Comemorações da República
Fantasmas do Centenário
Encerraram-se as comemorações da implantação da
República. Os actos oficiais e oficiosos foram cinzentos ou
sectários. Os historiadores de almanaque, com direito a tempo de pena e
de antena, centraram as considerações no anti-clericalismo, na
agitação laboral, na instabilidade institucional, no golpismo, no
bombismo, no envolvimento na Grande Guerra. À maneira das
procissões de 1918, só faltou invocar a pneumónica como
sinal divino contra
A Velhice do Padre Eterno.
O repertório anti-republicano insere-se na ofensiva contra os valores
democráticos: uma coisa é não ignorar
vacilações, discriminações, abusos, desvios; outra
coisa é concluir ou levar a concluir que se tratou de um ciclo
intrinsecamente falhado, escamoteando que a Primeira República herdou um
Estado de privilégios de sangue, assente na servidão
metropolitana e colonial, levado à pré-bancarrota pelo
parasitismo da realeza e da nobreza, apostado no analfabetismo em massa, no
manejo de uma série de travões civilizacionais. Além de
arcar com o preço desta herança e haver padecido de
contradições e limitações (desde logo, as
decorrentes do perfil burguês da nossa Revolução de
Outubro), a Primeira República deparou com a vindicta das forças
temporariamente derrotadas: as monarco-confessionais e castrenses, as do
atavismo agrário e do proteccionismo mercantil, as da agiotagem de
casaca e da incipiência da indústria, que alimentaram
sedições, convulsões e campanhas negras. Bastará
assinalar que a política republicana não seria acentuadamente
anti-clerical se Portugal não fosse um secular feudo de batinas. O
anti-clericalismo foi uma réplica ao clericalismo. Lembremos
também que o anti-clericalismo não foi um exclusivo da Primeira
República, ao contrário do que arenga a ignorância
categórica: desde a fundação da nacionalidade que
vários reis tiveram conflitos episódicos ou prolongados com a
Igreja (papas, cardeais, bispos, clero regular, ordens templárias e
monásticas), enquanto outros monarcas e governos (Salazar
ostensivamente) associaram a espada à cruz para fortalecer os interesses
das partes, cumulando a Igreja de benesses patrimoniais, subvencionais e
fiscais e facultando-lhe dispositivos de influência. Não obstante
os circunstancialismos e as decepções, o saldo da Primeira
República é transferível para os activos do progresso e da
democracia: introduziu inovação no aparelho de Estado e numa
série de actividades económicas, representou um avanço nos
direitos universais e nas liberdades públicas e individuais, abriu
espaço ao associativismo popular e à auto-regulação
operária, ampliou a rede educativa, criou uma estética da
mudança, alargou o mapa
não monárquico e não teocrático, deixando sementes
para a tenaz luta contra o fascismo e contribuindo à distância
para um modelo superior de libertação: a Revolução
de Abril. Revolução que também tem sido alvo de desgaste
de imagem e desvios do percurso libertário e igualitário. A
Primeira República sofreu o maior golpe em 28 de Maio de 1926. O
recolher obrigatório da cidadania foi prorrogado por 48 anos. A Terceira
República sofreu o maior golpe em 25 de Novembro de 1975. Desde
então, a democracia empobreceu nas quatro vertentes: política,
económica, social, cultural. Propomos um ângulo de visão,
não apenas do período republicano inaugural, mas dos três
períodos, através de Seis Retratos de Seis Fantasmas: os que mais
assombraram as expectativas de 1910/1974.
A Monarquia vigorou de 1128 a 1910. A República mantém-se
há um século, havendo atravessado o Período da
Implantação (1910-1926), o Período da
Fascização (1926-1974), o Período da
Consolidação (1974-2011). Durante este arco temporal, os chamados
destinos da pátria
tiveram ao leme
timoneiros
de várias matrizes e de diversos matizes, com destaque para ditadores
iluminados pela Providência e bonzos da democracia. Seleccionaremos seis
posters
da contra-revolução, tendo por base a moldura de pensamento e os
indicadores de práticas anti-progresso. Neste arco histórico, a
República ficou marcada por duas revoluções, inicialmente
bem sucedidas (1910/1974) e três contra-revoluções,
geralmente melhor sucedidas (1917/1926/1975). O critério do
portfólio baseia-se no nível de frustração das
aspirações populares e subversão dos valores
constitucionais de 1911/1976. Compulsados os tombos, qual não foi a
surpresa: os fantasmas-mores da República têm bastante em comum,
desde logo, um
S:
Sidónio,
Salazar,
Spínola,
Soares,
Sá,
Silva. Curtos reinados e outras regências irromperam (inclusive da
família
S
/Santana, Sócrates) mas os eleitos são dignos de um
Álbum das Glórias Portuguesas
(Bordalo).
Do primeiro ao último observa-se uma linha político-parental.
Além da consonância na consoante, outras afinidades retocam a
retratística. Na dinastia
S
, as liberdades e os direitos das maiorias sofreram acentuadas
coarctações ou supressões. Uns achar-se-ão
identificados com esta concepção de exclusão e de
privilégio. Haverá também numerosos portugueses com
razão de pergunta: que reais entidades realmente serviram ou servem
estes actores da
res publica
? Que redes autóctones e internacionais os amparam? Quem transformou um
Estado de Cidadãos num Estado de Clientes, um Estado de Direito num
Estado de Direita? No Estado não há isenção.
Há opção. No nosso juízo, o Grupo dos Seis fez a
sua opção. Acentuou os traços do Estado
patronal-classista, obedecendo a uma palavra de ordem: o máximo poder
aos poderosos. Com tal linhagem de raiz e realinhamento oligárquico, a
República perdeu suporte
nacional e radicalidade crítica e passou a rever em baixa os objectivos
de um desenvolvimento socialmente equilibrado e constitucionalmente escorado.
Os predadores de grande porte
reconquistaram e expandiram os territórios de caça, desalojaram
os defensores da
polis,
asseguraram a proliferação e a impunidade da plutocracia. A
venda a retalho da soberania nacional, a legislação à
peça e à medida de grupos de assalto sistémico, a primazia
do privado na ponderação do público, a aposta no
défice cívico, a escolarização de elites vorazes, o
autoritarismo de caserna, cátedra, casta e camarilha ultrajam a
ética republicana e ofendem as práticas constitucionais.
Dividiremos, pois, a História da República em períodos
dinásticos. Não assentes em perpetuações
heráldicas mas em ciclos do Estado Electivo, de facto, ao serviço
da economia majestática e da finança imperial.
PERÍODO SIDONISTA
Filho de Sidónio Marrocos Pais, notário e secretário
judicial e de Rita Silva Pais, doméstica, Sidónio Pais foi
oficial do Exército, professor, deputado, diplomata, ministro do
Fomento, das Finanças, dos Negócios Estrangeiros, da Guerra,
além de presidente da República. Na fase coimbrã, aderiu a
uma loja maçónica, demonstrando ser um investidor no que prometia
dar. Em 1918, instigou a perseguição a maçons e o assalto
a lojas do ramo. Em 5 Dezembro de 1917, encabeçara um golpe contra o
governo republicano eleito, proclamando uma
República Nova.
