2º trim./2010: Agravamento brutal da crise sistémica global
Reforço das cinco tendências negativas fundamentais
Para o LEAP/E2020, o efeito dos milhões de milhões gastos pelos
Estados para "atravessar a crise" já se terá dissipado.
Estas quantias imensas terão permitido atenuar durante alguns meses a
evolução da crise sistémica global. Mas, como antecipado
nos GEAB anteriores, esta estratégia não terá servido
in fine
senão para implicar definitivamente os Estados na crise gerada pelas
instituições financeiras.
Neste GEAB Nº 42 nossa equipe antecipa pois um agravamento brutal da crise
no segundo trimestre de 2010, gerada por um duplo efeito de alcançar por
fim fenómenos que foram provisoriamente "congelados" no
segundo semestre de 2009 e pela impossibilidade de manter as medidas paliativas
do ano passado.
Igualmente, neste mês de Fevereiro de 2010, um ano após o nosso
anúncio de que o fim do ano 2009 iria assinalar o arranque da fase de
deslocação geopolítica mundial, toda a gente pode
constatar que tal processo está efectivamente em curso: Estados à
beira da cessação de pagamentos, subida inexorável do
desemprego, milhões de pessoas a perderem benefícios de
protecção social, baixas de salários, supressões de
serviços públicos, desagregação do sistema de
governação global (fracasso da cimeira de Copenhaga,
confrontação crescente China/EUA, retorno do risco de conflito
Irão/Israel/EUA, guerra monetária global, etc...)
[1]
. Entretanto, não estamos senão muito no princípio desta
fase de que o LEAP/E2020 fornecerá um calendário antecipativo no
próximo número do GEAB.
O agravamento brutal da crise sistémica global vai assim ser
caracterizado por uma aceleração e/ou um reforço de cinco
tendências negativas fundamentais:
-
a explosão da bolha dos défices públicos e a
ascensão consequente das cessações de pagamentos de Estados
-
a colisão fatal do sistema bancário ocidental com a subida dos
incumprimentos de pagamento e o muro das dívidas a chegarem à
maturidade
-
a inelutável subida das taxas de juros
-
a multiplicação das tensões internacionais
-
a insegurança social crescente.
Neste GEAB Nº 42, a nossa equipe desenvolve as três primeiras
tendências desta evolução e apresenta uma
antecipação sobre a evolução da Rússia
frente à crise; assim como, naturalmente, nossas
recomendações mensais.
O CASO GREGO
Neste comunicado público, optámos por analisar o "caso
grego", por um lado porque ele nos parece emblemático daquilo que
nos reserva o ano 2010 e, por outro, porque ele ilustra perfeitamente a
evolução da informação sobre a crise mundial no
sentido de uma "comunicação de guerra" entre blocos e
interesses cada vez mais conflitantes. Em linguagem clara, é um
"must" para chegar decifrar a informação mundial dos
próximos meses e anos, que vai ser um vector crescente de
operações de manipulação.
As cinco características que fazem do "caso grego" a
árvore com a qual se tenta esconder a floresta
Vejamos agora o "caso grego" que desde há algumas semanas
agita os media e os peritos. Mas antes de entrar no pormenor das
evoluções em curso, precisemos desde já cinco pontos
essenciais da nossa antecipação sobre o assunto:
1- Como indicado nas nossas antecipações para o ano 2010,
publicadas no GEAB Nº 41, daqui a algumas semanas o problema grego
terá desaparecido dos radares mediáticos internacionais. É
a árvore utilizar para esconder em simultâneo a floresta bem mais
perigosa das dívidas soberanas (as de Washington e de Londres) e
princípio da nova queda da economia mundial, com os Estados Unidos
à cabeça
[2]
.
2- O problema grego é uma questão interna à zona Euro e
à UE e a situação actual proporciona uma ocasião
única aos dirigentes da zona Euro para finalmente obrigar a
Grécia (país que desde 1982 se qualifica de "alargamento
falhado") a sair do seu feudalismo político e económico. Os
outros países da zona Euro, Alemanha à cabeça, vão
fazer de tudo para obrigar as elites gregas a adaptar o seu país ao
século XXI em troca da sua ajuda. Ao assim fazer, jogando com o facto de
que a Grécia não representa senão 2,5% do PNB da zona Euro
[3]
, eles exploram os mecanismos de estabilização em tempos de crise
de que a zona Euro tem necessidade
[4]
.
