O novo aumento no IRS para muitos dos reformados e aposentados vai reduzir o seu rendimento em mais de 100 milhões € no ano de 2011

por Eugénio Rosa [*]

RESUMO DESTE ESTUDO

No fim de 2010, em Portugal, existiam 2.346.073 reformados e aposentados por velhice, sendo 1.897.321 pela Segurança Social e 448.752 pela CGA. Para além destes ainda existiam 291.448 reformados por invalidez da Segurança Social. Somando, obtém-se 2.617.521 reformados e aposentados por velhice e invalidez, o que corresponde a 25% da população portuguesa. As pensões de todos estes portugueses foram congeladas em 2011 (artº 65º da Lei do OE20110). E isto apesar da inflação até Nov.2010 ter aumentado 2,3% (a subida, em 2011, não será inferior), e de, no fim de 2010, a pensão média paga pela Segurança Social ser apenas de 369,29€ /mês, sendo a dos reformados do Regime da Pensão Social e do Regime Rural Transitório (32.675) 187,18 € por mês; e a pensão do Regime Regulamentar Rural (170.4549) somente de 224,62 €/mês. Na Administração Pública, no fim de 2009, existiam 92.020 aposentados com pensões inferiores a 500€/mês. Todas estas pensões, mesmo com estes valores, foram congeladas.

Mas para além disto, e do aumento dos impostos em 2011 que atingem todos os portugueses, os reformados e aposentados com pensões ilíquidas superiores a 1.607 € por mês vão sofrer, em 2011, mais um outro corte, que resulta do aumento de IRS. E isto porque, em 2011, vai aumentar o seu rendimento sujeito a IRS, devido a diminuir a parte que não está sujeita a IRS. Portanto, embora o seu rendimento efectivo não aumente em 2011, o rendimento sujeito a IRS vai aumentar e, consequentemente, vão ser obrigados a pagar mais IRS.

Qualquer reformado ou aposentado com uma pensão ilíquida superior a 1.607€ por mês pode calcular, embora seja um valor meramente indicativo, o aumento de IRS que sofrerá em 2011. Para isso, basta que faça as seguintes contas: (a) Em relação a 2010 : multiplique o valor da sua pensão mensal ilíquida que recebeu neste ano por 14, para obter o valor anual bruto da pensão, depois deduz a este valor 13% da diferença entre 6.000 € e o valor que a sua pensão bruta anual que excede 30.240€. Obtém-se assim um valor e é esse valor que deve multiplicar pela taxa de IRS que aparece na sua declaração de IRS de 2009 aumentada de 1% para incluir o aumento extraordinário de IRS que começou a vigorar em 2010: (b) Em relação a 2011 : multiplique o valor da sua pensão mensal ilíquida que vai receber este ano, que é a mesma de 2010, por 14, para obter o valor anual bruto da pensão, depois deduz a este valor 20% da diferença entre 6.000 € e o valor bruto anual da sua pensão que excede agora 22.500€ e não 30.240€ como foi no ano anterior. Obtém assim um valor e é esse valor que deve multiplicar pela taxa de IRS que aparece na sua declaração de IRS aumentada de 1% para incluir o aumento extraordinário que começou a vigorar em 2010 e que consta também da Lei do OE2011. Depois compara o valor que assim obtém com o de 2010, e fica a saber de uma forma aproximada, qual é o aumento de IRS que terá em 2011. Para obter o valor por pensão mensal basta dividir por 14. Estes são comparáveis se as restantes deduções (despesas de saúde, educação etc) se mantiverem constantes.

Nós fizemos esses cálculos para pensões de 1000€, de 1500€, de 2000€, de 2500€, de 3000€ e de 4000€ por mês, para abranger o maior número de pensionistas. E obtivemos os seguintes resultados indicativos: (a) Para pensões ilíquidas de 1000€ e 1500€ por mês, não se verifica aumento de IRS; (b) O aumento de IRS para um reformado ou aposentado com uma pensão ilíquida mensal de 2000 euros é de 391€/ano, o que dá um aumento de IRS em cada pensão recebida (14) de, aproximadamente, de 28€ por mês;(c) Se a pensão ilíquida for de 2.500€ por mês já o IRS aumenta, aproximadamente, em 668€ por ano, o que dá uma subida por pensão recebida (14) de 48€; (d) Se a pensão ilíquida for de 3.000€ por mês, o aumento anual de IRS é já, aproximadamente, de 842€/ano, ou seja, de 60€ por mês; (e) Finalmente, se a pensão ilíquida mensal for de 4.000€, o aumento de IRS anual é, aproximadamente, de 1.105 €, o que dá por cada pensão recebida (14) um aumento de IRS de 79€.