As novidades vieram de rajada: suspendeu a Constituição que,
como deputado constituinte, aprovara; passou a governar por decreto; ignorou a
competência legislativa e fiscalizadora do Parlamento; revogou a
separação da Igreja do Estado; impôs o estado de
sítio; abarrotou as prisões; encheu os tribunais de processos
políticos; forçou uma série de personalidades ao
exílio, entre elas, o presidente deposto, Bernardino Machado; reinfestou
a administração pública de monárquicos.
A visão renovadora era tão estreita que perseguiu
monárquicos que manifestavam alguma reserva, entre eles, Aristides de
Sousa Mendes, que viria a destacar-se como cônsul em Bordéus,
definitivamente ostracizado por Salazar. O auto-fascínio de
Sidónio roçou o patético: extinguiu os ministérios
do organograma governamental. Nem em ministros delegava ou confiava. Com a
passadeira livre, alçou-se a presidente da República e a chefe do
Governo. Só admitiu secretários. Fernando Pessoa, numa
jaculatória sebastianista, elevou o major a
Presidente-Rei
. Reinou um ano. Seguir-se-ia um reinado de 48 anos. Sidónio ensaiou uma
ditadura de longo prazo. Ambição interrompida por duas balas na
estação do Rossio, ao pôr o pé no comboio para o
Porto.
O beatério fez romagens, juncou o túmulo de flores, jurou
desforra, encomendou missas, reivindicou a canonização. Haveria
sinais da esfera celeste: a aparição do Major foi precedida da
aparição do Anjo em 1916 e caucionada por aparições
da Virgem em 1917. O ambiente estava a pedir um
Salvador.
Os púlpitos e os jornais de idêntico verbo santificaram o
lente-artilheiro, desde a primeira hora. António Sardinha, adepto da
Teologia da Opressão, não deixou de ver, na
aparição de Sidónio, a
intercessão da Virgem Maria
. Quanto à Medicina, Egas Moniz, prémio Nobel, tipificou a
sidonite como
desvario messiânico
. Seja como for, o messias do Alto Minho explorou a conjuntura
messiânico-mariana. Não lhe faltando a lamiré dos
céus, também contou com uma Igreja de raiz inquisitorial e
senhorial, um campesinato servil, manhoso e de alfabeto rudimentar, um aparelho
burocrático tocado por séculos de venalidade e amestrado em
vénias e genuflexões, um patronato fabril e financeiro inquieto
com o despertar da consciência do trabalho. Os
cadetes de Sidónio
também irromperam, emprestando garbo e guarnição ao
Salvador
. Uma chuva de louros e de pétalas jorrou do céu lusitano durante
a passagem e após o passamento de Sidónio: ele era
O Grande Português, O Libertador
, ombreava com Nuno Álvares Pereira, Infante D. Henrique e Vasco da
Gama, D. João I, D. Sebastião e D. João IV, ele foi
coroado Napoleão Bonaparte, ele foi consagrado
Santo Apóstolo do Ideal
e
Salvador da Pátria, Predestinado Condutor de Povos, Protector dos
Humildes, Bem-Amado
e
Grande Morto.
Rematando a sidoniolatria, Sidónio também provocava outros
efeitos magnéticos. Causava desmaios. Por aquele tempo, sem telenovelas
luso-tropicais ou revistas cor-de-rosa, as meninas da sociedade e as senhoras
de bom porte cultivavam fantasias de quartel.
É inquestionável que, perante este florilégio virtuoso, a
República se veja na obrigação de integrar o ciclo de
Sidónio nas celebrações do centenário. No
propósito de contribuir para os festejos, não se sugere uma
avenida em cada cidade e vila com o seu nome. Salazar já tratou da
perenização toponímica em 1948, como cuidou de trasladar
os despojos para o Mosteiro dos Jerónimos em 1953 e daqui para a Igreja
de Santa Engrácia em 1966. Parece-nos que a melhor maneira de resgatar o
sidonismo dos assombramentos da República será com um alerta. Os
sidónios não acabaram em 1918. Regressaram em 1926.
Regressarão sempre, porque é intolerável, para os
sidonistas, que os pequenos portugueses de Fernão Lopes e de Soeiro
Pereira Gomes tomem conta das ruas e moldem as leis. Assim tem sido. Assim
tenderá a ser. SP/Sidónio Pais, caudilho da
República Nova
e SP/Silva Pais, torcionário do
Estado Novo,
são dois exemplos do crime político organizado, dois
instrumentos da luta de classes. Ambos majores, ambos S, ambos P. Que nos
desculpem os bons majores, os bons sidónios, os bons silvas e os bons
pais. Quanto a Sidónio, está desculpado e reabilitado,
aguardando-se folga de orçamento para um museu na sua terra. Cavaco
Silva já se inteirou do projecto. O potencial é promissor. Viana
do Castelo e Caminha disputam a paternidade do pastel
Sidónio.
No meio da querela da doçaria regional, um novo factor competitivo
começa a delinear-se: o culto do D. Sebastião de Caminha
rivalizará com o da lampreia. O Alto Minho pode perder o comboio, a
agricultura e a indústria mas deve apegar-se ao pastel de feijão.
Portugal (do Minho aos Açores) organizará excursões
à Romaria da Agonia e ao Museu do Santo Apóstolo do Ideal.
Estamos a regressar, em passo acelerado, à
sopa do Sidónio.
Até o Regimento de Cavalaria de Braga disponibilizou homens e viaturas
para distribuir 600 rações de combate à fome. Imaginem que
Salgueiro Maia, em vez de se dirigir para o Terreiro do Paço e o Largo
do Carmo, lhe dava para a Revolução da Marmita. O dia 25 de Abril
ter-se-ia limitado a um peditório na Rua da Misericórdia.
POVO A SOPA
O Governo sente que tem de procurar o verdadeiro apoio no sentir e na
opinião quase unânime do povo português.
Inauguração da Cozinha da Assistência 5 de Dezembro,
Algés, 29/07/1918
PERÍODO SALAZARISTA
Filho de António Oliveira e Maria do Resgate, camponeses,
António de Oliveira Salazar foi seminarista, professor, deputado,
ministro das Finanças, ministro dos Negócios Estrangeiros,
Ministro das Colónias, Ministro da Guerra, presidente do Conselho. Como
chefe do Governo tutelava os restantes órgãos políticos,
policiais, militares, administrativos. Já Sidónio dispensara os
ministros. Salazar tolerou-os para repartir tarefas absorventes e manter
aparências de colegialidade. Paulo Rodrigues ilustrou lapidarmente o
estatuto de ministro:
eu apenas sou a caneta de Salazar.
O presidente da República,
Supremo Magistrado da Nação,
foi reduzido a criatura de aparato. Castraram-no e puseram-lhe uma etiqueta:
Venerando Chefe de Estado.
Salazar depressa verticalizou e usurpou funções e
decisões. Na fase de se mostrar aos
caçadores de talentos,
dramatizou a retórica, elencando imperativos para meter a
República nos eixos. Os círculos empresariais e clericais
consideram-no o homem certo para operar a transição da ditadura
militar para a ditadura civil. O empertigado lente usava botas de
campónio e exibia borlas. A nata do conservadorismo jogava nas virtudes
da submissão das organizações e das pessoas. Tinha, no
entanto, aprendido com o desfecho sidonista. Ao contrário de
Sidónio, militar e professor, Salazar encenava a separação
dos dois poderes, a abertura de um ciclo da normalização, falando
de cátedra para a sociedade, após o pronunciamento das casernas:
se soubesses quanto custa mandar, antes preferirias obedecer toda a vida.
