Cinco axiomas da sustentabilidade
Resumo: O meu objectivo neste ensaio é analisar a história dos
termos
sustentável
e
sustentabilidade,
as suas várias definições publicadas, e por
último expor um conjunto de cinco axiomas (baseado numa revisão
da literatura existente sobre o tema) a fim de ajudar a clarificar as
características de uma sociedade durável.
A essência do termo
sustentável
é bastante simples: "aquilo que pode ser mantido ao longo do
tempo". Implicitamente, isto significa que qualquer sociedade, ou qualquer
aspecto de uma sociedade, que seja insustentável, não pode ser
mantido por muito tempo e deixará de funcionar numa qualquer altura.
É provavelmente seguro assumir que nenhuma sociedade poderá ser
mantida para sempre: os astrónomos garantem-nos que daqui a uns
milhares de milhões de anos o Sol terá aquecido ao ponto em que
os oceanos se evaporarão e a vida no nosso planeta terminará.
Desta forma,
sustentabilidade
é um termo relativo. Parece então ser razoável tomar como
marco temporal de referência as durações das
civilizações anteriores, que variaram de várias centenas a
vários milhares de anos. Sendo assim, uma sociedade sustentável
seria aquela que fosse capaz de se manter durante muitos séculos no
futuro.
No entanto, a palavra
sustentável
tem sido amplamente usada nos anos recentes para, de um modo vago e geral,
referir apenas as práticas que têm a reputação de
estarem mais de acordo com um meio ambiente saudável do que outras. Esta
palavra é, com frequência, muito negligentemente usada, de tal
maneira que tem levado alguns ecologistas a aconselhar o abandono do seu uso
[1]
. Ainda assim, creio que o conceito de sustentabilidade é essencial para
compreender e solucionar o dilema ecológico das nossas espécies,
e que a palavra poderá ser reabilitada se estivermos dispostos a
despender um pequeno esforço para chegarmos a uma
definição clara.
História e antecedentes
O conceito essencial de sustentabilidade foi incorporado na visão
mundial e nas tradições de muitos povos indígenas; por
exemplo, foi um preceito de Gayanashagowa, ou a Grande Lei da Paz (a
constituição dos Haudenosaunee ou as Seis Nações da
Confederação dos Iroquois) que levava os chefes a avaliar o
impacte das suas decisões sobre a sétima geração
futura. O primeiro uso europeu conhecido de
sustentabilidade
(em alemão: Nachhaltigkeit) ocorreu em 1712 no livro
Sylvicultura Oeconomica
pelo silvicultor e cientista alemão Hannss Carl von Carlowitz. Mais
tarde, os silvicultores franceses e ingleses adoptaram a prática de
plantar árvores como um caminho para a "silvicultura de rendimento
contínuo".
O termo começou a ser mais difundido depois de 1987, quando o
Relatório Brundtland da Comissão Mundial de Ambiente e
Desenvolvimento definiu
desenvolvimento sustentável
como sendo o desenvolvimento que "satisfaz as necessidades da
geração actual sem comprometer a capacidade das
gerações futuras para satisfazer as suas próprias
necessidades"
[2]
. Esta definição de sustentabilidade teve a capacidade de, na
época, ser muito influente, sendo ainda amplamente usada; não
obstante foi criticada por não identificar de uma forma explícita
a insustentabilidade do uso de recursos não-renováveis, nem o
problema do crescimento da população
[3]
.
Ainda nos anos oitenta, o oncologista sueco Dr. Karl-Henrik Robèrt
reuniu os principais cientistas suecos para estabelecerem um consenso sobre as
exigências de uma sociedade sustentável. Em 1989 ele formulou este
consenso baseado em quatro condições para a sustentabilidade que
por sua vez configurou a base do estabelecimento para uma
organização,
O Passo Natural (The Natural Step)
[4]
. Subsequentemente, as principais 60 corporações suecas e 56
municipalidades, assim como muitas empresas de outros países,
empenharam-se no cumprimento das condições da
O Passo Natural.
As quatro condições são as seguintes:
1. Para que uma sociedade seja sustentável, as funções da
natureza e a diversidade não deverão estar sistematicamente
sujeitas a concentrações crescentes de substâncias
extraídas da crosta terrestre.
