A iminente desordem energética mundial
por Robert L. Hirsch
Robert L. Hirsch, Roger Bezdek e Robert Wendling foram co-autores de
"A iminente desordem energética mundial: O que é e o que significa para si" ("The Impending World Energy Mess: What It Is and What It Means to You")
, um livro agora editado pela Apogee Prime.
Hirsch trabalhou toda a sua vida na área da energia, desde o sector
petrolífero a numerosas formas de produção de energia
eléctrica. Em 2005 a sua equipe publicou "The Peaking of World Oil
Production: Impacts, Mitigation & Risk Management".
Esta entrevista, conduzida por Steve Andrews, foi publicada no boletim da
ASPO-USA
,
Peak Oil Review,
de 13/Setembro/2010.
Andrews: No seu trabalho anterior de cinco anos atrás, mostrou-se
relutante em prever um prazo temporal para o Pico Petrolífero. Parece
que neste livro houve uma grande mudança sob este aspecto. Poderia
comentar?
Hirsch:
Nos anos passados havia considerável incerteza no meu pensamento acerca
de quando o declínio da produção mundial de
petróleo poderia começar. Recentemente tornou-se claro para mim
que ela será mais cedo do que tarde. Acredito que o início do
declínio da produção mundial de petróleo é
provavelmente nos próximos dois a cinco anos. E quando digo
"petróleo" quero com isso dizer todos os combustíveis
líquidos.
Andrews: O sr. diz que, uma vez atingidos pelo declínio da oferta de
petróleo, provavelmente todos nós experimentaremos um agravamento
da situação económica mundial. Como é que isto pode
desdobrar-se? Qual é o cenário mais provável?
Hirsch:
Nossa ideia é que o que aconteceu nos dois choques petrolíferos
súbitos de 1973 e 1979 provavelmente será repetido quando
começar o declínio da produção. Aqueles foram dois
exemplos do mundo real de choques petrolíferos que surpreenderam as
pessoas e provocaram pânico. Acreditamos que a mesmo espécie de
coisa está em vias de acontecer outra vez, excepto que o problema
é para perdurar porque, ao contrário de antes, haverá
muito poucas válvulas não utilizadas de abastecimento de
petróleo para abrir nesse momento.
Se bem que as economias tenha mudado desde os anos 1970, a dependência e
a importância dos combustíveis líquidos não mudou. E
a natureza humana não mudou. As pessoas entram em pânico quando
são subitamente aterrorizadas. Muito embora o "Pico
Petrolífero" seja reconhecido por um certo número de
pessoas, ele está por perceber numa escala vasta.
Neste livro evitámos considerar fenómenos tais como anarquia,
guerras e outras catástrofes que são concebíveis. Vemos
muito pouca probabilidade de que as coisas venham a ser melhor do que o que
descrevemos, mas elas poderiam facilmente ser piores.
Além disso, temos fé em que a espécie humana não
está em vias de entrar em colapso por causa do problema do
declínio do petróleo. O mundo vai entrar em considerável
sofrimento por um longo tempo. No entanto, temos muita fé na
resiliência humana. As pessoas recuperar-se-ão, ficarão
muito pragmáticas, trabalharão arduamente e farão o que
é necessário para enfrentar os desafios. Em resultado, quando
tivermos atravessado tudo isto o que vai levar mais de uma década
as sociedades que emergirão serão muito mais fortes e mais
pragmáticas do que hoje.
Andrews: Você observa que não haverá consertos
rápidos. Que combinação de programas de emergência
recomenda actualmente como centro de quaisquer esforços políticos
acelerados?
Hirsch:
Nós delineámos opções práticas de
mitigação física para o mundo. Elas são aquelas que
descrevemos em 2005, mais ou menos umas poucas mudanças devido ao facto
de sermos agora um pouco mais inteligentes em algumas áreas. No livro,
acrescentámos aquilo que chamamos "atenuação
administrativa", tais como partilha de carros
(carpooling)
obrigatória, trabalho a distância obrigatório e
racionamento. Há benefícios a serem ganhos com estas
opções, mas a sua implementação não
será simples.
Por exemplo: o racionamento parece um conceito relativamente simples mas,
depois de se considerar os pormenores, é incrivelmente complicado devido
a decisões que têm de ser feitas, às burocracias que
têm de ser montadas e a fiscalização do cumprimento que tem
de aplicada. O entendimento das complexidades é necessário para a
tomada de decisões práticas.
Andrews: O sr. introduz uma nova sigla no seu livro. O que significa LFROI?
Hirsch:
Ela representa Liquid Fuels Return on Investment (Retorno de
Combustíveis Líquidos sobre o Investimento). A questão
é simplesmente que temos de investir combustíveis líquidos
no processo que vai produzir combustíveis líquidos, temos de
preferência de obter um grande multiplicador sobre o nosso investimento
em combustíveis líquidos ou o esforço não
valerá a pena. O conceito é claramente de importância
fundamental. As opções em que LFROI é de particular
preocupação são os processos
biomassa-para-líquidos, como o milho e o etanol celulósico, em
que grandes investimentos de combustíveis líquidos são
exigidos para colher e transportar biomassa para processamento.
