O pico petrolífero e as classes trabalhadoras
por Dale Allen Pfeiffer
[*]
Para começar, sejamos claros. Como sabemos, o governo é a
ferramenta das classes privilegiadas com a qual controlam as massas e garantem
um ambiente favorável aos seus próprios interesses. Para se ver
como isto é verdadeiro, basta passar em revista a história
americana desde a fundação dos Estados Unidos.
Desde a luta laboral do princípio do século XIX até ao
Acordo de Comércio Livre da América do Norte, o governo dos EUA
esteve sempre firmemente ao lado das classes privilegiadas. As leis dos
salários justos, do dia de oito horas de trabalho e da
mão-de-obra infantil não foram produto de um governo prudente e
benevolente, nem de um mundo empresarial humano e consciencioso. Foram sim
concessões dadas à classe trabalhadora para pôr fim a
longos períodos de efervescência laboral e ao resultante
desassossego no mercado. Todos os benefícios da classe trabalhadora
foram pagos com o sangue e o sofrimento das gerações anteriores.
O governo e a classe privilegiada tentaram sempre apresentar a imagem de que se
preocupavam com os pequenos e com a humanidade servil. Os nossos dirigentes
procuraram sempre aparentar a magnanimidade, desde a filosofia de Henry Ford de
pagar o suficiente aos seus empregados para que eles pudessem comprar os seus
próprios veículos, até à teoria das sobras dos
ricos de Ronald Reagan. No entanto, Henry Ford foi um apoiante fanático
do nazismo e do fascismo em geral, e Ronald Reagan foi um mau actor e um
palhaço cuja política económica conduziu ao
fenómeno da contracção do pessoal das empresas
(downsizing)
e permitiu que os seus directores ganhassem 300 vezes mais do que os
salários médios estagnados dos trabalhadores.
Desde há muito que o governo e as classes privilegiadas tentam subverter
o movimento dos trabalhadores. Aprenderam à sua custa que é
compensador pacificar a classe trabalhadora mas só o suficiente para que
ela se torne fraca e obediente. Todas as tentativas de formar uma
organização de trabalhadores verdadeiramente democrática
foram esmagadas ou impossibilitadas. O exemplo clássico é a
história do IWW, Industrial Workers of the World (Trabalhadores
Industriais Mundiais), que pode ser lida
aqui
. O poder, ao contrário, apoiou organizações como a AFL
(Federação Americana do Trabalho), ou organizações
domesticadas como o CIO (Congresso das Organizações Industriais).
Estas eram organizações profissionais centralizadas cuja
liderança estava mais do lado dos presidentes das grandes empresas do
que do lado dos trabalhadores que supostamente deviam representar. São
organizações cuja política é trabalhar com as
grandes empresas, o que se traduz numa liderança fraca da
organização que facilmente se refugia em questões como o
outsourcing
(contratação no exterior) ou no
downsizing
(redução de custos de pessoal) enquanto criticam coisas sem
importância. Tornaram-se um veículo para uma maior
subjugação da classe trabalhadora. (Sei que há muitos
sindicalistas dedicados nos níveis mais baixos tal como há
alguns dedicados funcionários civis nos níveis mais baixos do
governo. E organizações profissionais que, até certo
ponto, estão ao serviço da força laboral, embora acabem
por se revelar ineficazes)
Entretanto, o público é influenciado pelas opiniões e
perspectivas da classe privilegiada. Na escola, ensinam-nos a história
da elite, a história laboral serve apenas de rodapé se
é que é mencionada. Os nossos meios de comunicação
dão as notícias só do ponto de vista da elite
notícias de negócios. Dão-nos os índices de Dow
Jones e da NASDAQ (National Association of Securities Dealers Automated
Quotation Associação Nacional das Cotações
dos Fornecedores de Títulos Mecanizados), mas não dão o
valor real dos salários ou a actual proporção entre o
pagamento aos presidentes das empresas e o pagamento médio aos
trabalhadores. Noticiam a taxa de desemprego sem reflectir o número de
desempregados que chegaram ao fim dos benefícios de desemprego ou sem
procurar saber o número dos sem-abrigo. Noticiam os gastos do consumo
sem os correlacionar com as dívidas dos consumidores. E todos estes
pequenos pormenores navegam num mar de violência pública, que leva
muita gente a ter medo dos seus vizinhos e a ter medo de pôr o pé
fora das suas próprias casas. Para culminar, somos perturbados por uma
maré de entretenimentos que, na melhor das hipóteses, são
inócuos e, na pior, são defensores subconscientes da visão
aprovada da realidade.