2. Para que uma sociedade seja sustentável, as funções da
natureza e a diversidade não deverão estar sistematicamente
sujeitas a concentrações crescentes de substâncias
produzidas pela sociedade.
3. Para que uma sociedade seja sustentável, as funções da
natureza e a diversidade não deverão ser sistematicamente
empobrecidas através de deslocamento físico, da
sobre-exploração, ou de outras formas de
manipulação do ecossistema.
4. Numa sociedade sustentável, as pessoas não deverão
estar sujeitas a condições que sistematicamente debilitam a
capacidade de satisfazerem as suas necessidades.
Sentindo a necessidade de contabilizar ou criar um procedimento com o qual
fosse possível medir a sustentabilidade, em 1992 o ecologista canadiano
William Rees introduziu o conceito da
Pegada Ecológica,
definido como
a área de terra e água que hipoteticamente uma
população humana necessitaria para obter os recursos exigidos
à sua própria sustentação e para absorver os seus
desperdícios, em função da tecnologia em uso
[5]
. O que se infere desta definição é o reconhecimento de
que, para a humanidade alcançar a sustentabilidade, a pegada da
totalidade da população mundial deve ser inferior à
área total terra/água da Terra (aquela pegada é
actualmente calculada pela
Footprint Network
como sendo aproximadamente 23% maior do que o planeta pode regenerar,
concluindo-se que a espécie humana está a operar de um modo
insustentável).
Num trabalho publicado em 1994 (e revisto em 1998), o professor
catedrático de física Albert A. Bartlett formulou as 17 Leis da
Sustentabilidade, procurando clarificar o significado de
sustentabilidade
em termos de população e consumo de recursos
[6]
. As críticas de Bartlett ao uso descuidado deste termo, e a sua
rigorosa demonstração das implicações de
crescimento continuado, foram importantes influências no presente
esforço do autor para definir o que é genuinamente
sustentável.
Uma pesquisa histórica verdadeiramente exaustiva do uso dos termos
sustentável
e
sustentabilidade
não é viável. Uma procura na
amazon.com
da palavra
sustentabilidade
(17/Janeiro/2007) resultou em quase 25 mil possibilidades de pesquisa
provavelmente, correspondendo a vários milhares de títulos
distintos que contêm a palavra.
Sustentável
obteve 62 mil resultados, incluindo livros em liderança
sustentável, comunidades, energia, desenho, construção,
negócios, desenvolvimento, planeamento urbano, turismo, etc. Uma procura
de artigos de revista no
Google Scholar
resultou em mais de 538 mil resultados, indicando milhares de artigos
escolares ou referências que continham a palavra
sustentabilidade
nos seus títulos. Porém, o meu assumido conhecimento pouco
exaustivo em literatura sobre o tema, (sustentado, entre outras fontes, por
dois livros que fazem uma avaliação da história do
conceito de sustentabilidade)
[7]
sugere que muito, se não a maioria deste imenso corpo de
publicações repete ou baseia-se nas várias
definições e condições descritas atrás.
Cinco Axiomas
Como contribuição para este contínuo refinamento do
conceito, formulei cinco axiomas (verdades evidentes) de sustentabilidade.
Não apresentei nenhuma nova noção fundamental em nenhum
dos axiomas; o meu objectivo é apenas extrair as ideias que foram
propostas e analisadas por outros, e apresentá-las numa forma que seja
mais precisa e simples de entender.
Formulando estes axiomas procurei ter em conta definições
prévias de
sustentabilidade,
e também as mais convincentes críticas dessas
definições. Os meus critérios foram os seguintes:
-
Para ser qualificado como um axioma, o seu texto deve ser capaz de ser
avaliado usando metodologia científica;
-
Colectivamente, um conjunto de axiomas, que pretenda definir
sustentabilidade, deve ser mínimo (sem redundâncias);
-
Ao mesmo tempo, os axiomas devem ser suficientes, não deixando
nenhuma saída evidente;
-
Os axiomas devem ser formulados em condições que qualquer
pessoa comum possa entender.
Temos então aqui os axiomas, seguidos de uma breve
Discussão:
1. (Axioma de Tainter): Qualquer sociedade que use continuamente recursos
críticos de modo insustentável, entrará em colapso.
