O que é que se obtém quando se combina militarismo
estado-unidense, fantasias de dominação e uma
administração que encara a Internet como um viveiro de
"malfeitores" e "subversivos"? O Ciber Comando,
naturalmente! Só este esquema tem o potencial de infligir danos
maciços sobre populações civis através de todo o
planeta.
Situada actualmente na discreta Base da Força Aérea de Barksdale,
na Louisiana, o
Air Force Cyber Command
, o mais novo comando do
Pentágono desde a década de 1990, está devotado à
noção de que a "próxima guerra" será
combatida no espectro electromagnético, visão que encara
computadores como armas "centradas em rede".
Com uma estrutura organizacional unificada e um orçamento de US$2 mil
milhões para o primeiro ano de operações, o Ciber Comando
é considerado como a "grande coisa" a seguir. Segundo um
artigo recente no
Air Force Times
, o Ciber Comando "estabeleceu 17 novos Códigos de Especialidade da
Força Aérea criando grandes mudanças nas carreiras
de mais de 32 mil homens da Força Aérea".
Finalmente, se os securocratas da Força Aérea tem a sua carreira
definida, ela "crescerá até se tornar um dos maiores
comandos em serviço". Com a missão de "enganar, negar,
perturbar, degradar e destruir" uma infraestrutura de
informação do inimigo, o potencial de danos da parte dos
"combatentes" americanos e dos especialistas em propaganda negra da
"diplomacia pública" não deveria ser subestimado.
Embora a
"Visão estratégica"
apresentada pela
Força Aérea seja velada numa linguagem defensiva, pela sua
própria natureza o Ciber Comando representa um salto qualitativo do
Pentágono rumo à criação de uma capacidade
ofensiva, uma capacidade de extremo alcance e com consequências
potencialmente catastróficas para sociedades que caem sob o sinistro
olhar dos ciber-guerreiros americanos.
Isto é claramente explicitado pelos teóricos da Força
Aérea. Na sua visão, o "ambiente estratégico"
que confronta o imperialismo é descrito como "imprevisível e
cada vez mais perigoso", caracterizado "pela confluência da
globalização, de disparidades económicas e de
competição por recursos escassos".
E como as "disparidades económicas" tornam-se cada vez mais
ofuscantes, meios novos e mais efectivos para obter a
"submissão" são exigidos pelo nossos mestres
corporativos e seus militaristas cães de ataque. Isto é
sublinhado pelo objectivo declarado do Ciber Comando de "alcançar
domínio situacional no
tempo e lugar de nossa escolha
" [itálico nosso]. Segundo a Força Aérea,
A vigilância global exige a capacidade de sentir e assinalar
através do espectro electromagnético. O alcance global exige a
capacidade de conectar e transmitir, utilizando um vasto conjunto de redes de
comunicações para movimentar dados por toda a Terra quase
instantaneamente. O poder globalé a capacidade para manter em risco ou
atingir qualquer alvo com energia electromagnética e finalmente entregar
efeitos cinéticos e não cinéticos através de todos
os domínios. Estas capacidades no ciberespaço nos
permitirão assegurar a nossa infraestrutura, conduzir
operações militares sempre que necessário, e degradar ou
eliminar as capacidades militares dos nossos adversários. (Air Force
Cyber Command,
"Strategic Vision,"
sem data)
Segundo Noah Shachtman, analista de defesa da
Wired
,
A Força Aérea quer um conjunto de ferramentos hacker, para lhe
dar "acesso" e "pleno controle" a qualquer
espécie de computador que haja. E uma vez que os info guerreiros
estão dentro, a Força Aérea quer que eles vigiem de perto
a infraestrutura de informação dos seus
"adversários" completamente não detectados".
Tradicionalmente, os militares têm sido extremamente relutantes em falar
muito acerca de operações ofensivas online. Em vez disso, o foco
normalmente tem sido a protecção contra ataques
electrónicos. Mas desde o ano passado o tom mudou e tornou-se
mais belicoso. "O ciber, como campo de combate ... como o ar, favorece o
ataque", diz Lani Kass, assistente especial da Chefia de Staff da
Força Aérea que anteriormente dirigiu a Cyberspace Task Force.
("Air Force Aims for 'Full Control' of 'Any and All' Computers,"
Wired,
May 13, 2008)
Como é que isto pode terminar nas megacidades do Sul global,
identificadas pelos planeadores do Pentágono como "o terreno
estratégico" do século XXI?
O geógrafo Stephen Graham, da Durham University,
descreve
a
tendência que guia a actual doutrina do Pentágono da seguinte
maneira: Num nível teórico os estrategas militares,
particularmente os proponentes da "guerra centrada na rede" a
"Revolução em assuntos militares" ("Revolution in
Military Affairs", RMA) de Rumsfeld acreditam que a
dominância pode ser alcançada através "da sua
vigilância cada vez mais omnipotente e da 'percepção
situacional', do poder de fogo aéreo devastador e alvejado com
precisão, e da supressão e degradação das
comunicações e capacidade de combate de quaisquer forças
opositoras".