Com esta filosofia de Estado, verdadeiro RDC/Regulamento de Disciplina Civil,
impôs a fábula de predestinado, que Cardoso Pires reduziu a
Dinossauro Excelentíssimo.
A cobertura legalista culminou com o embuste da Constituição de
1933. No rasto do ditador de Caminha, que personificou a
República Nova,
o ditador de Santa Comba personificou o
Estado Novo,
inspirado na Itália de Mussolini e na Alemanha de Hitler. Salazar
decretou três dias de luto em honra do
führer.
Salazar convivia diariamente com a fotografia do
duce
na secretária. Salazar fez diversos exercícios de mão
estendida. Na vigência deste regime policial-confessional, foram
suspensas as principais liberdades e garantias; encarcerados dezenas de
milhares de cidadãos, centenas em campos de concentração,
dezenas assassinados; outros deportados ou exilados; muitos saneados da
administração Pública ou despedidos das empresas por
pressão da polícia política e da política do Estado
Policial. A ditadura apostou na miséria controlada, na ignorância
planificada, na propaganda massiva, no terror selectivo, no medo difuso.
Estabeleceu, também, como prioridade ideológica, a
celebração da Concordata e do Acordo Missionário com a
Santa Sé, retomando o conúbio interrompido pela legalidade laica.
Reservou assento na Assembleia Nacional à barretina cardinalícia.
O patriarca desempenhava um papel na cenografia do poder. Estado e Igreja
tornaram-se parceiros da Domesticação Social/
Política do Espírito.
A ditadura, sustentada no tripé económico-financeiro,
religioso-propagandístico, militar-policial, impôs o
condicionamento mental e industrial, protegeu meia dúzia de grupos/
famílias,
conteve a educação média-superior, deixou afundar o
país na crise social, na emigração clandestina, na guerra
colonial. O regime, que começou por se auto-exaltar como regenerador das
finanças públicas e restaurador da credibilidade externa,
terminou com 45% do orçamento sorvido pelo
problema africano,
fazendo de Portugal um estado-pária,
orgulhosamente só.
Supostamente só também vivia o ditador, mas, de facto, na
órbita de uma governanta enciumada e rude. O falso misógino,
apresentado como
casado com a Pátria,
terá sido também um abocanhador de esposas de viris membros do
Governo, de viúvas em transe patriótico, de meninagem de orfanato
e de bem. Se SP/Sidónio Pais fora vendido como macho-modelo,
galã-botifarra, devoto de Aparições da Virgem, OS/Oliveira
Salazar conseguiu adaptar o
Direito de Pernada,
cuidando de pôr o Secretariado de Propaganda a vender
Deus, Pátria e Família
aos tementes de Deus, devotos da Pátria, defensores da Família.
Regressemos, porém, a outras tramas, ao epílogo da
História. Sidónio tombou às mãos de um pistoleiro.
Salazar estatelou-se, sem o amparo de uma cadeira, no Forte de Santo
António, em 1968. Eis o maior milagre antonino: uma cadeira cometeu um
atentado. Crime onomástico. Um antónio ajustou contas com outro.
O
enviado de Deus
sofreu um hematoma intracraniano subdural, jamais se restabelecendo,
não cedendo o hematoma à vaga de preces,
intervenções cirúrgicas, conferências de sumidades.
Com a Revolução de Abril, a efígie, que havia decorado
milhares de paredes, ao lado do crucifixo, foi removida. Após
intermitentes ensaios de reactivação do culto, a RTP abriu um
processo de beatificação em 2007. A estação de 5 de
Outubro, Televisão do Estado Republicano, colocou o maior pervertor da
República a plebiscito.
Os Grandes Portugueses
foram a jogo. A lógica das telecomunicações fez o resto. O
Excelentíssimo
bateu todos os poetas, santos e heróis. Título à altura
de quem liderou um Império e deu
lições ao mundo.
Tentemos, porém, olhar Sua Excelência com alguma distância.
Quem, de facto, em 838 anos de Monarquia e 100 anos de República,
mereceria o galardão? Cumpre ao Estado, pacificada a celeuma, um gesto
definitivo: acabar com o arrastamento da polémica do Museu de Salazar.
Aproveite-se o frémito ou o rescaldo das comemorações.
Baixemos a tensão política. Cultivemos o sentimento reparador.
Demos lugar à magnanimidade da Ideologia e à objectividade da
Paleontologia. Salazar foi categórico:
Sei muito bem o que quero - e para onde vou.
Respeitemos à letra a divisa e a determinação. Um
homem providencial
nunca se engana. Encarreguemos das honras fúnebres uma empresa de
eventos do Novo Estado. Traslademos o
Grande Português,
o
homo santacombensis,
para o Museu da Lourinhã. O próximo 10 de Junho seria uma data
de consenso, copiada que foi do Calendário Salazariano. Milhões
de potenciais telespectadores sufragariam o préstito. A comunidade
científica rejubilaria com um congresso internacional sobre
fósseis. O cerimonial ocuparia a agenda mediática. Durante meio
ano, a Democracia deixaria de importunar a governação.
Viveríamos em Necrocracia. Até os 800 mil desempregados teriam
uma oportunidade, cumprindo Serviço Cívico: ladeando o cortejo,
batendo palmas a recibo verde, agitando a bandeira que sai à rua nos
desafios de futebol, cantando o Hino dos Egrégios. O
Último Enterro do Excelentíssimo
daria um argumento a Manoel de Oliveira e um Leão de Ouro em Veneza.
Igualmente seria de instituir um Prémio de Pintura e Escultura, tendo
por mote Paula Rego:
Salazar vomitando a Pátria
ou A Pátria vomitando Salazar.
PARTICIPAÇÃO NO PRÉSTITO
Todos não somos demais para continuar Portugal.
Manifestação, Terreiro do Paço, 28/05/1941
PERÍODO SPINOLISTA
Filho de António Sebastião Spínola, chefe de gabinete de
Salazar e de Maria Gabriela Alves, doméstica, genro de um
comandante-geral da GNR, António Spínola seguiu a carreira
castrense. Germanófilo, integrou, como observador, a
Divisão Azul,
corpo de tropas nazis que participou na invasão da URSS/cerco de
Leninegrado, 1941. Como oficial da GNR, intercambiou modelos e
experiências de actuação com a Guardia Civil franquista.
Foi comandante na Guerra Colonial em Angola (1961-1963), governador e
comandante-chefe na Guiné-Bissau (1968-1973). Apercebeu-se de que o
problema africano
não tinha
solução militar.
Procurou substituir Américo Tomás, presidente da
República, movendo os cordelinhos de uma operação sem dor.
Tentou a mudança mínima, sempre no quadro do regime. Montou, para
o efeito, uma máquina de pressão-persuasão, utilizando
canais político-militares e de comunicação social.