Excepção:
Uma sociedade pode evitar o colapso encontrando recursos de
substituição.
Limite à excepção:
Num mundo finito, o número de possíveis
substituições é também finito.
Discussão:
Mencionei este axioma de Joseph Tainter, autor do estudo clássico,
The Collapse of Complex Societies
que demonstra que o colapso é frequente, se não o destino
universal das sociedades complexas, e argumenta que o colapso está
directamente relacionado com a diminuição do retorno do
esforço despendido para suportar o crescente nível de
complexidade das sociedades com a energia colhida do meio ambiente. O livro de
Jared Diamond,
Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed
apresenta o argumento que o colapso é o destino comum das sociedades
que ignoram os constrangimentos dos recursos
[9]
.
Este axioma define sustentabilidade pelas consequências de sua
ausência, isto é, o colapso. Tainter define
colapso
como uma redução na complexidade social isto é,
uma contracção da sociedade em termos da sua dimensão
populacional, da sofisticação tecnológica, da taxa de
consumo das pessoas, e da diversidade das actividades sociais especializadas.
Com frequência ao longo da História, o colapso significou um
declínio precipitado na população provocada por caos
social, guerra, doença, ou escassez. Porém, o colapso
também pode ocorrer de um modo mais gradual durante um período de
várias décadas ou mesmo vários séculos.
Também existe a possibilidade teórica de uma sociedade poder
escolher entrar em colapso (isto é, reduzir a sua complexidade) tanto de
forma controlada como gradual.
Enquanto puder ser argumentado que uma sociedade pode escolher mudar ao
invés de entrar em colapso, as únicas escolhas que poderiam
afectar substantivamente o resultado dessa decisão seria deixar de usar,
insustentavelmente, recursos críticos ou encontrar recursos
alternativos.
Uma sociedade que use recursos sustentavelmente pode entrar em colapso por
outras razões, algumas das quais poderão estar fora do controlo
da sociedade (como sejam o resultado de um desastre natural violento, ou ser
conquistada por outra sociedade mais agressiva e mais preparada militarmente,
para nomear apenas duas de muitas possibilidades), assim não se pode
dizer que uma sociedade sustentável está imune ao colapso, a
menos que sejam previstas muitas mais condições para a
sustentabilidade. Este primeiro axioma focaliza-se no consumo dos recursos
porque isso é decisivo, quantificável, e, em princípio, um
factor determinante no controlo da sobrevivência a longo prazo de uma
sociedade.
A questão do que constitui um uso sustentável ou
insustentável dos recursos é tratada nos axiomas 3 e 4.
Os recursos críticos são os considerados essenciais para a
manutenção da vida e das funções sociais
básicas incluindo (mas não necessariamente limitado a) a
água e os recursos necessários para a produção de
comida, e energia utilizável.
A
Excepção
e o
Limite à excepção
coloca o argumento comum dos economistas do livre-mercado, que defende que os
recursos são infinitamente substituíveis, e que portanto as
sociedades modernas baseadas no mercado nunca sofrerão um colapso
originado pelo esgotamento, mesmo que a sua taxa de consumo continue a crescer
[8]
. Nalguns exemplos, os recursos substitutos podem ser prontamente
disponíveis, e serem até quantitativamente superiores, como foi o
caso quando, em meados do século XIX, o querosene do petróleo
substituiu o óleo de baleia como combustível para candeeiros.
Noutros casos, os substitutos são inferiores em qualidade (como é
o caso das areias betuminosas como substituto do petróleo convencional,
dado que as areias betuminosas são energicamente menos concentradas,
requerem uma maior incorporação de energia para o seu
processamento, e produzem mais emissões de CO
2
). Com o passar do tempo, as sociedades tenderão, primeiramente a
esgotar os substitutos de maior quantidade e de mais fácil
captação, depois aqueles que são equivalentes, e
posteriormente as sociedades terão de confiar cada vez mais nos
substitutos de inferior quantidade e qualidade, para repor recursos esgotados
a menos que sejam asseguradas taxas de consumo muito reduzidas e
normalmente inaceitáveis (ver axiomas 2 e 4).
