A auto-destruição da Europa
1. O anúncio foi feito. O Banco Central Europeu comprometeu-se com
sucessivas operações de expansão monetária que
atingirão "pelo menos" 1.140.000 milhões de Euros entre
Março de 2015 e Setembro de 2016. Uma loucura.
2. Uma loucura, sobretudo, porque o objectivo desta operação
não é lutar contra a deflação e nem impulsionar a
reactivação da economia europeia e sim, mais uma vez, ajudar os
grandes bancos em dificuldades. Dificuldades que decorrem tanto do
sobre-endividamento como do risco acumulado no mercado de derivados financeiros.
3. Que ninguém se engane pelo facto de se falar unicamente em
operações "de aquisição de
dívida". O importante é quem é o titular desses
activos e o titular é, quase na totalidade, o sector
bancário, que vai ser o receptor da liquidez aportada e o
beneficiário desta expansão monetária.
4. Se quisermos fazer uma ideia do que está a acontecer na Europa, basta
contrastar o tão publicitado e mediático Plano Juncker com esta
operação de expansão monetária do BCE. Ou, se se
preferir, o que as instituições europeias estão dispostas
a fazer a favor da economia real e o que ao contrário
estão a transferir da economia real para o sector financeiro.
5. A comparação entre estes dois números seria
cómica se o que está em jogo o futuro da Europa
não fosse tão dramático.
6. O montante do tão publicitado Plano Juncker revela-nos o que a
União Europeia está disposta fazer a favor da economia real: 21
mil milhões de Euro no período 2015-2017. Destes, só 5 mil
milhões são contribuições directa do Banco Europeu
de Investimentos e o resto 16 mil milhões são
garantias.
7. Frente a isto, "pelo menos" 1.140.000 milhões de Euros
vão ser trasfegados da economia real europeia para o sector financeiro
através da expansão monetária do Banco Central de
Investimentos.
8. Depois de tudo o que sucedeu desde o estalar da crise, da ruptura
forçada com os países emergentes ou da artificial
colocação em marcha do Tratado TTIP com os Estados Unidos, se
alguém tivesse alguma dúvida sobre quem detém o poder
político na Europa ficaria esclarecido por estes números.
Números que confirmam uma estratégia repetida desenvolvida desde
2008, que de forma reiterada e obstinada deu prioridade aos interesses da
oligarquia financeira frente à indústria, à economia real
e ao emprego.
9. A quantia de 1.140.000 milhões de Euro corresponde aproximadamente a
uns 11,5% do Produto Interno Bruto da Eurozona. Ou seja, a aproximadamente um
mês e meio de rendimento de todos os europeus que se retirada da economia
real e se entrega ao sector bancário.
10. A decisão reflecte, por um lado, a desesperada
situação do sector financeiro europeu, repetidamente advertida
pelo EKAI Center. Reflecte também o pânico da oligarquia central
perante o risco acumulado na grande banca e após o esgotamento da
capacidade da Reserva Federal dos Estados Unidos e, posteriormente, do
Banco do Japão para continuar a alimentar a bolha especulativa. E
revela, naturalmente, a intolerável submissão dos meios de
comunicação e de uma grande parte da classe política
europeia e sua indiferença frente aos interesses dos cidadãos.
11. Frente a esta situação, é claro o que se deveria fazer
que é, mais ou menos, o contrário do que agora se faz:
Enfrentar o quanto antes a reestruturação interna da grande
banca, ao mesmo tempo que se libertam as cargas excessivas de endividamento dos
governos e das empresas eficientes e viáveis.
Canalizar qualquer expansão monetária rumo à economia
real e não ao sector financeiro.
Assegurar a relação comercial, industrial e de infraestruturas
com os países emergentes.
Renovar a aposta da Eurozona na formação, no investimento e na
inovação tecnológica.
12. A Europa está a destruir a sua economia real, através de uma
série contínua de estratégias e decisões
condicionadas pelos interesses a oligarquia financeira. Tudo parece indicar que
só uma ruptura política democrática nos pode salvar do
desastre. Mas não estamos a falar de um processo de décadas. A
mudança geopolítica acelera-se e tudo leva a pensar que os
próximos anos ou meses serão decisivos.
Acerca da QE ver também:
O BCE, a QE e a fuga à estagnação
, Michael Roberts
A QE do BCE
, Jacques Sapir
Declarações de Mario Draghi
[*]
Empresa de consultoria do País Basco.
O original encontra-se em
https://pt.scribd.com/doc/253603591/EUROPA-SE-AUTODESTRUYE
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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