O pico petrolífero e as classes trabalhadoras

por Dale Allen Pfeiffer [*]

ASPO. Para começar, sejamos claros. Como sabemos, o governo é a ferramenta das classes privilegiadas com a qual controlam as massas e garantem um ambiente favorável aos seus próprios interesses. Para se ver como isto é verdadeiro, basta passar em revista a história americana desde a fundação dos Estados Unidos.

Desde a luta laboral do princípio do século XIX até ao Acordo de Comércio Livre da América do Norte, o governo dos EUA esteve sempre firmemente ao lado das classes privilegiadas. As leis dos salários justos, do dia de oito horas de trabalho e da mão-de-obra infantil não foram produto de um governo prudente e benevolente, nem de um mundo empresarial humano e consciencioso. Foram sim concessões dadas à classe trabalhadora para pôr fim a longos períodos de efervescência laboral e ao resultante desassossego no mercado. Todos os benefícios da classe trabalhadora foram pagos com o sangue e o sofrimento das gerações anteriores.

O governo e a classe privilegiada tentaram sempre apresentar a imagem de que se preocupavam com os pequenos e com a humanidade servil. Os nossos dirigentes procuraram sempre aparentar a magnanimidade, desde a filosofia de Henry Ford de pagar o suficiente aos seus empregados para que eles pudessem comprar os seus próprios veículos, até à teoria das sobras dos ricos de Ronald Reagan. No entanto, Henry Ford foi um apoiante fanático do nazismo e do fascismo em geral, e Ronald Reagan foi um mau actor e um palhaço cuja política económica conduziu ao fenómeno da contracção do pessoal das empresas (downsizing) e permitiu que os seus directores ganhassem 300 vezes mais do que os salários médios estagnados dos trabalhadores.

Desde há muito que o governo e as classes privilegiadas tentam subverter o movimento dos trabalhadores. Aprenderam à sua custa que é compensador pacificar a classe trabalhadora mas só o suficiente para que ela se torne fraca e obediente. Todas as tentativas de formar uma organização de trabalhadores verdadeiramente democrática foram esmagadas ou impossibilitadas. O exemplo clássico é a história do IWW, Industrial Workers of the World (Trabalhadores Industriais Mundiais), que pode ser lida aqui . O poder, ao contrário, apoiou organizações como a AFL (Federação Americana do Trabalho), ou organizações domesticadas como o CIO (Congresso das Organizações Industriais). Estas eram organizações profissionais centralizadas cuja liderança estava mais do lado dos presidentes das grandes empresas do que do lado dos trabalhadores que supostamente deviam representar. São organizações cuja política é trabalhar com as grandes empresas, o que se traduz numa liderança fraca da organização que facilmente se refugia em questões como o outsourcing (contratação no exterior) ou no downsizing (redução de custos de pessoal) enquanto criticam coisas sem importância. Tornaram-se um veículo para uma maior subjugação da classe trabalhadora. (Sei que há muitos sindicalistas dedicados nos níveis mais baixos – tal como há alguns dedicados funcionários civis nos níveis mais baixos do governo. E organizações profissionais que, até certo ponto, estão ao serviço da força laboral, embora acabem por se revelar ineficazes)

Entretanto, o público é influenciado pelas opiniões e perspectivas da classe privilegiada. Na escola, ensinam-nos a história da elite, a história laboral serve apenas de rodapé – se é que é mencionada. Os nossos meios de comunicação dão as notícias só do ponto de vista da elite – notícias de negócios. Dão-nos os índices de Dow Jones e da NASDAQ (National Association of Securities Dealers Automated Quotation – Associação Nacional das Cotações dos Fornecedores de Títulos Mecanizados), mas não dão o valor real dos salários ou a actual proporção entre o pagamento aos presidentes das empresas e o pagamento médio aos trabalhadores. Noticiam a taxa de desemprego sem reflectir o número de desempregados que chegaram ao fim dos benefícios de desemprego ou sem procurar saber o número dos sem-abrigo. Noticiam os gastos do consumo sem os correlacionar com as dívidas dos consumidores. E todos estes pequenos pormenores navegam num mar de violência pública, que leva muita gente a ter medo dos seus vizinhos e a ter medo de pôr o pé fora das suas próprias casas. Para culminar, somos perturbados por uma maré de entretenimentos que, na melhor das hipóteses, são inócuos e, na pior, são defensores subconscientes da visão aprovada da realidade.

