Como evitar guerras petrolíferas, terrorismo e colapso económico
Neste momento a maior parte das pessoas bem informadas está consciente
de que a produção global de petróleo poderá atingir
em breve o seu pico histórico, e de que as consequências
provavelmente serão severas.
Muitos países importantes na produção de petróleo
(tais como os Estados Unidos, a Indonésia, o Irão) e algumas
regiões inteiras (tal como o Mar do Norte) já ultrapassaram os
seus máximos de produção. A cada ano, aproximadamente,
mais um país atinge um plateau de produção ou principia o
seu declínio terminal.
Enquanto isso, as taxas globais de descobertas petrolíferas têm
estado a cair desde o princípio da década de 1960, como foi
confirmado pela ExxonMobil. Todos os 100 campos gigantes ou supergigantes que
são responsáveis colectivamente por cerca da metade da
produção actual do mundo foram descobertos nas décadas de
1940, 1950, 1960 e 1970. Nenhum outro campo de dimensão
comparável foi descoberto desde então. Ao invés disso, a
exploração durante os últimos anos resultou apenas em
campos muito mais pequenos que se esgotam relativamente rápido. O
resultado é que hoje está a ser descoberto apenas um novo barril
de petróleo por cada quatro que é extraído e utilizado.
Os líderes mundiais têm a sua capacidade de avaliar a
situação restringida pela falta de dados consistentes. Os
números das reservas provadas de petróleo parecem reconfortantes:
o mundo ainda teria aproximadamente um trilião (10
12
) de barris para produzir,
talvez mais. Na verdade, os números das reservas oficiais nunca foram
tão elevados. Contudo, a evidência circunstancial sugere que
alguns dos maiores países produtores inflacionaram os números das
suas reservas por razões políticas. Enquanto isso, as companhias
de petróleo habitualmente (e legitimamente) relatam crescimento das
reservas de campos descobertos décadas atrás. Além disso,
os números das reservas muitas vezes são conspurcados
pela inclusão de recursos de petróleo não convencional,
tais como areias betuminosas os quais precisam ser levados em conta, mas
numa categoria separada, pois as suas taxas de extracção
estão limitadas por factores diferentes daqueles que constrangem a
produção do petróleo bruto convencional. Em
consequência de todas estas práticas, as reservas de
petróleo tendem a dar uma impressão de expansão e
abundância, enquanto os dados de descobertas e de esgotamento indicam o
oposto.
Este aparente conflito nos dados provoca disputas entre peritos acerca de
quando acontecerá o pico petrolífero global. Alguns analistas
dizem que o mundo agora está virtualmente no seu pico de
produção, outros respondem que o evento pode ser adiado por duas
décadas ou mais através do investimento avançado na
exploração, da adopção de novas tecnologias de
extracção, e da substituição do petróleo
convencional por fontes de petróleo não convencionais (areias
betuminosas, condensados de gás natural e petróleos
asfálticos).
Entretanto, há pouco ou nenhum desacordo em que uma série de
picos de produção está agora à vista
primeiro, para o petróleo convencional não-OPEP; a seguir para o
petróleo convencional em termos global; e finalmente para todas as
fontes petrolíferas globais em conjunto, convencionais e não
convencionais.
Além disso, apesar de poder haver discussão quanto ao momento
temporal destes eventos, está a tornar-se amplamente reconhecido que o
pico mundial de todas as fontes em conjunto terá consequências
económicas globais significativas. Os esforços de
suavização exigirão muitos anos de trabalho e
triliões de dólares de investimento. Mesmo que as
previsões optimistas quanto ao momento do pico global de
produção se revelem exactas, o mundo está a enfrentar uma
mudança histórica que é sem precedentes em âmbito e
profundidade de impacto.
Devido à dependência sistemática do petróleo para o
transporte, agricultura e as produção de plásticos e
produtos químicos, todos os sectores de todas as sociedades serão
afectados. Serão necessários esforços para criar fontes
alternativas de energia, para reduzir a procura por petróleo
através de eficiência energética elevada, e para redesenhar
sistemas inteiros (cidades inclusive) para operarem com menos petróleo.
