Pico petrolífero e mercados financeiros: Uma previsão para 2008

por Gail, o Actuário

Nesta altura do ano, lemos muitas previsões financeiras para o ano que se inicia. Quase todas são redigidas com o "filtro" da certeza do crescimento infinito. "A questão da produção petrolífera é uma dificuldade temporária; depois de uma breve descida, é provável que a economia continue novamente a crescer. Podemos ter uma ligeira recessão, mas voltaremos ao caminho certo, como sempre". Etc.

Considero que este filtro é fundamentalmente um erro e conduz a uma impressão errada no que diz respeito à direcção para a qual o mundo se dirige. O petróleo escasseia e esta escassez irá provavelmente aumentar no futuro. A pressão da diminuição do fornecimento e os preços galopantes acrescentam um desequilíbrio sistemático que a comunidade financeira não está a aceitar. Este desequilíbrio tem na sua base o facto de que está a tornar-se mais e mais difícil, tanto para os cidadãos como para os comerciantes, pagar os seus empréstimos devido aos custos ascendentes do petróleo e da alimentação. Não é credível que esta situação acabe. De facto, irá, quase de certeza, piorar nos próximos anos, à medida que o fornecimento de petróleo diminui.

Para além do desequilíbrio sistemático, existe também um risco sistémico, que advém da interligação de todas as partes da economia. Isto foi bem descrito alguns dias atrás no post The Failure of Networked Systems . Um dos problemas do risco sistémico diz respeito ao próprio sistema financeiro. Se uma parte do sistema falha, aumenta a probabilidade das outras partes falharem também.

Outro aspecto do risco sistémico é a ligação estreita entre o sistema financeiro e o resto da economia. Um exemplo é o preço cada vez mais elevado do petróleo e dos bens alimentares já mencionados que levam a um desequilíbrio sistemático em relação a incumprimentos maiores. Um outro é o facto de que a falta de petróleo irá certamente dificultar o crescimento infinito, fazendo com que o modelo de crescimento infinito subjacente ao actual sistema económico seja menos sustentável, baseado no modelo económico de Robert Ayres e Benjamin Warr. Uma outra ligação é a do petróleo com o etanol, o que faz aumentar ainda mais o custo da alimentação, como demonstrado por Stuart Stanford em Fermenting the Food Supply .

Contextualização

Em primeiro lugar, algumas definições para acompanhar a introdução.

O desequilíbrio sistemático ocorre num sistema quando um processo favorece um determinado resultado. Em vez dos erros serem ocasionais, são consistentes e recorrentes. Um exemplo é o termómetro que dá leituras elevadas consistentemente. Na economia, o desequilíbrio sistemático acontece quando os empréstimos sofrem uma tendência crescente em direcção à falta de pagamento, devido a mudanças no sistema (aumento do preço do petróleo) desde o momento em que a probabilidade de incumprimento foi originalmente calculada. Como exemplo adicional, o aumento do preço do petróleo pode também provocar que lucros de empresas individuais cresçam mais lentamente (em relação à experiência do período anterior) do que o esperado, devido a uma contracção do crescimento económico geral.

O risco sistémico é um risco que está relacionado com a interligação do sistema. Um impulso numa das partes do sistema provoca uma sacudidela numa outra parte, resultando em desaires não previstos. A título de exemplo, o insucesso de um banco poderá levar ao insucesso de outros, por causa do risco de contraparte. Existem motivos significativos para crer que a interligação do sistema está a aumentar com o passar do tempo, enquanto os alimentos começam a ser usada como combustível e enquanto os produtos financeiros se tornam mais complexos. Vide The Failure of Networked Systems .

A comunidade financeira já concebeu muitos modelos. Alguns usados por "analistas" na avaliação de produtos financeiros mais recentes. Outros são usados pelas companhias de seguros na avaliação do risco de incumprimento das obrigações e das hipotecas.

A suposição adoptada nestes modelos é a de que a experiência histórica pode ser utilizada, apenas com ligeiros ajustamentos, como um guia na avaliação dos produtos correntes. Esta abordagem é insuficiente no reconhecimento do risco crescente que está a entrar agora no sistema, derivado do desequilíbrio sistemático resultante do aumento do preço do petróleo e do maior risco sistémico devido à crescente interligação.

