Pico Petrolífero
Onde estão os economistas?

por Peter Pogany [*]

Características dos autistas. O mundo está "efectivamente" nos espasmos do Pico Petrolífero. Os preços do bruto e dos refinados tendem para cima ao mesmo tempo que os mercados se tornam cada vez mais sensíveis a notícias e rumores.

Tempestades junto a portos, perturbações num país produtor do terceiro mundo ou retórica populista e com floreados geopolíticos do seu líder, um acidente num oleoduto, um encerramento para reparações, novas preocupações acerca de taxas de câmbio — qualquer destas coisas seria suficiente para os media financeiros informarem que "saltam os preços no mercado de futuros devido a preocupações quanto à oferta".

Mas nessa altura uma única opinião crível (mesmo que ela seja astuciosamente calculada e atempada) pode fazer com que as sombras se desvaneçam momentaneamente: "Os preços do petróleo bruto caem. Estará ultrapassada a corrida ao mercado? Os dados do passado confirmam o recuo".

O que estamos a testemunhar é a consciência intensificada quanto às disponibilidades juntamente com um potencial crescente para amplificar pequenas margens em grandes ganhos ou perdas. Isto é o que significa estar "efectivamente" no pico — o resultado sumário de realidades económicas, negociais, tecnológicas, institucionais e políticas a ganharem a cena frontal em relação às incertezas geológicas.

A deslocação económica (isto é, recessão ou pior) não resolverá o problema.

Como Keynes nos recordaria de além túmulo, por que assumiria o capital privado enormes compromissos para construir e expandir a infraestrutura para um input substitutivo mais caro (produtos petrolíferos não convencionais) quando a procura agregada é morosa?

Talvez as autoridades públicas pudessem ajudar. Sim, mas onde governos de países industrializados, já a lutar com dívidas, obtêm os recursos para abastecer a economia do mundo com os cobiçados substitutivos do petróleo convencional? Novos impostos poderiam piorar as perspectivas de crescimento (ameaça de deflação) e "pressionar a bomba" (criar e gastar moeda) poderia acelerar a inflação. Vender activos nacionais? (A não atractividade de qualquer destas abordagens não exclui, naturalmente, a sua aplicação futura).

QUEDA PARA 58 E 39 MILHÕES B/D, EM 2020 E 2030

O independente Energy Watch Group projecta um grande declínio no consumo global de petróleo, do nível actual de mais de 80 milhões de barris por dia para 58 milhões em 2020 e 39 milhões em 2030 (nem sequer metade do consumo actual). Uma vez que as tendências actualmente observadas excluem o preenchimento do fosso com energia não-exaurível e substitutivos verdes de refinados de petróleo, as previsões optimistas acerca de um crescimento económico vigoroso (acompanhado por uma lenta mas firme ascensão no consumo de petróleo) durante as próximas décadas parecem ser irrealistas. Será que o esticar das capacidades de produção do Médio Oriente altera estas projecções, afastando-as no tempo por uns poucos anos?

Não há resposta precisa mas é claro que a actual geração já terá de se adaptar a um mundo de constrangimento petrolífero. Isto posto, não seria de esperar que os melhores e mais brilhantes profissionais das Ciências Económicas saíssem à liça quando ventos ameaçadores assopram sobre a excitada linha de frente do interesse humano geral, a defender nossa civilização, a analisar, a argumentar apaixonadamente, a aconselhar governos nacionais e organizações internacionais, não permitindo jamais que o sentido de urgência se afaste da consciência pública?

Se mantinha tais expectativas, ficará sem fôlego ao olhar os conteúdos mostrados nos índices das principais publicações de Ciências Económicas.

Como fartamente demonstrado pelas edições mais recente do American Economic Review, Econometrica, Journal of Political Economy, Journal of Economic Theory, Quarterly Journal of Economics, Journal of Econometrics, Econometric Theory, Review of Economic Studies, Journal of Business and Economic Statistics, Journal of Monetary Economics, Games and Economic Behavior, Journal of Economic Perspectives, Review of Economics and Statistics, European Economic Review e International Economic Review, o assomar da emergência petrolífera não liberta as asas da criatividade nos mais elevados escalões da profissão. (A lista de publicações foi tomada do Professor W.C. Horrace, da Universidade de Syracuse). [NR]

O SENHOR PRESTIMOSO & A SENHORITA IRRESISTÍVEL

Será que a maior parte da academia ainda acredita no mito simplista de que — graças à interacção ininterrupta entre o sempre prestimoso Sr. Tecnologia Protectora e a irresistível Srtª Mercado Não Regulamentado — o mundo já está prenhe de uma solução para a sua difícil situação petrolífera, e de que a eterna necessidade de bens materiais nunca se deparará com inalteráveis constrangimentos físicos?

O núcleo de convicções dominantes, com sabor neoclássico (grosso modo neoliberal) nas Ciências Económicas implica que a preocupação com o "Pico Petrolífero" nada mais é do que medo amedrontado intensificado por terror aterrorizado. Mas se insistir numa resposta pode obtê-la na forma de uma repreensão: "Você não tem fé suficiente na mão invisível". Qual jovem professor assistente que aspira a um lugar permanente se arriscaria a uma censura tão explícita do presidente do departamento?

Apesar da sua diversidade ostensiva e controvérsias aparentes, a teoria económica permanece agarrada uniformemente à visão de mundo newtoniana de ciclos idealizados que mostram o futuro como uma reflexão simétrica do passado. A morte do autor , de Roland Barthes, tornou-se aplicável ao Economista. Afinal de contas, se fosse efectuado um inquérito junto a profissionais da corrente dominante (uma categoria que exclui o grupo dos economistas ecologistas, mais arejado), ele provavelmente indicaria um expectável declínio nos preços do petróleo para as vizinhanças dos US$45/barril por volta de 2010.

A explicação de que a ciência económica é uma ideologia ao serviço de interesses adquiridos não se mantém. Encorajar decisores políticos na crença de que mordiscar nas margens, persuasão moral e cenários de sublimes objectivos pode substituir profundas e inéditas mudanças políticas bem como programas drásticos prejudica toda a gente, incluindo os interesses adquiridos.

A questão petrolífera global é mais iminente e directamente ameaçadora do que o do "ambiente". Mas onde está o "Al Gore" do Pico Petrolífero? Pelo menos agora já sabemos onde não procurar.

23/Abril/2008

[NR] Em Portugal, o motor de pesquisa no sítio web da Ordem dos Economistas apresenta 0 (zero) resultados para a expressão "Pico Petrolífero".

[*] Economista, autor do livro Rethinking the World .

O original encontra-se em http://www.energybulletin.net/43046.html


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
25/Abr/08