Andrews: Convém recordar aqui que, desde 1978, a maior parte do
investimento regular que temos feito em combustíveis alternativos
é em etanol a partir do milho. Se o senhor fosse discursar perante o
presidente dos EUA e o Senado como Czar da Energia, o que é que lhes
diria acerca da política que efectuámos em relação
ao etanol do milho?
Hirsch:
Eu lhes diria para aprenderem com os erros passados. O etanol do milho era
atraente sob muitos aspectos, mas verificou-se ser um perdedor do ponto de
vista da energia, do custo e do ambiente. As pessoas estavam a agarrar em
palhas trocadilho intencional, desculpe. As pessoas no governo federal
queria fazer algo para coibir importações de petróleo e
ajudar os agricultores. Eu próprio quero proteger os agricultores, parte
da minha infância foi na propriedade agrícola do meu avô.
Ao invés de agarrar esta ou aquela opção que parece boa,
para uma abordagem séria o governo precisa efectuar uma análise
energética imparcial de modo a que possam ser tomadas decisões
pragmáticas e que o sector privado possa executar a sua
aplicação inteligente e livre. Exactamente agora estamos metido
numa confusão porque os governos estão a escolher vencedores e
perdedores e a estrangular os nossos sistemas energéticos.
Dentre outras coisas que discutimos no livro está a
produção de energia eléctrica de origem solar e
eléctricas, as quais são perdedoras porque não
proporcionam o que o público pede energia eléctrica quando
solicitada
(on demand).
E não esqueçamos o facto muitas vezes ignorado de que as
opções de produção de energia eléctrica
terão pouco impacto sobre as nossas importações de
petróleo e os iminentes problemas de escassez de petróleo durante
muito longo tempo.
Andrews: O sr. declara que as prioridades da sociedade mudarão
dramaticamente. Pode expô-las?
Hirsch:
Uma das maiores questões em cima da mesa é a
alteração climática aquecimento global. As
preocupações relacionadas com o mesmo terão de ser
abandonadas às necessidades urgentes da existência humana imediata
depois de a produção mundial de petróleo começar a
declinar. As nossas economias não podem florescer com preços
muito elevados de combustíveis líquidos cuja escassez está
a agravar-se. Será exigida atenuação maciça,
rápida e séria. Não podemos tudo ao mesmo tempo, o que
significa que os esforços quanto ao aquecimento global e os sonhos de um
futuro com energia renovável estarão a ser secundarizados frente
à necessidade urgente e ampla de recuperar alguma espécie de
razoável equilíbrio económico.
Andrews: Como algumas destas mudanças de prioridade na sociedade
serão reflectidas a nível individual?
Hirsch:
Todos nós sofreremos impacto com o declínio da
produção mundial de petróleo. Os custos do
combustível líquido subirão dramaticamente foi o
que aconteceu em 1973 e 1979 e isso acontecerá outra vez. Haverá
escassez, a qual provocará toda espécie de problemas.
Haverá aumento do desemprego e declínios dramáticos nos
mercados de acções. E haverá inflação. Isso
aconteceu antes e é lógico que acontecerá outra vez,
excepto que desta vez o sofrimento perdurará um bocado mais.
A questão então vem a ser o que é que cada um de
nós como indivíduo faz para nos protegermos. No penúltimo
capítulo do nosso livro discutimos as questões e os investimentos
que as pessoas deveriam evitar, lugares para onde olhar a fim de proteger o seu
pé-de-meia e coisas que se podem fazer para minimizar seu dano pessoal.
Por exemplo: se tiver uma casa no país, longe de uma mercearia e de
lugares onde possa trabalhar, provavelmente terá um tempo muito
árduo quando o valor daquela propriedade declinar. Recorde que a
razão primária de aqueles lugares serem viáveis foi a
gasolina abundante e barata, a qual permitia às pessoas irem e virem
dali.
Andrews: Quando se chega às opções pessoais, o sr. escreve
que os indivíduos precisam entender a situação a fim de
efectuarem as opções mais inteligentes. Qual é a chave
desse entendimento? Por que não há mais pessoas a
compreendê-lo?
Hirsch: A chave para fazer opções inteligentes é ter
60-80% da informação relevante. Menos de 50% é
insuficiente muitas vezes, enquanto esperar por mais de 90% significa que
provavelmente esperará demasiado. O assunto do declínio da
produção petrolífera mundial ("Pico
Petrolífero") é desagradável e penoso, de modo que
tentar escondê-lo pode ser compreensível, mas o problema
não irá embora. Quantos de nós realmente gostam de ouvir
más notícias e quanto de nós são suficientemente
pragmáticos para actuar racionalmente diante de notícias
más?
A administração actual e anterior dos EUA tentou arduamente
minimizar a discussão do "Pico Petrolífero" porque
é realmente má notícia. Quando a consciência do
público for elevada sobre este assunto, este ficará furioso com
os governos: por que não nos contaram acerca disto e o que vão
fazer quanto a isso? Educar-se a si próprio adiante do problema
dá-lhe a melhor oportunidade de enfrentá-lo efectivamente, ao
invés de ser arrastado com a corrente.
