Balanço dos efeitos do TLCAN no México
As tendências dominantes da economia mundial nas últimas
décadas do século passado foram a globalização e
regionalização. O Tratado de Livre Comércio da
América do Norte (TLCAN) é o reflexo desta última. O
velho projecto da plutocracia e do governo estadunidenses, de levar a cabo a
integração das Américas e do Caribe sob a sua hegemonia e
em seu benefício quase absoluto, conheceu nesses anos um novo impulso,
no quadro do fortalecimento mundial da direita e da imposição da
globalização neoliberal.
A estratégia da primeira potência mundial avançou, e
concretizou-se mais facilmente com a queda da URSS e do bloco soviético,
com a passagem da "guerra fria" a um mundo unipolar e como elemento
da tendência dominante para a formação de mega blocos
económicos e geopolíticos da Europa, Ásia oriental e
Américas.
Como processo de longo prazo, o imperialismo estadunidense no continente
americano passou por várias etapas. As mais recentes concretizaram-se
no
Tratado de Livre Comércio da América do Norte (TLCAN),
que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 1994, e o
Acordo de Livre Comércio das Américas (ALCA),
subscrito em Abril de 2001 por todos os governos do hemisfério, com
excepção de Cuba, e cuja entrada em vigor estava prevista para
janeiro do corrente ano.
É evidente que os ataques terroristas a dois dos símbolos
primordiais do poder no mundo: as torres do World Trade Center de Nova Iorque e
o Pentágono em Washington, modificaram, no tempo e na forma, a agenda
dos donos do poder económico e político mundial e, a partir
daí, também a dos povos em luta contra a pobreza, a
injustiça e a opressão em todas as suas formas.
A entrada em vigor da ALCA não se concretizou devido a uma importante
mudança na correlação de forças com a subida ao
poder de governos opostos ao neoliberalismo e à sua modalidade
liberalizadora na América do Sul, pela incansável luta dos
movimentos alternativos e as forças políticas de esquerda e
centro esquerda. Por isto, os Estados Unidos optaram pelo "Plano B",
que consiste em assinar Tratados de Livre Comércio, individualmente com
os países e grupos de países, como foi o caso do Chile e da
América Central, e a negociação, agora na sua fase final,
com a Comunidade Andina.
No actual contexto, e por ser de interesse para os nossos povos e para as
forças políticas que lutam pela justiça social, a
democracia e o socialismo, o Partido do Trabalho do México deseja
partilhar as suas reflexões colectivas sobre a experiência do
México no quadro do Tratado de Livre Comércio da América
do Norte.
I- Antecedentes
O TLCAN foi concebido como um dos eixos essenciais da estratégia dos
Estados Unidos para recuperar o terreno perdido, nos anos setenta e oitenta,
frente ao processo de formação dos mega blocos económicos
da União Europeia e do Leste asiático. Foi adoptado para
relançar a sua hegemonia económica mundial, mediante o
reforço do seu domínio imperialista, primeiro na região da
América do Norte e, depois, em todo o hemisfério, através
da ALCA.
Neste contexto, o seu antecedente mais longínquo é o
Relatório Hill
de finais dos anos setenta, onde se colocava que devia ser de interesse
estratégico para os Estados Unidos oferecer "as garantias
norte-americanas de compra dos combustíveis mexicanos [...] e
estabilizar os seus preços, bem como comprar os produtos
agrícolas e manufacturados do México sem restrições
[...] (e) uma solução para o problema dos trabalhadores
migrantes, mediante a eliminação das barreiras migratórias
existentes [...]. Além disso, os Estados Unidos garantiriam a
segurança militar desta comunidade económica e estenderia as suas
operações no Caribe".
Desde logo foi, e continua sendo, de primordial interesse para o imperialismo
estadunidense deixar permanentemente de lado o tema migratório, enquanto
acelerou a formalização do livre fluxo das suas mercadorias e
capitais, bem como assegurou o abastecimento barato e suficiente de energia
para o seu gigantesco aparelho produtivo.
Esta estratégia imperialista foi imposta ao México a partir de
1982, com a adopção do modelo neoliberal por parte do novo grupo
governante. A partir de Washington, o governo dos Estados Unidos e as
agências económicas multilaterais (FMI, Banco Mundial, BID, etc)
ditaram que regeriam (e ainda regem) a política económica
mexicana: redução do défice fiscal, controlo da
inflação, privatização dos activos públicos,
abertura comercial autonomização do banco central.