Esta é a matriz em que vivemos hoje. Peço desculpa aos que têm consciência de tudo isto, se esta introdução parece pedante, mas é preciso expor tudo isto antes de podermos continuar com o tema deste artigo. Quanto aos que acham que esta introdução é apenas propaganda, lamento que não consigam tirar as vossas vendas nem por um minuto sequer. É duvidoso que aproveitem alguma coisa do resto deste artigo. Quanto aos que desejarem saber mais sobre a história laboral, recomendo Strike! de Jeremy Brecher (South End Press). Brecher dá-nos uma apresentação muito boa deste assunto.

Agora, depois de esboçarmos uma apreciação muito breve mas honesta de como o fenómeno do pico petrolífero terá impacto nesta estrutura social, proporemos sugestões sobre como a classe trabalhadora deverá encarar a crise que se aproxima.

O PICO PETROLÍFERO & A LUTA DE CLASSES

Há bastante tempo que se verifica a pilhagem dos Estados Unidos; pelo menos desde a década de 1980. E há mesmo quem diga que ela se verifica desde a chegada dos primeiros europeus a este continente. Mas, neste momento, a pilhagem dos EUA está a começar a acelerar.

Podem ter a certeza de que a elite já chegou à conclusão de como vai maximizar os seus lucros com o pico petrolífero. Apesar de todos os disparates que os economistas dizem, eles sabem que a nossa economia pode começar a contrair-se em resultado da diminuição da produção de energia. E sabem que em qualquer forma de capitalismo – seja ela o mercado livre, o mercado assistido pelo estado ou o mercado fortemente regulamentado – a contracção económica contínua é um eufemismo para colapso. Os peritos na manipulação do dinheiro sabem quando devem saltar fora, e sabem como manipular mesmo um mau negócio a fim de obter o máximo lucro.

Notícias recentes ( US$380 Oil? Banks talk Oil Depletion , Michael Kane, From the Wilderness, 07/Junho/2005) indicam que a classe privilegiada poderá utilizar a histeria do pico petrolífero para elevar prematuramente os preços a alturas artificiais. Embora haja razões para os preços do petróleo estarem actualmente a subir, não há razão nenhuma nesta altura para terem atingido os 60 dólares por barril. Isto é resultado da especulação, e há quem esteja a tirar enormes lucros com isso. Até agora, o pico petrolífero é apenas conversa sussurrada no mercado. O verdadeiro pânico do mercado ainda está para chegar, talvez daqui a um ano, talvez no próximo mês ou já na próxima semana – se não ocorrer antes de este artigo ser publicado.

Quando o pânico chegar, a elite está pronta para o gerir. Os privilegiados vão arrebatar todos os lucros, depois vão liquidar os seus bens e levá-los para longe antes que o mercado desabe. Vão desarmar as suas tendas e sair da cidade, talvez para as Ilhas Caimão, talvez para lugares seguros na Ásia ou noutro sítio qualquer. Aí trocarão os seus dólares por ouro, ou possivelmente por yuan chineses, estimulando uma desvalorização monumental do dólar americano. E vão recostar-se em segurança e conforto a observar o colapso. Depois de a poeira assentar, voltarão – juntamente com todos os outros abutres – para apanhar o que resta por meia dúzia de cêntimos.

Entretanto, a classe trabalhadora vai sofrer o principal impacto desta catástrofe. A taxa de desemprego vai levantar voo quando as grandes empresas fecharem as portas e declararem bancarrota. Quer os salários subam ou desçam, o valor da moeda em que forem pagos torná-los-á inúteis. Haverá crises simultâneas nos transportes, na agricultura e no saneamento público. Haverá um aumento brutal de sofrimento, miséria, fome e morte.

Enquanto os negócios estarão a abrir falências às carradas, o público não será capaz de aliviar a sua carga de dívidas pessoais, graças às novas leis de falências que Bush impôs ao Congresso. Milhões poderão vir a ser condenados a uma qualquer forma de servidão por dívidas. Ao mesmo tempo, como noticiou Stan Goff ( The Global Battlefield - We are Standing on it , Stan Goff, From the Wilderness, 08/Julho/2005), os negócios e serviços que restarem vão ter assegurada a sua força de trabalho sob a capa da segurança nacional. Muitos endividados, abalados e sem trabalho, poderão ser despachados a fim de se tornarem trabalhadores rurais sob a supervisão de guardas armados.