Uma das formas de descrever estes modelos é afirmando que eles partem do pressuposto de que os incumprimentos são "acontecimentos independentes" – isto é, não existe um desequilíbrio em todo o sistema que causa cada vez mais incumprimentos. Esta suposição mantém baixos os prémios de seguros e faz funcionar a distribuição dos pacotes de títulos de crédito. É óbvio que com o desequilíbrio sistemático e o risco sistémico que actualmente contaminam o sistema financeiro, estes pressupostos deixam de ser válidos.

Clique a imagem para encomendar. Intimamente relacionado com o pressuposto de que os acontecimentos são independentes está a suposição de que as distribuições "normais" – isto é, que seguem a distribuição gaussiana. Benoit Mandelbrot demonstrou em The (Mis) Behavior of Markets que as caudas (tails) reais das distribuições são muito mais "gordas" do que o implícito na distribuição gaussiana. O desequilíbrio originado pela situação petrolífera torna a distribuição normal ainda menos apropriada. Por exemplo, com o aumento do preço do petróleo, o número de incumprimentos de obrigações será maior do que o previsto, caso se parta do princípio de que a distribuição normal aplicada à experiência do passado será indicativa de experiências futuras.

Se atentarmos às teorias financeiras como o Modelo de Avaliação de Activos Financeiros (Capital Asset Pricing Model) e ao Modelo de Black Scholes (Black Scholes Option Pricing Model) , veremos que supõem distribuições normais e independência estatística. Já foi provado que tais modelos não são apropriados, porque as distribuições subjacentes não são realmente normais, tal como Mandelbrot demonstrou. Agora que o desequilíbrio sistemático e o risco sistémico estão a desempenhar um papel mais importante, o valor indicativo que tinham anteriormente irá previsivelmente cair ainda mais.

O que se segue?

Não creio que possamos saber com precisão. Através dos dados que seguem, apresento a minha opinião sobre como a situação financeira poderá desenvolver-se no ano que temos pela frente, levando em linha de conta as questões discutidas anteriormente.

1- Muitas seguradoras de títulos de linha única (monoline) sofrerão desvalorização em 2008 e algumas poderão abrir falência.

As seguradoras de títulos e hipotecas irão quase certamente passar por dificuldades porque estas coberturas são redigidas no pressuposto de que a experiência de incumprimentos do passado pode ser usada como um guia para os preços necessários. Se existe um desequilíbrio sistemático em relação ao aumento de incumprimentos, como se vê actualmente, os preços serão demasiado baixos.

Assim que as seguradoras de obrigações percam as suas avaliações de risco AAA, a sua cobertura terá pouco valor. As agências de avaliação farão a sua avaliação baseada na posição financeira da organização que emite o título, em vez de associar a notação de risco da seguradora à obrigação. Isto poderá significar uma desvalorização global dos títulos.

Warren Buffet está a constituir uma nova seguradora de títulos. Mesmo que esta companhia se limite apenas aos títulos municipais e cobre taxas mais elevadas, duvido da viabilidade da companhia a longo prazo. Será difícil cobrar um preço em 2008 que reflicta o verdadeiro risco de incumprimento daqui a cinco ou dez anos, quando o fornecimento de petróleo será muito mais restrito do que actualmente.

2- Cada vez mais pessoas com influência nos mercados financeiros começarão a admitir o pico petrolífero.

Vimos já como os mercados petrolíferos se comportam de forma diversa, assim que os comerciantes de petróleo se apercebem que o pico petrolífero não anda longe. Tornam-se mais agressivos e exigem contrapartidas mais favoráveis. Apercebem-se que têm uma alavanca e começam a utilizá-la.

