaram a sua fortuna em 150 mil
milhões de dólares.
É óbvio que não podemos apoiar os governos burgueses na
América Latina, inclusive os que são participados ou têm o
apoio de partidos comunistas. Por exemplo, o Brasil é um país
imperialista poderoso com monopólios fortes, com enormes lucros por um
lado e por outro com 55 milhões de indigentes.
Na intervenção do KKE, em conclusão, destacou que o
projecto do comunicado comum dá uma direcção errada
à luta, leva à incorporação no sistema, impede o
processo de ajuste da estratégia do movimento comunista às
necessidades da luta de classes, pelo socialismo.
O debate que se levou a cabo no Encontro Internacional foi rico e a
experiência pode ser utilizada para reflectir, tirar conclusões e
o KKE dará para tal o seu contributo. Lamentavelmente, algumas
contribuições, entrevistas, etc. de representantes de partidos
comunistas proporcionam, depois do encontro, interpretações
arbitrárias que dão lugar a perguntas.
Que significa, por exemplo, a posição que diz que os partidos
comunistas que não estavam de acordo com o comunicado não
têm responsabilidade na direcção do Estado ou são
pequenos?
Trata-se de uma posição perigosa de diferenciação
dos partidos comunistas por critérios burgueses. Desde quando é
negativo que um partido comunista não participe no jogo da gestão
burguesa?
Esta é uma tarefa e uma pré-condição para a luta
independente dos partidos comunistas pelo reagrupamento do movimento comunista
e operário, popular.
A relação com a social-democracia, o apoio e a
participação em governos burgueses que administram o poder dos
monopólios e exploram os povos é um desenvolvimento
verdadeiramente negativo.
Qual é objectivo da discussão acerca dos partidos comunistas
"grandes" e "pequenos" com critérios parlamentares?
Por que é que é pequeno um partido que luta consequentemente pelo
derrube do capitalismo, que luta por estabelecer uma base no movimento
operário com grandes sacrifícios e com dirigentes assassinados
pelos mecanismos patronais e do Estado burguês? Por que é que
é "grande" um partido que absolutiza a actividade parlamentar
e fomenta ilusões de que através do parlamento burguês se
podem resolver os problemas populares e se podem satisfazer as necessidades
populares?
A experiência histórica ensina de forma evidente que os partidos
comunistas que absolutizaram o parlamentarismo separaram-se da linha
revolucionária, foram depreciados, romperam as suas
relações com a classe operária, dirigiram-se ao
oportunismo, numa espiral descende corrosiva, como aconteceu com os partidos
comunistas em França , Espanha e Itália.
Há partidos comunistas sem representação parlamentar que
lutam em condições de intenso anticomunismo, dão
prioridade ao trabalho nos locais de trabalho, deparando-se com muitas
dificuldades e cuidam de elaborar uma estratégia e tácticas
revolucionárias. Há partidos comunistas com
representação parlamentar que apoiam a UE e a sua
estratégia, que há muito tempo renunciaram à via
revolucionária, como é o caso dos partidos da
direcção do Partido da Esquerda Europeia (PEE)
Cada partido assume a responsabilidade pela posição que adopta.
O KKE considera que os problemas do movimento comunista não podem ser
tratados com aforismos, mas pela discussão essencial em temas cruciais
de importância estratégica e tendo como objectivo o reagrupamento
revolucionário. Os e as comunistas em todo o mundo têm uma causa e
o dever de participar neste processo.
Do mesmo autor:
Não à diluição dos PCs, pela saída do capitalismo
"A UE é uma união inter-estatal imperialista"
O KKE continuará a luta pelo derrube da barbárie capitalista
Política de alianças no interesse do povo e não para a perpetuação dos monopólios
[*]
Membro da Comissão Política do KKK.
O original encontra-se no diário
Rizospastis
de 15/Dezembro/2013 e a versão em inglês em
inter.kke.gr/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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