3- Os dirigentes e os media anglo-saxónicos utilizam a
situação (tal como no ano passado com o chamado tsunami
bancário vindo da Europa do Leste que iria arrebatar a zona Euro
[5]
) para mascarar a evolução catastrófica das suas economias
e das suas dívidas públicas, bem como para tentar enfraquecer a
atractividade da zona Euro num momento em que os EUA e o Reino Unido têm
uma dificuldade crescente para atrair os capitais de que têm uma
necessidade urgente. Paralelamente, Washington e Londres (que, desde a entrada
em vigor do Tratado de Lisboa, estão totalmente excluídos da
governação do Euro) ficariam maravilhados por ver o FMI, que eles
controlam perfeitamente
[6]
, introduzir-se na governação da zona Euro.
4- Os dirigentes da zona Euro actualmente estão encantados por ver o
Euro baixar para 1,35 em relação ao dólar. Eles sabem
muito bem que isto não é durável uma vez que problema
tendencial é o afundamento do valor do dólar (e da libra
esterlina), mas apreciam este "balão de oxigénio" para
os exportadores.
5- Os especuladores (hedge-funds e outros) e os bancos pesadamente envolvidos
na Grécia
[7]
têm um interesse conjunto em tentar promover um apoio financeiro
rápido da Eurozona à Grécia pois, caso contrário,
se os europeus se recusarem a recorrer ao livro de cheques (à maneira
escandalosa da dupla Paulson-Geithner com a AIG e o conjunto da Wall Street em
2008/2009), a agências de classificação os terão
involuntariamente enganado. Na verdade, um rebaixamento da
classificação da Grécia mergulharia este pequeno mundo nos
espasmos de importantes perdas financeiras se, para os bancos, o valor dos seus
empréstimos à Grécia fossem analogamente desvalorizados ou
se as suas apostas contra o Euro não funcionassem no devido tempo
[8]
.
Goldman Sachs como actor de tragédia grega ... e das próximas
falências soberanas
No "caso grego", assim como em toda aventura com suspense, é
preciso haver um "mau" (ou, para retomar a lógica da
tragédia clássica, um
"deus ex machina"
). Ora, nesta
fase da crise sistémica global, o papel do "mau" é
geralmente desempenhado pelos grandes bancos de investimento da Wall Street e,
mais particularmente, pelo líder, o Goldman Sachs. E o "caso
grego" não escapa à norma uma vez que o banco de
negócios nova-iorquino esteve directamente implicado na
prestidigitação orçamental que permitiu à
Grécia qualificar-se para entrar no Euro quando os seus défices
orçamentais reais teriam devido desqualificá-la. Na realidade foi
o Goldman Sachs que, em 2002, pôs de pé uma destas montagens
financeiras astuciosas de que ele tem o segredo
[9]
e que, de maneira quase sistemática desde então, retornam alguns
anos mais tarde contra o próprio cliente. Mas o que importa se no
momento o GS (Goldman Sachs) pôde aumentar o seu lucro!
No caso grego, o que o banco de investimento propôs foi muito simples:
montar um empréstimo invisível do ponto de vista
orçamental (
acordo Swap
que permitia reduzia ficticiamente a amplitude do défice público
grego)
[10]
. É claro que a responsabilidade dos dirigentes gregos da época
é total e eles deveriam, segundo o LEAP/E2020, serem submetidos a
inquéritos políticos e judiciários tanto gregos como
europeus por terem enganado a UE e os seus próprios cidadãos no
quadro de um processo histórico de grande importância, a
criação da moeda única europeia.
Mas, sejamos muito explícitos: a responsabilidade do banco de
investimento de Nova York (como cúmplice) é igual, sobretudo
quando se sabe que o vice-presidente para a Europa do Goldman Sachs naquela
época era um certo Mario Draghi
[11]
, actual presidente do Banco Central da Itália e actual candidato
[12]
à sucessão de Jean-Claude Trichet à testa do Banco
Central Europeu
[13]
.