Parece-me que em 2008 os mercados financeiros começarão também a aperceber-se do pico petrolífero. Os economistas mais eminentes falam já abertamente sobre o assunto. A 15 de Dezembro de 2007, o Wall Street Journal citava Alan Greenspan dizendo que o fornecimento de petróleo tinha atingido o valor mínimo e num período mais curto do que se previra. O Toronto Star citou Jeff Rubin, economista-chefe do CIBC World Markets [1] : "Creio que já não vamos assistir a aumentos na produção convencional de petróleo. Penso que (o pico petrolífero) chegou". Com economistas como Greenspan e Rubin a falar abertamente do pico petrolífero, é bem provável que alguns governantes comecem a pensar sobre as suas implicações nos empréstimos e noutros produtos financeiros. Isto parece especialmente garantido, caso a produção petrolífera continue relativamente estagnada ou diminua em 2008.

3- Empréstimos a longo prazo, incluindo aqueles para companhias de energia, tornar-se-ão certamente menos disponíveis à medida que a consciência do pico petrolífero aumenta.

Assim que os mercados financeiros se apercebam do pico petrolífero, penso que as instituições de crédito passarão a ser mais cautelosas em relação a empréstimos a longo prazo, devido à dúvida sobre a liquidação destes empréstimos mal a produção petrolífera mundial comece a diminuir. As taxas de juro irão subir. Os endividados marginalizados poderão nem conseguir contrair um empréstimo. Todos estes efeitos irão progressivamente apertar o cerco à volta dos empréstimos.

O banco central (Federal Reserve) poderá ter de baixar as taxas de juro, mas à medida que os incumprimentos aumentam e as instituições de crédito tomam consciência do pico petrolífero, a margem de risco para os não pagamentos incluída nas taxas de juro tenderá a aumentar. Assim, as taxas de juro actuais cobradas aos consumidores e ao comércio poderão não diminuir, mesmo que o Federal Reserve baixe as taxas de juro alvo (target interest rates).

Não acredito numa total aceitação do pico petrolífero pelos mercados financeiros em 2008, especialmente se uma crise de crédito fizer baixar os preços do petróleo. Assim que o pico petrolífero seja reconhecido (quase de certeza quando os seus efeitos forem notórios e a sua atenuação não esteja a resultar), a contracção de dívidas a longo prazo deixará de estar disponível, até para os governos.

4- Existe uma forte probabilidade de uma grave recessão em 2008, que se agravará com o decorrer do ano.

Os preços do petróleo e da alimentação irão certamente aumentar, deixando os consumidores com menos dinheiro para gastar no pagamento dos empréstimos e nas compras diárias. Reajustamentos nas taxas de juro irão exacerbar ainda mais os problemas com hipotecas. Os incumprimentos de hipotecas vão aumentar, tal como nos empréstimos de todo o género – incluindo empréstimos a estudantes, débitos de cartões de crédito, auto-empréstimos, hipotecas comerciais e outros mais. Eventualmente, os problemas estender-se-ão às obrigações estatais e municipais.

Cada vez mais negócios vão confrontar-se com dificuldades financeiras, que levarão a incumprimentos de empréstimos. Os comerciantes falidos irão despedir trabalhadores.

Com a desvalorização das habitações, as receitas fiscais dos municípios irão diminuir. Esta situação poderá levar a cortes na despesa, aumentando a contracção económica. Aumenta também a probabilidade de incumprimentos em títulos municipais.

5- Pelo menos alguns grandes bancos irão falir.

Com a desvalorização e falência das obrigações e seguros hipotecários, e cada vez mais incumprimentos de todo o tipo, parece que muitos bancos vão ficar em dificuldade financeiras. A Federal Deposit Insurance Corporation [2] e outras agências governamentais irão tentar resolver estes problemas, mas não é garantido que sejam bem sucedidos. Uma das abordagens poderá ser abrandar as necessidades de capital. Ou então encontrar uma forma temporária de valorizar os empréstimos que não reflictam a dimensão dos seus problemas.

Em determinado momento, a FDIC irá ser forçada a fazer uso da sua prometida cobertura de seguros (100 mil dólares na maioria das contas, 250 mil em Planos Poupança Reforma). A FDIC cobra prémios de seguro aos bancos a que presta serviços, mas se muitos deles falirem, a sociedade não possui fundos suficientes para reembolsar os depositantes ao nível das garantias iniciais.