Assim, rapidamente, perder-se-ão 200 anos de conquistas sindicais. Não se iluda pensando que isto não pode acontecer. A classe privilegiada não recebeu nenhuma bênção especial; obteve os seus privilégios através do roubo e do saque. Ela trepou até ao topo pondo os pés em cima dos outros. Pouco importam as banalidades sobre fraternidade e interesse comum que possa ter proferido, a grande maioria fará o que for necessário para manter a sua posição. As grandes empresas bem podem dizer que estão cá para servir o público, mas o seu intuito fundamental é a maximização do lucro.

De todas as medidas necessárias para a pilhagem final dos EUA, o empobrecimento da população americana e a instituição da escravidão por dívidas já estão em marcha ou estão a ser preparadas no preciso momento em que está a ler estas palavras. Só falta uma deixa dos bastidores.

Há uma coisa que poderia impedir este cenário: um levantamento da classe trabalhadora. A classe trabalhadora tem poder para fazer parar tudo através da greve geral. Só a ignorância e a abdicação deste poder último é que dá à classe privilegiada esse poder que ela utiliza para nos explorar.

Neste momento eles não acreditam que sejamos capazes de tal resistência unificada. As nossas organizações sindicais são fracas, subornadas e corruptas. Estamos mal informados, endoutrinados e isolados. Temos medo dos nossos próprios vizinhos e somos metidos rapidamente na linha com a ameaça do terrorismo. Já se esqueceram da batalha de Seattle e têm ignorado protestos semelhantes desde então. Logo que é localizado um protesto, podem refreá-lo, minimizar a publicidade dos media e dar-lhe a volta apropriada, e esmagá-lo se necessário. O maior espinho que têm neste momento é a nossa capacidade de comunicar pela Internet.

Creio que eles nos subestimam.

VISÃO

Mas, nós também nos subestimamos.

Sobrecarregado de trabalho e mal pago, desinformado e reduzido a zero, medroso e inseguro, o trabalhador vulgar tem dificuldade em se aperceber que os seus problemas são os mesmos de milhões de outras pessoas, e por isso dificilmente compreende que esses problemas não são pessoais mas sistémicos. Estes problemas são resultantes de um sistema que procura maximizar o lucro, maximizando a exploração da força de trabalho.

Só quando a classe trabalhadora conseguir ver até que ponto esta luta é comum é que será capaz de perceber os problemas que a provocam. Cada um de nós vai ter de manter a cabeça fora de água o melhor que puder, e quando a água subir, podemos mesmo vir a afogar alguns dos nossos vizinhos no meio do nosso pânico. A percepção da natureza sistémica do problema pode mesmo levar ao desespero, à resignação ou a uma fúria cega, se não conseguirmos ver nenhuma alternativa para o domínio do capital e a exploração dos trabalhadores.

Uma das façanhas da propaganda do século passado foi a ideia de que só há dois sistemas sociais possíveis, que estão diametralmente opostos: o capitalismo, em que a elite endinheirada detém o poder, e o comunismo totalitário, em que os burocratas detêm o poder. Os propagandistas ocidentais proclamaram em voz alta que a queda da União Soviética provara que o comunismo totalitário era um fracasso e, inversamente, que o capitalismo era o único sistema social bem sucedido e de boa saúde. No entanto, tanto o capitalismo como o comunismo totalitário estão baseados em disparidades de poder e, como tal, são insustentáveis. Talvez o nosso sistema seja um pouco mais dinâmico do que o sistema soviético, mas não prevejo que lhe sobreviva durante muito tempo.

A dupla linguagem dos propagandistas ocidentais torna muito difícil compreender tudo isto. Evitam a palavra capitalismo e em seu lugar utilizam a palavra democracia. O que eles querem dizer com democracia é um sistema de democracia representativa em que o poder que toma decisões fica totalmente nas mãos da classe privilegiada. A democracia representativa é uma ficção destinada a pacificar as massas e ao mesmo tempo limitar a sua voz dentro do sistema. Na realidade, a democracia e o capitalismo são antitéticos. O que é na verdade diametralmente oposto ao capitalismo é a democracia no local de trabalho.