Estes esforços serão bastante desafiadores no contexto de um
ambiente económico estável. Entretanto, se os preços para
o óleo se tornarem extremamente voláteis, os programas de
suavização poderiam ser prejudicados. Enquanto preços
altos mas estáveis encorajariam a conservação e o
investimento em alternativas, preços que repetidamente disparam e a
seguir mergulham poderiam devastar economias inteiras e desencorajar
o investimento a longo prazo. Carências reais de petróleo
de que os choques de preços seriam apenas um sintoma seriam ainda
mais devastadoras. Os piores impactos seriam sofridos por aqueles
países, e aqueles aspectos das economias nacionais, que não
pudessem obter para si próprios petróleo a qualquer preço
razoável. Interrupções da oferta provavelmente ocorreriam
com maior
frequência e por períodos crescentes de tempo à medida que
a produção global de petróleo chegasse ao seu
término.
Os esforços para planear uma transição energética a
longo prazo seriam frustrados, tanto nos países importadores como
exportadores. Enquanto isso, a percepção entre os importadores
de que os países exportadores estariam a aproveitar-se da crise
fomentaria animosidades e uma escalada da predisposição para
conflitos internacionais.
Em suma, o pico global de produção é provável que
conduza ao caos económico e a tensões geopolíticas
extremas, levantando espectros de guerra, revolução, terrorismo e
mesmo fome a menos que os países adoptem algum método de
reduzir cooperativamente sua dependência do petróleo.
Um plano de desactivação global
O
Protocolo do Esgotamento do Petróleo
(Oil Depletion Protocol)
proporciona um caminho para o futuro (o texto está no fim deste
artigo). Ele foi redigido pela
Association for the Study of Peak Oil
(ASPO).
Entretanto, a fonte deste documento tem pouca importância
só o seu conteúdo tem interesse. Apesar de ser simplesmente uma
sugestão esboçada, que exigirá concretização
e negociações pormenorizadas, o Protocolo é basicamente
simples. Como se tornará claro a partir da discussão abaixo,
seria desnecessário para todos os países ratificarem o Protocolo
para este ter um efeito benéfico. Mesmo se apenas um país o
adoptasse, esse país seria beneficiado. Entretanto, se um número
substancial de países o assinarem isto criará uma plataforma para
a estabilidade económica internacional e a cooperação.
O Protocolo será apresentado em várias importantes
conferências internacionais onde estarão presentes líderes
mundiais em 2005. Também serão efectuados esforços para
publicá-lo e comunicá-lo ao público geral. Espera-se que
uns poucos políticos corajosos em cada país venham a entender a
sua importância e o levem aos respectivos corpos governamentais para
consideração e adopção.
COMO FUNCIONARIA?
A ideia do Protocolo é essencialmente directa: países
importadores de petróleo concordariam em reduzir as suas
importações numa porcentagem anual ajustada (a Taxa de
Esgotamento do Petróleo Mundial,
World Oil Depletion Rate
), ao passo que os países exportadores concordariam em reduzir a sua
taxa de exportações de acordo com a sua Taxa de Esgotamento
nacional.
O conceito de Taxa de Esgotamento é talvez o aspecto técnico mais
desafiador do Protocolo, apesar de ser fácil apreende-lo se se pensar um
pouco. Cada país tem claramente uma dotação finita de
petróleo dada pela natureza. Assim, quando o primeiro foi
extraído, há consequentemente um a menos deixado para o futuro.
Aquilo que é deixado para o futuro consiste de dois elementos:
primeiro, quanto permanece em campos petrolíferos conhecidos, denominado
Reservas Remanescentes
(Remaining Reserves);
e segundo, quanto ainda há para ser descoberto no futuro (denominado
Ainda por Descobrir,
Yet-to-Find
). Quanto é o Ainda por Descobrir pode ser razoavelmente estimado
através da extrapolação da tendência de descobertas
do passado. A Taxa de Esgotamento é igual ao total do Ainda por
Descobrir dividido pela quantidade anual actualmente a ser extraída.
VAMOS ANALISAR UNS POUCOS EXEMPLOS:
A Noruega é um país que relata estimativas de reservas
excepcionalmente exactas. O total produzido até à data é
de 18,5 mil milhões de barris (Gb), e 11,3 Gb permanecem em campos
conhecidos, com cerca de 2 deixados por descobrir, o que dá um total
arredondado de 32 Gb. Segue-se que 13,5 Gb restam por produzir. Em 2004,
foram extraído 1,07 Gb, o que dá uma Taxa de Esgotamento de 7,4
porcento (1,07/13,5). Esta é uma taxa comparativamente elevada,
típica de um ambiente
offshore.