O governo mexicano não só não opôs resistência
a esta imposição imperialista como, inclusivamente, estava
convencido de que com este modelo o México acederia ao mundo do
desenvolvimento, e que o sector exportador de manufacturas e serviços
seria o motor do crescimento. Isto levou à entrada do México no
GATT em 1985, e à entrada em vigor, em 1 de Janeiro de 1994, do Tratado
de Livre Comércio entre o México, o Canadá e os Estados
Unidos, conhecido como Tratado de Livre Comércio da América do
Norte (TLCAN). Era a primeira etapa da estratégia imperialista
estadunidense de criar o ALCA sob o seu domínio e, com esta base,
relançar a sua hegemonia económica mundial a longo prazo.
II- Características
Pelo seu conteúdo, o TLCAN foi o procedimento através do qual o
Canadá, os Estados Unidos e o México criaram uma
zona de comércio livre de segunda geração
, ao incluir não só o intercâmbio de mercadorias, mas
também de serviços, os investimentos e a propriedade intelectual.
Neste marco formal, os temas substantivos que se acordaram com o TLCAN foram os
seguintes:
-
Acordo nacional e acesso de bens e serviços
-
Regras de origem
-
Sector agro-pecuário
-
Investimentos
-
Sector energético e petroquímica
-
Serviços financeiros
-
Política de concorrência e monopólios
-
Compras do sector público
-
Propriedade intelectual
-
Medidas de normalização do Tratado
-
Salvaguardas e solução de conflitos
Também se estabeleceram tempos diferenciados para a
liberalização de sectores e ramos, supõe-se que em
função do desenvolvimento relativo dos mesmos em cada
país. Por outro lado, no interesse dos Estados Unidos, deixou-se de
fora o tema migratório; e o México pediu (pelo menos formalmente)
para não se incluir o tema petrolífero.
Uma característica importante do TLCAN radica em não se terem
estabelecido salvaguardas compensatórias para reduzir os efeitos
negativos e potenciar os positivos, nas relações de
comércio livre do México com o Canadá e especialmente com
os Estados Unidos.
Não obstante, para justificar a aprovação do TLCAN, o
governo mexicano de turno afirmou que se atingiriam os seguintes objectivos:
-
Vinculação da economia mexicana ao principal centro
económico mundial.
-
Assegurar o acesso amplo e permanente dos produtos mexicanos a um mercado de
mais de 350 mil consumidores.
-
Redução das distorções e estabelecimento de regras
claras e segurança nas nossas relações económicas
com os Estados Unidos e Canadá.
-
Abrir a oportunidade de especializar a nossa produção onde
tínhamos vantagem.
-
Elevar os benefícios dos consumidores ao disporem de mais mercadorias,
melhor qualidade e menor preço.
-
Atrair mais investimento externo e com isso gerar mais empregos e melhores
salários para os mexicanos.
-
Incentivar a inovação, a criatividade e a competitividade das
empresas mexicanas nos mercados internacionais.
-
Superar obstáculos estruturais e incorporar o México no mundo
desenvolvido.
-
Contribuir para a expansão do comércio, a
cooperação e o desenvolvimento harmónico internacional.
Em sentido estrito a maioria destes objectivos derivava do primeiro, ao
procurar a vinculação da economia mexicana com a dos Estados
Unidos. No entanto, desde antes da segunda guerra mundial, esta economia
já absorvia cerca de 60% das vendas mexicanas ao exterior; e na
década de oitenta a porcentagem já superava os 70%. Em todo o
caso, o TLCAN não só contribuiu para conseguir
condições mais favoráveis para as nossas
exportações para aquele país e elevar esse nível
para 80%, como elevou os investimentos exteriores provenientes dos Estados
Unidos.
III- Aspectos favoráveis
Há quem sustente que apesar de todos os problemas, o TLCAN foi o
principal factor da modernização e do relativo dinamismo da
economia mexicana. Esta afirmação é exagerada, ainda que,
sem dúvida alguma tenha tido aspectos positivos. À frente
mencionaremos os mais importantes.
Em teoria, o TLCAN previa criar os benefícios que se obtém ao
estabelecer, adequadamente, uma zona de comércio livre de segunda
geração: eliminar os obstáculos ao comércio de bens
e serviços, garantir a concorrência leal, aumentar as
oportunidades de investimento e proteger a propriedade intelectual.
O comércio recíproco entre o México e os Estados Unidos,
em termos genéricos, triplicou. Mas não está claro que
isso tenha sido, exclusivamente, devido ao TLCAN, porque antes da
negociação do tratado o governo mexicano já tinha
liberalizado mais de 80% das nossas importações provenientes dos
Estados Unidos, e este país mantinha um imposto, entre 3% e 4%, para a
maioria das exportações mexicanas.