Por outras palavras, um processo integrado que é extraído da
teoria actual de gestão de empresas a fim de criar "apoio
contínuo sempre ligado para operações militares em terreno
urbano". Chame-se a isto "batalha no espaço" demente
onde a Wal-Mart transmuta-se no Terminator. Graham escreve:
A retórica esmagadora em tais esforços enfatiza que a nova
ciência tecno-militar, concebida especificamente para tratar de cidades,
transformará os ambientes urbanos do Sul global em áreas que as
forças estado-unidenses possam dominar completamente, utilizando suas
vantagens tecnológicas, com um mínimo de baixas para si
próprias. Novas armas e programas de sensoreamento, concebidos
especificamente para aumentar a capacidade das futuras forças dos EUA
para controlar e dominar cidades do Sul global através de meios
centrados em rede, já estão a emergir dos esforços mais
amplos em simulação física e electrónica, jogos de
guerra, e da avaliação da experiência da insurgência
no Iraque. Isto centra-se, primeiro, sobre cidades do Sul global expostas
através da tecnologia de novos sensores, e, segundo, no desenvolvimento
de sistemas de armas automatizado e robotizados ligados a tais sensores.
("From Space to Street Corner: Global South Cities and US Military
Technophilia", documento não publicado, 2007)
Como é que o Ciber Comando se ajusta nisto? Sob o título
"Cyberspace Attack Operations", os teóricos da Força
Aérea asseveram:
Os dispositivos do ciberespaço obtidos a partir da tecnologia emergente,
tais como energia dirigida, incluem: ruptura de sensores,
manipulação de dados, degradação do apoio à
decisão, ruptura de comando e controle, e degradação de
sistema de armas. Ataques no ciberespaço podem ser dirigidos à
infraestrutura de comunicação terrestre, aerotransportada e
espacial do adversário, bem como às suas forças,
equipamento e logística.
Na verdade tais operações são plenamente teorizadas como
meios para alcançar "dominância de pleno espectro" via
"Cyberspace Offensive Counter-Operations":
O ciberespaço favorece operações ofensivas. Estas
operações negarão, degradarão, romperão,
destruirão ou enganarão um adversário.
Operações ofensivas no ciberespaço asseguram liberdade de
acção ali enquanto negam esta mesma liberdade aos nossos
adversários. Aumentaremos nossas capacidades para conduzir ataques a
sistemas electrónicas, interdição e ataque a sistemas
electromagnéticos, ataque a redes e operações de ataque a
infraestruturas. Os alvos incluem as redes terrestres, aerotransportadas e
espaciais do adversário, e
ele próprio.
Na medida em que um adversário se torna mais dependente do
ciberespaço, as operações ofensivas ali tem potencial para
produzir maiores efeitos. ("Strategic Vision," op. cit.)
[ênfase acrescentada]
"Maiores efeitos" neste contexto significa nada menos que a
capacidade de tornar sociedades "alvo" completamente
vulneráveis ao ataque imperialista. Cerca de uma década
atrás, as forças da NATO lançaram o que foi descrito como
uma
"bomba blackout"
a grafite, a BLU-114/B sobre Belgrado e outras
cidades durante a sua guerra de agressão contra os remanescentes da
antiga Jugosláveis com efeitos devastadores. Marty Mclaughlin
escreveu
:
Uma consequência particularmente perigosa do blackout de energia é
o dano aos sistemas de água em muitas cidades jugoslávas, as
quais dependem de estações de bombagem movimentadas por energia
eléctrica. Novi Sad, uma cidade de 300 mil habitantes que é a
capital da província sérvia de Vojvodina, ficou sem água
corrente durante oito dias, segundo os moradores. Famílias foram
obrigadas a obter água do Danúbio para lavagens e
operações sanitárias, e de um punhado de poços para
ter água de beber.
Estações de tratamento de esgotos também foram encerradas,
com o resultado de que o esgoto não tratado começou a ser escoado
para dentro das redes de rios que alimentam o Danúbio, a mais importante
via navegável da Europa. ("Wall Street celebrates stepped-up
bombing of Serbia," World Socialist Web Site, May 5, 1999)
Com os avanços tecnológicos, os ciberguerreiros imperialistas
acreditam que podem simplesmente transformar uma infraestrutura em rede de um
adversário num sistema "zumbi" sob o seu controle para
conseguir a mesma, se não maior, devastação. Como relata
Marty Grahan em
Wired
:
Comparações entre armas nucleares e ciber-armas podem ser
forçadas, mas há pelo menos uma coisa em comum.