No caso dos EUA (considerando apenas os 48 estados do continente e excluindo
águas profundas), os números correspondentes são:
produzido até à data, 173 Gb; Reservas Remanescente, 24 Gb;
Ainda por Descobrir, 2 Gb o que significa que há 27 Gb restantes.
A produção anual em 2004 foi de 1,3 Gb, o que dá uma Taxa
de Esgotamento de 4,6 por cento (1,3/27).
Para o mundo como um todo, 944 Gb foram produzidos; 722 permanecem em campos
conhecidos e uns estimados 134 Gb estão no Ainda por Descobrir, o que
significa restarem 906 Gb. A produção de petróleo
convencional em 2004 foi de 24 Gb, assim a Taxa de Esgotamento é de 2,59
porcento (24/906).
Estas estimativas excluem petróleos não convencionais
xistos petrolíferos, areias betuminosas, petróleo pesado e
extra-pesado, petróleo de águas profundas e líquidos de
unidades de gás. A maior parte do petróleo produzido até
à data tem sido da variedade convencional, a qual no futuro
dominará de longe toda a oferta, de modo que faz sentido nos
concentrarmos sobre esta categoria.
Deve se enfatizado que as actuais estimativas de Reservas que estão no
domínio público são grosseiramente inconfiáveis, e
uma das finalidades do Protocolo é assegurar melhor
informação. A Taxa de Esgotamento estimada para cada
país, e finalmente para o Mundo como um todo, é sujeita a
revisão quando se torna disponível melhor
informação, mas a resultante correcção da Taxa de
Esgotamento não será grande, provocando provavelmente uma
variação de menos de um porcento.
O Protocolo de Esgotamento exigiria aos importadores que reduzissem as suas
importações de acordo com a Taxa Mundial de Esgotamento (que
é de 2,5 porcento) a cada ano a fim de por a procura em
equilíbrio com a oferta mundial. Tal como declarado antes, os
exportadores reduziriam a sua produção de acordo com a sua Taxa
de Esgotamento nacional. Assim, a Noruega reduzria a sua
produção em 7,4 porcento a cada ano (a produção
daquele país já está a declinar a uma taxa ainda mais
elevada).
A imposição sobre os países produtores não
representa um grande fardo, uma vez que de qualquer forma poucos agora aumentam
a sua taxa de produção, e muitos estão a experimentar
produção declinante por razões puramente
geológicas, como é o caso da Noruega e dos EUA. Concordar em
produzir menos petróleo não inibiria a exploração
porque novas descobertas reduziriam a Taxa de Esgotamento nacional, e isso
permitiria uma taxa de exportação mais elevada do que seria o
caso antes das mesmas. O principal impulso do Protocolo seria no sentido de
exigir aos importadores que cortassem importações, mas a
inclusão dos produtores nas disposições estimularia maior
cooperação entre as duas facções. Qualquer
produção nativa num país que fosse um importador
líquido provavelmente não proporcionaria àquele
país uma vantagem injusta, pois a produção dentro da maior
parte dos países importadores já está a declinar a uma
taxa mais alta do que a Taxa de Esgotamento Mundial.
Como os importadores tratariam internamente da restrição de
importação seria da sua própria competência (embora
estratégias tanto para obter ofertas de combustíveis alternativos
e para reduzir a procura por petróleo sem dúvida fossem
necessárias). Alguns podem pretender introduzir uma quota
(allowance)
de energia como uma de ração comerciável (como
será discutido abaixo com mais pormenor.
DISCUSSÃO DO PROTOCOLO
QUESTÕES E POSSÍVEIS OBJECÇÕES
À primeira vista o Protocolo pode parece simplesmente uma boa ideia
sem nenhuma possibilidade real de implementação. Entretanto, um
exame mais atento sugere que a sua implementação beneficiaria
quase todos os intervenientes globais importantes e as objecções
que provavelmente serão levantadas poderão ser facilmente
rebatidas.
O que aconteceria se as previsões de um pico a curto prazo na
produção global de petróleo estivessem erradas?
Não será um custo preparar demasiado cedo para o pico
petrolífero? Em termos práticos, não significará
isto sufocar voluntariamente o crescimento económico?
Porque há demasiado em jogo, é importante que estas
questões vitais sejam dirigidas não apenas pelos participantes no
debate acerca do momento temporal do pico da produção
petrolífera (os chamados "optimistas" e os
"pessimistas"); é necessária alguma
avaliação independente dos custos de preparar demasiado cedo
versus os custos de preparar demasiado tarde.
