"Portugal tem de sair da zona euro se quiser ser um país livre"
por Nuno Aguiar
Markus Kerber é professor de Economia Política na Universidade
Técnica de Berlim. Faz parte do grupo de 52 economistas e juristas
alemães pertencentes ao grupo de pressão Europolis que apresentou
uma providência cautelar no Tribunal Constitucional da Alemanha para
travar a participação alemã no empréstimo a
Portugal. O grupo já tentou o mesmo com a Grécia e a Irlanda.
Se esta acção tiver sucesso, não exercerá mais
pressão sobre Portugal?
Não ser resgatado não criará mais pressão sobre
Portugal. Esta acção não é contra Portugal. Se
Lisboa não receber o resgate, será livre para abandonar a zona
euro e conduzir a sua própria política. Se forem resgatados,
receberão dinheiro da União Europeia e do FMI,
o que tornará Portugal um protectorado
.
A única solução para Portugal é sair do euro?
É óbvio que Portugal não conseguirá restabelecer o
seu crescimento económico e a sua competitividade no quadro da zona
euro. As taxas de juro e a paridade do euro são simplesmente demasiado
elevadas para Portugal. As medidas de austeridade com que diferentes governos
corajosamente avançaram vão criar mais recessão e
não vão trazer Portugal para um caminho de crescimento.
Estão a conduzir uma política económica
pró-ciclíca, o que é um absurdo.
Como querem voltar a crescer sem um sector público que gaste ou que,
pelo menos, não corte tão severamente como tem feito? Portugal
precisa de uma desvalorização competitiva e, como não o
consegue fazer na zona euro, deve abandoná-la.
Portugal deve também reestruturar a sua dívida?
Claro que sim. Não existe alternativa quando a dívida deixa de
ser suportável. Portugal tem uma boa razão para entrar em
incumprimento. Ao contrário dos gregos e dos irlandeses, não se
pode censurar os portugueses por terem cometido infracções
estatísticas ou criado um sistema bancário com uma
dimensão inadequada para o tamanho do país. A Grécia
é um caso de falência criminosa e manipulação
estatística. O verdadeiro problema de Portugal é a
competitividade. E uma reestruturação seria viável.
A saída do euro seria permanente?
Portugal teria de sair da zona euro durante alguns anos.
Se Portugal quiser continuar a ser um país livre e manter todos os
instrumentos económicos de soberania, tem de sair da zona euro.
Mas isso é sequer possível com os actuais tratados? E não
provocaria enormes fugas de capitais?
Sou advogado e estou a orientar várias teses de doutoramento que
concluem que existem formas de sair. Uma consensual e outra compulsória.
Proponho algo que devolverá a Portugal a sua liberdade. Não quero
expulsar Lisboa do euro, mas acho que têm de pesar as vossas
opções. Seria como um membro da família a
abandoná-la durante alguns anos para reconquistar a sua
independência.
Isso não aumentaria o risco de contágio a Espanha, que Bruxelas
tanto teme?
Espanha não é um caso tão dramático porque o seu
nível de endividamento é mais baixo. De qualquer forma, mesmo que
não haja um resgate espanhol, os bancos terão de reestruturar
dívida.
Não considera que existe um risco sistémico?
Esse discurso pertence aos que desde o início da crise grega têm
afirmado que nenhum país da zona euro algum vez iria à
falência, entraria em incumprimento ou abandonaria o euro. Quando se faz
este tipo de política declaratória, como fizeram Juncker, Barroso
e Trichet, fica-se preso a ela. A política que tem sido conduzida levou
a um aumento dos spreads dos juros.
Temos de quebrar o tabu de que nenhum país da zona euro a pode abandonar
ou que não poderá entrar em incumprimento.
Mesmo que exista um risco sistémico, a hora da verdade chegará,
mais cedo ou mais tarde. Estamos apenas a comprar tempo. Não podemos
continuar assim. Se os resgates continuam, nem a Alemanha conseguirá
pagar, e então teremos um colapso certo.
Concorda com a receita que o FMI se prepara para aplicar a Portugal?
A receita do FMI é sempre a mesma e não vale a pena
comentá-la. O que é indiscutível é que,
se há medidas de austeridade a tomar, cabe aos portugueses
tomá-las. Ninguém do FMI ou da Comissão Europeia foi
eleito para impor medidas de austeridade aos portugueses.
Mas vocês estão a defender os interesses da Alemanha e não
os de Portugal...
A minha posição não é apenas defender os
contribuintes alemães. Estou a fazê-lo como europeu e não
como alemão. É completamente ridículo dizer que a Alemanha
tem ganho muito com o euro. A economia alemã sempre foi uma economia
exportadora, e não começou a exportar mais devido ao euro.
Dos sete países para onde a Alemanha mais exporta, cinco pertencem
à zona euro. Não acha que as decisões tomadas a
nível europeu têm prejudicado os países do Sul em favor da
Alemanha? Por exemplo, a última subida da taxa de juro pelo Banco
Central Europeu (BCE).
A decisão do BCE teve como objectivo controlar a inflação
e não servir um país. O papel do BCE deve ser apenas
monetário, e não político.
Então como classifica comprar dívida no mercado secundário?
Não excluo avançar com uma acção legal contra o
BCE. O que fizeram é completamente ilegal. O facto de ser motivado por
razões políticas não o torna aceitável.
14/Abril/2011
O original encontra-se em
www.ionline.pt/...
. Os sublinhados a vermelho são da responsabilidade de resistir.info.
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/
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