A justificação que o governo apresentou para aquela diminuição da dedução no rendimento sujeito a IRS – necessidade de convergir para a dedução no rendimento que têm os trabalhadores no activo – é falsa. A dedução específica por rendimentos de trabalho é igual a 72% de 12 salários mínimos nacionais, o que correspondeu, em 2010, a um abatimento de 4.104 € no rendimento sujeito a IRS. E isto para todas as remunerações. No entanto, em 2011, um reformado ou aposentado com uma pensão mensal ilíquida de 2500€ por mês o abatimento no seu rendimento anual sujeito a imposto é de 3.500€; se tiver uma pensão mensal de 3000€ o abatimento é de 2.100€; e se tiver uma pensão mensal de 4.000€ por mês não abate nada. Em 2011, o aumento do IRS determinado pela diminuição da parcela da pensão não sujeita a imposto deverá atingir 350.000 pensionistas (130.000 da Segurança Social, e 220.000 aposentados da Administração Pública). Eis mais um corte nas pensões que tem passado despercebido, o que vai reduzir mais uma vez o poder de compra destes reformados e aposentados. Estimamos que cause uma redução do rendimento destes pensionistas em mais de 100 milhões €. E as pensões destes reformados e aposentados já há vários anos que não são actualizadas, e não apenas em 2011.

Muitos reformados e aposentados da Segurança Social e da Administração Pública têm-me pedido, por email, que os informe de quais serão os efeitos no valor das suas pensões da alteração que a Lei do OE2011 introduziu no Código do IRS. Na impossibilidade de responder individualmente a todos, aqui se deixa uma explicação que poderá ser útil a muitos.

Na Lei do Orçamento do Estado para 2011 apresentada pelo governo e aprovada na Assembleia da República, existe uma disposição que altera o artº 53º do Código do IRS que vai determinar, em 2011, um aumento de imposto a pagar pelos reformados e aposentados com pensões superiores a 1.607 euros por mês devido a aumentar o rendimento sujeito a imposto.

O RENDIMENTO NÃO SUJEITO A IRS PASSARÁ A SER PARA MUITOS REFORMADOS E APOSENTADOS INFERIOR À DEDUÇÃO ESPECIFICA QUE TÊM OS TRABALHADORES NO ACTIVO

Quando em 2005, o governo de Sócrates começou a reduzir a parcela da pensão não sujeita a pagamento de IRS, a justificação apresentada é que era necessária fazer a convergência para o valor isento de IRS proveniente de rendimentos do trabalho. Mas mais uma vez Sócrates diz uma coisa para logo a seguir fazer uma outra. A mentira tornou-se a prática corrente do actual governo. E isto porque com a alteração constante da Lei do OE2011, para muitos pensionistas, a parcela da pensão não sujeita a IRS é bastante inferior à parcela dos rendimentos do trabalho de um trabalhador no activo não sujeita a IRS.

Para que isso fique claro vamos começar por apresentar num quadro o que constou do Código do IRS em 2010 e o que está da Lei do OE2011 que foi aprovado na Assembleia da República.

Quadro 1- O que consta actualmente do Código de IRS e o que está na Lei do OE2011
DESCRIÇÃO
2010 – artº 53º do Código IRS
2011- artº 92º da Lei OE2011
Valor da dedução nos rendimentos brutos de pensões (artº 53º do Código do IRS) É deduzido, até ao rendimento anual bruto de 30.240 euros, 6000 euros É deduzido, até ao rendimento anual de 22.500 euros, 6000 euros
Limite máximo que se aplica a dedução anterior Se a pensão anual ilíquida for superior a 30.240 €, na dedução de 6.000 € é abatida, até à sua concorrência, 13% da parte da pensão anual ilíquida que exceder 30.240 euros Se o valor da pensão anual ilíquida for superior a 22.500 € , na dedução de 6.000 € é abatida, até à sua concorrência, 20% da parte do valor da pensão anual ilíquida que exceder 22.500 euros


Para se calcular o rendimento de um reformado ou aposentado sujeito a IRS, deduz –se ao rendimento bruto anual um determinado valor. E como é calculado esse valor em 2010 e em 2011?

Em 2010, em relação às pensões mensais até 2.160 €, ou seja, de valor anual (pensão mensal vezes 14) igual a 30.240 euros deduzia-se 6.000€, portanto só estava sujeito a IRS o valor que restava. Se a pensão mensal fosse superior a 30.240 euros por ano (2160€/mês), é que se verificava uma redução gradual do valor de 6.000 euros que se deduzia. E este valor era calculado deduzindo a 6.000 € a diferença entre o valor da pensão ilíquida anual e 30.240€ e multiplicando o valor assim obtido por 0,13 (13%).