Em todos estes anos de TLCAN, o investimento directo estrangeiro (IDE) aumentou
consideravelmente, mesmo sem considerar as operações de
aquisição dos maiores bancos, Banamex e Bancomer, por parte da
banca estrangeira. Não obstante, uma boa parte deste investimento
dirigiu-se à aquisição de activos já existentes na
estrutura económica mexicana, e não a criar novos activos
produtivos.
O TLCAN foi um instrumento eficaz para a integração regional
apenas em três tipos de indústrias: a) máquinas e
aparelhos mecânicos e seus componentes; b) máquinas e aparelhos
eléctricos e seus componentes; e c) automóveis e seus
componentes. Também beneficiou a indústria têxtil, que nos
últimos anos perdeu terreno, face às exportações da
China para o mercado dos Estados Unidos.
Também foi positivo na especialização mexicana de
exportação de frutas e hortaliças. Foi parcialmente
positivo como meio de dirimir diferendos entre as partes.
IV- Aspectos desfavoráveis
Em comparação com os aspectos positivos, os negativos são
consideráveis. Passamos a indicar os mais importantes.
Foi concebido como um dos instrumentos centrais da estratégia
imperialista dos Estados Unidos, assim foi desenhado e implementado durante
mais de década.
O TLCAN consolidou, aprofundou, institucionalizou e deu carácter de
permanência aos diversos aspectos da abertura comercial que se tinha
iniciado nos anos oitenta. Isto foi importante, nada mais.
Ao ampliar e aprofundar a integração/absorção
comercial, fortaleceu os vínculos da economia mexicana com o ciclo
económico dos Estados Unidos; e por isso gerou uma
sobredependência do México em relação à
potência imperial.
Recrudesceu o conflito de interesses entre o público e o privado, na
medida em que o Estado se colocou ainda mais ao serviço das grandes
empresas exportadoras.
Subordinou as políticas fiscal, monetária e financeira do
México às exigências dos Estados Unidos. De facto, pode
afirmar-se que o México ficou sem estas políticas, que são
indispensáveis para impulsionar o crescimento e o desenvolvimento.
O TLCAN não teve um período de preparação que
permitisse reduzir as enormes desigualdades ("assimetrias", na
linguagem da teoria económica burguesa) existentes entre o México
por um lado e os Estados Unidos e o Canadá pelo outro. Também
não se desenharam os instrumentos necessários, nem se
estabeleceram os tempos mais convenientes para alcançar os seus
objectivos.
Não se desenharam políticas públicas que complementassem o
TLCAN, que minimizariam os seus efeitos negativos e potenciariam os positivos.
Foi assim, em parte pelas restrições que, noutros aspectos,
impunha o modelo neoliberal; também porque se acreditava que o TLCAN,
por si só, desencadearia os impulsos requeridos; mas, sobretudo porque
isso não era do interesse dos Estados Unidos, o governo mexicano
sujeitou-se às directrizes que lhe marcaram.
Na ausência de uma política activa, as grandes empresas impuseram
os seus interesses na esperada especialização produtiva. Por isso
mesmo, na ausência de políticas de apoio e fomento da produtivo,
era inevitável que se aprofundasse a crise no campo.
Uma vez negociado o que respeitava ao sector agro-pecuário no TLCAN, o
governo mexicano não lançou uma política sectorial para
atenuar os seus efeitos negativos e potenciar os seus benefícios.
Deixou tudo aos "desígnios do mercado".
Nem sequer aproveitou cabalmente os benefícios que proporciona uma
adequada zona de comércio livre de segunda geração, pois
os Estados Unidos levantam barreiras não comerciais nos sectores em que
o México é competitivo, como a produção de
aço, cimento, vidro, atum, abacate e outros.
Em termos gerais, do ponto de vista produtivo que é o mais
importante o TLCAN contribuiu, decisivamente, para a
desvinculação do sector exportador do resto da economia. Isto
foi acompanhado por um grande debilitamento do mercado interno.
Não se estabeleceram "critérios de desempenho" aos
capitais estrangeiros que ingressaram, como IED, na economia mexicana, quer
dizer: medidas regulamentares e orientadoras do investimento, como a
obrigação de provimento de determinada porcentagem de
fornecimentos e serviços nacionais, equilíbrios comerciais ou de
divisas, transferência de tecnologia e permanência mínima,
entre outros.