Esta é a matriz em que vivemos hoje. Peço desculpa aos que
têm consciência de tudo isto, se esta introdução
parece pedante, mas é preciso expor tudo isto antes de podermos
continuar com o tema deste artigo. Quanto aos que acham que esta
introdução é apenas propaganda, lamento que não
consigam tirar as vossas vendas nem por um minuto sequer. É duvidoso que
aproveitem alguma coisa do resto deste artigo. Quanto aos que desejarem saber
mais sobre a história laboral, recomendo
Strike!
de Jeremy Brecher (South End Press). Brecher dá-nos uma
apresentação muito boa deste assunto.
Agora, depois de esboçarmos uma apreciação muito breve mas
honesta de como o fenómeno do pico petrolífero terá
impacto nesta estrutura social, proporemos sugestões sobre como a classe
trabalhadora deverá encarar a crise que se aproxima.
O PICO PETROLÍFERO & A LUTA DE CLASSES
Há bastante tempo que se verifica a pilhagem dos Estados Unidos; pelo
menos desde a década de 1980. E há mesmo quem diga que ela se
verifica desde a chegada dos primeiros europeus a este continente. Mas, neste
momento, a pilhagem dos EUA está a começar a acelerar.
Podem ter a certeza de que a elite já chegou à conclusão
de como vai maximizar os seus lucros com o pico petrolífero. Apesar de
todos os disparates que os economistas dizem, eles sabem que a nossa economia
pode começar a contrair-se em resultado da diminuição da
produção de energia. E sabem que em qualquer forma de capitalismo
seja ela o mercado livre, o mercado assistido pelo estado ou o mercado
fortemente regulamentado a contracção económica
contínua é um eufemismo para colapso. Os peritos na
manipulação do dinheiro sabem quando devem saltar fora, e sabem
como manipular mesmo um mau negócio a fim de obter o máximo
lucro.
Notícias recentes
(
US$380 Oil? Banks talk Oil Depletion
, Michael Kane,
From the Wilderness,
07/Junho/2005) indicam que a classe privilegiada poderá utilizar a
histeria do pico petrolífero para elevar prematuramente os preços
a alturas artificiais. Embora haja razões para os preços do
petróleo estarem actualmente a subir, não há razão
nenhuma nesta altura para terem atingido os 60 dólares por barril. Isto
é resultado da especulação, e há quem esteja a
tirar enormes lucros com isso. Até agora, o pico petrolífero
é apenas conversa sussurrada no mercado. O verdadeiro pânico do
mercado ainda está para chegar, talvez daqui a um ano, talvez no
próximo mês ou já na próxima semana se
não ocorrer antes de este artigo ser publicado.
Quando o pânico chegar, a elite está pronta para o gerir. Os
privilegiados vão arrebatar todos os lucros, depois vão liquidar
os seus bens e levá-los para longe antes que o mercado desabe.
Vão desarmar as suas tendas e sair da cidade, talvez para as Ilhas
Caimão, talvez para lugares seguros na Ásia ou noutro
sítio qualquer. Aí trocarão os seus dólares por
ouro, ou possivelmente por yuan chineses, estimulando uma
desvalorização monumental do dólar americano. E vão
recostar-se em segurança e conforto a observar o colapso. Depois de a
poeira assentar, voltarão juntamente com todos os outros abutres
para apanhar o que resta por meia dúzia de cêntimos.
Entretanto, a classe trabalhadora vai sofrer o principal impacto desta
catástrofe. A taxa de desemprego vai levantar voo quando as grandes
empresas fecharem as portas e declararem bancarrota. Quer os salários
subam ou desçam, o valor da moeda em que forem pagos
torná-los-á inúteis. Haverá crises
simultâneas nos transportes, na agricultura e no saneamento
público. Haverá um aumento brutal de sofrimento, miséria,
fome e morte.
Enquanto os negócios estarão a abrir falências às
carradas, o público não será capaz de aliviar a sua carga
de dívidas pessoais, graças às novas leis de
falências que Bush impôs ao Congresso. Milhões
poderão vir a ser condenados a uma qualquer forma de servidão por
dívidas. Ao mesmo tempo, como noticiou Stan Goff (
The Global Battlefield - We are Standing on it
, Stan Goff,
From the Wilderness,
08/Julho/2005), os negócios e serviços que restarem vão
ter assegurada a sua força de trabalho sob a capa da segurança
nacional. Muitos endividados, abalados e sem trabalho, poderão ser
despachados a fim de se tornarem trabalhadores rurais sob a
supervisão de guardas armados.