Em 2011, só nas pensões ilíquidas mensais até 1607 € (o que corresponde a uma pensão bruta anual de 22.500€), é que é deduzido os 6.000 €. Em relação às pensões superiores a 1.607 € por mês o valor a deduzir é já inferior a 6000€. Este valor a deduzir é calculado deduzindo a 6.000 euros a diferença entra o valor da pensão ilíquida anual e 22.500 €, e multiplicando o valor assim obtido por 0,2 (20%).

Alguns exemplos concretos que se apresentam no quadro seguinte tornam mais claro as consequências para os pensionistas, com diferentes valores de pensões mensais, das alterações introduzidas pela Lei OE2011.

Quadro 2 – Aumento do IRS em 2011 a pagar pelos reformados e aposentados
PENSÃO MENSAL
PENSÃO ANUAL
(Rendimento bruto anual = Pensão mensal x 14)
Deduz no rendimento bruto anual
(artº 53º do Código do IRS e Lei OE-2011)
Rendimento sujeito a IRS
Aumento do rendimento sujeito a IRS entre 2010 e 2011
Aumento de IRS em 2011
(Valor anual indicativo)
Aumento de IRS no valor de pensão mensal em 2011
(14 pensões)
1000 € em 2010 e em 2011 14.000 € 6.000 € 8.000 € 0 € 0 € 0 €
1500 € em 2010 e em 2011 21.000 € 6.000 € 15.000 € 0 € 0 € 0 €
2000€ em 2010 28.000 € 6.000 € 22.000 €      
2000€ em 2011 28.000 € 4.900 € 23.100 € 1.100 € 391 € 28 €
2500€ em 2010 35.000 € 5.381 € 29.619 €      
2500€ em 2011 35.000 € 3.500 € 31.500 € 1.881 € 668 € 48 €
3000€ em 2010 42.000 € 4.471 € 37.529 €      
3000€ em 2011 42.000 € 2.100 € 39.900 € 2.371 € 842 € 60 €
4000€ dm 2010 56.000 € 2.909 € 53.091 €      
4000€ em 2011 56.000 € -700 € 56.000 € 2.909 € 1.105 € 79 €


Os reformados e aposentados com pensões ilíquidas superiores a 1.607 euros por mês (22500:14) sofrem, em 2011, um aumento de IRS que é tanto maior quanto mais elevada é a pensão.

Assim, o aumento do IRS anual para um reformado ou aposentado com uma pensão ilíquida mensal de 2.000 € é de 391€, o que dá um aumento de IRS a deduzir em cada pensão recebida (14) de, aproximadamente, de 28€ por mês; se a pensão for de 2.500€ por mês já o IRS aumenta, aproximadamente, 668€ por ano, o que dá uma subida mensal (14 meses ) de 48€ de IRS; se a pensão ilíquida for de 3.000€ por mês, o aumento anual de IRS é já, aproximadamente, de 842€, o que dá um aumento de IRS em 2011 de 60€ em cada pensão recebida (14); finalmente, se a pensão for de 4.000€ por mês, o aumento de IRS anual é, aproximadamente, de 1.105 €, o que dá, por cada pensão recebida, um aumento IRS de 79€. Estes valores são aproximados. Para que cada pensionista possa obter um valor mais aproximado em relação ao seu caso concreto terá apenas de multiplicar a diferença que se obtém da forma que foi explicada anteriormente pela taxa aumentada de 1% (melhor 1 ponto percentual) que consta da sua declaração de IRS de 2009.

Como se sabe os reformados e aposentados com pensões ilíquidas superiores a 1500€ por mês, já não têm há vários anos qualquer actualização nas suas pensões. Isso não acontece apenas em 2011. Mas como qualquer outro pensionista tem estado sujeito ao efeito corrosivo do aumento de preços (entre Nov2009 e Nov2010, os preços aumentaram 2,3%, e em 2010 será certamente superior a este), em 2010 (e também em 2011), terão também de suportar, como qualquer outro português, o aumento extraordinário de 1% ( 1 p.p.) na taxa de IRS e, devido à Lei do OE2011, vão sofrer mais um corte no seu rendimento, que não atinge os outros portugueses.

Em 2005, a parcela da pensão anual que estava não sujeita a IRS era de 8.283€, e desde esse ano tem sido reduzida pelo governo de Sócrates, o que tem determinado, só por esta razão, um corte todos os anos nos rendimentos de muitos reformados e aposentados. E a justificação dada é que era necessário que convergisse para o valor da dedução específica que tinha os trabalhadores em actividade. Mas esta justificação é também uma grande mentira. A dedução por rendimentos de trabalho é igual a 72% de 12 salários mínimos nacionais o que corresponde, em 2010, a 4104 euros. E isto para todas as remunerações, mesmo as mais elevadas. No entanto, em 2011, como se conclui do quadro 2 (3ª coluna a contar da esquerda) um reformado ou aposentado com uma pensão ilíquida mensal de 2500€ por mês o abatimento no seu rendimento anual sujeito a IRS é apenas de 3.500€; se tiver uma pensão mensal de 3000€ o abatimento será de apenas 2.100€; e se tiver uma pensão mensal de 4.000€ por mês não abate nada.

