Os motivos da operação israelense
Pillar of Cloud
por Rui Pedro Fonseca
[*]
A operação
"Pillar of Cloud"
foi levada a cabo por Israel no dia 14 de Novembro, durante cinco dias,
precisamente uma semana após a reeleição de Obama, e a
poucos meses das eleições em Israel. Os
mass media
Ocidentais de referência indicaram a operação
"Pillar of Cloud"
efectuada por Israel como resposta de "autodefesa" aos ataques
palestinianos ao sul de país. É verdade que existiram disparos de
facções armadas palestinianas, mas porquê e quando é
que começaram a ser disparados os rockets artesanais a partir de Gaza?
Dois dias antes das ofensivas militares de Israel em Gaza ocorrerem, as
forças IDF
(Israel Defense Forces)
dispararam e mataram um rapaz de 13 anos que jogava futebol com os seus
amigos na aldeia de Abassan, a 1,5km dos soldados israelenses. Ainda no
decorrer do mês de Outubro de 2012, militares da IDF haviam matado 15
palestinianos. A 10 de Novembro outros/as quatro jovens civis, entre 16 e 19
anos, foram também assassinados/as.
Mas o cessar-fogo das fações armadas em Gaza veio apenas a ser
interrompido a 14 de Novembro de 2012 com o assassinato de Ahmed al-Jabari,
líder militar do Hamas, o negociador que permitiu a troca de
prisioneiros entre o soldado israelense Ghalit por cerca de mil prisioneiros
palestinianos. A própria Amnistia Internacional atesta que foi o
assassinato de Ahmed al-Jabari
que despoletou o conflito armado entre civis em Gaza e as IDF no sul de Israel,
e originou a posterior operação israelense
"Pillar of Cloud".
[1]
Ahmed al-Jabari foi também o negociador intermediário de
vários movimentos dentro de Israel e do Egipto para um cessar-fogo a
longo termo. O jornal israelense
Haaretz
revela que Jabari foi assassinado quando alegadamente possuía uma
cópia de um acórdão de paz com Israel
[2]
A operação
"Pillar Cloud"
permitiu, então, interromper e inviabilizar, mais uma vez, qualquer
tipo de negociações entre Israel e Palestina.
Adicionalmente,
"Pillar of Cloud"
procurou assegurar a
capacidade de dissuasão (deterrence capacity)
de Israel. Depois de Netanyahu andar (em vão) pela Assembleia
Geral das Nações Unidas a pregar como um demente a
"red line"
sobre energia nuclear iraniana (supervisionada pela Agência Internacional
de Energia Atómica) para que os EUA bombardeassem o Irão,
resolveu usar o grande bastão militar e investir em Gaza para demonstrar
a
capacidade de dissuasão
de Israel e procurar restabelecer o medo no mundo árabe. Também
aqui, nada de novo. Já no massacre de 2008/2009 designado de
Operação
"Cast Lead",
o próprio correspondente do Médio Oriente Ethan Bronner
afirmara, depois da contundente derrota de Israel no Líbano (em 2006)
pelas forças Hezbollah, que era importante
"restabelecer a capacidade de dissuasão israelense"
porque
"os seus inimigos têm menos medo de Israel do que antes
(
)."
[3]
Depois do ataque de 22 dias a Gaza (2008/2009), Israel montou um sistema
antimísseis designado de
"Iron Dome"
que, no decorrer da operação deste ano, veio a interceptar cerca
de 90% dos rockets lançados pelo Hamas.
[4]
A operação
"Pillar Cloud"
permitiu testar este sistema antimísseis contra eventuais ataques
aéreos que cheguem do Líbano, Gaza e, sobretudo, do Irão,
caso Israel se envolva militarmente. Dois dias antes do ataque a Gaza, o
próprio ministro da Defesa Ehud Barak disse, no dia 12 de Novembro, que
o exercício
"tinha a profunda cooperação dos americanos, e que seu
objetivo era tornar o sistema apto para lidar com futuras
situações."
[5]
A Operação
"Pillar of Cloud"
também permitiu continuar a anexar mais território palestiniano.
O jornal israelense de referência
Haaretz
afirma que
"apenas em 2012 Israel destruiu 569 edifícios e outras
infraestruturas palestinianas, incluindo poços de água e 178
casas. No total 1014 pessoas ficaram afetadas pelas
demolições."