Escreveu um livro de advertência,
Portugal e o Futuro,
1974. Mas o núcleo mais impermeável do regime não
acolheu as recomendações da via spinolista da
evolução na continuidade.
Foi destituído de vice-chefe do Estado-Maior-General das Forças
Armadas.
Com a
Revolução dos Capitães,
Spínola reentra, como actor principal, no palco do novo poder, a fim
de o regular e controlar. O presidente do Conselho, Marcelo Caetano, refugiado
no Quartel do Carmo, solicita a sua presença para o ritual de
rendição. É-lhe confiada a presidência da Junta de
Salvação Nacional. É nomeado presidente da
República pela JSN. O general com guarda-roupa de generalíssimo
procura liderar o processo, contendo a mudança nos limites de um golpe
palaciano. Impõe igualmente reservas ao programa do MFA, censurando,
entre outras expressões, os termos
democracia
e
fascismo.
E postula que, em vez de
democracia política,
se escreva
acção do governo.
Faz força para poupar a PIDE/DGS, contraria a independência das
colónias, defendendo a
totalidade intercontinental,
empresta a sua capa a grupos económicos beneficiários e
servidores da ditadura. Logo no dia 29 de Abril, recebe, na Cova da Moura,
José Manuel de Mello, Ricardo Espírito Santo e Miguel Quina, um
triunvirato de capitães da indústria e da finança. Com a
sociedade civil em dinâmica emancipadora, o cabo-de-guerra sente o tapete
a fugir debaixo das botas e conspira. Sob a sua égide, é
desencadeada a intentona da
maioria silenciosa
de 28 de Setembro de 1974. Frustrado o levantamento, abandona o cargo de
presidente da República, dois dias depois. Prossegue o reviralho na
acção armada de 11 de Março de 1975. Falhado o
putsch
de Março, escapuliu-se para Espanha. Estende o mapa da
conspiração, buscando suportes no Brasil, na Suíça,
na Alemanha. É banido das Forças Armadas. Patrocina a
criação do ELP/Exército de Libertação de
Portugal, organização de cariz terrorista, chefiada por Barbieri
Cardoso, subdirector da ex-PIDE/DGS. Tutela, de seguida, o MDLP/Movimento
Democrático de Libertação de Portugal, com o mesmo
programa. Ambas as organizações se treinam e acoitam na Espanha
de Franco. Contam com cumplicidades militares, partidárias,
empresariais, clericais. Mário Soares legendou a
maquinação incendiária e sangrenta da extrema-direita como
indignação genuína.
Segundo revelação de Guenter Wallraff (Imprensa, Março
de 2010), jornalista que o entrevistou, fazendo-se passar por traficante de
armas, AS tencionava
eliminar fisicamente
os adversários. O saldo de terror aponta para mais de uma centena de
atentados a instalações da Esquerda partidária, sindical,
social, cultural, a residências e viaturas, bem como à embaixada
de Cuba. Registaram-se quatro vítimas mortais (sindicalistas e
funcionários diplomáticos).
Após o golpe de 25 de Novembro de 1975, AS é reintegrado nas
Forças Armadas; dignificado como chanceler das Antigas Ordens Militares,
condecorado com a Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada, elevado
à dignidade de Marechal. Mais recentemente, a pretexto do
centenário do nascimento, que coincide com o da República, a
Câmara de Lisboa, presidida pelo
socialista
António Costa engalanou uma avenida com o seu nome. À
cerimónia presidiu Cavaco Silva, que considerou a homenagem um acto de
grande justiça
, ele que, enquanto primeiro-ministro, não considerou um acto de simples
justiça atribuir uma pensão à viúva de Salgueiro
Maia. Política de reabilitação de inimigos e infiltrados
da Revolução e de ostracização de capitães e
companheiros de Abril, na senda de Mário Soares, que também
dá pela alcunha de
socialista,
ele,
compagnon
do general de pingalim, a quem forneceu retórica e cobertura nas
conspirações e nas reparações. Assim se reintegra
mais um
Grande Português
na normalidade democrática. Ele que só falou em abertura
política na fase terminal da ditadura. Ele que só levantou a voz
para que ouvissem a sua voz. Ele que nunca se incomodou com a
maior silenciosa
subjugada pelo fascismo. Ele que só descobriu o
Bom Povo Português
depois da revolução de Abril haver despertado o Mau Povo
Português.
Bom
seria se porventura despertasse para defender as forças acobertadas
atrás do general que olhava o povo de monóculo, que mirava o povo
de binóculo, que observava o povo de telescópio.
SETEMBRO NEGRO
A maioria silenciosa do povo português terá de despertar e de se
defender.
Reconhecimento da Independência da Guiné, Lisboa, 10/09/2011
PERÍODO SOARISTA
Filho de um padre e professor, João Soares, que chegou a ministro da I
República e de Elisa Nobre, que se rendeu aos encantos laicos do
clérigo, Mário Soares chegou a ministro, primeiro-ministro,
presidente da República, eurodeputado. Também foi comunista
fugaz, militante do MUD Juvenil/1945. Depressa se apercebeu de que não
era homem para grandes ideais. Mais ganharia em ser homem com algumas ideias.
Muito ganharia mesmo em ter uma grande ideia: instaurar um novo culto mariano,
rivalizando com a devoção a Maria, festejada desde o séc.
XII e padroeira de Portugal desde 1646. Ambição que só
realizaria tornando-se trunfo de reserva da burguesia nacional e das
potências ocidentais. Foi construindo, consequentemente, um
palmarés de anti-fascista sóbrio e socialista
gold.
O
antigo regime
depressa descodificou o
seu
estofo de opositor. Aplicou-lhe certas medidas de clausura e desterro, mas
evitou penas de eterna segurança ou torturas que lhe desfizessem o
nó da gravata. Descontado um apertão do tempo em que foi avaliado
como hipotético revolucionário, a inteligência fascista e
os seus algozes cedo se aperceberam de que o
licenciado Soares
não protagonizaria uma evasão temerária dos curros,
não organizaria um levantamento de rancho nos quartéis, uma greve
do salário mínimo no Barreiro ou da fome máxima no
Alentejo, sequer um dia de pesado luto estudantil ou uma
manifestação do 1.º de Maio. Os repressores tinham
igualmente em linha de desconto que o
licenciado
fazia parte do elenco alternativo, conservado em banho-maria pelos Aliados do
Atlântico Norte.
Havia mútua contenção. O regime até aliviou a
secura protocolar. A relação tornou-se gradualmente
cavalheiresca. A determinada altura, o
licenciado
passou a
Senhor Doutor.
Soares retribuiu. Da
fixação de residência
em São Tomé (1968-1969), trouxe o conforto do
pide simpático.
Pides de boas-maneiras nunca foram destacados para custodiar as
vítimas dos espancamentos por turnos, do isolamento prolongado, em
Peniche, Caxias, no Heroísmo ou nos Campos de Concentração
do Tarrafal, Machava ou São Nicolau. Um agente de
estimação não tem preço. Soares não poderia
mostrar-se senão grato durante toda a vida. Em 1981, no Tribunal de
Santa Clara, no decurso do julgamento dos assassinos de Humberto Delgado,
cavaqueou efusivamente com Agostinho Tienza e Pereira de Carvalho,
ex-dirigentes da PIDE/DGS, ante uma sala atónita, incluindo o colectivo
de magistrados. Recorde-se que Soares foi advogado da família do
general sem medo.