Assim, rapidamente, perder-se-ão 200 anos de conquistas sindicais.
Não se iluda pensando que isto não pode acontecer. A classe
privilegiada não recebeu nenhuma bênção especial;
obteve os seus privilégios através do roubo e do saque. Ela
trepou até ao topo pondo os pés em cima dos outros. Pouco
importam as banalidades sobre fraternidade e interesse comum que possa ter
proferido, a grande maioria fará o que for necessário para manter
a sua posição. As grandes empresas bem podem dizer que
estão cá para servir o público, mas o seu intuito
fundamental é a maximização do lucro.
De todas as medidas necessárias para a pilhagem final dos EUA, o
empobrecimento da população americana e a
instituição da escravidão por dívidas já
estão em marcha ou estão a ser preparadas no preciso momento em
que está a ler estas palavras. Só falta uma deixa dos bastidores.
Há uma coisa que poderia impedir este cenário: um levantamento
da classe trabalhadora. A classe trabalhadora tem poder para fazer parar tudo
através da greve geral. Só a ignorância e a
abdicação deste poder último é que dá
à classe privilegiada esse poder que ela utiliza para nos explorar.
Neste momento eles não acreditam que sejamos capazes de tal
resistência
unificada. As nossas organizações sindicais são fracas,
subornadas e corruptas. Estamos mal informados, endoutrinados e isolados.
Temos medo dos nossos próprios vizinhos e somos metidos rapidamente na
linha com a ameaça do terrorismo. Já se esqueceram da batalha de
Seattle e
têm ignorado protestos semelhantes desde então. Logo que é
localizado um protesto, podem refreá-lo, minimizar a publicidade dos
media e dar-lhe a volta apropriada, e esmagá-lo se necessário. O
maior espinho que têm neste momento é a nossa capacidade de
comunicar pela Internet.
Creio que eles nos subestimam.
VISÃO
Mas, nós também nos subestimamos.
Sobrecarregado de trabalho e mal pago, desinformado e reduzido a zero, medroso
e inseguro, o trabalhador vulgar tem dificuldade em se aperceber que os seus
problemas são os mesmos de milhões de outras pessoas, e por isso
dificilmente compreende que esses problemas não são pessoais mas
sistémicos. Estes problemas são resultantes de um sistema que
procura maximizar o lucro, maximizando a exploração da
força de trabalho.
Só quando a classe trabalhadora conseguir ver até que ponto esta
luta é comum é que será capaz de perceber os problemas
que a provocam. Cada um de nós vai ter de manter a cabeça fora
de água o melhor que puder, e quando a água subir, podemos mesmo
vir a afogar alguns dos nossos vizinhos no meio do nosso pânico. A
percepção da natureza sistémica do problema pode mesmo
levar ao desespero, à resignação ou a uma fúria
cega, se não conseguirmos ver nenhuma alternativa para o domínio
do capital e a exploração dos trabalhadores.
Uma das façanhas da propaganda do século passado foi a ideia de
que só há dois sistemas sociais possíveis, que
estão diametralmente opostos: o capitalismo, em que a elite
endinheirada detém o poder, e o comunismo totalitário, em que os
burocratas detêm o poder. Os propagandistas ocidentais proclamaram em
voz alta que a queda da União Soviética provara que o comunismo
totalitário era um fracasso e, inversamente, que o capitalismo era o
único sistema social bem sucedido e de boa saúde. No entanto,
tanto o capitalismo como o comunismo totalitário estão baseados
em disparidades de poder e, como tal, são insustentáveis. Talvez
o nosso sistema seja um pouco mais dinâmico do que o sistema
soviético, mas não prevejo que lhe sobreviva durante muito tempo.
A dupla linguagem dos propagandistas ocidentais torna muito difícil
compreender tudo isto. Evitam a palavra capitalismo e em seu lugar utilizam a
palavra democracia. O que eles querem dizer com democracia é um sistema
de democracia representativa em que o poder que toma decisões fica
totalmente nas mãos da classe privilegiada. A democracia representativa
é uma ficção destinada a pacificar as massas e ao mesmo
tempo limitar a sua voz dentro do sistema. Na realidade, a democracia e o
capitalismo são antitéticos. O que é na verdade
diametralmente oposto ao capitalismo é a democracia no local de
trabalho.