Um sector estratégico para impulsionar o desenvolvimento
económico como é o sector de serviços financeiros
foi liberalizado, inclusivamente mais aceleradamente que os compromissos
assumidos no TLCAN. Deste modo, o financiamento interno foi entregue, em quase
90%, às decisões e taxas de juro da banca estrangeira.
Onze anos de TLCAN não lhe creditaram capacidade para impulsionar o
desenvolvimento económico do México. Nos termos em que foi
negociado e executado, não se converteu numa vantagem, antes se
converteu numa pesada carga e um obstáculo ao crescimento e ao
desenvolvimento do México.
V- Balanço sócio-económico e estatístico
Nota prévia: para efeitos deste balanço, deixa-se de lado tudo o
que respeita à relações entre o México e o
Canadá pelo seu escasso significado. Para dar um só exemplo:
actualmente as importações mexicanas provenientes deste
país representam cerca de 4% do total importado e as
exportações para aquele mercado são 1,5% do total.
A experiência mexicana de onze anos no TLCAN deixou claro que nem a
consolidação do impulso exportador iniciado anteriormente, nem o
aumento do investimento externo, nem a especialização produtiva
em sectores competitivos se traduziram em maiores taxas de crescimento e
melhores condições de vida para os mexicanos.
Por outro lado, para especializar a nossa produção exportadora
não era indispensável um tratado comercial, mas apenas a
adopção de uma adequada política industrial, o que foi
totalmente posto de lado quando, em principio dos anos oitenta, se impôs
ao México o modelo neoliberal. Em todo o caso, esta
especialização não teve lugar; apenas se reforçaram
as tendências de uma especialização da estrutura produtiva
mexicana, o que já estava a acontecer antes do TLCAN.
No que respeita à competitividade, nos últimos anos, o
México regista uma descida do México na
classificação
mundial. E quanto a criar novos empregos, elevar os rendimentos dos
trabalhadores e proporcionar melhores condições de vida para os
mexicanos, é evidente que apenas se conseguiu o contrário. A
verdade é que o México não entrou no "primeiro
mundo", bem pelo contrário, encontra-se com graves problemas
próprios do subdesenvolvimento e aumentou a sua dependência para
com os Estados Unidos.
Crescimento do PIB
A taxa de crescimento da economia entre 1940 e 1976, sob o modelo anterior ao
neoliberalismo, foi superior a 6%. Na década anterior à entrada
em vigor do TLCAN (1984-1993), o crescimento foi de 2,5%. Depois do TLCAN,
período de 1994-2004, o crescimento anual do PIB foi de 2,8%. Só
três decimas mais do PIB, enquanto a população cresceu
anualmente a uma taxa de 1,7%. Por outras palavras, depois do TLCAN o mesmo
nível de riqueza criada foi distribuído por mais mexicanos.
Distribuição da riqueza e mais pobreza
Naturalmente, a distribuição da riqueza foi muito desigual: 20%
da população com maiores rendimentos fica com 60% do riqueza
nacional criada anualmente, enquanto os 20% com menores rendimentos repartem
apenas 3,1% dessa riqueza.
O resultado foi o desmedido crescimento da pobreza no México: De acordo
com os dados oficiais, em princípios dos anos noventa, 24% da
população total encontrava-se na situação de
pobreza e 13% na de extrema pobreza; em 2002 a proporção foi,
respectivamente, de 53% e pouco mais de 20%.
A crise no campo, a migração e as remessas
O TLCAN acentuou a menor atenção ao campo, que hoje se encontra
mergulhado na mais profunda crise sofrida desde o
porfiriato.
Nas zonas rurais vive 25% da população, a maioria encontra-se
numa situação de pobreza ou de pobreza extrema e dali partem os
grupos mais numerosos que emigram para os Estados Unidos, procurando melhores
oportunidades, ainda que à custa da própria vida.
Nos anos oitenta, uma média anual de 100 mil mexicanos emigrava para os
Estados Unidos; actualmente estima-se uma média anual de 450 mil. Em
1993, as remessas enviadas pelos emigrantes mexicanos atingiam os 3.673
milhões de dólares; em 2004, multiplicaram-se até atingir
os 16.600 milhões de dólares. Estas divisas converteram-se na
segunda fonte de divisas do nosso país, só superadas pelas
receitas petrolíferas.
Cadeias industriais, desemprego e salários
Por outro lado, o TLCAN abriu, totalmente e em poucos anos, a nossa economia
à concorrência com a economia mais poderosa do planeta. Isto
provocou a ruptura das cadeias produtivas e a falência de milhares de
micro, pequenas e médias empresas industriais, comerciais e de
serviços, que eram as que garantiam mais de 60% do emprego formal no
nosso país.
