A lavar cérebros de um modo polido e profissional
por John Pilger
Um dos livros mais originais e provocantes da última década
é
Mentes disciplinadas (Disciplined Minds)
de Jeff Schmidt
[NR 1]
(Rowman & Littlefield). "Um olhar críticos aos
profissionais assalariados", diz a capa, "e o sistema de massacre de
almas que molda as suas vidas". O seu tema é a América
pós-moderna mas também se aplica à Grã-Bretanha,
onde o estado corporativo engendrou uma nova classe de administradores
americanizados para dirigir os sectores privado e público: os bancos, os
principais partidos, corporações, comités importantes, a
BBC.
Dizem que os profissionais são meritórios e não
ideológicos. Mas, apesar da sua educação, escreve Schmidt,
eles pensam menos independentemente do que não profissionais. Eles
utilizam jargões corporativos como "modelo",
"desempenho",
"alvos", "visão estratégica". Em
Mentes disciplinadas,
Schmidt argumenta que o que faz profissional moderno não é
conhecimento técnico mas "disciplina ideológica".
Aqueles na educação superior e nos media fazem "trabalho
político" mas de um modo que não é visto como
político. Ouçam um indivíduo sénior da BBC
descrever o nirvana da neutralidade ao qual ele ou ela se elevaram. "Tomar
partido" é anátema; e o profissional moderno sabe nunca
desafiar a "ideologia incorporada do status quo". O que importa
é a "atitude certa".
[NR 2]
Uma chave para o treino de profissionais é o que Schmidt chama
"curiosidade assinalável". As crianças são
naturalmente curiosas, mas ao longo do caminho para tornar-se um profissional
eles aprendem que a curiosidade é uma série de tarefas assinalada
por outros. Ao entrar no treino, os estudantes são optimistas e
idealistas. Ao deixá-lo, estão "pressionados e
perturbados" porque percebem que "o objectivo primário para
muitos é serem suficientemente compensados por abandonarem seus
objectivos originais". Tenho encontrado muitos jovens, especialmente
jornalistas novatos, que se reconheceriam a si próprios nesta
descrição. Pois não importa quão indirecto é
o seu efeito, a influência primária dos administradores
profissionais é culto político extremo da devoção
ao dinheiro e à desigualdade conhecido como neoliberalismo.
O supremo administrador profissional é Bob Diamond, o presidente do
Barclays Bank em Londres, que em Março obteve um bónus de
£6,5 milhões. Mas de 200 administradores do Barclays levaram para
casa £554 milhões no ano passado. Em Janeiro, Diamond disse no
comité do Tesouro do parlamento britânico que "o temo do
remorso está ultrapassado". Ele referia-se ao £1 milhão
de milhões
(trillion)
de dinheiro público entregue sem condições a bancos
corrompidos por um governo trabalhista cujo líder, Gordon Brown,
descreveu tais "financeiros" como a sua
"inspiração" pessoal.
Isto foi o acto final do golpe de estado corporativo, agora disfarçado
por um debate especioso acerca de "cortes" e de um
"défice nacional". A maior parte das premissas humanas da vida
britânica estão a ser eliminadas. O "valor" dos cortes
diz-se ser de £83 mil milhões, quase exactamente o montante da
tributação evitada legalmente pelos bancos e
corporações. Que o público britânico continua a dar
aos bancos um subsídio adicional anual de £100 mil milhões
em seguro gratuito e garantias um número que financiaria todo o
Serviço Nacional de Saúde é abafado.
Assim, também, é o absurdo da própria noção
de "cortes". Quando a Grã-Bretanha estava oficialmente em
bancarrota a seguir à Segunda Guerra Mundial, havia pleno emprego e
algumas das suas maiores instituições públicas, tais como
o Serviço de Saúde, foram montadas. Mas os "cortes"
são administrados por aqueles que dizem opor-se a eles e fabricam
consentimento para a sua aceitação ampla. Este é o papel
dos administradores profissionais do Partido Trabalhista.
Em questões de guerra e paz, as mentes disciplinadas de Schmidt promovem
violência, morte e caos numa escala ainda não reconhecida na
Grã-Bretanha. Apesar da evidência incriminatória no
inquérito Chilcot do antigo chefe de inteligência, general de
divisão Michael Laurie, o administrador do "negócios
principal", Alastair Campbell, permanece solto, assim como todos os outros
administradores da guerra trabalharam com Blair e no Foreign Office para
justificar e vender o banho de sangue no Iraque.
Os media de referência muitas vezes desempenham um papel subtilmente
crítico. Frederick Ogilvie, o qual sucedeu ao fundador da BBC, Lord
Reith, como director geral, escreveu que o seu objectivo era transformar a BBC
num "instrumento de guerra plenamente efectivo". Ogilvie teria ficado
deliciado com os seus administradores do século XXI. Na corrida para a
invasão do Iraque, a cobertura da BBC reflectia esmagadoramente a
posição mentirosa do governo, como mostra estudos da Universidade
de Gales e da Media Tenor.
Contudo, o grande levantamento árabe não pode ser facilmente
administrado, ou apropriado, com omissões e advertências, como
deixa claro um diálogo no programa
Today,
da BBC, de 16 de Maio. Com o seu celebrado profissionalismo, concentrado em
discursos corporativos, John Humphrys entrevistou um porta-voz palestino, Husam
Zomlot, a seguir ao massacre de Israel de manifestantes desarmados no 63º
aniversário da expulsão ilegal do povo palestino dos seus lares.
Humphrys: ... não é surpreendente que Israel tenha reagido do
modo o fez?
Zomlot: ... estou muito orgulhoso e satisfeito [eles estavam] a manifestar-se
pacificamente só para... realmente chamar atenção para os
seus 63 anos de infortúnio.
Humphrys: Mas eles não se manifestaram pacificamente, esse é o
meu ponto...
Zomlot: Nenhum deles... estava armado... Opuseram-se a tanques,
helicópteros e F-16s israelenses. Você não pode sequer
começar a comparar a violência... Isto não é uma
questão de segurança... [os israelenses] sempre falham em tratar
com um assuntos puramente político, humanitário e legal...
Humphrys: Desculpe interrompê-lo mas... se eu marcho dentro da sua casa
agitando um cassetete e lançando-lhe um pedra então isso seria
uma questão de segurança, não seria?
Zomlot: Desculpe-me. Segundo resoluções do Conselho de
Segurança das Nações Unidas, aquelas pessoas estavam a
marchar para as suas casas; elas têm os direitos sobre os seus lares;
é sua propriedade privada. Vamos então por as coisas em pratos
limpos de uma vez por todas...
Foi um momento raro. Por as coisas em pratos limpos não é um
"objectivo" administrativo.
23/Junho/2011
[NR 1]
Jeff Schmidt foi editor da revista
Physics Today
durante 19 anos, até que foi despedido por ter escrito
Disciplined Minds
. Para encomendá-lo clique em
Rowman & Littlefield Publishers Inc.
[NR 2) Desde a publicação deste livro as coisas agravaram-se. Agora os media
que se proclamam como "referência" proíbem os profissionais que neles
trabalham de exprimirem opiniões independentes fora dos mesmos (blogs, sítios web ou
quaisquer outros meios de informação). Tais proibições estão mesmo fixadas nas
suas respectivas normas internas. Anula-se assim a separação entre o trabalho feito para um
patrão e a vida pessoal do assalariado. Este, na sua vida privada, está
politicamente castrado: fica impedido de manifestar-se em público a fim
de conservar o emprego.
O original encontra-se em
http://www.johnpilger.com/articles/brainwashing-the-polite-and-professional-way
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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