A LEI DO ORÇAMENTO DE ESTADO PARA 2011 CONGELA TODAS AS PENSÕES MESMO AS MAIS BAIXAS O QUE, COM A SUBIDA DOS PREÇOS, VAI DETERMINAR MAIS MISÉRIA

No fim de 2010, existiam, em Portugal, 2.346.073 reformados e aposentados por velhice, sendo 1.897.321 da Segurança Social e 448.752 da CGA. Para além destes, ainda existiam 291.448 reformados por invalidez também da Segurança Social. Somando, obtém-se 2.617.521 reformados e aposentados por velhice e invalidez, o que corresponde a cerca de 25% da população portuguesa. Todos estes pensionistas têm as suas as pensões congeladas em 2011 pelo artº 65º da Lei OE2011, apesar da taxa de inflação ter aumentado, entre Nov.2009/Nov.2010, em 2,3%, segundo o INE, e apesar também de se prever que a subida da taxa de inflação em 2011 não seja inferior àquele valor; portanto, em 2 anos, só devido ao aumento de preços, os pensionistas portugueses verão o seu poder de compra diminuir em mais de 4,6%

A gravidade desta situação torna-se mais clara se se tiver presente que a esmagadora maioria dos pensionistas recebem pensões muitos baixas, como mostra o quadro seguinte, construído com dados divulgados pela Segurança Social referentes a Novembro de 2010.

Quadro 3 – Número de pensionistas de velhice da Segurança Social e valor da pensão recebida em Novembro de 2010 e que vão receber também em 2011
REGIME
Nº pensionistas Nov.2010
Pensão
Regime Geral 1.694.192 413,56 € (*)
Regime regulamentar rural 170.454 224,62 €
Regime Pensão Social 26.715 187,18 €
Regime rural transitório 5.960 187,18 €
TOTAL 1.897.321 369,29 € (*)
Fonte: Estatísticas da Segurança Social -2010; (*) Pensão média

Em Novembro de 2010, a pensão média de 1.897.321 reformados paga pela Segurança Social era apenas de 369,29€ por mês, recebendo os reformados do Regime da Pensão Social e do Regime rural transitório (32.675 pensionistas) apenas 187,18 € por mês; a pensão dos do Regime regulamentar rural (170.454 pensionistas) era somente de 224,62 € por mês; e a pensão média mensal do Regime Geral era de 413,56€. Portanto, tudo valores abaixo ou próximos do limiar da pobreza. Se repartimos os pensionistas da Segurança Social por escalões de valores de pensões constantes da estrutura da Conta da Segurança Social de 2008, que é a última disponível, a gravidade da situação ainda se torna mais clara. Utilizando essa estrutura, conclui-se que, em 2010, 10,7% do total de reformados (203.129) do Regime Geral recebiam pensões iguais ou inferiores a 225€ por mês; e 68% (1.293.065 ) recebiam uma pensão média que devia rondar os 336 € por mês. Apenas 0,5% (10.151 reformados ) recebiam pensões superiores a 2.500€ por mês.

Em relação a Administração Pública, a situação era, em 31/12/2009, a constante do quadro 4

Quadro 4- Aposentados e reformados da Administração Pública por escalões de pensões
ESCALÕES
Nº aposentados e reformados em 31/12/2009
% do TOTAL
Até 227,39 € 22.311 5,2%
De 227,40 a 250€ 32.538 7,6%
De 250,01 a 500€ 38.061 8,9%
De 500,01 a 750€ 68.902 16,1%
De 750,01 a 1000€ 57.422 13,4%
De 1000,01 a 1500€ 75.752 17,7%
De 1500,01 a 2000€ 37.797 8,8%
De 2000,01 a 2500€ 48.554 11,3%
De 2500,01 a 3000€ 33.834 7,9%
De 3000,01 a 4000€ 9.048 2,1%
Superior a 4000€ 4.533 1,1%
TOTAL 428.752 100,0%
Fonte : Relatório e Contas - 2009 da CGA

Apenas 1,1% (4.533) do total de aposentados e reformados da Administração Pública recebiam, no fim de 2009, uma pensão de valor superior a 4.000€ por mês, e 21,7% (92.910) recebiam pensões inferiores a 500 €/mês. E a lei do OE 2010 congelou todas as pensões em 2011, seja qual for o seu valor, o que atirará os pensionistas com pensões mais baixas para uma miséria maior.

02/Janeiro/2011
[*] Economista, edr2@netcabo.pt

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
05/Jan/11