Esta é, assim, a perspectiva de que os trabalhadores desiludidos
precisam: uma democracia participativa baseada não na regra da maioria,
mas no consenso ou em qualquer mecanismo semelhante que garanta que não
se torna numa ditadura da maioria. Quanto a esta questão, os defensores
do capitalismo gostam de afirmar que tais formas de democracia são
demasiado lentas para tomar decisões de negócios. Onde é
que há um único exemplo duma robusta democracia participativa?,
perguntam.
Isto parece-se com o matulão no recreio que pergunta porque é que
ninguém o desafia. No nosso sistema dominante, os protectores
governamentais do capitalismo barricaram-se contra as alternativas. E o
mundo dos negócios esventrará rapidamente qualquer companhia
dirigida por trabalhadores que mostre tendência a crescer. Apesar deste
ambiente agressivo, há algumas histórias de sucesso de empresas
dirigidas por trabalhadores. O colectivo Mondragón em Espanha fornece o
exemplo provavelmente mais conhecido. A companhia alemã, Endenburg
Electrotechniek, Inc., é outro exemplo, juntamente com algumas empresas
Quaker. Quanto a exemplos teóricos,
Parecon and sociocracy
(Economia Participativa e sociocracia) retrata de que modo uma empresa
democrática pode funcionar sem percalços e com eficácia.
Munidos da percepção dos problemas sistémicos que
estão na base da sua luta, e do conhecimento de sistemas alternativos
viáveis, os trabalhadores só precisam de um empurrão que
os lance na acção. Esse empurrão pode ser a
noção de que o pico petrolífero vai piorar dramaticamente
a sua situação actual; a sua luta é tornar-se-á
obrigatoriamente mais frenética e trágica. Ao observarem isto,
aperceber-se-ão que já não estão a lutar apenas
para se manterem à tona de água; estão a lutar pelas suas
vidas e pelas vidas dos seus entes queridos.
Com a percepção da verdadeira natureza da sua luta, a perspectiva
de uma alternativa e a compreensão de que o pico petrolífero
transformará esta luta numa questão de vida ou de morte, a classe
trabalhadora pode reanimar-se praticamente dum dia para o outro, e pode
pôr fim a esta loucura na manhã seguinte.
O que é preciso agora é organização e
educação, e um conjunto de objectivos que nos conduzam a uma
mudança sistémica.
OBJECTIVOS
Segue-se um conjunto progressivo de exigências laborais que, se forem
executadas, resultarão numa mudança sistémica. De notar
que todas estas exigências têm que ser tomadas a nível
central. Não são apenas o género de exigências que
uma organização sindical possa fazer a uma empresa individual.
Os trabalhadores podiam tentar que estas exigências fossem cumpridas,
pressionando os nossos políticos centrais. No entanto, isso seria um
esforço inglório. Embora alguns políticos possam enganar
os trabalhadores com falinhas mansas, não há forma de os
trabalhadores e as suas organizações poderem competir em
pé de igualdade com os milhões de dólares de
contribuições para as campanhas que são oferecidos pelos
contribuidores das empresas e seus intermediários. Ainda por cima, a
grande maioria dos políticos federais são provenientes da classe
privilegiada e têm pouca tendência para trair a sua própria
classe. Mesmo que houvesse um grupo de membros do Congresso que estivesse
verdadeiramente preocupado com a classe trabalhadora e apostado em legislar
essas reformas, antes de se conseguir aprovar qualquer proposta de lei
apresentada, esta provavelmente seria alterada e adulterada ao ponto de perder
todo o sentido. Todo o nosso sistema legislativo e o nosso tão gabado
equilíbrio de poder estão concebidos para marginalizar a voz do
povo em favor da classe privilegiada.
Estas exigências só serão ouvidas se forem gritadas por um
grande e unificado movimento dos trabalhadores. A classe privilegiada só
aceitará medidas destas se souber que não tem alternativa,
perante uma completa paragem do trabalho, como é costume. Tal é o
poder da greve geral. Sem ela nenhum destes objectivos verá a luz do
dia.
São os seguintes, então, os objectivos que a classe trabalhadora
tem que atingir em resposta ao pico petrolífero:
1. Fim da globalização.
Temos que sair da NAFTA (North American Free Trade Agreement Acordo do
Comércio Livre da América do Norte), da FTAA (Free Trade Area of
the Americas Area de Comércio Livre das Américas), da WTO
(World Trade Organization Organização Mundial do
Comércio), da CAFTA (Central American Free Trade Agreement Acordo
Centro-Americano do Comércio Livre) e pôr fim à crueldade
da globalização tal como é hoje praticada. Todas as
grandes empresas que tentem fugir para fora do país têm que ser
fortemente penalizadas, e essas penalizações têm que ser
retroactivas alargadas desde a data em que foram consignadas na lei
até à data em que foram propostas pela primeira vez.