Em princípios dos anos noventa, a taxa de desemprego real oscilava entre
os 2 e os 3%, e o subemprego reflectido na chamada "economia
informal" era de 35% do PEA; actualmente o desemprego tende a manter-se
nos 3,5 a 4%, enquanto o subemprego chega aos 50% do PEA. Deve acrescentar-se
que, desde 1994 até hoje, se estima que o salário real perdeu
mais de 20% do seu poder aquisitivo. Tudo o que foi dito anteriormente explica
o enorme debilitamento sofrido pelo nosso mercado interno.
Outros aspectos negativos para o México dentro do TLCAN
Maior diferenciação e desigualdade entre as regiões do
país; margens cada vez mais estreitas para definir a política
económica; condições privilegiadas para os investimentos
estrangeiros; enorme e crescente influência dos grupos financeiros sobre
as decisões de política monetária, que é uma das
funções centrais do Estado; fomento da economia especulativa em
detrimento da produtiva; sobre-exploração dos recursos naturais e
deterioração do meio ambiente.
Balança comercial
Entre 1994 e 2003 as importações mexicanas provenientes dos
Estados Unidos cresceram a uma taxa média anual de 7,6%; enquanto na
década anterior (1984-1993) tinham aumentado a uma taxa de 22,4%. Em
contraste, as exportações mexicanas para aquele país
tiveram um comportamento contrário: no período de 1994-2003
tiveram um crescimento médio anual de 12%; enquanto que nos anos de
1987-1993 cresceram 9,3%.
Sob o TLCAN, de 1994 a 2003 as exportações do México para
os Estados Unidos multiplicaram-se por 3,4, enquanto as
exportações procedentes daquele país multiplicaram-se por
2,3. Como resultado desse maior crescimento das exportações, o
saldo bilateral, que era negativo em 2.400 milhões de dólares em
1993, converteu-se num saldo favorável ao México em cerca de 40
mil milhões de dólares em 2003. No entanto, apesar do TLCAN
favorecer a nossa dinâmica exportadora, este resultado deve-se mais
à abertura da economia mexicana que se iniciou em 1982 e ao longo
período de alta da economia estadunidense de 1991-2000.
Devemos sublinhar, também outros três aspectos:
1- O crescimento das exportações do México obedeceu, em
grande medida, ao incremento das exportações de cereais. Do
total das exportações, a exportação de cereais
representou 39% em 1995 e em 2003 chegou quase aos 50%. A balança
comercial do México dentro do TLCAN (principalmente com os Estados
Unidos) foi positiva desde 1995, passando de 13 mil milhões de
dólares nesse ano a quase 40 mil milhões em 2003. Mas se
excluirmos a exportação de cereais, a balança comercial
foi altamente negativa desde 1997, passando de menos 8.200 milhões de
dólares, a quase menos de 24.000 mil milhões de dólares em
2003.
2- Ao concentrar mais de 80% das exportações mexicanas nos Estados
Unidos, a balança com o resto do mundo é deficitária em
maiores quantidades que o saldo favorável (incluindo os cereais) para o
México, registado com o TLCAN. O déficit comercial do
México com o resto do mundo passou de menos 6 mil milhões de
dólares em 1995, para menos 45.300 mil milhões em 2003. Nos
mesmos anos, o saldo comercial do México (incluindo cereais) com o TLCAN
foi positivo, atingindo os 13.100 milhões de dólares em 1995 e
39.700 milhões de dólares em 2003. Por esta razão, o
saldo total da balança comercial do México foi negativo desde
1998 até hoje. Tudo isto se observa no quadro seguinte:
Balança comercial do México
(milhões de dólares)
Ano
|
Saldo do TLCAN
|
TLCAN sem cereais
|
Saldo c/ resto do mundo
|
Saldo Total
|
1994
|
-5.200
|
-11.000
|
-13.300
|
-18.500
|
1995
|
13.100
|
8.200
|
-6.000
|
7.100
|
1996
|
13.500
|
7.100
|
-6.900
|
6.500
|
1997
|
12.500
|
3.600
|
-11.800
|
600
|
1998
|
9.100
|
-1.400
|
-17.000
|
-7.900
|
1999
|
14.500
|
1.000
|
-20.100
|
-5.600
|
2000
|
19.400
|
1.700
|
-35.200
|
-9.900
|
2001
|
25.300
|
6.000
|
-35.200
|
-9.900
|
2002
|
34.700
|
15.900
|
-42.600
|
-7.900
|
2003
|
39.700
|
21.400
|
-45.300
|
-5.600
|
2004
|
n.d.