2. (O Axioma de Bartlett): o crescimento populacional e/ou o crescimento das
taxas de consumo dos recursos não é sustentável.
Discussão:
Mencionei este axioma de Albert A. Bartlett por ser a sua Primeira Lei da
Sustentabilidade, que foi reproduzida literalmente (achei que seria
impossível qualquer melhoria)
[10]
.
O mundo viu a população humana crescer durante muitas
décadas, pelo que este crescimento foi obviamente sustentado até
ao presente. Como podemos ter a certeza de que este crescimento não
poderá ser sustentado num futuro indefinido? Podemos usar uma simples
aritmética para demonstrar que, mesmo se considerarmos pequenas taxas de
crescimento, se esse crescimento for continuado, então a dimensão
populacional e as taxas de consumo aumentam de uma forma absurda e claramente
insuportável. Por exemplo: uma simples taxa de crescimento de 1% da
população humana actual (inferior à actual taxa de
crescimento) resultaria numa duplicação da
população em cada 70 anos. Assim, em 2075 a Terra albergaria 13
mil milhões de humanos; em 2145, 26 mil milhões ; e assim por
diante. Antes do ano 3050, haveria um ser humano por metro quadrado da
superfície da Terra (incluindo as montanhas e os desertos).
3. Para ser sustentável, o uso dos recursos
renováveis
deve seguir uma taxa que deverá ser inferior ou igual à taxa de
reposição.
Discussão:
Os recursos renováveis são esgotáveis. As florestas
podem ser sobre-exploradas, o que resulta em paisagens estéreis e
escassez de madeira (como aconteceu em muitas zonas da Europa nos
últimos séculos), e os peixes podem ser sobre-capturados, o que
resulta na extinção, ou quase extinção, de muitas
espécies (como está a acontecer nos dias de hoje a nível
global).
Este axioma foi mencionado (com algumas variantes) por muitos economistas e
ecologistas, e é a base da "silvicultura de rendimento
sustentado" e da gestão dos recursos pesqueiros de
"máximo rendimento sustentável". Continuam os
esforços para refinar este princípio essencial de
sustentabilidade
[11]
.
O termo "taxa de reposição natural" requer alguma
discussão. O primeiro indício de que a taxa de captura é
superior à taxa de reposição natural, é o
declínio da reservas dos recursos de base. Porém, um recurso pode
estar em declínio por diferentes razões das provocadas por
sobre-captura; por exemplo, uma floresta que não seja tratada pode ser
dizimada pela doença. Não obstante, se um recurso estiver em
declínio, para que se consiga atingir o ponto de sustentabilidade,
é requerido que a taxa de captura seja reduzida, independentemente da
causa do declínio do recurso. Por vezes, para que o recurso tenha tempo
suficiente para recuperar, as capturas deverão diminuir drasticamente
numa taxa muito superior à taxa do declínio do recurso. Este foi
o caso relacionado com o comercio da baleia e de espécies de peixes que
foram sobre-capturadas até ao ponto próximo do esgotamento, o que
requereu uma moratória interditando por completo a sua captura para o
restabelecimento da população as espécies
não conseguem recuperar quando a população reprodutora
restante é muito pequena.
O Axioma 3 está relacionado com a terceira condição de
O Passo Natural.
4. Para ser sustentável, o uso de recursos
não-renováveis
tem de evoluir a uma taxa em declínio, e a
taxa de declínio
deve ser maior ou igual à
taxa de esgotamento (depletion rate).
Taxa de esgotamento
é a quantidade extraída durante um dado intervalo de tempo
(normalmente um ano) como uma percentagem da quantidade deixada para
extracção. Fórmula: (quantidade extraída) /
(quantidade ainda por extrair).
Discussão:
Nenhuma continuada taxa de consumo de qualquer recurso
não-renovável é sustentável. Porém, se a
taxa de consumo estiver em declínio a uma taxa superior ou igual
à taxa de esgotamento, então estamos perante uma
situação sustentável, em que a dependência da
sociedade do recurso será reduzida ao mínimo antes do recurso ser
esgotado.
