Seja jovem e cale a boca!
por Rémy Herrera
Em 22 de Maio último, na sequência de uma
manifestação da função pública em Paris, a
que aderiram ferroviários e estudantes, cerca de uma centena de jovens
muitas vezes menores e alguns apenas com 14 anos! foram presos
pelas forças da ordem quando protestavam e ocupavam um liceu (o
Lycée Arago) da capital.
Antes de serem colocados sob custódia, cerca de sessenta deles foram
parqueados como gado num furgão da polícia durante mais de quatro
horas, sem autorização para prevenirem seus parentes, beberem ou
irem às toilettes. Na sequência destas
interpelações, traumatizantes para adolescentes e angustiantes
para as suas famílias, vários destes jovens foram apresentados,
algemados nos pulsos, em procedimento de urgência, diante de um juiz.
Qual o delito cometido por estes jovens rebeldes? Eles haviam decidido e
tido a coragem de se oporem (sem provocarem nenhuma
degradação, com excepção de um vidro partido)
à "reforma" neoliberal do sector da educação que
o presidente Macron quer impor. Um dos jovens interpelados declara:
"Fiquei chocado com a agressividade das forças da ordem e as
condições de detenção. Pretendeu-se fazer de
nós um exemplo para travar a mobilização dos jovens, mas
vou continuar a mobilizar-me, ainda mais".
Desde há meses os sindicatos estudantis de esquerda afirmam a sua recusa
em ver a educação mercantilizada quando o sistema
francês dá um lugar preponderante ao público , com as
despesas de inscrição aumentadas os cursos do superior
eram até à pouco ainda eram (quase) gratuitos , com a
selecção generalizada à entrada da universidade , o
acesso a esta era, até uma lei recente, garantido a todos após o
bacharelato. Eles dizem não ao facto de que cada vez mais jovens
desfavorecidos são proibidos, pelo dinheiro, de fazerem estudos e serem
condenados ao desemprego. Muitos professores também estão
mobilizados. Todos reclamam mais meios para o sector educativo, asfixiado pela
austeridade.
Seja o que for que se pense do presidente Macron, e seja qual for o
qualificativo que se dê a um governo age assim, um regime que está
reduzido a atacar dessa forma juventude, evidentemente não se porta bem.
Aqui não se passa nem um dia sem repressão política da
cólera social. Será que se pretende que nos habituemos a ver as
CRS
invadir campus universitários em efervescência, a espancar
estudantes recalcitrantes? Seria preciso que aceitássemos assistir
passivamente ao confisco por uma hierarquia ministerial autoritária
decisões de assembleias-gerais de professores e funcionários
administrativos em luta? Isto equivale a renunciar aos poucos espaços
democráticos concedidos pela nossa sociedade capitalista!
Só a comédia da democracia burguesa é tolerada. E por
enquanto. Num teatro de Paris (o Odéon, célebre por ter sido
ocupado pelos estudantes em Maio de 1968), foi dados um espectáculo em 7
de Maio a fim de rememorar os acontecimentos de 50 anos atrás. Tudo se
desenrolava como o previsto... até que verdadeiros estudantes (de hoje!)
subitamente irrompessem na sala do espectáculo e se fizessem convidar a
tomar a palavra para explicar ao público os motivos das suas
contestações actuais. A direcção do teatro, em
pânico, chama a polícia que fez evacuar
manu militari,
num mal-estar geral, os jovens perturba-festas!
Alguma coisa está errada no reino de Macron. Esta alguma coisa é
talvez um povo que recusa o destino que se lhe reserva. Um povo que,
lentamente, toma consciência de que a desmontagem dos serviços
público não é um progresso, que as "reformas"
louvadas pelos media a soldo da finança não são
senão destruições. Um povo que, penosamente, aprende a se
por de pé para marchar novamente. Tudo isso exigirá tempo. Mas
é claro que somos numerosos nós os que não os queremos
deixar actuar.
O ministro do Interior, Gérard Collomb, sem dúvida já o
compreendeu. Ele anunciou em 27 de Maio: "Se se quiser manter
amanhã o direito de manifestar, que é uma liberdade fundamental,
é preciso que as pessoas que queiram exprimir sua opinião possam
também se opor aos "arruaceiros" e não, pela sua
passividade, serem, de certo ponto de vista, cúmplices do que se passa
[os danos provocado]". Condicionar o direito de manifestar em
França à transformação em policiais de todos os
"manifestantes ordinários", como ele os chama, que belo
projecto de sociedade!
03/Junho/2018
Este artigo encontra-se em
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