Também temos que regressar à localização da
produção. Com o pico petrolífero, isto vai acontecer quer
queiramos quer não. É preferível começar já
o processo, de forma ordenada. É previsível que, deixadas
à rédea solta, as empresas planeiem relocalizar a
produção depois de o pico petrolífero e de o resultante
colapso económico terem empobrecido os trabalhadores ao ponto de eles
aceitarem quaisquer salários e condições de trabalho que
lhes ofereçam. Temos que exigir esta mudança já, enquanto
ainda temos força para o fazer.
2. Infra-estrutura fiscal das corporações.
O pico petrolífero exige importantes alterações na nossa
infra-estrutura. Pondo de lado todos os disparates sobre automóveis
alimentados por pilhas de combustível a hidrogénio ou o
biodiesel, temos que reestruturar as nossas comunidades, melhorar os caminhos
de ferro para o transporte de cargas, e construir desde o início uma
eficaz rede de transportes públicos. É bem sabido que diversas
empresas em especial os fabricantes de automóveis e de pneus
fizeram um esforço deliberado para desmantelar os nossos
transportes públicos no século XX, e para planear as nossas
comunidades à volta dos automóveis e dos camiões. Em
consequência, essas empresas tiveram enormes lucros, enquanto nós
ficámos com uma sociedade pulverizada altamente dependente do
petróleo. Ainda por cima, a construção e
manutenção do sistema de transportes foi subsidiado pelos
impostos públicos, com pouco ou nenhum custo para o negócio. As
empresas já beneficiaram deste sistema tempo demais. É agora
justo que paguem pela sua restruturação durante o declínio
da idade do petróleo.
3. O dia de 4 Horas e o salário mínimo.
Com um dia de quatro horas, podemos atingir uma taxa de pleno emprego,
assegurando ao mesmo tempo que os trabalhadores não fiquem tão
sobrecarregados com trabalho que lhes seja impossível terem uma vida
significativa para além do trabalho, ou serem participantes bem
informados na democracia. Além do mais, é totalmente justo prever
um salário mínimo para uma semana de 20 horas. Não nos
esqueçamos de que um salário mínimo será certamente
mais baixo numa economia localizada onde as pessoas não precisam de
pagar todas aquelas despesas que hoje são necessárias para o seu
transporte pessoal. O custo dum salário mínimo ainda pode ser
reduzido com a exigência seguinte.
4. Direito à habitação, à alimentação
e
aos cuidados de saúde.
Os Estados Unidos são um dos dois únicos membros das
Nações Unidas que se recusaram repetidas vezes a assinar a Carta
Internacional dos Direitos Humanos. Tudo por causa das
disposições no acordo relativas ao direito de todos os
indivíduos à habitação, alimentação e
cuidados de saúde. No entanto, não podemos ter uma democracia
saudável se estas necessidades básicas não forem
garantidas. Na verdade, o custo para isto é mínimo e é
equilibrado pela possibilidade de um salário mínimo mais baixo.
Este ponto levanta uma questão básica: como é que vamos
enfrentar o declínio da idade do petróleo, todos por um ou cada
um por si próprio?
5. Democracia Participativa.
Como é que podemos ter esperanças alguma vez de ter um sistema
social democrático a funcionar verdadeiramente, se o mundo do trabalho
se mantém sob uma ditadura? Este é na verdade o maior e o mais
fatal equívoco dos nossos antepassados fundadores. Há mesmo quem
afirme que não houve equívoco nenhum, visto que os nossos
antepassados fundadores eram todos membros da classe privilegiada. De qualquer
modo, é tempo de rectificar esta situação.
Estas cinco exigências são todas elas progressivas. Embora o mundo
empresarial grite escandalizado a cada uma destas exigências, elas foram
aqui enumeradas pela ordem da possibilidade de serem concretizadas. Os pontos
1 e 2 preocupam-se com as mudanças necessárias exigidas, duma
maneira ou doutra, para se sobreviver ao declínio da idade do
petróleo sem que haja um colapso total da civilização.