Foi Albert A. Bartlett quem, num artigo de 1986, primeiramente expôs este
princípio numa forma mais abrangente e matematicamente rigorosa,
"Disponibilidade Sustentada: Um programa de gestão dos recursos
não-renováveis"
[12]
. O resumo do artigo diz:
Se a taxa de extracção diminuir numa fracção fixa
por unidade de tempo, a taxa de extracção aproximar-se-á
de zero, mas o total integrado do recurso extraído entre t=0 e
t=infinito permanecerá finito. Se escolhemos uma taxa de declínio
da taxa de extracção do recurso tal que o total integrado de toda
a extracção futura iguale a dimensão actual do recurso
remanescente, então temos um programa que permitirá que
em quantidades declinantes o recurso esteja disponível para sempre.
Com a redução anual da taxa de extracção de um
determinado recurso não-renovável de acordo com a sua taxa de
depleção anual, chega-se ao mesmo resultado, exigindo a sua
explicação apenas uma aritmética simples e termos comuns.
As estimativas da "quantidade deixada para extracção",
mencionada no axioma, são controversas para todos os recursos
não-renováveis. Se, numa atitude muito pouco realista,
considerarmos as estimativas mais optimistas, elas tenderiam a impor à
taxa de esgotamento uma tendência descendente, arruinando os
esforços no sentido de se atingir a sustentabilidade através de
um protocolo do esgotamento do recurso. Podemos, ainda assim, afirmar que no
futuro, as pessoas desenvolverão processos que permitirão uma
extracção mais completa dos recursos
não-renováveis, ou seja, uma extracção de quantias
adicionais do recurso que de outra maneira seriam deixadas no solo, tornando-se
então economicamente viáveis em resultado do aumento dos
preços desses recursos, e em resultado das melhorias das tecnologias de
extracção. Também é provável que as
técnicas de prospecção melhorem, levando a descobertas
adicionais de recursos. Por outro lado, as estimativas realistas apontam para
que as quantidades ultimamente descobertas deverão ser superiores
às quantidades actualmente disponíveis para
extracção, com a actual tecnologia e aos preços actuais.
Porém, não será realista pensar que no futuro as pessoas
poderão extrair economicamente todo um determinado recurso, ou que os
limites do declínio das margens de lucro, relativas ao processo de
extracção, não se aplicarão nunca. Além
disso, se a taxa de descoberta estiver actualmente em declínio, é
provavelmente irrealista pensar que no futuro, essas mesmas taxas,
aumentarão substancialmente. Com base no exposto, podemos afirmar que,
para qualquer recurso não-renovável, será prudente aceitar
as estimativas mais conservadoras da "quantidade deixada para
extracção".
O axioma 4 condensa as 7ª e 8ª Leis da Sustentabilidade de Bartlett.
É também a base do Protocolo do Esgotamento do Petróleo,
sugerido primeiramente em 1996 pelo geólogo petrolífero Colin J.
Campbell, e o assunto de um recente livro do presente autor
[13]
. O objectivo do Protocolo do Esgotamento do Petróleo é reduzir o
consumo mundial de petróleo para evitar as prováveis crises
resultantes do declínio do fornecimento incluindo o colapso
económico e as guerras por recursos. Nos termos do Protocolo do
Esgotamento do Petróleo, os países importadores de
petróleo reduziriam as suas importações de acordo com a
taxa de esgotamento do petróleo mundial (segundo cálculos de
Campbell, será de 2,5% ao ano); os países produtores reduziriam a
suas produções segundo as suas taxas de esgotamento nacionais.
5. A sustentabilidade requer que as substâncias introduzidas no ambiente
pela actividade humana sejam minimizadas e tornadas inofensivas para as
funções da biosfera.
Nos casos em que a poluição ameaça a viabilidade dos
ecossistemas, em virtude da extracção e do consumo dos recursos
não-renováveis, sendo que se tem assistido ultimamente, e desde
algum tempo, a uma ampliação destas taxas, temos então a
necessidade de estabelecer uma redução das taxas de
extracção e de consumo desses recursos a uma taxa superior
à taxa de esgotamento.
Discussão:
Se os axiomas 2 e 4 forem implementados, então, em resultado disso, a
poluição deveria ser minimizada. Não obstante, estas
condições não são suficientes em todos os casos
para que se evitem potenciais impactes devidos a colapsos induzidos.