Sem pré-julgar o papel do Sr. Draghi no negócio do
empréstimo manipulador de estatísticas à Grécia
[14]
, pode-se perguntar se não seria útil questioná-lo acerca
deste assunto
[15]
. Em democracia, a imprensa
[16]
assim como os parlamentos (no caso, grego e europeu) são supostos
encarregarem-se desta tarefa. Dada a importância tomada pelo GS nos
negócios financeiros mundiais destes últimos anos, nada do que
este banco faça deveria deixar indiferentes os governos e os
legisladores. Foi aliás
Paul Volcker
, o actual patrão dos
conselheiros económicos de Barack Obama, que se tornou um dos censores
mais rigorosos das actividades do Goldman Sachs
[17]
. Ora, como já havíamos escrito no momento da
eleição do actual presidente americano, esta é a
única pessoa no seu círculo que possui a experiência e a
capacidade para tomar as medidas difíceis
[18]
e que, no caso, sabe do que, ou melhor de quem, fala.
Nesta mesma lógica, e com a ilustração do papel nefasto do
Goldman Sachs e dos grandes bancos de investimento em geral em matéria
de transparência das actividades financeiras e orçamentais
públicas, o LEAP/E2020 considera que seria muito útil à
União Europeia e aos seus 500 milhões de cidadãos,
interditar o acesso a todas as funções dirigentes financeiras,
orçamentais e económicas (BCE, comissão, bancos centrais
nacionais) aos antigos responsáveis destes mesmos bancos de investimento
[19]
. A confusão de géneros não pode conduzir senão a
uma maior confusão dos interesses públicos e privados, a qual
só pode ser em detrimento do interesse público europeu.
Para começar, a zona Euro poderia igualmente, a partir de hoje, exigir
ao governo grego que cesse de recorrer aos serviços da Goldman Sachs uma
vez que, segundo o
Financial Times
de 28/01/2010, Atenas continua sempre a recorrer aos seus serviços.
Se o patrão do Goldman Sachs considera-se "Deus", como ele
disse numa entrevista recente
[20]
, seria sábio supor que o seu banco e os seus homólogos podem
comportar-se como diabos e, portanto, tomar as precauções
consequentes. Este conselho, segundo a nossa equipe, é válido
para a Europa assim como para todos os outros continentes. Há
"serviços privados" que vão contra o "interesse
colectivo": pergunte aos cidadãos gregos e aos proprietários
americanos de casas arrestadas pelos bancos!
Em conclusão, a nossa equipe propõe um jogo edificante
àqueles que querem saber onde encontrar a próxima crise de
dívida soberana: investigue qual estado recorreu ao Goldman Sachs nestes
últimos anos e terá uma pista importante
[21]
!
Notas:
(1) As recentes declarações do antigo secretário de Estado
do Tesouro de G. W. Bush, Hank Paulson, segundo as quais a Rússia e a
China teriam conspirado para fazer cair a Wall Street no Outono de 2008,
ilustram o grau de desconfiança que existe doravante entre os grandes
actores globais. Fonte:
DailyMail
, 29/01/2010
(2) Desde há quatro anos a nossa equipe expõe regularmente as
aberrações do sistema de medição do PNB dos EUA.
Portanto não retornaremos aqui a este aspecto muito "grego"
das estatísticas americanas. No que se refere à
evolução da economia americana nos próximos meses, basta
constatar que o índice sectorial da tonelagem dos transportadores
rodoviários estava em queda livre em Janeiro de 2010, como estivera no
fim do primeiro semestre de 2008. Fonte:
USAToday
, 11/02/2010
(3) Ver o gráfico abaixo para reconduzir o "caso grego" a
justas proporções em matéria de PIB da zona Euro.
(4) E de que o GEAB sublinha a necessidade desde há quatro anos, assim
como o amplo apoio público (mais de 90% em média segundo os
GlobalEurometres mensais) de que beneficiaria uma governação
económica da zona Euro.
