Até onde e até quando?

por Rémy Herrera

'. No conflito na SNCF, um dos argumentos do presidente Macron é que a "reforma" que ele impôs aos ferroviários – a lei que inclui esta "reforma" tendo já sido votada pelo parlamento – não implicará privatização do sector ferroviário. Mas, no momento em que as organizações de direita (UNSA) e reformista (CFDT) rompem a unidade sindical e que os sindicatos mais combativos (CGT, SUD-Rail) anunciam que prosseguirão a greve durante o Verão (inclusive aquando das partidas dos veraneantes), o ministro da Economia e das Finanças, Bruno Le Maire (ex-ministro de Nicolas Sarkozy) apresentava seu projecto de "lei Pacto". No cerne deste projecto, dissimulado sob um dispositivo pretensamente destinado a ajudar as pequenas e médias empresas e a desendividar o Estado, figura um programa governamental de privatizações.

Este texto prevê próximas cessões de participações do Estado a proprietários privados da ADP (sociedade que gere os aeroportos de Paris-Charles-de-Gaulle e Orly, número 1 na Europa para o frete e o correio), da ENGIE (grupo energético, antigamente GDF-Suez, 3º grupo mundial na energia não petrolífera) e na Française des Jeux (loterias e apostas desportivas). A retirada do Estado afectaria também a Air France (onde os sindicatos permanecem mobilizados num conflito social não resolvido), Orange (telecomunicações) e o automóvel (Peugeot, Renault). Enquanto a dose máxima de "ópio do povo" é injectada pelos media e suas legiões de mercenários de comentadores futebolísticos, até onde os neoliberais chegarão a fazer recuar o Estado?

O contra ataque dos trabalhadores não se fez esperar. Em 14 de Junho, cerca de 150 locais eram ocupados pelos electricitários e gasistas. Pode-se gostar do futebol, mas mais ainda da luta. Nas muitas agências onde vieram em massa para obter explicações da sua direcção a propósito da privatização da energia, os empregados viram seus chefes baixarem a cabeça sem dizerem uma palavra, barricarem-se nos seus gabinetes ou fugirem a correr! No dia 21 de Junho, mais de 220 locais estavam ocupados por sindicalistas. Por toda a parte, bem no meio dos halls de entrada, piscinas infláveis eram instaladas e, em fatos de banho, grevistas faziam imersões à espera que seus filhos fossem convidados a fazer o mesmo durante o fim-de-semana! Nas greves da Frente Popular de 1936 jogava-se ping-pong nas fábricas ocupadas!

Durante este tempo, os mordomos de Emmanuel Macron anunciavam que o presidente desejava construir – às custas da República – uma nova piscina (acima do solo) em Brégançon, lugar de recreação posto à sua disposição na côte d'Azur. E que o casal presidencial decidiu renovar a louça do Eliseu (por 500 mil euros)! No mesmo dia, circulava um vídeo na Internet mostrando o presidente a declarar que "uma loucura de dinheiro" é gasta com os mínimos sociais. Deve-se compreender que a próxima obra de demolição será reduzir os orçamentos públicos de luta contra a pobreza (rendimentos e prestações sociais transferidas a famílias pobres, mínimo de velhice, subvenções para alojamento...)?

Isso cairia bem. Um relatório oficial recente indica que o número de crianças pobres explode: cerca de 20% das crianças em França vivem hoje abaixo do patamar de pobreza. Elas são sobretudo de famílias monoparentais e/ou no desemprego. O poder afirma que o desemprego baixa. Na realidade, os constrangimentos de registo impostos aos desempregados endureceram-se de tal forma que permitem retirar das estatísticas muitos dos sem emprego. Que consequência extrai o governo? Despedir 4000 empregados do Pólo Emprego (Pôle Emploi), o organismo público encarregado de ajudar os desempregados a encontrarem um emprego!

Portanto eles juntar-se-ão aos milhares de despedidos do grupo Carrefour, que souberam, dia 15 de Junho, que a assembleia dos accionistas desta emprega de grande distribuição (número 3, atrás da Walmart) havia atribuído ao seu presidente-director-geral um prémio de 13 milhões de euros pela sua gestão (2500 supressões de empregos anunciada) e uma pensão anual de mais de meio milhão de euros. Até quando estes dirigentes predadores e cínicos, apoiados pelo governo, conseguirão fazer funcionar seu sistema de destruição e de pilhagem?

Dia 21 de Junho, a Federação CGT Minas-Energia reivindicava o corte da alimentação de gás da Palácio do Eliseu, colocado em "precariedade energética", tal como milhões de lares franceses. Alguns dias antes, perto de Toulouse, o primeiro-ministro Édouard Philippe fora constrangido a fazer um discurso na obscuridade e sem microfone por causa de um corte energético organizado pela CGT.

25/Junho/2018

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24/Jun/18