Esta é, assim, a perspectiva de que os trabalhadores desiludidos precisam: uma democracia participativa baseada não na regra da maioria, mas no consenso ou em qualquer mecanismo semelhante que garanta que não se torna numa ditadura da maioria. Quanto a esta questão, os defensores do capitalismo gostam de afirmar que tais formas de democracia são demasiado lentas para tomar decisões de negócios. Onde é que há um único exemplo duma robusta democracia participativa?, perguntam.

Isto parece-se com o matulão no recreio que pergunta porque é que ninguém o desafia. No nosso sistema dominante, os protectores governamentais do capitalismo barricaram-se contra as alternativas. E o mundo dos negócios esventrará rapidamente qualquer companhia dirigida por trabalhadores que mostre tendência a crescer. Apesar deste ambiente agressivo, há algumas histórias de sucesso de empresas dirigidas por trabalhadores. O colectivo Mondragón em Espanha fornece o exemplo provavelmente mais conhecido. A companhia alemã, Endenburg Electrotechniek, Inc., é outro exemplo, juntamente com algumas empresas Quaker. Quanto a exemplos teóricos, Parecon and sociocracy (Economia Participativa e sociocracia) retrata de que modo uma empresa democrática pode funcionar sem percalços e com eficácia.

Munidos da percepção dos problemas sistémicos que estão na base da sua luta, e do conhecimento de sistemas alternativos viáveis, os trabalhadores só precisam de um empurrão que os lance na acção. Esse empurrão pode ser a noção de que o pico petrolífero vai piorar dramaticamente a sua situação actual; a sua luta é tornar-se-á obrigatoriamente mais frenética e trágica. Ao observarem isto, aperceber-se-ão que já não estão a lutar apenas para se manterem à tona de água; estão a lutar pelas suas vidas e pelas vidas dos seus entes queridos.

Com a percepção da verdadeira natureza da sua luta, a perspectiva de uma alternativa e a compreensão de que o pico petrolífero transformará esta luta numa questão de vida ou de morte, a classe trabalhadora pode reanimar-se praticamente dum dia para o outro, e pode pôr fim a esta loucura na manhã seguinte.

O que é preciso agora é organização e educação, e um conjunto de objectivos que nos conduzam a uma mudança sistémica.

OBJECTIVOS

Segue-se um conjunto progressivo de exigências laborais que, se forem executadas, resultarão numa mudança sistémica. De notar que todas estas exigências têm que ser tomadas a nível central. Não são apenas o género de exigências que uma organização sindical possa fazer a uma empresa individual.

Os trabalhadores podiam tentar que estas exigências fossem cumpridas, pressionando os nossos políticos centrais. No entanto, isso seria um esforço inglório. Embora alguns políticos possam enganar os trabalhadores com falinhas mansas, não há forma de os trabalhadores e as suas organizações poderem competir em pé de igualdade com os milhões de dólares de contribuições para as campanhas que são oferecidos pelos contribuidores das empresas e seus intermediários. Ainda por cima, a grande maioria dos políticos federais são provenientes da classe privilegiada e têm pouca tendência para trair a sua própria classe. Mesmo que houvesse um grupo de membros do Congresso que estivesse verdadeiramente preocupado com a classe trabalhadora e apostado em legislar essas reformas, antes de se conseguir aprovar qualquer proposta de lei apresentada, esta provavelmente seria alterada e adulterada ao ponto de perder todo o sentido. Todo o nosso sistema legislativo e o nosso tão gabado equilíbrio de poder estão concebidos para marginalizar a voz do povo em favor da classe privilegiada.

Estas exigências só serão ouvidas se forem gritadas por um grande e unificado movimento dos trabalhadores. A classe privilegiada só aceitará medidas destas se souber que não tem alternativa, perante uma completa paragem do trabalho, como é costume. Tal é o poder da greve geral. Sem ela nenhum destes objectivos verá a luz do dia.

São os seguintes, então, os objectivos que a classe trabalhadora tem que atingir em resposta ao pico petrolífero:

1. Fim da globalização. Temos que sair da NAFTA (North American Free Trade Agreement – Acordo do Comércio Livre da América do Norte), da FTAA (Free Trade Area of the Americas – Area de Comércio Livre das Américas), da WTO (World Trade Organization – Organização Mundial do Comércio), da CAFTA (Central American Free Trade Agreement – Acordo Centro-Americano do Comércio Livre) e pôr fim à crueldade da globalização tal como é hoje praticada. Todas as grandes empresas que tentem fugir para fora do país têm que ser fortemente penalizadas, e essas penalizações têm que ser retroactivas – alargadas desde a data em que foram consignadas na lei até à data em que foram propostas pela primeira vez.