|
n.d.
|
n.d.
|
n.d.
|
Fonte: Estadísticas de Comércio Exterior, INEGI, 2004
Adicionalmente, assinale-se que nos últimos anos o México perdeu
terreno perante a China no mercado estadunidense, passando do segundo lugar,
depois do Canadá no ano 2000, ao terceiro depois da China em 2003. Com
base nos aspectos anteriormente assinalados que são fundamentais
para o modelo económico de crescimento "para fora" que rege o
México podemos afirmar que o TLCAN está esgotado e,
portanto, também o próprio modelo neoliberal.
Investimento estrangeiro e balança de pagamentos
Para o México, o resultado do TLCAN neste campo foi ambíguo. No
período de 1984-1993 a média anual de IED foi de 1.900
milhões de dólares; com o TLCAN passou a uma média anual
de 7 mil milhões de dólares. O comportamento do investimento
estrangeiro observa-se no quadro seguinte:
Ano
|
IDE
|
Investimento em carteira
|
TOTAL
|
1994
|
10.973
|
1.859
|
12.932
|
1995
|
9.526
|
-13.341
|
-3.815
|
1996
|
9.185
|
3.709
|
12.894
|
1997
|
12.830
|
3.800
|
16.630
|
1998
|
12.346
|
-612
|
11.734
|
1999
|
13.190
|
2.852
|
16.042
|
2000
|
16.598
|
401
|
16.999
|
2001
|
26.843
|
1.092
|
27.935
|
2002
|
14.775
|
47
|
14.822
|
2003
|
10.783
|
779
|
11.562
|
2004*
|
10.292
|
-477
|
9.815
|
*Dados preliminares
Fonte: Anexo, Cuarto Informe de Gobierno, 2004
O IDE não se orientou para a criação de novos activos
produtivos, mas para a aquisição de empresas já existentes
nos sectores comercial e de serviços, destacando-se a compra quase total
da banca comercial mexicana. Cabe acrescentar que, desde a
consumação do "resgate bancário" em 1999
que representou a maior fraude ao povo do México em toda a nossa
história após a independência: cerca de 100 mil
milhões de dólares , as principais fontes de rendimentos
dos bancos são os pagamentos com recursos públicos desse
"resgate", as cobranças de juros pela dívida do governo
federal e as comissões estratosféricas por serviços
bancários. Nas actuais condições, o sistema
bancário não serve o país, é o país que
serve a banca estrangeirada, para esta realizar negócios
astronómicos com um risco próximo do zero.
Não obstante, o investimento estrangeiro (que provém
essencialmente dos Estados Unidos) contribuiu para manter elevados saldos
positivos da Conta Capital. Isto permitiu compensar o persistente
défice da Conta Corrente da Balança de Pagamentos, como se mostra
a seguir.
Balança de pagamentos
(milhões de dólares)
Ano
|
Conta Corrente
|
Conta de Capital
|
Erros e Omissões
|
Saldo
|
1994
|
-26.662
|
14.976
|
-3.705
|
-18.385
|
1995
|
-1.577
|
15.332
|
-4.164
|
9.591
|
1996
|
-2.508
|
4.327
|
-46
|
1.773
|
1997
|
-7.665
|
16.639
|
1.538
|
7.436
|
1998
|
-16.072
|
18.737
|
-526
|
2.139
|
1999
|
-14.012
|
13.903
|
701
|
592
|
2000
|
-18.188
|
18.474
|
2.538
|
2.824
|
2001
|
-18.170
|
25.676
|
-181
|
7.325
|
2002
|
-13.772
|
22.570
|
-1.708
|
7.090
|
2003
|
-8.936
|
17.650
|
724
|
9.438
|
2004*
|
-2.274
|
4.904
|
-934
|
1.696
|
* preliminar
Fonte: Anexo, Cuarto Informe de Gobierno, 2004
Esta situação é insustentável a médio e
longo prazo. Dados recentes da UNCTAD revelam que o IDE, durante 2003,
reduziu-se 23%, em comparação com 2002 e, muito provavelmente,
manterá essa tendência perante o maior atractivo que para os
grandes investidores representam outros países como a China, a
Índia, a Austrália, o Brasil e alguns países recentemente
ingressados na União Europeia. Em todo o caso, também se colocou
em evidência o esgotamento do TLCAN para atrair investimentos externos
significativos, que impulsionem o crescimento económico do México.