Recorde-se que Pereira de Carvalho foi o dirigente policial que recebeu MS,
em 1970, na sede de António Maria Cardoso, dando-lhe oito horas para
regressar a Paris, evitando, com esta
abertura marcelista,
detê-lo. Recorde-se que, na sequência da
Revolução do Cravos,
tempo de exaltação dos mártires do fascismo, devotos
marianos plantaram a figura de Sua Excelência no parlatório da
Prisão de Peniche, evocando a passagem do resistente
pela masmorra. Sucede que o filho do padre João não afrontou o
fascismo ao ponto de merecer tão severa hospedagem. É natural
que, consumado o projecto de instalação de uma Pousada de
Portugal no corpo da fortaleza, o
Pai da Democracia
se abalance a reservar uma suite presidencial. Peniche era para casos
particularmente sérios. E a respeito da comedida oposição
muito se poderia rever. Recorde-se, a fechar o florilégio, que MS
manteve contactos com o Governo de Marcelo, tentando uma
abertura
para a
sua
pessoa e os
seus
cortesãos nas costas do conjunto da Oposição
Democrática. Recorde-se que, em 1969, depois de haver subscrito uma
plataforma de unidade contra o regime, rompeu o acordo e avançou com
candidaturas independentes às Legislativas desse ano. Recorde-se o
direito à indignação
de Armando Bacelar:
Não lhe tremeu a mão, sr. dr.!
Após a
Revolução de Abril,
Mário Nobre Soares depressa deu sinais de descolagem da frente de
esquerda. Cinco dias passados sobre o
Dia da Liberdade,
protagonizou o incidente do 1.º de Maio, abrindo caminho ao
empurrão para apanhar um banho de classe trabalhadora. A agenda
divisionista prosseguiria, desde os
complots
político-militares à sabotagem da Unidade Sindical, até
à sabotagem e liquidação da Reforma Agrária. Esta
contou com a deserção do Conselho de Ministros por parte dos
socialistas,
aproveitando o PPD para tomar o lugar de esquerda do PS, aprovando a
alteração do regime de propriedade e exploração do
latifúndio. Dentro do
seu
partido, além de se auto-suspender, num gesto de desafronta
majestática, cortou com os
maiores amigos,
desde Manuel Serra a Salgado Zenha, de Rui Mateus a Manuel Alegre, nunca
havendo perdoado a quem obstaculizasse o
seu
caminho. Foi transformando amigos em inimigos e inimigos em amigos. Foi
cultivando cumplicidades de alto estrondo. Lembre-se a caução do
terrorismo de Spínola, o indulto a Ramiro Moreira, operacional do
terrorismo, a condecoração do cónego Melo, mentor do
terrorismo. Lembre-se que, em 1972, no livro
Le Portugal bailloné
/Portugal Amordaçado, acusou a Igreja de concubinato com regime de
Salazar e, em 1975, solicitou ao patriarca de Lisboa, António Ribeiro,
que mobilizasse as paróquias para a manifestação da Fonte
Luminosa. Acordo religiosamente respeitado. Lembre-se também o
seu
apoio ao candidato Soares Carneiro, personagem da direita casernícola,
contra Ramalho Eanes. Assinale-se o perfil de Estado nas referências a
Cavaco Silva,
Você não tem biografia,
a Francisco Balsemão,
um mestre-escola desastrado,
a Nicole Fontaine,
dona de casa.
São também conhecidos outros episódios: verberou um juiz
de Coimbra por não acomodar as leis num caso que lhe dizia respeito; o
jornalista Lopes Araújo/RTP foi exilado para os Açores por mandar
para o ar uma reportagem de protesto popular; deu um raspanete, estilo
enxota-cão, defronte da Comunicação Social, a um agente da
GNR, da
sua
escolta:
Ó sr. Guarda, desapareça!;
recebeu representantes de 270 associações de
emigrantes/França/RFA, descalçando os sapatos e pondo os
pés em cima da Mesa de Diálogo. Foi assim Mário. É
assim Soares. Para manter a corte, no activo partidário, governamental e
presidencial, distribuiu cargos, favores, comendas e viagens; na fase de
Senador da República,
criou a Fundação Mário Soares, ligada por um
cordão umbilical à fazenda pública, por onde já
correram milhões de euros. Ideologicamente, não só
proclamou, para que as centrais do capitalismo ouvissem, que
meteu o socialismo na gaveta,
como, na prática, a marca de água do
seu
exercício de poder se timbrou por cumplicidades, compromissos e
alianças à Direita (1978/CDS/1983/PPD/PSD). O que nunca o impediu
de dar larga a estribilhos esquerdizantes, adulando a rua, a arraia, nas horas
de incerteza e de namoros multitudinários. A nível internacional,
o
homo nafarrensis
mereceu o cognome de
homem dos americanos.
Só se lhe conhecem duas entidades a que jurou respeito e
obediência: a ele próprio e aos USA. De resto, os USA, sempre que
uma ditadura esgota o prazo de validade, por regra, têm preparado um
soares
para a transição de rédea curta. Basta rever o mapa da
geopolítica. Ainda no que toca a alinhamentos internacionais, é
de listar que, entre os
seus
favoritos e as suas amizades, se encontram personagens de referência:
espiões-golpistas, genocidas-saqueadores, patrocinadores de
esquadrões da morte, traidores de revoluções, usurpadores
do Estado, corruptos foragidos à Justiça, como Frank Carlucci,
Filipe González, Jonas Savimbi, Eden Pastora, Nicolau Ceaucescu,
Andrés Pérez, Betino Craxi.
Na esfera económico-social, norteou-se pela recuperação
capitalista, destruindo a Reforma Agrária, iniciando o processo de
devolução de empresas (Mundet/Facar), dando o tiro de partida das
privatizações e desnacionalizações e do
proteccionismo de grupos, fazendo emergir, em contraponto, os salários
em atraso, o
apertar o cinto,
a mãozinha do FMI/
lay off.
Um empresário ultraconservador, Salvador Caetano, vendo-se na
emergência de justificar o apoio a MS/Mário Soares contra
FA/Freitas do Amaral, candidato natural da Direita, fez jurisprudência do
deve-haver:
Devo-lhe uns favores.
Na mesma linha, o seu Governo financiou a catedral do megalómano e
ultraconservador D. Rafael, bispo de Bragança. Foi neste quadro
capitulacionista, classista e negocista que Soares fechou para balanço o
seu
25 de Abril, mandou às favas
as conquistas irreversíveis das classes trabalhadoras
, engavetou o socialismo e anunciou a laicos e republicanos as
aparições marianas da
Europa connosco,
o milagre das rosas com código de barras. Projecto que o poder real
(económico-financeiro) formatou e que o poder formal
(político-mediático) vendeu a eleitores, contribuintes e
consumidores. Fraude, entretanto, às escâncaras: o poder
económico-financeiro entrou no período de pilhagem abrupta de
estados, empresas, salários e pensões e o poder
político-mediático aí está para aplicar e revender
o plano como
medidas de austeridade
para conter o défice. Défice provocado pelo poder
económico-financeiro. Soares via, aplaudia e decidia em nome da
esquerda democrática,
em prol da
Europa connosco
e da Sua Glória.