Parece-me que encontrar-se-á formas de ultrapassar esta dificuldade – por exemplo, poderá ser dada permissão à FDIC para contrair um empréstimo ilimitado com o apoio do governo americano. Esta abordagem requer compradores condescendentes para com a nova dívida. Outra abordagem poderá ser a utilização da política monetária para assegurar que os bancos possuam fundos suficientes para cobrir os levantamentos, mesmo que pareçam estar falidos. Qualquer uma delas será certamente inflacionária.

6- A capacidade de endividamento dos consumidores irá diminuir.

Até à data, grande parte do declínio da capacidade de endividamento tem sido na área do crédito à habitação. Penso que ao longo de 2008, esta capacidade vai diminuir noutras áreas também. Parte desta queda será resultado directo do aumento do número de incumprimentos. A condição financeira debilitada dos bancos irá reduzir a disponibilidade de crédito. Com o capital em queda, os bancos estarão cada vez menos preparados para conceder empréstimos e poderão apertar os critérios dos empréstimos que realmente aprovam. Os consumidores com cartões de crédito poderão ver diminuir o seu limite de endividamento. Os limites nos empréstimos participativos poderão também ser reduzidos.

Existe também a possibilidade de que um grande número de bancos com grandes emissões de cartões de crédito enfrente dificuldades financeiras. Se isto acontecer, não é provável que uma nova instituição de crédito vá emitir novos cartões à totalidade dos anteriores titulares. O seguro da FDIC está ligado aos depósitos, não à disponibilidade de crédito, por isso, não há garantias de um novo cartão. Alguns indivíduos, em especial com baixas avaliações de crédito, poderão ser obrigados a saldar dívidas antigas, sem nenhuma outra fonte de crédito.

7- Fannie Mae e Freddie Mac poderão necessitar de ajuda do governo.

Com o crescente número de incumprimentos, os problemas da Fannie Mae e do Freddie Mac vão manter-se. Ambos terão dificuldade em manter meios financeiros suficientes e poderão necessitar de algum tipo de intervenção do Estado, nem que seja para permitir que vivam com menos dinheiro.

8- Uma nova categoria de casas – as que "nunca se venderão" – irá emergir.

Em 2008, o número de compradores de casas tornar-se-á reduzido, em parte devido ao distanciamento das regras descuidadas dos empréstimos do passado recente. Se aos futuros proprietários for exigido provas de um rendimento adequado às casas que pretendem adquirir, muitas pessoas ficarão limitadas a habitações muito mais pequenas, ou até nenhuma.

À medida que o pico petrolífero se torna mais evidente, o número de futuros proprietários irá ser reduzido. Uma das razões é que as pessoas estarão menos disponíveis para viajar para uma casa de praia ou de campo e, então, vão necessitar apenas de uma residência, em vez de ambas. Outro motivo prende-se com o preço elevado do combustível para aquecimento, da gasolina e dos alimentos, que serão um incentivo cada vez maior para as famílias numerosas viverem juntas.

A dificuldade em vender a quantidade actual de habitações a um número cada vez menor de futuros clientes é que algumas casas não vão encontrar comprador num período de tempo tolerável. Algumas serão eventualmente demolidas, muitas vezes após terem sido vandalizadas. Existe uma forma eficaz para contornar esta dificuldade, desde que os empréstimos continuem disponíveis. Um futuro vendedor poderá aproveitar ao máximo a hipoteca sobre uma propriedade, antes de a colocar no mercado. Depois, se não encontrar comprador, o vendedor pode minorar os seus prejuízos enviando as chaves à instituição de crédito.

Parece-me que nos próximos dois anos, as instituições de crédito hipotecário começarão a aperceber-se que os proprietários podem usar a hipoteca para diminuir as suas perdas no acto de venda da casa. Por isso, penso que as instituições vão começar a exigir pelo menos 20% de entrada em transacções de habitações. Os que re-financiam casas estarão limitados a um empréstimo total de 80% do valor da casa. Estas práticas irão reduzir ainda mais o número de futuros proprietários, dificultando a venda de habitações.

9- Os políticos continuarão a tentar ajudar os proprietários e talvez outros tipos de subscritores de crédito.

Com o aumento das taxas de juro, uma economia em recessão e regras de concessão de empréstimos mais rígidas, é pouco provável que todas as casas continuem habitadas, a não ser que o governo permita, de alguma forma, que as pessoas permaneçam em casas que não podem pagar. Se as casas ficarem desocupadas, existe, é claro, a hipótese de serem vandalizadas e o seu precioso recheio roubado.