Também temos que regressar à localização da produção. Com o pico petrolífero, isto vai acontecer quer queiramos quer não. É preferível começar já o processo, de forma ordenada. É previsível que, deixadas à rédea solta, as empresas planeiem relocalizar a produção depois de o pico petrolífero e de o resultante colapso económico terem empobrecido os trabalhadores ao ponto de eles aceitarem quaisquer salários e condições de trabalho que lhes ofereçam. Temos que exigir esta mudança já, enquanto ainda temos força para o fazer.

2. Infra-estrutura fiscal das corporações. O pico petrolífero exige importantes alterações na nossa infra-estrutura. Pondo de lado todos os disparates sobre automóveis alimentados por pilhas de combustível a hidrogénio ou o biodiesel, temos que reestruturar as nossas comunidades, melhorar os caminhos de ferro para o transporte de cargas, e construir desde o início uma eficaz rede de transportes públicos. É bem sabido que diversas empresas – em especial os fabricantes de automóveis e de pneus – fizeram um esforço deliberado para desmantelar os nossos transportes públicos no século XX, e para planear as nossas comunidades à volta dos automóveis e dos camiões. Em consequência, essas empresas tiveram enormes lucros, enquanto nós ficámos com uma sociedade pulverizada altamente dependente do petróleo. Ainda por cima, a construção e manutenção do sistema de transportes foi subsidiado pelos impostos públicos, com pouco ou nenhum custo para o negócio. As empresas já beneficiaram deste sistema tempo demais. É agora justo que paguem pela sua restruturação durante o declínio da idade do petróleo.

3. O dia de 4 Horas e o salário mínimo. Com um dia de quatro horas, podemos atingir uma taxa de pleno emprego, assegurando ao mesmo tempo que os trabalhadores não fiquem tão sobrecarregados com trabalho que lhes seja impossível terem uma vida significativa para além do trabalho, ou serem participantes bem informados na democracia. Além do mais, é totalmente justo prever um salário mínimo para uma semana de 20 horas. Não nos esqueçamos de que um salário mínimo será certamente mais baixo numa economia localizada onde as pessoas não precisam de pagar todas aquelas despesas que hoje são necessárias para o seu transporte pessoal. O custo dum salário mínimo ainda pode ser reduzido com a exigência seguinte.

4. Direito à habitação, à alimentação e aos cuidados de saúde. Os Estados Unidos são um dos dois únicos membros das Nações Unidas que se recusaram repetidas vezes a assinar a Carta Internacional dos Direitos Humanos. Tudo por causa das disposições no acordo relativas ao direito de todos os indivíduos à habitação, alimentação e cuidados de saúde. No entanto, não podemos ter uma democracia saudável se estas necessidades básicas não forem garantidas. Na verdade, o custo para isto é mínimo e é equilibrado pela possibilidade de um salário mínimo mais baixo. Este ponto levanta uma questão básica: como é que vamos enfrentar o declínio da idade do petróleo, todos por um ou cada um por si próprio?

5. Democracia Participativa. Como é que podemos ter esperanças alguma vez de ter um sistema social democrático a funcionar verdadeiramente, se o mundo do trabalho se mantém sob uma ditadura? Este é na verdade o maior e o mais fatal equívoco dos nossos antepassados fundadores. Há mesmo quem afirme que não houve equívoco nenhum, visto que os nossos antepassados fundadores eram todos membros da classe privilegiada. De qualquer modo, é tempo de rectificar esta situação.

Estas cinco exigências são todas elas progressivas. Embora o mundo empresarial grite escandalizado a cada uma destas exigências, elas foram aqui enumeradas pela ordem da possibilidade de serem concretizadas. Os pontos 1 e 2 preocupam-se com as mudanças necessárias exigidas, duma maneira ou doutra, para se sobreviver ao declínio da idade do petróleo sem que haja um colapso total da civilização. Perante uma greve geral e a realidade do pico petrolífero, a classe privilegiada provavelmente submeter-se-á a estas duas exigências.