Perante uma greve geral e a realidade do pico petrolífero, a classe
privilegiada provavelmente submeter-se-á a estas duas exigências.
Os pontos 3 e 4, embora não estejam totalmente relacionados com o pico
petrolífero, ajudarão a suavizar o declínio da idade do
petróleo. Embora a classe privilegiada possa mostrar maior
resistência a estas exigências, não poderá
recusá-las frente a uma greve geral. Quanto à última
exigência, a implementação em grande escala de uma
democracia participativa exigirá provavelmente uma
revolução completa. Mas, então, não é esse o
objectivo final da greve geral?
Há outras exigências que podiam ser acrescentadas a esta lista,
mas estas são as cinco exigências chave relacionadas com o pico
petrolífero e o declínio da idade do petróleo. Há
algumas profissões que deixarão de ser viáveis na era
pós-petróleo. À cabeça vêm logo as
indústrias dos transportes aéreos e terrestres. Talvez se pudesse
acrescentar a esta lista uma exigência adicional para reciclagem e
colocação dos trabalhadores das indústrias obsoletas.
IMPLEMENTAÇÃO
As medidas acima enumeradas ajudariam o público em geral a enfrentar
mais facilmente a diminuição dos fornecimentos
energéticos. Não eliminariam totalmente as dificuldades, mas
ajudariam a minimizá-las. Vamos todos ter que apertar o cinto quando os
fornecimentos de energia diminuírem, e vamos ter que reduzir a nossa
população. Mas estas medidas ajudar-nos-ão a estar
preparados, e evitarão que um segmento da sociedade mantenha a
cabeça fora da água às custas dos restantes. Com um
sistema mais justo, com a garantia de que ninguém se vai esgueirar pelos
cantos, a nossa população pode reduzir-se a um ritmo natural, sem
sofrimento desnecessário.
No entanto, estas medidas nunca serão postas em prática se as
pedirmos ao nosso governo. Nem serão apoiadas com êxito pelas
principais organizações sindicais que actualmente existem. A
aprovação destas medidas exigirá o envolvimento de um
grande número de trabalhadores que estão fora das
organizações sindicais tradicionais. É até de
esperar que as organizações tradicionais ajudem a reprimir um
movimento deste tipo. Sem qualquer dúvida, esse movimento será
caluniado na imprensa e os seus membros serão rotulados pelo governo de
terroristas internos.
Este movimento tem que criar uma rede de comunicações, calma mas
rapidamente, através de todas as grandes indústrias da
nação. Depois, na altura própria, tem que se erguer e
expor a sua causa claramente ao público em geral, quer directamente por
meio duma greve geral, quer através de uma série de greves
selvagens estratégicas que culminarão numa greve geral. Mas
primeiro que tudo temos que comunicar e organizar.
(...)
CONCLUSÃO
É preciso que todos se envolvam, para seu próprio bem e pelo bem
dos seus entes queridos. Se deixarmos esta questão nas mãos da
classe privilegiada, depois não podemos queixar-nos quando nos
encontrarmos a estrebuchar debaixo da canga da servidão por
dívidas ou ainda pior a morrer à fome. Se
não começarmos a agir agora mesmo, será demasiado tarde.
Sem dúvida, o governo utilizará todos os meios ao seu dispor para
reprimir este movimento e deter a greve geral. Os dirigentes identificados
serão presos como terroristas internos. Mas, como será um
movimento democrático descentralizado, não haverá
dirigentes. Ou, mais propriamente, todos nós seremos dirigentes. Podem
encher as cadeias e as prisões até deitar por fora. Se toda a
gente se recusar a trabalhar, eles perdem.
Para vencer basta ter determinação
determinação de que queremos viver num mundo livre onde todos
tenham uma voz igual na sociedade e no local de trabalho, e onde a todos seja
garantido o seu direito a uma casa, à alimentação, aos
cuidados de saúde, e à busca da felicidade. Com esta perspectiva
e com a arma da greve geral, não podemos perder. Quando começar a
greve geral e enquanto todos se recusarem a trabalhar, havemos de vencer. Pelo
nosso bem futuro, e pelas vidas dos nossos entes queridos, seremos bem
sucedidos.
02/Setembro/2005
Este artigo encontra-se em
http://www.onlinejournal.com/Special_Reports/090205Pfeiffer/090205pfeiffer.html
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Tradução de Margarida Ferreira.
[*]
Assistente de pesquisas no Deptº. de Comunicações e
Jornalismo na Universidade de Massey, Nova Zelândia.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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