Encerra-se o percurso com uma citação que poderá servir de
lápide em qualquer cemitério ideológico. É
óbvio que MS é credor de muitos preitos: é
indubitavelmente digno de uma arca no Panteão de Santa Engrácia,
de uma estatueta votiva num aparador da Casa Branca e de uma réplica de
Pai da Democracia
no Museu da República de Nafarros.
SUPER-MARXISTA
Eu sou contra o capitalismo.
L`Express,
10/07/1972
PERÍODO SACARNEIRISTA
Filho de José Gualberto Sá Carneiro, advogado, que foi deputado
da União Nacional de Salazar (única formação
representada na Assembleia Nacional) e de Maria Francisca da Costa Leite, que
foi viscondessa de Lumbrales e vereadora da Câmara Municipal do Porto,
num tempo em que o poder local não era eleito e sobrinho de João
da Costa Leite Lumbrales, que foi ministro das principais pastas de Salazar,
presidente da Legião e da União Nacional. Este o cordão
político-umbilical de Sá Carneiro, Francisco, que franqueou a
porta da política institucional, em 1969, pela mão da
ANP/Acção Nacional Popular de Marcelo Caetano, ex-UN/União
Nacional, integrando a
Ala Liberal.
Com os companheiros de jornada, procurou, na senda de outras personalidades
da
evolução na continuidade
(nomeadamente de membros da Igreja e das Forças Armadas, da Alta
Finança e da Grande Indústria), persuadir o regime a conformar-se
com uma
abertura
que salvaguardasse o fundamental. Nesta ambivalência, a sua Ala
apresentou, em 1971, um projecto de revisão da
Constituição de 1933. Também gizou um projecto de Lei de
Imprensa. SC teve um desempenho frenético na XI Legislatura: 85
intervenções. Até citou Maurice Duverger, prudente
constitucionalista francês. Até citou a elegante
Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Até levantou a
voz contra as arbitrariedades de que eram alvo os presos políticos. Mas
o Estado Policial não atendeu a recomendações nem a rogos
nem a denúncias. O investimento na
Ala Liberal
pressupunha exibir um corpo cénico. O presidente do Conselho e arauto
da
Primavera,
Marcelo Caetano, confessaria ao semanário Tempo (1980) que contratara
os
liberais
para um número de animação e simulação:
Eu convidei um grupo de gente nova justamente para animar a Assembleia e
não dar sempre a impressão de unanimidade. Eles estavam lá
para isso.
O animoso Sá Carneiro, de resto, manejava uma retórica parlamentar
colada ao salazarismo-marcelismo (1970):
Muito se falou da novidade desta Assembleia, na realidade profundamente
renovada na sua composição
E, no entanto, nem a ideia nem a
experiência eram novas, pois de longe vinha a defesa, pelo menos
teórica, da presença nesta sala, para aumento da liberdade da
Assembleia, "de pessoas independentes e desligadas de disciplinas
partidárias, com os olhos postos apenas na sua competência,
independência de critério e idoneidade moral, bom senso e
espírito patriótico", como referia, em 1953, o dr. Salazar.
Após algum frenesim,
SC resignou, incapaz de educar a ditadura salazarista dentro da ditadura
marcelista. Porém, enquanto Miller Guerra se afastava do hemiciclo,
agredido a soco pela
ala dura,
SC despedia-se por carta e votação. Protocolarmente, como seria
de esperar de um visconde de Lumbrales. Com todas as formalidades, como seria
de esperar de um jurista da
ordem estabelecida.
As 85 alocuções foram as suas
Conversas em Família.
Afinal, muito os unia e pouco os dividia.
Uma Tentativa de Participação Política
(1973), livro do saldar de contas do
compromisso histórico
do sacarneirismo nascente com o marcelismo decadente, colocava o seu retrato
na galeria da pequena dissidência e no cartório da herança
da
outra senhora.
É que havia outras maneiras e vias de
participação política,
mas SC não tencionava enveredar pelos caminhos nem ombrear com os
custos da
Oposição Democrática.
Contentava-se com uma
abertura
onde ele coubesse. Mostrou-se em 1969 e retirou-se em 1973. Ficou de atalaia.
Em 1974 já discursava à Nação com nova sigla.
Comprovado o êxito da Revolução dos Cravos, no mês
seguinte, fundou, com um escol portuense, o PPD, depois PSD ou PPD/PSD, segundo
o pendor populista e adaptacionista das lideranças e das
circunstâncias. Com um partido no papel e um passado de
liberal,
ganhou lustro para ministro sem pasta no I Governo Provisório,
chefiado por Adelino da Palma Carlos. Andava exultante com a partilha e o
perfume do poder: o que tentara e falhara na ditadura conseguia-o em
democracia. Em Junho, mostrava-se eufórico perante a Imprensa
brasileira: a harmonia conjugal reinava no Governo. Álvaro Cunhal?
Mário Soares? Movimento das Forças Armadas?
Tem sido efectivamente uma experiência entusiástica, extremamente
enriquecedora
Temos uma base comum: o programa do Governo do MFA. Temos
um desejo comum: institucionalizar a Democracia. Temos um receio comum: o de
que as forças da reacção aproveitem qualquer
ingenuidade
Mas a aceleração do processo revolucionário demonstraria
que também se acelerava o processo reaccionário. Enquanto SC
vincava, no Atlântico Sul, a
base comum,
o
desejo comum
e o
receio comum,
no Atlântico Norte, a sua base era outra, o seu desejo era outro, o seu
receio era outro. As forças do
antigamente
conspiravam, tendo como placa giratória o primeiro-ministro. Palma
Carlos, ligado às grandes corporações (chegou ao 25 de
Abril com assento em 20 das maiores empresas), tentou antecipar as
eleições para a Constituinte, no denominado
golpe constitucional
/Manutenção Militar (com Spínola e outros generais da
Junta de Salvação Nacional). Passou a produzir
legislação de emergência com o propósito de formatar
o novo regime. Sentindo a crescer a desconfiança e a
rejeição à sua volta, nomeou Sá Carneiro
vice-primeiro-ministro (cargo não previsto), colocando-o em vantagem na
linha sucessória e SC lestamente mudou as bagagens para S. Bento.
Três dias depois, recebeu ordem de despejo do MFA.
Base comum
? Não se deslocou ele, com Spínola aos Açores, à
revelia dos outros parceiros do Governo e dos Movimentos de
Libertação, a fim de negociar com Nixon, presidente dos USA, o
destino das colónias? E que modelo de descolonização
transportava Sá Carneiro na mente e na mala diplomática? Em 1970,
já se avistara com Marcelo Caetano, presidente do Conselho, que recordou
(1980): Sá Carneiro
Disse estar admirado de eu ter podido avançar tanto em
relação ao Ultramar, a tal ponto que no projecto apresentado pelo
grupo liberal nada se propunha a mais nesse capítulo.
Foi assim: sempre a animar a diferença e a simular o consenso. Em
diversos tempos. Em todos os temas. Em Novembro de 1974, no Congresso do PPD
dava vivas ao socialismo. Também a respeito da
Constituição (1976/Comércio do Porto) desfazia
dúvidas e reafirmava fidelidades:
O problema da Constituição não se põe. A partir do
momento em que a Constituição está feita é para ser
cumprida.