Andrews: Voltando um pouco atrás, que opções está a
fazer na sua vida pessoal e familiar que antecipem os problemas de energia que
se aproximam?
Hirsch:
Um dos diapositivos na próxima apresentação na
conferência da ASPO-USA em Washington intitula-se "Algo do que tenho
feito". Ali listo seis pontos. Anos atrás, passei por um
ajustamento mental e emocional relativamente ao que provavelmente aconteceria
quando a produção mundial de petróleo declinasse e
ponderei quando poderia começar. Considerei que não sabia, mas
que queria estar à frente do problema e não atrás dele.
Assim, pus "à prova de Pico Petrolífero" os meus
investimentos e a minha vida pessoal num grau que considero razoável.
Pelas razões esboçadas no nosso livro, livrei-me de quase todas
acções e títulos. Investi em algumas anuidades
(annuities,
pensão anual), as quais pagam bom juro e das quais podia sair
rapidamente, e raciocinei que o ouro ia subir dramaticamente quando a
inflação relacionada com o petróleo atacasse.
Mudámo-nos para uma casa mais próxima para ir às compras e
da massa de trânsito e troquei o meu carro beberrão de gasolina
por um Prius. Os primeiros quatro passos por acaso ajudaram-nos a aguentar a
"Grande Recessão". Uma vez que acredito agora que a
produção mundial de petróleo provavelmente
começará a declinar dentro de dois a cinco anos, penso que fiz
tanto quanto podia para proteger a minha família.
Andrews: O senhor no livro diz que escava "realidades que outros
estão relutantes em discutir". Como assim?
Hirsch:
Estávamos a referir-nos ao iminente declínio da
produção mundial de petróleo e o seu significado; a
questão da alteração climática, ambas as incertezas
e os jogos deploráveis efectuados por muitos na comunidade ambiental. As
realidades das outras fontes de energia, incluindo renováveis
nós usamos a expressão "as pessoas estão intoxicadas
sobre renováveis" e finalmente que acções as
pessoas podem tomar para minimizar o dano que é provável quando a
produção mundial de petróleo entrar em declínio.
Andrews: Para pessoas já familiares com a mudança de paradigma
que relatou em 2005, o seu livro é primariamente uma
construção lógica sobre aquele fundamento ou pensa que se
afastou substancialmente das descobertas daquele estudo?
Hirsch: As descobertas do nosso estudo de 2005 mantiveram-se notavelmente bem
ao longo dos últimos cinco canos. Ninguém argumentou com
veemência de que as nossas estimativas de atenuação
estivessem erradas. Alguém poderia argumentar acerca de pormenores das
nossas estimativas, mas a história permanece basicamente a mesma. No
livro, actualizamos nossas considerações anteriores e
acrescentámos algumas coisas.
Uma das maiores diferenças entre 2005 e os dias de hoje é que,
naqueles tempos, tendíamos a pensar em termos de "Pico
Petrolífero" como um pico relativamente agudo a
produção a ascender e então, subitamente, entrando em
declínio. Foi isso que aconteceu nos EUA-48 estados. Agora não
pensamos em termos de um pico agudo porque a produção mundial de
petróleo tem estado num planalto flutuante desde meados de 2004
com produção mundial essencialmente constante. Consideramos que o
planalto muito provavelmente continuará durante os próximos dois
a cinco anos e então começará o declínio. Assim,
quando digo "Pico Petrolífero" o que estou realmente a falar
é acerca do iminente declínio da produção mundial
de petróleo em relação à flutuação
existente. Por vezes utilizo a expressão "Pico
Petrolífero" porque ela é amplamente conhecida, mas agora
não é um descritor estritamente preciso. A propósito, sabe
de alguém que tenha previsto o actual planalto de cinco anos na
produção mundial de petróleo? Eu não sei.
Andrews: Então, afinal de contas, porque escreveu o livro?
Hirsch:
Juntamente consigo e muitos outros, estive a falar e a escrever acerca deste
assunto durante anos. Um certo de número de livros e artigos foram
escritos, mas a questão ainda está "abaixo do
horizonte" para o público em geral. Minha esperança era que
o tipo de livro que podíamos escrever pudesse fazer uma diferença
sensível. Assim, fizemos o esforço.
Ao colocar as questões do petróleo, da energia e do clima e ao
escrever seleccionando cuidadosamente as nossas palavras, esperamos sermos
capazes de melhor comunicar uma audiência vasta de pessoas e de modo
concebível fazer uma diferença. Foi por isso que o escrevemos.
Andrews: Por que as pessoas deveriam comprar o livro?
Hirsch: As pessoas deveriam comprar porque as questões são muito
importantes para elas nas suas vidas pessoais. Elas precisam entender os
problemas, ainda que desagradáveis. As probabilidades de não
ficarem queimados são essencialmente zero. Ser prevenido é estar
preparado.
O original encontra-se na revista
VGN.
Para descarregá-la (44,3 MB) clique
http://www.apvgn.pt/capa/vgn_03.pdf
.
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/
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