A "ajuda" governamental poderá até estender-se a outros tipos de empréstimo, tais como a estudantes universitários impedidos de pagar o empréstimo contraído devido ao desemprego. Toda esta intervenção do governo irá provocar descontentamento entre as seguradoras de títulos de crédito.

10- A quantidade de endividamento estruturado irá cair para níveis próximos do zero.

Ao longo de 2008, será cada vez mais notório que a dívida estruturada tem demasiados problemas para ser um método viável de transferência de dívidas do banco emissor para múltiplos compradores. A deficiente avaliação apontada no início deste artigo será mais evidente em 2008. Isto irá juntar-se aos restantes problemas da dívida estruturada, incluindo a falta de comissão de subscrição, avaliações optimistas de obrigações, elevados custos do sistema e rendimentos reduzidos devido à intervenção do governo na ajuda aos endividados.

11- Para além dos bancos, muitos outros intervenientes nos mercados financeiros vão enfrentar dificuldades financeiras em 2008.

Para além dos bancos, os mercados financeiros incluem fundos de investimento especulativo, fundos de tesouraria, companhias seguradoras, fundos de pensões e muitos fundos de investimento sectorial. Creio que as dificuldades vão estender-se a muitas destas organizações, por uma variedade de motivos:

  • O valor das obrigações e da dívida estruturada mantido por estas organizações vai provavelmente diminuir , à medida que mais negócios e indivíduos passam por dificuldades financeiras. Da mesma forma, a venda de títulos de crédito ao longo de 2008 tornará claro o seu real valor. As organizações serão forçadas a ponderar o valor de mercado.

  • Vendedores de Credit Default Swaps (CDS) irão provavelmente sofrer graves prejuízos . Os CDSs comportam-se como políticas de seguro contra incumprimento de obrigações. As instituições que emitem CDSs não mudaram o suficiente para cobrir o tipo de aumento sistémico em risco que acontece actualmente. Estas instituições vão acabar por ter enormes prejuízos. Compradores de CDSs verificarão que os vendedores são incapazes de cumprir com as suas promessas.

  • O endividamento vai estar menos disponível ou apenas disponível com elevadas taxas de juro. As instituições que utilizam alavancagem, tais como fundos de investimento especulativo, vão ter dificuldade em manter o mesmo nível de endividamento e poderão até ser forçadas a vender alguns dos seus activos devido à diminuta disponibilidade de crédito.

Caso alguma destas organizações falhe, não se sabe ao certo a amplitude que a intervenção do governo irá ter. Não existe nenhuma razão em especial para esperar intervenção governamental em fundos de investimento especulativo ou fundos de tesouraria. Os fundos de pensões e as seguradoras possuem algum tipo de garantias, mas os programas não são implementados com o objectivo de lidar com múltiplas falências.

12- O valor do dólar irá cair em relação a algumas moedas, fazendo com que o preço do petróleo aumente.

Prevejo que a Arábia Saudita e outros países produtores petrolíferos do Médio-Oriente irão revalorizar as suas moedas em relação ao dólar, provocando a descida deste. Por causa desta revalorização, o custo do petróleo vai aumentar, apesar da grave recessão económica.

Continuo sem perceber como é que o dólar americano irá competir com outras unidades monetárias. A Europa, o Japão e o Canadá terão também as suas próprias dificuldades económicas relacionadas com o pico petrolífero e com a queda no mercado imobiliário. As mudanças nestas moedas poderão ser pouco significativas. Não me espanta que o dólar desvalorize em relação à moeda chinesa, dada a capacidade da China para usar o carvão na produção de exportações.

13- A bolsa de valores vai provavelmente entrar em declínio em 2008.

A combinação de uma recessão com taxas de juro mais altas no endividamento das empresas irá resultar numa descida acentuada nos valores do mercado bolsista. As empresas de serviços financeiros, em especial, irão ter fracos resultados. Haverá ainda, porém, uma ligeira possibilidade de aumento nos valores do mercado bolsista, devido à grande quantidade de pagamentos de "petróleo reciclado" e ao impacto inflacionário do endividamento governamental suplementar e da política monetária imprudente.