Felizmente, tal avaliação já foi realizada
"Peaking of World Oil Production: Impacts, Mitigation, & Risk
Management" , um relatório preparado pela Science
Applications International Corporation (SAIC) para o Departamento de Energia
dos EUA, divulgado em Fevereiro de 2005, cujo autor principal é Robert
L. Hirsh (daqui em diante referido como "o Relatório SAIC").
[Excerto do mesmo em português em
http://resistir.info/energia/pico_petrolifero.html
].
O Relatório SAIC conclui que uma suavização substancial
dos impactos económicos, sociais e políticos do Pico
Petrolífero poderia vir só de esforços tanto para aumentar
as ofertas de energia de fontes alternativas como para reduzir a procura por
petróleo. Em relação à afirmação de
que as medidas de eficiência seriam suficientes para impedir impactos
horríveis, Hirsch e os co-autores observam que "Se bem que maior
eficiência no uso final seja essencial, só o aumento da
eficiência não será nem suficiente nem bastante atempado
para resolver o problema. A produção de grandes quantidades de
combustíveis líquidos substitutos será
necessária". Além disso, "A suavização
exigirá o mínimo de uma década de esforço intenso e
caro, porque a escala da suavização de combustíveis
líquidos é por natureza extremamente grande". Hirsh e os
co-autores também destacam que "Os problemas associados com o pico
da produção mundial de petróleo não serão
temporários e a experiência das passadas 'crises de energia'
proporcionarão uma orientação relativamente pequena".
O Relatório SAIC concorda em que os esforços de
suavização empreendidos demasiado cedo em breve também se
tornariam um custo para a sociedade. Contudo, conclui que "Se o pico
estiver iminente, a falha em iniciar a suavização atempada
poderia ser extremamente nociva. A administração prudente do
risco exige o planeamento e a implementação da
suavização bem antes de chegar ao pico. A
suavização antecipada quase certamente será menos cara do
que a suavização retardada.
O que se passa se os pessimistas estiverem certos e o mundo já estiver
no seu pico da produção de petróleo? Nesse caso,
será demasiado tarde para implementar o Protocolo do Esgotamento?
Se o mundo atingir o pico da produção dentro dos próximos
dois anos haverá muito pouco tempo para empreender grandes
esforços de suavização antes do evento e, portanto,
há a probabilidade de serem severos os impactos económicos,
sociais e políticos esboçados no Relatório SAIC.
Contudo, nesse caso a necessidade do Protocolo deveria tornar-se evidente de
forma rápida e ampla. Se bem que todas as nações venham a
sofrer com os preços mais elevados e os desabastecimentos, só um
sistema cooperativo de quotas nacionais e internacionais impedirá as
crises económicas e geopolíticas ainda mais extremas que caso
contrário se seguiriam.
Por que o mercado não pode cuidar do problema? Será que
preços altos não estimularão mais exploração
e o desenvolvimento de alternativas? Não seria danosa a
interferência com os mecanismos do mercado?
Os autores do Relatório SAIC rejeitam a afirmação de que o
mercado poderá resolver quaisquer problemas de escassez decorrentes do
pico da produção petrolífera global, com preços
mais altos do petróleo a estimularem investimentos em fontes de energia
alternativa, carros mais eficientes e assim por diante. Os sinais do
preço advertem apenas da escassez imediata. Contudo, os esforços
de suavização necessários a fim de preparar o mundo para o
pico da produção petrolífera global e assim deter
desabastecimentos e remoinhos de preços devem ser empreendidos muitos
anos antes do evento. Hirsch e os co-autores sustentam que, "Será
exigida a intervenção por parte dos governo, porque as
implicações económicas e sociais do pico
petrolífero do contrário seriam caóticas. As
experiências das décadas de 1970 e 1980 proporcionam importantes
orientações tanto para acções do governo que
são desejáveis como para aquelas que são
indesejáveis, mas o processo não será fácil".
Historicamente, a produção petrolífera tem sido
administrada pelos governos ou por cartéis. Nos dias primitivos do
petróleo, os ciclos de crescimento e queda do mercado livre levaram
à bancarrota muitos dos participantes (incluindo o "pai" da
indústria petrolífera, Edwin Drake). A seguir John D.