SC aplaudiu as nacionalizações, a Reforma Agrária, o
controlo operário. Em 1979, atirou para a praça um projecto de
revisão,
Uma Constituição para os Anos 80,
que partia a ossatura e pulverizava a lógica do Texto Fundamental,
negando tudo o que proclamara três anos antes. Muita coisa clamou e
proclamou. Desencadeou fracturas fora e dentro do partido. Ausentou-se e
regressou com ganas reformistas e guinadas restauracionistas. Teve como
tesoureiro partidário e confidente o terrorista Ramiro Moreira. Escolheu
o general Soares Carneiro, comandante do Campo de Internamento de S. Nicolau
(Angola) para candidato à Presidência da República. Sempre
a forçar o presente a regressar ao passado. O filme de Sá
Carneiro rebobinava nos estúdios da
outra senhora.
Kaulza de Arriaga, general ultra-direitista, revelaria (1980/
O Retornado
):
Em 1972, recusei o convite para me candidatar à Presidência da
República pela então ala liberal da Assembleia Nacional, chefiada
ou co-chefiada por Sá Carneiro.
Sá Carneiro, lançador de candidaturas de generais fascistas em
1972 e 1980, esconjurou a candidatura de Eanes, general democrata, em 1980, SC
que também apoiara gostosamente o general Spínola e a contragosto
o general Costa Gomes, em 1974. SC/
Diário de Notícias
(1979):
Bom, essa tradição de militares na Presidência da
República é do período do salazarismo e do regime de
Marcelo Caetano.
Precisamente em 1980, SC/Sá Carneiro pereceu ao levantar voo. Dirigia-se
a um comício de SC/Soares Carneiro no Coliseu portuense. Sofreu um
desastre ou um atentado, conforme as orações fúnebres. O
PPP/PSD (pela mão do partido, do poder central e local) encheu de
fotografias os gabinetes e de monumentos as praças e implantou um vasto
culto toponímico. Até o aeroporto de Pedras Rubras foi
rebaptizado com a sua graça. Os passageiros e tripulantes são
convidados a meditar na tragédia sempre que aterram e descolam.
Também a tumba processual de Camarate é oportuna e metodicamente
reaberta. Nos 100 anos da República, apenas Sidónio Pais mereceu
semelhante onda necrófila. Coincidências: também
Sidónio Pais pereceu em Lisboa, a caminho do Porto. Em 1918, SP
pôs o pé no estribo do comboio. Em 1980, SC subiu a escada da
aeronave. Também SP e SC se destacaram pelo ímpeto e pela
obsessão, usando o manobrismo e a volubilidade como arma num país
de muita história e de pouca memória.
EPITÁFIO DE UM PRIMEIRO-MINISTRO
Não quero ser primeiro-ministro.
Gulbenkian,
25 de Abril de 1976
PERÍODO SILVACAVAQUISTA
Filho de Teodoro Silva e Maria Cavaco, da pequena burguesia rural e comercial
louletana (ligada ao cultivo de frutos secos e à venda de
combustíveis), Aníbal Cavaco Silva estudou em Boliqueime, Faro,
Lisboa e York e leccionou em Lisboa. Passou pela tropa como contabilista. Foi
bolseiro e investigador de Economia e Finanças da Fundação
Gulbenkian e director de Estatística e Estudos Económicos do
Banco de Portugal. Mais foi ou continua a ser: deputado, ministro das
Finanças e do Plano, primeiro-ministro, presidente da República.
Foi ainda secretário-geral do PSD. Uma data emerge na
aceleração e projecção da carreira: 1985. Um facto
súbito oferece a oportunidade: falecimento de Mota Pinto. Um evento
serve de rampa: Congresso do PSD. Um local assinala o triunfo: Casino da
Figueira da Foz. Bateu Rui Machete e João Salgueiro, graças
à mão de Eurico de Melo,
vice-rei
do PSD/Norte, diligente e proficiente angariador de fundos, que se tornou
ministro de Estado e da Administração Interna e
vice-primeiro-ministro e ministro da Defesa, havendo abandonado este posto em
condições obscuras, passando de sustentáculo
partidário e pilar governamental a militante silencioso e eurodeputado
invisível.
No exercício das funções governativas e presidenciais, o
homo boliqueimensis
deixou uma marca de executor do neo-liberalismo como economia financeirizada e
de passadismo como pauta ideológica. Doutorado pelo
thatcherismo-reaganismo, esforçou-se, a partir de 1986, por aplicar a
receita testada pela Escola de Chicago no Chile de Pinochet, a partir de 1973:
como em Portugal o regime constitucional e o condicionamento democrático
não permitiam uma solução casernícola, CS foi
pressionando a Lei Fundamental. Barrado, em 1987, por uma moção
de censura, dissolvida a AR e convocadas eleições, CS
obtém a maioria absoluta. Repetirá a absoluta, em 1991,
então coligado. Este suporte confere-lhe campo de subversão para
dar largas a uma concepção de Thatcher de calças e Reagan
sem chapéu. Entrado Portugal, no seu consulado, na CEE, CS drenaria,
durante dez anos, o manancial de fundos para obras públicas, parte delas
de aparato ou de desbarato, fazendo crescer o polvo de betão à
sombra da árvore das europatacas.
Deixem-me trabalhar!
Os fundos que não jorraram para infra-estruturas, frequentemente
megalómanas ou desconectadas de um Plano Estratégico de
Desenvolvimento, foram engordar o sector particular em nome do sector privado,
enquanto se desmantelava a indústria pesada e mecânica, se abatia
drasticamente o efectivo pesqueiro e se pagava para não produzir na
agricultura.
Deixem-me trabalhar!
Este fontismo fim-de-século XX engordou uma geração de
empreiteiros, presenteou uma geração de
empreendedores
absentistas e fez despontar uma geração de banqueiros
cavaquistas. Desde o ouro do Brasil que algumas estirpes não nadavam
tanto em dinheiro fácil. Cavaco é o
Magnânimo
da Europa dos Fundos Perdidos. Mas, ao menos, D. João V, o rei do
Mosteiro de Mafra e da Ópera Italiana, não perdia tempo a subir a
coqueiros: apreciava saias de freira. Ia ao primor de montar suite
de luxe
à madre Paula no Convento de Odivelas. Descontado o devocionário
paulista, a política de Estado não comportará grandes
diferenças. Terão ambos algo de positivo no percurso. D.
João V também fez obra, representada pelo emblemático
Aqueduto das Águas Livres. Contudo, o que nacionalmente falhou superou o
bem realizado. O fausto é muitas vezes prenúncio de bancarrota.
João também tinha Secretariado de Propaganda para impressionar a
populaça e os salamaleques dos cortesãos. João fazia gala
em deslumbrar o papa romano e o imperador chinês. Falecido o monarca da
Palhavã e da Patriarcal, dos solenes pontificais, dos coches e dos
deboches, não havia disponibilidades de tesouraria para um funeral
luzidio, à altura do
Rei-Sol Português.