VI- Conclusões
O TLCAN passou de meio a fim, subordinando todo o funcionamento do país
às suas exigências. Nestas condições o fracasso era
previsível. A economia mexicana encontra-se sobre uma bomba de
explosão retardada, que está sendo contida, em grande parte,
pelos rendimentos petrolíferos (que beneficiaram dos preços
altos) e pelas crescentes remessas do principal "produto" mexicano de
exportação: a emigração para os Estados Unidos.
O TLCAN foi o factor principal no espectacular aumento das
exportações e, ligeiramente menos, das importações,
uma mudança significativa na balança comercial favorável
ao México em relação aos Estados Unidos, e de um
importante aumento do IDE, proveniente deste país. No entanto,
não produziu os resultados pelo qual o México o subscreveu e
não os produzirá no futuro: impulsionar o crescimento
económico e o desenvolvimento social, contribuir para a
modernização do aparelho produtivo, elevar a sua competitividade
e conduzir o México ao "primeiro mundo". Com
excepção de alguns resultados positivos, em termos gerais, as
suas consequências foram totalmente ao contrário.
Como é possível que um tão espectacular aumento das
exportações, que se supunha serem o motor do crescimento e de um
incremento importante do IDE, se reflicta numa taxa de crescimento praticamente
a mesma em 1994 e em 2004, ou seja, de incremento nulo? Como é
possível que uma taxa de desemprego oficial de 3,64% em 1994 tenha
passado para 3,78% em 2004? Como é possível que o salário
mínimo real, que é a principal referência de toda a escala
social, tenha perdido cerca de 22% do seu poder de compra entre 1994 e 2004?
Como é evidente, o TLCAN não foi o único
responsável por estes resultados; mas pressupunha-se que seria um
instrumento fundamental para relançar o crescimento e o desenvolvimento
social do México.
A resposta está no facto de o TLCAN ter sido concebido para apoiar o
relançamento da economia dos Estados Unidos, através da
formação de um mega bloco económico que respondesse ao
mega bloco da União Europeia.
Também está no facto de o boom exportador do México ter
obedecido ao maior período de auge (1991-2000) da história
contemporânea dos Estados Unidos, que ao TLCAN. Inclusivamente, este
boom explica-se a si mesmo pela combinação dos baixos custos da
força de trabalho mexicana com um incremento dos componentes importados
das nossas exportações. A isto, há que acrescentar que a
maioria das empresas do sector exportador elevou a sua produtividade,
através da evolução tecnológica, sem aumentar os
salários na mesma proporção, o que significa um
subsídio, ou uma transferência do fundo salarial para a
acumulação de capital.
Sem políticas compensatórias, sem política industrial
activa de apoio à agricultura, o TLCAN teve estes efeitos sobre a
economia mexicana:
-
Desarticulação das cadeias produtivas e separação
do sector exportador do resto da economia
-
Falência de milhares de empresas, não geração de
empregos.
-
Deterioração do poder aquisitivo
-
Aprofundamento da crise na agricultura
-
Redução de mercado interno
-
Diminuição do nível de vida da maioria dos mexicanos
-
Incremento desmedido da economia informal e da emigração dos
mexicanos para os Estados Unidos
-
Concentração nos Estados Unidos do comércio externo, dos
investimentos e das fontes de financiamento externo da economia mexicana
-
Sobredependência da economia mexicana e sua absorção, de
facto, pela economia estadunidense
-
Desarticulação social
-
E proliferação da delinquência organizada e da
violência no nosso país.
O modelo neoliberal, e particularmente o TLCAN, propiciaram o regresso da
economia mexicana aos centros mineiros e agrícolas exportadores, que
caracterizaram a região latino-americana entre 1870 e a grande crise de
1929-1933. Este período corresponde, no México ao
porfiriato,
à revolução armada e aos três primeiros lustros do
período pós-revolucionário.
Nunca, na história do capitalismo, o mercado livre, por si só,
gerou as condições necessárias para o crescimento
económico. Pelo contrário. E a experiência recente da
economia mexicana sob o TLCAN confirmou, uma vez mais, esta tese.
VII- Perspectivas
Já se diluíram os efeitos positivos do TLCAN na economia
mexicana, absorvidos pela economia mundial. O México teve acesso
preferencial ao maior mercado do mundo, o que passou pelo período de
crescimento mais longo do séc. XX.