Rockefeller trouxe uma certa ordem para a situação através
da criação da Standard Oil Trust (ao fazer isso ele expulsou
muitos competidores e pessoalmente aproveitou-se disso num grau
extraordinário). Este regime chegou a um fim em 1911, quando o governo
americano desmembrou a Standard Oil depois de processá-la por
violação das leis anti-trust.
Este regime acabou em 1911, quando o Governo americano desmembrou a Standard
Oil depois de processá-la por violação das leis
anti-trust. A partir da década de 1930, com os EUA em
posição para controlar os preços globais do
petróleo, a Texas Railroad Commission pôs um tampão nos
níveis de produção a fim de estabilizar o mercado. Depois
de a produção de petróleo americano ter atingido o pico em
1971 e de o país ter perdido a sua capacidade para controlar os
preços globais, o centro de gravidade do petróleo transferiu-se
para o Médio Oriente, e a OPEP começou a impor quotas de
produção aos seus membros a fim de manter os preços dentro
de uma banda desejável.
Assim, apesar de a administração de preços globais do
petróleo ter precedentes, a situação no futuro será
fundamentalmente diferente daquela existente até agora, em que o
problema anterior era demasiado petróleo e preços em colapso que
proporcionavam pouco incentivo à exploração. A
situação que o mundo enfrentará em breve é a de
oferta insuficiente que leva a choques extremos de preços, volatilidade
de preços e escassez aguda. Assim, uma nova espécie de esquema
de administração será necessária.
Como a adopção do Protocolo afectará importadores e
exportadores de modo diferenciado?
Importadores:
Não há dúvida que os países industriais
descobrirão que é difícil sustentar o crescimento
económico enquanto utilizam cada vez menos petróleo a cada ano.
Assim, a adopção voluntária do Protocolo pelos
importadores pareceria desvantajosa "difícil de vender".
Entretanto, deve ser reconhecido que um declínio na disponibilidade de
petróleo é inevitável em qualquer caso; apenas o
período temporal do princípio do declínio é
incerto. Sem um acordo estruturado em vigor para limitar as
importações, os países serão inclinados a protelar
os preparativos para a transição energética até que
o preços subam, momento em que uma tal transição se
tornaria muito mais difícil devido à condições
económicas caóticas que se seguiriam. Com o Protocolo em vigor,
os importadores serão capazes de contar com preços
estáveis e poderão então, mais facilmente, empreender o
difícil mas necessário processo de planear um futuro com menos
petróleo.
Os países pobres podem objectar que ao utilizar menos petróleo
eles terão de privar-se do desenvolvimento económico
convencional. Contudo, o desenvolvimento ulterior que for baseado na
utilização de petróleo simplesmente criará
dependência estrutural num recurso que está em esgotamento. Sem o
Protocolo, estes países serão sangrados financeiramente pelos
preços altos e voláteis. Com o Protocolo em vigor e com
preço estabilizados, estes países serão capazes de arcar
com a importação do petróleo que eles necessitam
absolutamente, ao mesmo tempo que terão todos os incentivos para
desenvolver as suas economias por um caminho que não seja
petróleo-dependente.
Exportadores:
Economias que são baseadas primariamente no rendimento da
extracção e exportação de recursos naturais muitas
vezes tendem a provocar governos que são mais sensíveis aos
interesses de poderosos compradores estrangeiros de recursos do que às
necessidades dos seus próprios cidadãos. Assim, é do
interesse dos países exportadores de recursos desenvolverem
indústrias nativas a fim de diversificar as suas economias.
Países que dependem primariamente do rendimento das
exportações de petróleo precisarão desabituar-se
desta dependência, afinal da contas, em qualquer caso à medida que
os seus campos petrolíferos são esgotados. O Protocolo
proporciona-lhes um meio de efectuar a transição de uma forma que
lhes permita planear a longo prazo.
Sem o Protocolo, os países exportadores mais pequenos provavelmente
estarão à mercê de importadores militarmente poderosos. O
Protocolo proporcionará meios para minimizar interferências
políticas externas nos assuntos destes países. Em
consequência, muita tensão e conflito internacional, incluindo a
ameaça de terrorismo, pode ser minimizada o que será uma
ajuda também para os importadores ricos.
Como as companhias de petróleo serão afectadas?