Além da distribuição do euromaná, Cavaco Silva
notabilizou-se a privatizar empresas públicas, inclusive por ajuste
directo e a preço mínimo, acentuou o desequilíbrio do
estatuto laboral face ao patronal, procedeu à revisão da Lei de
Imprensa, abrindo a Rádio e a Televisão a grupos
mediáticos afectos, retirou o poder vinculativo aos Conselhos de
Redacção, criou os regimes fiscais de IRS/IRC, beneficiando a
banca e a generalidade das aplicações aforristas e bolsistas.
Deixem-me trabalhar!
No quer toca ao modelo de Estado, contribuiu, como ninguém, para o que
mais tarde classificaria como
monstro:
para as clientelas partidárias e colaboracionistas, a ética
como ramo de negócio, as sobreposições de
funções e competências. Miguel Cadilhe, que foi ministro
das Finanças do Cavaquistão, reconheceu CS como o verdadeiro
pai do monstro,
Quanto ao pretenso excesso de funcionários públicos, CS
recomendou em tempos a implacável lei da natureza:
deixá-los morrer.
Mas alguns portugueses tiveram direito a berço dourado. No
magnânimo reino do Cavaquistão, fomentou-se o culto dos
vencedores, desde logo, dos JEP`s/Jovens de Elevado Potencial. E foi-se
revelando o
potencial
de Oliveiras e Costas, Dias Loureiros, Duartes Limas. O cavaquismo foi uma
fábrica de novos-ricos. Alguns dos sinais institucionais desse
novo-riquismo traduziram-se na aquisição de uma frota de
aviões executivos Falcon, nas comitivas régias e nas despesas
colossais
da Presidência da República.
Deixem-me trabalhar!
O Novo SPN/Secretariado de Propaganda Nacional, esse vendia e revendia
Portugal como um
oásis
no meio da desolação e com brios de
bom aluno
europeu num clube de cábulas. Portugal integrava ou brevemente
integraria o
pelotão da frente.
E agora que jazemos em 2011, no término das evocações
republicanas ou da
coisa pública,
em que se salda o país-ficção do
homem do leme
? Bastará passar os olhos pelo mapa continental e insular: as
tempestades de areia toldaram o
oásis.
Verificou-se o incumprimento das regras de contabilidade da Euro-Escola e da
Universidade de York e do Instituto Comercial de Lisboa, confirmou-se o
endividamento crónico e insustentável, agravou-se o retrocesso
económico, alastrou a mancha da pobreza, decretou-se o saque fiscal e
social da classe trabalhadora e da classe média. E tão calamitoso
como a calamidade económico-social é o drama de Portugal ter
vindo a perder soberania e independência de modo célere ao cair no
ciclo infernal da dívida e da recessão,
nas garras dos prestamistas, dos agiotas, dos batoteiros: da
economia de casino.
O CS de 2011 é idêntico ao CS de 1985: foi eleito num casino e
muito lhe deve Portugal por se haver transformado um casino, onde alguns
são senhores das máquinas e das fichas e do tapete verde e outros
pagam as paradas do BPN e do BPP e das parcerias público-privadas e das
derrapagens orçamentais e dos paraísos fiscais e dos vencimentos
provocatórios e das reformas obscenas. Cavaco Silva não pode
dizer que não passou por aqui ou que não sabia o que se passava
por aqui.
Deixem-me trabalhar!
Não houve outro
timoneiro
(com excepção de Salazar) com tal latitude e amplitude de
mandato. Também não pode dizer que é humano e errou.
Exerceu o magistério da infalibilidade:
nunca me engano e raramente tenho dúvidas.
E nem precisava de recorrer à Imprensa para se inteirar dos
acontecimentos:
não leio jornais.
York
dixit.
Chicago
diktat.
Já no itinerário democrático, CS homenageou Spínola
e agraciou ex-Pides compreendendo-se que, na ditadura, se tivesse
confessado à PIDE, por escrito,
integrado no salazarismo.
Vocacionado para se integrar na ditadura, negar a pensão à
viúva a Salgueiro Maia, Capitão de Abril, foi um acto de
continuidade. Como foi um acto de continuidade a Petrogal (empresa
pública sob tutela do X Governo Constitucional/CS) haver nomeado Ramiro
Moreira para alto cargo em Madrid, para onde se evadira, após
condenação a 21 anos de cadeia. Lembre-se que era, na altura,
ministro dos Negócios Estrangeiros Pedro Pires de Miranda, ex-presidente
da Petrogal, eminência que sentiu necessidade de abandonar a terra lusa
no 25 de Abril e no 11 de Março. CS foi apodado de
ditador
por Belmiro de Azevedo, seu apoiante. CS foi acusado por Miguel Júdice,
seu apoiante, de haver
destruído
o PSD original, de haver
aumentado o peso do Estado
e de ser
autoritário.
Acrescentaremos que tratava os ministros por
adjuntos.
Sidónio Pais só tolerava
secretários.
Já no Plano Nacional de Leitura, o pai do
colossal
deslize das contas do Centro Cultural de Belém leu uns livros de
contabilidade, economia e finanças. Mesmo assim, troca competitividade
por
competividade.
No restante,
confunde Tomás Moro com Thomaz Moore e desconhece os cantos dos
Lusíadas. Terá mandado ler ao inquisidor Lara o Evangelho de
Saramago?
Apesar do
colossal
défice literário, nada impede CS de ter um
futuro risonho
como ficcionista do mundo rural, mundo que tanto ajudou a desertificar e a
liquidar. Segundo CS, terão ficado imunes à PAC algumas vacas de
elevado potencial.
Dir-se-á: que sorte ser
boy
em Portugal e vaca nos Açores. Isso mesmo. CS redimir-se-á das
agruras agrárias. Deliciar-nos-á com o Monólogo da
Graciosa. Gil Vicente, esteja onde estiver, orgulhar-se-á por reler, em
2011, o seu Auto de 1502. O novel talento é um português dos
grandes em época de ânimos abatidos e credores à perna.
Ninguém estranhe a narrativa e o êxtase do narrador: o destino de
Portugal sempre esteve dependente do gado: do bravo e do manso. As vacas,
então, sempre deram provas de férreo portuguesismo e acrisolado
patriotismo. Quem não se recordará da Batalha da Salga, em 1581,
dominados por Castela, só faltando submeter a Ilha Terceira? Oitenta
vacas desceram dos verdejantes pastos, investiram contra os afoitos
desembarcados, desbarataram a invencível armada de Filipe II. Onde falta
a carga de cavalaria sempre resta a carga de vacaria. Que fique a
lição para Merkel e Sarkozy: as vacas nem sempre se desfazem em
sorrisos. No entanto, ver vacas consoladas é um privilégio. Como
suma honra é pertencer a uma
raça
cuja Língua se enriquece cruzando a épica da Terceira e o
pitoresco da Graciosa. A alma do
Portugal Profundo
emerge. Atentemos na importância do vaquismo e do cavaquismo na
História da Defesa e da Literatura.
AUTO DO VAQUEIRO
Ontem eu reparava no sorriso das vacas. Estavam satisfeitíssimas olhando
o pasto que começava a ficar verdejante.
Imprensa / Rádio/Televisão,
21/09/2011.
[*]
Escritor/Jornalista
Este artigo encontra-se em
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