Mas as condições mudaram desde 2001. Acabou o longo
período de euforia dos Estados Unidos, e o México começou
a perder terreno nesse gigantesco mercado, face a outros países que,
inclusivamente, não beneficiam de nenhum tratado comercial.
O TLCAN, como instrumento do modelo neoliberal, e como expressão do
maior modelo de economia aberta que foi imposto ao México em
princípios dos anos oitenta, está esgotado.
Os Estados Unidos já têm outros tratados de comércio livre
com o Chile e a América Central e está na fase final de um outro
com a Comunidade Andina. É preciso dizer que isto indica um caminhar a
passos gigantescos no "Plano B" dos Estados Unidos, perante a
intenção frustrada de concretizar a ALCA em 2004.
Até agora, comentava-se nos círculos governamentais,
políticos e académicos três cenários
possíveis: a) continua tudo na mesma; b) renegociação
dos aspectos mais gravosos para o México e; c)muda-se de rumo e
avança-se para outro tipo de integração económica
na América do Norte.
No primeiro cenário, o México teria que procurar outras fontes de
competitividade, não baseadas no baixo custo da força de
trabalho, e diversificar o seu comércio exterior, face à perda de
espaço no mercado estadunidense. A vinculação
histórica com esse país torna este cenário
improvável.
A experiência de onze anos de TLCAN sugeriria adoptar o segundo
cenário, principalmente quando se tornam evidentes os aspectos pontuais
que teriam que se modificar, numa revisão e renegociação
dos mesmos; por exemplo os sectores agro-pecuário e de transporte de
carga, para só citar dois. Por este caminho poderiam conseguir-se
alguns benefícios adicionais aos mui limitados efeitos favoráveis
que teve o TLCAN no México, mas tudo seria feito no marco de um Tratado
já esgotado.
O terceiro aspecto poderia ser o que no Canadá e no México se
chamou de "
"TLCAN-plus"
e mais recentemente de
Iniciativa para a América do Norte.
Desconhece-se o seu conteúdo, mas refere-se que esta nova etapa das
relações económicas entre os três países
abarcaria três temas: bens industriais, alimentos, maiores facilidades
para o comércio e energia. Os dois primeiros temas faziam parte do
TLCAN, pelo que apenas seria uma maior
integração/absorção do México pelos Estados
Unidos. As maiores facilidades para o comércio, sim, é do
interesse do México pelas peias não aduaneiras que os Estados
Unidos levantam permanentemente aos bens e serviços que exportamos, mas
parece excessivo que este tema possa ser o eixo de uma nova
negociação. O tema dos alimentos ficará esgotado em 2008,
quando desaparecerem as barreiras que ainda subsistem em algumas rubricas
agro-pecuárias. Em contrapartida, para o México, o tema
migratório é estratégico; provavelmente os Estados Unidos
aceitariam alguma solução parcial, mas a troco do sector
energético mexicano. Em todo o caso, este cenário continuaria a
significar que os maiores benefícios de uma nova etapa do livre
comércio na América do Norte voltariam a ser para os Estados
Unidos e os custos económicos e sociais para o México.
A manter-se o actual grupo governante ou ocorrendo uma alternância com
tendência para a manutenção do modelo neoliberal nas
eleições de 2006, é certo que escolheriam o terceiro
cenário. Isto seria ainda mais catastrófico para o povo mexicano
do que tem sido a experiência do TLCAN.
O Partido do Trabalho continuará a luta para evitar que prossiga este
caminho, pela mudança de rumo do país. Consideramos que a
perspectiva mais favorável para o México seria a
conjugação dos seguintes elementos:
-
Uma regulação estratégica do Estado sobre a economia (isto
é feito por todos os países desenvolvidos, e muitos dos chamados
emergentes que estão a entrar no caminho do crescimento elevado e
sustentado a longo prazo);
-
Uma renegociação do actual TLCAN;
-
Adopção de uma política que diversifique as nossas
relações económicas;
-
Recuperar as experiências de construção da União
Europeia e do Mercosur;
-
E orientarmo-nos para a integração económica da
América Latina e Caribe nos termos colocados pelo presidente Hugo Chavez
na ALBA.
Temos que entender o que há muito Simón Bolivar advertiu:
"Quando se faz um pacto com o forte, já é grande a
obrigação do débil".
Hoje existem condições mais favoráveis para escolher o
caminho que mais convém ao México.
[*]
Economista, dirigente do Partido do Trabalho (México),
intervenção no IX Seminário "Os Partidos e a Nova
Sociedade" realizado na cidade do México de 4 a 6 de Março
de 2005).
Tradução de José Paulo Gascão.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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