Académicos que estudam a ética de utilizar bombas lógicas,
cavalos de Tróia, vírus
(worms)
e robots
(bots)
em tempo de guerra muitas vezes acham-se eles próprios a andar sobre o
chão pisado pela geração anterior dos jogadores nucleares
da Guerra Fria.
"Há montes de coisas desconhecidas num ciber-ataque", afirma
Neil Rowe, professor no Center for Information Security Research da U.S. Naval
Postgraduate School, o qual rejeita os ciber-ataques como ferramenta
legítima de guerra. "O potencial para dano colateral é pior
do que na tecnologia nuclear... Com a ciber, isto pode difundir-se
através da infraestrutura civil e afectar muito mais civis".
("Welcome to Cyberwar Country, USA",
Wired,
February 11, 2008)
É precisamente por isso que a Força Aérea manifestou
interesse em construir um Ciber Comando robusto!
Segundo uma Folha de Informação da Força Aérea,
"Cyberspace 101"
, eles concebem a sua "missão" como
aquela que "nos permitirá capacidades ofensivas e atingir alvos
deliberados".
Com data de lançamento oficial programada para 1 de Outubro de 2008, o
Ciber Comando por enquanto não tem lar permanente mas pode-se prever que
o "líder" do Congresso que pode proporcionar bens para os seus
"constituintes" colherá o prémio de um acordo a longo
prazo. De Hampton, Virgínia, a Yuba City, na Califórnia,
líderes locais estão a cair sobre eles com tratos negociados
atrás das costas dos seus cidadãos.
E segundo a
Wired
, grupos de interessados locais estão a
"lançar ofertas de terreno, apoio académico e de
investigação associado e, num caso, um edifício de US$11
milhões com um canal de protecção".
Com milhares de mihões de dólares em contratos governamentais
externos pendentes, o Ciber Comando não é matéria de
brincadeira. Em Dezembro último a
Aviation Week
relatava que "líderes da U.S. Air Force a trabalhar no nascente
ciber comando acreditam que haverá uma 'enorme' necessidade de
serviços contratados para apoiar o esforço em embrião
quando ele enfrentar ventos contrários quanto a pessoal, tecnologia e
financiamento". Michael Bruno escreveu:
"Há enormes necessidades de contratação em
andamento", diz o Maj. Gen. Charles Ickes II, assistente especial da Air
National Guard junto vice-chefe de staff para operações, planos e
requisitos.
"Penso que ninguém pode dizer quão grandes", disse ele
em 5 de Dezembro na conferência da Força Aérea sobre
tecnologia de informação na Associação das
Forças Armadas para Comunicações e Electrónica,
secção da Virgínia do Norte. ("New Cyber Command to
be 'Huge' Business Opportunity," Aviation Week, December 6, 2007)
Em Maio, o
Washington Technology
relatou que a Força Aérea "está a pedir
relatórios pormenorizados
(white papers)
sobre como pode ela conduzir ofensivas com êxito contra
adversários no ciber espaço". E para apoiar este pedido, o
Air Force Research Laboratory (
AFRL
) oferece US$11 milhões em
financiamento para o projectos de dois anos que forem propostos.
Se os projectos passados do Pentágono constituem alguma
indicação para onde as propostas da AFRL podem levar, a
estimativa de US$30 mil milhões de custos para o seu projecto inicial de
cinco anos tem todas as marcas de outro maciço buraco negro financiado
pelo dinheiro dos contribuintes para empreiteiros da defesa.
Na verdade, a Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA)
desempenhará um papel crítico para a Força Aérea e
actualmente está a conceber um "National Cyber Range" que
"criará um ambiente virtual onde o Departamento da Defesa pode
imitar a guerra real", tanto a defesa como a ofensiva", segundo
Sharon Weinberger, analista de defesa da
Wired
.
De acordo com um anúncio publicado pelo
sítio web
do Federal Business Opportunities, o projecto, concebido pelo
Strategic Technology Office
do DARPA, é descrito como uma zona de teste que
permitirá "conduzir ciber operações ao proporcionar
um persistente ciber cenário". Muitos dos pormenores do programa
são classificados.
Encarada como uma força que conduz "operações
ofensivas e defensivas sustentadas através do espectro
electromagnético plenamente integradas com operações
aéreas e espaciais", o Ciber Comando da Força Aérea
"potenciará ... capacidades ciber-espaciais ... em todos os
domínios, para criar efeitos globais e de teatro em apoio da equipe
conjunta que trava a guerra".
Crimes de guerra ao pressionar do botão? O futuro é agora e sua
aparência é sinistra.
19/Julho/2008
[*]
Investigador e activista residente na Área da Baía de San
Francisco, EUA. Além de publicar na Covert Action Quarterly, Love &
Rage e Antifa Forum é editor de
Police State America: US Military 'Civil Disturbance' Planning
.
O original encontra-se em
http://antifascist-calling.blogspot.com/
e em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=9619
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.