Sem o Protocolo, as companhias de petróleo podem desfrutar de
rendimentos record por algum tempo. Mas elas serão demonizadas
por se aproveitarem da miséria do resto da sociedade. Ao mesmo tempo,
terão as suas operações entravadas pela
desestabilização de economias nacionais resultantes de rodopios
selvagens nos preços do petróleo. Como observado anteriormente,
a Standard Oil Trust, a Texas Railroad Commission e a OPEP proporcionaram
mecanismos de produção-racionamento que trouxeram ordem
àquilo que de outra forma teriam sido situações
caóticas. As companhias petrolíferas (por vezes de forma
relutante) aceitaram estes mecanismo, reconhecendo que um ambiente
económico estável era mais importante para elas a longo prazo do
que a oportunidade de fazer lucros momentâneos inesperados.
Com o Protocolo, as companhias de petróleo permanecerão
lucrativas, elas terão o incentivo para empreender novas
explorações, e serão capazes de planear para as
décadas pela frente. Elas também ficarão motivadas a se
tornarem companhias de energia mais genéricas (ao invés de
permaneceram apenas companhias de petróleo) e assim investir no
desenvolvimento de fontes de energia alternativas.
Já há evidências de que as companhias de petróleo
estão preocupadas acerca de uma reacção adversa do
público quando os preços da gasolina sobem: a Chevron Texaco
iniciou a campanha cara de relações públicas
"Será que você se juntará a nós?"
("Will You Join Us?"),
apresentando um sítio web (
www.willyoujoinus.com
) e anúncios caros em jornais a informar os leitores de que "a era
do petróleo fácil está ultrapassada" e a pedir ao
público discussão sobre a questão. O Protocolo do
Esgotamento Petrolífero proporcionará mais segurança a
longo prazo para a indústria petrolífera do que qualquer campanha
de PR poderia alguma vez fazer e sem custos.
Será que tanto os importadores como exportadores não serão
tentados a trapacear? Como seria imposto o Protocolo?
O Protocolo exigirá um sistema para monitorar a produção,
a exportações e as importações as quais
não pode ser escondidas num grau muito grande em qualquer caso. A
aplicação exigirá o estabelecimento de um Secretariado
para o julgamento
(adjudication)
de disputas e reclamações, e um sistema de penalidades
económicas a ser negociado pelos países que o subscrevem.
Como podem os países ajustar-se internamente para ter menos
petróleo?
O retrocesso da dependência petrolífera será um imenso
desafio que exigirá cooperação e compromisso da parte de
todo e qualquer indivíduo. Serão necessários
esforços tanto para criar ofertas de combustíveis alternativas
como para reduzir a procura por petróleo.
Esta última tarefa será muito mais fácil se forem
concebidos sistemas para fazer com que o interesse individual seja não
só de reduzir a sua própria dependência do petróleo
como também persuadir outros a reduzirem a sua. Um tal sistema para
criar motivação colectiva e cooperação consiste nas
Quotas Internas Comerciáveis
(Domestic Tradable Quotas, ou DTQs).
As DTQs podem ser usadas para racionar todas as fontes de energia de
hidrocarbonetos (a fim de reduzir as emissões de gases com efeito
estufa) ou combustíveis específicos tais como petróleo. A
bem da simplicidade da discussão, vamos supor a utilização
dos DTQs apenas para o petróleo, como um meio de implementar o Protocolo
do Esgotamento dentro dos países.
Primeiro, seria redigido um Orçamento do Petróleo nacional,
baseado na produção nativa do país e nas
importações de petróleo como imposto pelo Protocolo do
Esgotamento. Um segmento do Orçamento do Petróleo seria
então emitido como um direito
(entitlement)
para todos os adultos e dividido igualmente entre eles; o remanescente seria
leiloado para a indústria, utilizadores comerciais e governo. As
unidades poderiam então ser compradas e vendidas, de modo que
utilizadores incapazes de arcar com a sua ração poderia
aumentá-la, ao passo que outros que mantem o seu consumo de
combustível baixo poderiam vender e comercializar as sua Petro-unidades
no mercado nacional. Todas as transacções seriam executadas
electronicamente, utilizando tecnologias e sistemas já existentes para
sistemas de débito directo e cartões de crédito.
Quando consumidores (cidadãos, negócios ou o governo) fazem
compras de combustível, eles entregariam a sua quota ao retalhista de
energia, acessando a conta da sua quota através (por exemplo) do uso do
seu cartão Petro ou débito directo. O retalhista a seguir
entregaria as unidades ao comprar energia do grossista. Finalmente, o
fornecedor de energia primária entregaria unidades de volta ao Registo
Nacional (National Register) quando a companhia bombeasse ou importasse o
petróleo. Isto fecha o anel
(loop).