(5) Recordamos a este respeito que o GEAB nº 33, na Primavera de 2008, foi
um dos raros media a denunciar o carácter mentiroso e manipulador do
grande pavor de um "tsunami bancário" vindo da Europa do Leste
e que era suposto engolfar o sistema bancário da zona Euro. Na
época, o Euro havia mergulhado para níveis bem mais baixos que os
de hoje ... para levantar-se outra vez algumas semanas mais tarde. Convidamos
igualmente aqueles que desejam compreender bem a situação
mediática actual a reler o comunicado público do
GEAB Nº 33
.
(6) E o facto de um francês estar à testa nada muda nesta
situação.
(7) Fontes:
Le Figaro,
, 12/02/2010
(8) Dito isto, nesta matéria, a manipulação
mediática é notável. Nestes últimos dias
viu-se/leu-se/ouviu-se um pouco por toda a parte que somas enormes , eram
lançadas contra o Euro (a apostar na baixa do Euro) ... ou seja oito
milhões de milhões de dólares. De facto "somas
enormes", é uma gota de água no oceano do mercado mundial
dos câmbios que a cada dia monta a várias centenas de
milhões de milhões de dólares. Fonte:
Financial Times
, 08/02/2010
(9) No mesmo espírito altamente construtivo para os países onde
ele actua que levou os Estados Unidos em 2006/2007 a jogar na baixa por sua
própria conta os produtos financeiros baseados no imobiliário que
vendia aos seus clientes.
(10) Fonte:
Spiegel
08/02/2010 ;
Le Temps
, 13/02/2010 ;
Reuters
, 09/02/2010
(11) Durante a preparação da entrada da Itália no Euro,
era o director-geral do Tesouro italiano. Fontes:
Banque d'Italie
;
Wikipedia
;
Goldman Sachs
.
(12) Muito activamente apoiado pelos meios financeiros londrinos e americanos
como já nos havíamos feito eco, há alguns meses, no nosso
boletim ... e naturalmente por Silvio Berlusconi. Fonte:
Sharenet/Reuters
,
10/02/2010
(13) O seu concorrente mais sério é
Axel Weber
, actual
patrão do Bundesbank.
(14) Pois seria espantoso que o patrão para a Europa do banco
encarregado de um emprétimo destinado a mascarar uma parte do
défice público de um país, e ele próprio antigo
patrão do Tesouro de um país vizinho, não esteja ao par da
operação.
(15) E, em vista das suas responsabilidades passadas, não se pode
senão apreciar o seu sentido de humor quando ele fala de um
reforço da gestão económica da zona Euro. Fonte:
Les Echos
, 13/02/2010
(16) Que se contenta no momento em recopiar os artigos anglo-saxónicos
que fazem o caso grego desempenhar o papel de "derrubador dos mercados
mundiais", e que repete ao longo do artigo que o Euro cai ... quando ele
está num nível que esta mesma imprensa há apenas quatro
anos considerava impossível atingir.
(17) Fonte:
Reuters
, 12/02/2010
(18) Ele pertence a estas gerações de americanos que
construíram o "império EUA" do após guerra, que
sabem da sua fragilidade e que conhecem perfeitamente o seu modo de emprego, ao
contrário dos Summers, Geithner e outros Rubin. Nossa equipe raramente
faz cumprimentos a Barack Obama, mas se ele continuar a ouvir pessoas como Paul
Volcker estará inegavelmente na boa direcção.
(19) Nossa equipe sabe, por ter conhecido, que houve uma época,
há uma trintena de anos, em que os banqueiros de investimento sabiam
intervir tendo em mente o interesse a longo prazo dos seus clientes. Esta
época está bem ultrapassada e doravante eles têm em vista
apenas o seu próprio interesse a curto prazo. É preciso portanto
extrair todas as consequências e proibir-lhes o acesso às
funções públicas chave, ao invés de pretender
reformar o seu comportamento. Se houvesse banqueiros de investimento
crianças (como há crianças soldado), poder-se-ia esperar
salvar alguns do seu vício nos lucros a curto prazo; mas para os
banqueiros de investimento adultos, é demasiado tarde.
(20) Fonte:
Times,
08/11/2009
(21) Do lado do sector privado, pergunte à Lehman Brothers, AIG, ...
eles poderão confirmar que é um bom indício.
15/Fevereiro/2010
[*]
Global Europe Anticipation Bulletin
O original encontra-se em
www.leap2020.eu
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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