Os pontos 3 e 4, embora não estejam totalmente relacionados com o pico petrolífero, ajudarão a suavizar o declínio da idade do petróleo. Embora a classe privilegiada possa mostrar maior resistência a estas exigências, não poderá recusá-las frente a uma greve geral. Quanto à última exigência, a implementação em grande escala de uma democracia participativa exigirá provavelmente uma revolução completa. Mas, então, não é esse o objectivo final da greve geral?

Há outras exigências que podiam ser acrescentadas a esta lista, mas estas são as cinco exigências chave relacionadas com o pico petrolífero e o declínio da idade do petróleo. Há algumas profissões que deixarão de ser viáveis na era pós-petróleo. À cabeça vêm logo as indústrias dos transportes aéreos e terrestres. Talvez se pudesse acrescentar a esta lista uma exigência adicional para reciclagem e colocação dos trabalhadores das indústrias obsoletas.

IMPLEMENTAÇÃO

As medidas acima enumeradas ajudariam o público em geral a enfrentar mais facilmente a diminuição dos fornecimentos energéticos. Não eliminariam totalmente as dificuldades, mas ajudariam a minimizá-las. Vamos todos ter que apertar o cinto quando os fornecimentos de energia diminuírem, e vamos ter que reduzir a nossa população. Mas estas medidas ajudar-nos-ão a estar preparados, e evitarão que um segmento da sociedade mantenha a cabeça fora da água às custas dos restantes. Com um sistema mais justo, com a garantia de que ninguém se vai esgueirar pelos cantos, a nossa população pode reduzir-se a um ritmo natural, sem sofrimento desnecessário.

No entanto, estas medidas nunca serão postas em prática se as pedirmos ao nosso governo. Nem serão apoiadas com êxito pelas principais organizações sindicais que actualmente existem. A aprovação destas medidas exigirá o envolvimento de um grande número de trabalhadores que estão fora das organizações sindicais tradicionais. É até de esperar que as organizações tradicionais ajudem a reprimir um movimento deste tipo. Sem qualquer dúvida, esse movimento será caluniado na imprensa e os seus membros serão rotulados pelo governo de terroristas internos.

Este movimento tem que criar uma rede de comunicações, calma mas rapidamente, através de todas as grandes indústrias da nação. Depois, na altura própria, tem que se erguer e expor a sua causa claramente ao público em geral, quer directamente por meio duma greve geral, quer através de uma série de greves selvagens estratégicas que culminarão numa greve geral. Mas primeiro que tudo temos que comunicar e organizar.

(...)

CONCLUSÃO

É preciso que todos se envolvam, para seu próprio bem e pelo bem dos seus entes queridos. Se deixarmos esta questão nas mãos da classe privilegiada, depois não podemos queixar-nos quando nos encontrarmos a estrebuchar debaixo da canga da servidão por dívidas ou – ainda pior – a morrer à fome. Se não começarmos a agir agora mesmo, será demasiado tarde.

Sem dúvida, o governo utilizará todos os meios ao seu dispor para reprimir este movimento e deter a greve geral. Os dirigentes identificados serão presos como terroristas internos. Mas, como será um movimento democrático descentralizado, não haverá dirigentes. Ou, mais propriamente, todos nós seremos dirigentes. Podem encher as cadeias e as prisões até deitar por fora. Se toda a gente se recusar a trabalhar, eles perdem.

Para vencer basta ter determinação – determinação de que queremos viver num mundo livre onde todos tenham uma voz igual na sociedade e no local de trabalho, e onde a todos seja garantido o seu direito a uma casa, à alimentação, aos cuidados de saúde, e à busca da felicidade. Com esta perspectiva e com a arma da greve geral, não podemos perder. Quando começar a greve geral e enquanto todos se recusarem a trabalhar, havemos de vencer. Pelo nosso bem futuro, e pelas vidas dos nossos entes queridos, seremos bem sucedidos.

02/Setembro/2005
Este artigo encontra-se em
http://www.onlinejournal.com/Special_Reports/090205Pfeiffer/090205pfeiffer.html .
Tradução de Margarida Ferreira.

[*] Assistente de pesquisas no Deptº. de Comunicações e Jornalismo na Universidade de Massey, Nova Zelândia.


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
27/Set/05