Todas as compras de petróleo seriam feitas com Petro-unidades, seja do
petróleo a ser usado como combustível ou como
matéria-prima para plásticos ou produtos químicos. Desde
que o petróleo tenha sido usado como combustível, a
Petro-unidades teriam de ser passadas para trás da linha, principiando
pelo utilizador final. Entretanto, se o petróleo fosse incorporado como
matéria-prima na fabricação de um produto (tais como
plásticos), o fabricante simplesmente acrescentaria o custo das
Petro-unidades ao custo do produto. Assim, no caso de matérias-primas,
o fabricante de bens seria o presumido utilizador final.
Compradores não dispondo de quaisquer Petro-unidades para entregar num
ponto de venda visitantes estrangeiros, pessoas que esqueceram o seu
cartão ou gastaram toda a sua quota logo que a receberam
comprariam uma quota no ponto de compra, a seguir entrega-la-iam imediatamente
em troca de combustível, mas pagariam um custo como penalidade por isto
(isto é, o
spread
da oferta e procura cotado pelo mercado).
Os DTQs colocariam toda a gente no mesmo barco: famílias,
indústria e governos teriam de trabalhar juntos, enfrentando o mesmo
Orçamento do Petróleo, e comerciando no mesmo mercado em
Petro-unidades. Toda a gente teria um pé no sistema. Todos teriam o
senso de que os seus próprios esforços de
conservação não seriam desperdiçados pela
prodigalidade energética de outros, e que o sistema era justo.
Além disso, os DTQs são garantidos para serem efectivos, porque o
único combustível que poderia ser comprado seria o
combustível dentro do Orçamento. O Orçamento ajustaria um
horizonte temporal distante de modo que as pessoas teriam a
motivação e a informação de que necessitam para
efectuar acções no presente a fim de alcançar
reduções drásticas na utilização de
petróleo ao longo de um período de vinte anos.
O que aconteceria se apenas uns poucos países assinassem? Não
seria o Protocolo ineficaz se uns poucos grandes exportadores ou importadores
se recusassem a aderir?
À primeira vista pode parecer que aqueles países que não
adoptassem o Protocolo teriam uma vantagem. Contudo, qualquer benefício
temporário seria obtido a expensas de calamidades económicas
posteriores. Como discutido no Relatório SAIC, os países que
embarcarem na transição energética mais cedo
ficarão muito melhor do que aqueles que a adiarem.
E quanto ao gás natural e ao carvão? Deveria haver protocolos
semelhantes para estes? Podem os países simplesmente queimar mais
carvão para compensar por terem menos petróleo?
O Protocolo do Esgotamento Petrolífero não impede outros acordos
destinados a reduzir a utilização de combustíveis fosseis
a fim de evitar impactos no clima global, mas ele será mais ambicioso na
sua trajectória de redução do que o Protocolo de Quioto ou
o Asia Pacific Partnership on Clean Development and Climate. Se os
países sentirem que o Protocolo do Esgotamento Petrolífero
é positivo, isto proporcionará motivação para
forjar acordos semelhantes que cubram estes outros combustíveis
fósseis.
Como pode começar o processo de adopção do Protocolo do
Esgotamento Petrolífero?
Um programa destinado a conseguir a implementação do Protocolo
deve focar tanto a educação do público em geral como dos
decisores de alto nível.
A adopção do Protocolo exigirá que uns poucos decisores
políticos o promovam e o apresentem diante do seu parlamento nacional ou
congresso. Se apenas um país adoptar o Protocolo, isto ajudará a
abrir a discussão global.
Ao mesmo tempo, é importante que os cidadãos entendam as
questões e o que está em jogo, pois a pressão a partir de
baixo sobre os responsáveis eleitos ajudará a focar a
atenção destes últimos sobre o assunto.