É possível que uma sociedade gere poluição grave
devido ao uso pouco inteligente dos recursos renováveis (como foi o uso
de agentes nefastos utilizados no processos de curtição de peles
durante séculos ou milénios), e tais impactes devem ser evitados.
Da mesma maneira, e especialmente onde existe grande concentração
populacional, os desperdícios biológicos podem colocar
sérios problemas ambientais; tais desperdícios devem ser
adequadamente transformados em composto orgânico para
reutilização.
As formas mais sérias de poluição no mundo moderno surgem
da extracção, do processamento e do consumo de recursos
não-renováveis. Se (como foi referido no axioma 4) o consumo dos
recursos não-renováveis diminuir, a poluição
também deverá diminuir. Assim, e teoricamente, se uma sociedade
seguir as propostas do Axioma 4, a probabilidade de no futuro surgirem
problemas de poluição, será menor.
No entanto, na situação actual, em que já há algum
tempo se verifica o crescimento da extracção e do consumo de
recursos não-renováveis, resultando em níveis de
poluição que ameaçam as funções
básicas da biosfera, são exigidas medidas extraordinárias.
Esta é, evidentemente, a situação que diz respeito
às concentrações atmosféricas de gases de efeito de
estufa, especialmente em relação à queima do recurso
não-renovável que é o carvão; também
é o caso que tem a ver com a poluição petroquímica
de imitação hormonal que inibe a reprodução de
muitas espécies vertebradas. No entanto, e relativamente ao primeiro
exemplo, reduzir apenas o consumo de carvão de acordo com a taxa de
esgotamento global do carvão não bastaria para evitar uma
catástrofe climática. A taxa de esgotamento do carvão
é baixa, os impactes climáticos das emissões da
combustão do carvão estão a acumular rapidamente, e as
reduções anuais destas emissões têm de acontecer a
taxas altas se se pretender evitar consequências ameaçadoras para
os ecossistemas. De forma semelhante, no caso da poluição
petroquímica, reduzir a dispersão de plásticos e outros
materiais petroquímicos no ambiente, de acordo com a taxa anual de
esgotamento de petróleo e gás natural, não seria
suficiente para evitar os danos ambientais que potencialmente conduz ao colapso
dos ecossistemas e das sociedades humanas.
No caso em que a redução das emissões ou de outros
poluentes pode ser obtida sem uma redução do consumo dos recursos
não-renováveis, por exemplo, usando tecnologia que permita
capturar as substâncias poluentes e isolar essas substancias sem
métodos agressivos para o ambiente, ou que pode ser obtida reduzindo a
produção de certas substâncias químicas industriais,
então para alcançar a sustentabilidade é preciso apenas
que se dê uma redução do consumo dos tais recursos à
taxa de depleção. Porém, a sociedade deverá ser
suficientemente céptica e cautelosa em relação à
defesa das capacidades tecnológicas, não testadas, de sequestrar
com segurança substâncias poluentes durante períodos de
tempo muito longos.
Este axioma fundamenta-se na condição 2 de
O Passo Natural.
Avaliação
Estes axiomas estão evidentemente abertos a um refinamento adicional.
Tentei antecipar-me a possíveis críticas, prevendo-as e tendo-as
em consideração, que provavelmente serão do tipo que acham
que estes axiomas não são suficientes para definir o conceito de
sustentabilidade. De todas elas, a crítica mais óbvia é a
que merece ser mencionada e discutida aqui:
Porque não existe nenhum axioma relacionado com a justiça social
(semelhante à quarta condição do Passo Natural)?
O propósito do conjunto de axiomas expostos aqui, não será
a descrição das condições que nos conduziriam a uma
sociedade boa ou justa, mas simplesmente a uma sociedade capaz de se manter ao
longo do tempo. Não é claro que uma igualdade económica
perfeita, ou um sistema perfeitamente igualitário de tomada de
decisão, seja indispensável para evitar o colapso da sociedade.
É certo que a extrema desigualdade torna as sociedades
vulneráveis a motins sociais e políticos. Por outro lado,
poderíamos argumentar que a adesão de uma sociedade aos cinco
axiomas expostos, resultaria numa sociedade com níveis maiores de
igualdade económica e política, eliminando assim a necessidade de
um axioma separado considerando este último aspecto em questão.