[6]
Os bombardeamentos surgem, durante o mês de Julho de 2012, num momento em
que foram aprovadas as construções de mais de 850 casas colonatos
na Cisjordânia, e em que o parlamento israelense rejeitou pagar uma multa
para legalizar algumas casas na área e compensar palestinianos/as.
[7]
O Centro de Direitos Humanos de Israel B´Tselem indicou que a
operação
"Pillar of Cloud"
matou cerca 102 palestinianos, dos quais 19 são menores e 10 são
mulheres
[8]
. Do lado de Israel morreram 3 pessoas. A fome tem sido também uma
estratégia utilizada como forma de aumentar a ocupação
militar da Palestina; e esta operação, em particular, dizimou
campos agrícolas em Gaza: o ministro da Agricultura estimou perdas da
agricultura e pesca acima dos US$50 milhões
[9]
; e o ministro da Saúde declarou que Gaza está sem 40% dos seus
medicamentos básicos.
[10]
De Israel, o ministro do Interior Eli Yishai sustentou que a
operação
"Pillar of Cloud"
deveria ter um bombardeamento mais intensivo:
"Gaza deveria ser enviada para a Idade Média".
[11]
Já o jornalista Gilad Sharon, filho de Arial Sharon, defendera num
editorial no
Jerusalem Post
que Israel precisa de
"espalmar bairros inteiros de Gaza. Espalmar tudo em Gaza. Os
norte-americanos não pararam em Hiroshima porque os japoneses não
se renderam rápido o suficiente, e por isso Nagasaki também foi
atingida."
[12]
Independentemente da ocupação de Israel em território
palestiniano, assim como da sua hostilidade para com os povos vizinhos, a
vitimização constante de Israel tende cada vez mais a cair em
saco roto, e a hostilidade é cada vez mais notória. Embora a
operação
"Pillar of Cloud"
tenha sido relatada por grande parte dos
media
ocidentais como contra-terrorismo, a verdade é que as críticas
têm-se vindo a fazer sentir cada vez com mais veemência pela
comunidade internacional: milhares vieram às ruas criticar Israel e o
compadrio dos EUA: os massacres; a ocupação; a limpeza
étnica; o cerco e bloqueio (à livre circulação de
pessoas, entrada de alimentos e medicamentos); o controlo do espaço
terrestre e aéreo; os colonatos ilegais que têm tido lugar na
Palestina. Por mais que alguns
media
de referência ainda se esforcem, não há mais como
disfarçar o óbvio que perdura há 45 anos: que a
expansão de território israelense e a limpeza étnica na
Palestina estão em curso. Embora em grande parte do jornalismo de
referência se note a tentativa de mascarar a realidade e ignorar o
direito internacional, não utilizando a linguagem apropriada para com
determinadas ocorrências, a verdade é que Israel não
pára de cometer atentados terroristas em "território
palestiniano ocupado". A Palestina está sob ocupação
e as fronteiras definidas pelas Nações Unidas em 1967 não
são cumpridas por Israel. A expansão do território e o
colonialismo de Israel jamais poderão ser encarados como
"autodefesa". E esta é a raiz do problema.
(1)
Amnisty International
(2)
"Israeli peace activist: Hamas leader Jabari killed amid talks on long-term truce"
, Haaretz
, 26 November 2012
(3)
"Gaza goal to re-establish Israeli deterrence?"
, Ethan Bronner, 29 December 2008,
New York Times,
(4) Cf.
"Iron Dome: A Missile Shield That Works",
Mark Thomspon, 19 November 2012,
Time U.S.
(5)
"IDF and U.S. Army launch four Patriot missiles as part of mass joint drill",
, Gili Cohen,
Haaretz,
12 November 2012
(6)
"Israel's 'right to self-defense' - a tremendous propaganda victory"
, Amira Hass,
Haaretz,
19 November 2012,
(7)
"Israel to build more West Bank homes"
, Aljazeera
(8) Cf.
B´Tselem
(9)
"GazaUnderAttack | Behind the Pillar of Cloud Gaza Severely Maimed"
by Sabbah Report,
November 25, 2012
(10)
Idem
(11)
"Israel's minister of incitement"
, Haaretz,
November 20 2012
(12)
"A decisive conclusion is necessary"
, por Gilad Sharon, 18 November 2012,
The Jerusalem Post
Do mesmo autor:
Irão e Israel: A dupla face dos media e do Conselho de Segurança da ONU
[*]
Investigador, da Universidade do Porto.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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