14- Os preços da alimentação e da energia irão com certeza subir em 2008. Os preços das casas e de bens e serviços não-essenciais poderão baixar.

Os americanos irão verificar que o seu rendimento é cada vez mais aplicado à alimentação e à energia, restando menos para bens e serviços não-essenciais e pagamento de dívidas. Esta situação verificar-se-á em muitos países do mundo.

15- Existe a hipótese de que algum tipo de descontinuidade provoque uma repentina mudança para pior das condições financeiras.

Será que a economia vai descarrilar? Honestamente, não sei.

Penso que existem alguns factores que poderão ajudar a prevenir uma grande ruptura em 2008.

Em primeiro lugar, os acontecimentos tendem a desenrolar-se gradualmente. A economia possui um ímpeto significativo e isto tenderá a manter as coisas como estão. Levará alguns meses até que as notações de risco baixem e para que esta informação seja incluída nos balanços dos bancos e seguradoras. Se algumas das seguradoras de títulos e hipotecas estiverem realmente falidas, a sua identificação levará ainda mais tempo. Alguns dos problemas potenciais a que aludi poderão não acontecer antes de 2009 ou posteriormente.

Em segundo lugar, os reguladores de vária ordem têm o poder de mudar as regras à medida que avançam. Têm a capacidade de negligenciar empréstimos que não rendem e de fazer baixar as necessidades de capital. Podem emprestar dinheiro aos bancos, usando como garantia os títulos de crédito que a maioria considera sem valor. Podem criar, no mínimo, uma determinada quantia de capital novo. Em alguns casos, poderá ser requerida a aprovação do congresso para estas abordagens, mas se a alternativa resumir-se à falência dos bancos e outros negócios, o congresso irá provavelmente pactuar com qualquer proposta de planos de emergência.

Em terceiro lugar, de forma a manter as coisas a funcionar, o que é necessário é manter o dinheiro em circulação. Até certo ponto, os problemas que enfrentamos são problemas de balanços – valores de activo e passivo. Gostaria de ver mais resultados da acção da Agência de Garantia de Benefícios e Pensões (Pension Benefit Guaranty Corporation) – pagando benefícios, apesar dos compromissos financeiros serem mais altos do que os activos. É possível atrasar o momento da verdade através de uma valorização optimista dos fundos, usando taxas de desconto elevadas sobre as obrigações e concentrando-se no capital para as transacções actuais.

Finalmente, parece que algo vai acontecer para travar o desfile. Uma possibilidade é os EUA deixarem de encontrar compradores para todo o endividamento criado. Isto não ocorrerá até que haja uma aceitação geral do pico petrolífero. Uma outra é que os insucessos do sistema financeiro se sucedam de tal forma que impossibilite a sua sustentabilidade. Outra possibilidade é o predomínio da hiperinflação. Se é certo que alguma delas, ou qualquer outra adversidade, vá provavelmente ocorrer, não sei se será em breve.

Por que é esta informação sobre o sistema financeiro importante para as companhias petrolíferas e outras companhias no campo da energia?

Ter um sistema financeiro a funcionar é muito importante do ponto de vista da produção petrolífera e sistema de distribuição. As companhias petrolíferas têm de ser capazes de pagar aos seus trabalhadores. Têm de estar aptas a contrair empréstimos para iniciar novos projectos. Têm de estar aptas para fazer contratos com outras companhias para serviços necessários, como alugar equipamentos de perfuração. Têm de estar preparadas para negociar petróleo do estrangeiro e pagar, utilizando métodos de transacção estáveis. Tudo isto poderá ser problemático, caso se verifiquem muitas falências de bancos ou outras questões graves no sistema financeiro. Isto possui o potencial de criar um mecanismo de resposta negativo que irá limitar ainda mais o fornecimento de petróleo.

Notas
[1] Banco de investimentos norte-americano.
[2] Sociedade governamental americana que procura garantir os depósitos dos bancos comerciais.


O original encontra-se em http://www.theoildrum.com/node/3382 . Tradução de Ernesto Correia.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
17/Jan/08