Na literatura antropológica, as taxas modestas de consumo dos recursos e
a baixa dimensão populacional, relativamente à
dotação dos recursos de base, estão correlacionados com o
uso do processo de tomada de decisão e com a equidade económica
embora a correlação seja distorcida por outras
variáveis, tais como as relacionadas com a alimentação (as
sociedades caçadoras e colectoras tendem a ser altamente equitativas e
igualitárias, enquanto as sociedades de massas tendem a ser menos). Se
tais correlações continuarem a manter-se, a reversão para
taxas de consumo de recursos mais baixas deveria conduzir a uma sociedade mais
igualitária, em lugar de menos igualitária
[14]
.
Será que alguma vez os políticos, locais, nacionais e
internacionais, irão dar forma a uma política pública que
esteja de acordo com estes cinco axiomas? É evidente que as
políticas que exijam o fim do crescimento populacional e
inclusivamente, talvez o decrescimento populacional assim como a
redução do consumo dos recursos, não seriam populares, a
menos que as pessoas em geral pudessem ser persuadidas da necessidade de tornar
sustentáveis as suas actividades. No entanto, se os líderes
não começarem a ter em conta estes axiomas, a sociedade como um
todo, ou alguns aspectos dela, começará seguramente a
desmoronar-se. Talvez este seja um estímulo suficiente para superar a
resistência psicológica e política que, a não
verificar-se, frustraria os esforços que nos conduziriam a uma
verdadeira sustentabilidade.
Notas
1. Eric Freyfogle,
Why Conservation Is Failing and How It Can Regain Ground
(Yale University Press, 2006)
2. Comissão mundial do ambiente e desenvolvimento,
Our Common Future
(1987),
www.are.admin.ch/are/en/nachhaltig/international_uno/unterseite02330/
3. Albert A. Bartlett,
Reflections on Sustainability, Population Growth, and the
EvnironmentRevisted.
Renewable Resources Journal, Vol. 15, No. 4, Winter 1997-1998, 6-23.
www.hubbertpeak.com/bartlett/reflections.htm
4.
www.naturalstep.org
5. William E. Rees and Mathis Wackernagel,
Our Ecological Footprint
(New Society, 1995).
www.footprintnetwork.org
6. Bartlett 1998, op. cit.
7. Simon Dresner,
Principles of Sustainability
(Earthscan, 2002); Andres Edwards,
The Sustainability Revolution: Portrait of a Paradigm Shift
(New Society, 2005)
8. Julian Simon,
The State of Humanity: Steadily Improving.
Cato Policy Report, Vol. 17, No. 5, 131.
9. Jared Diamond,
Collapse: How Societies Choose to Fail or Survive
, Bantam Press, Londres, 2006, 352 pgs., ISBN: 0593055527
; Joseph Tainter,
The Collapse of Complex Societies
(Cambridge University Press, 1988)
10. Bartlett 1998, op. cit.
11. E.g., Simone Valente,
Sustainable Development, Renewable Resources and Technological Progress
em Environmental and Resource Economics, Vol. 30, No. 1, January 2005, 115-125.
12. Albert A. Bartlett,
Sustained Availability: A Management Program for Nonrenewable Resources.
American Journal of Physics, Vol. 54, May 1986, 398-402
13. Richard Heinberg,
The Oil Depletion Protocol: A Plan to Avert Oil Wars, Terrorism and Economic
Collapse
(New Society, 2006);
www.oildepletionprotocol.org
14. Ver, por exemplo, Marshall Sahlins,
Stone Age Economics
(Aldine, 1972); Gerhard Lenski,
Power and Privilege
(University of North Carolina Press, 1977); and Ivan Illich,
Energy and Equity
(Calder and Boyars, 1974).
[*]
Autor de
The Oil Depletion Protocol
.
O texto do protocolo em português encontra-se em
http://resistir.info/energia/depletion_protocol_p.html
.
Para definições de expressões utilizadas neste artigo ver
Glossary
O original encontra-se em
http://www.globalpublicmedia.com/articles/851
. Tradução de MJS.
Este ensaio encontra-se em
http://resistir.info/
.
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