No futuro próximo, estará a caminho um programa para obter apoios
ao Protocolo da parte de organizações e indivíduos
proeminentes. Este artigo é parte de um esforço preliminar para
informar o público tanto da questão do Pico Petrolífero
como do Protocolo do Esgotamento Petrolífero. Ajude por favor a copiar
este artigo e enviá-lo à família, amigos, colegas, media e
responsáveis eleitos. Esta pode ser a nossa última melhor
oportunidade para impedir o recurso a guerras, terrorismo e colapso
económico ao entrarmos na segunda metade da Era do Petróleo.
|
PROTOCOLO DO ESGOTAMENTO DO PETRÓLEO
Considerando que a passagem da história tem registado um ritmo de
mudança crescente, de modo que a procura por energia tem aumentado
rapidamente em paralelo com a população mundial ao longo dos
últimos 200 anos posteriores à Revolução
Industrial;
Considerando que a oferta de energia exigida pela população
mundial tem vindo principalmente do carvão e do petróleo, tendo
sido formados quase sempre no passado geológico, e que tais recursos
estão inevitavelmente sujeitos a esgotamento;
Considerando que o petróleo proporciona 90 por cento do
combustível para os transportes, é essencial ao comércio e
desempenha um papel crítico na agricultura, necessária para
alimentar a expansão populacional;
Considerando que o petróleo está desigualmente distribuído
sobre o Planeta por razões geológicas bem entendidas, com grande
parte dele estando concentrado em cinco países junto ao Golfo
Pérsico;
Considerando que todas as maiores províncias produtivas do Mundo
já foram identificadas graças à tecnologia avançada
e ao conhecimento geológico cada vez melhor, sendo agora evidente que as
descobertas alcançaram um pico na década de 1960, apesar dos
progressos tecnológicos e de uma pesquisa diligente;
Considerando que o pico passado da descoberta inevitavelmente conduz a um
correspondente pico da produção durante a primeira década
do século XXI, assumindo que não haja um declínio radical
da procura;
Considerando que o início do declínio deste recurso
crítico afecta todos os aspectos da vida moderna, o que tem graves
implicações políticas e geopolíticas;
Considerando que é adequado planear uma transição ordenada
para o novo ambiente mundial de oferta de energia reduzida, tomando
disposições para evitar o desperdício de energia,
estimular a entrada de energias substitutas e estender o tempo de vida do
petróleo remanescente;
Considerando que é desejável atender aos desafios que assomam no
horizonte de uma maneira cooperativa e equitativa, assim como os relacionados
com as preocupações da mudança climática, da
estabilidade económica e financeira e das ameaças de conflitos
para acesso a recursos críticos.
É PROPOSTO AGORA QUE
1- Seja convocada uma convenção de nações para
considerar a questão tendo em vista concertar um Acordo com os seguintes
objectivos:
a) evitar a
especulação
(profiteering)
com a escassez, de modo a que os preços do petróleo possam
permanecer num relacionamento razoável com o custo de
produção;
b) permitir aos países
pobres manterem as suas importações;
c) evitar desestabilizar fluxos
financeiros decorrentes de preços excessivos de petróleo;
d) encorajar os consumidores a
evitarem o desperdício;
e) estimular o desenvolvimento
de energias alternativas.
2- Tal Acordo terá disposições com os seguintes contornos:
a) Nenhum país
produzirá petróleo acima da sua actual Taxa de Esgotamento, sendo
a mesma definida como produção anual como uma porcentagem da
quantidade estimada deixada para produzir;
b) Cada país importador
reduzirá as suas importações para atingir a actual Taxa
Mundial de Esgotamento, deduzindo qualquer produção interna.
3- Disposições pormenorizadas cobrirão a
definição das várias categorias de petróleo,
isenções e qualificações, e os procedimentos
científicos para a estimação da Taxa de Esgotamento.
4- Os países signatários cooperarão proporcionando
informação sobre as suas reservas, permitindo auditoria
técnica plena, a fim de que a Taxa de Esgotamento possa ser determinada
com precisão.
5- Os países signatários terão o direito de recorrer
quanto à avaliação da sua Taxa de Esgotamento no caso de
alteração de circunstâncias.
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Outras fontes de informação:
Sobre o esgotamento petrolífero:
www.globalpublicmedia.com
www.energybulletin.net
www.peakoil.net
www.odac-info.org
Sobre Quotas internas comerciáveis (
Domestic Tradable Quotas
, DTQs):
www.dtqs.org
Sobre o Relatório SAIC:
www.cge.uevora.pt/aspo2005/ abscom/Abstract_Lisbon_Hirsch.pdf
www.hilltoplancers.org/stories/hirsch0502.pdf
[*]
Autor de
Powerdown - Options and Actions for a Post-Carbon World
(New Society
Publishers 2004). Jornalista, educador, editor, professor e membro do New
College of California, onde dá cursos sobre "Energia e
sociedade" e "Cultura, ecologia e comunidade sustentável".
O original encontra-se em
http://www.museletter.com/archive/160.html
. Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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