A crise e a luta anticapitalista
As recentes quedas nas bolsas de valores de todo o mundo e as crises das
dívidas públicas dos países centrais são anunciadas
pela imprensa como uma nova crise, que viria a atrapalhar as tentativas de
recuperação econômica mundial após a crise de
2007/2008. Esses analistas procuram a todo custo diferenciar o movimento
atual e mostrar que a economia privada vai bem, o problema agora é dos
países extremamente endividados, portanto, a saída
para o capitalismo deveria ser de ajustes fiscais por parte dos Estados, com
cortes nos gastos públicos e nos direitos dos trabalhadores e
aposentados. Essa visão de curto prazo, tão comum aos
ideólogos do capitalismo nos últimos anos, não permite
perceber os reais problemas por que passa o capitalismo e deixa claro que essa
crise atual nada mais é do que a continuação e
o aprofundamento da crise sistêmica em que se encontra o capitalismo
desde a década de 1990.
O que ocorre hoje é consequência direta das medidas tomadas
há dois anos para tentar salvar o grande capital financeiro e os grandes
bancos que especularam e sugaram enormes massas de valores produzidos, num
movimento irracional de acumulação fictícia em escala
global. Quando a crise sistêmica do capitalismo se deixou mostrar
claramente com o estouro dos fundos especulativos em 2007 e 2008, levando
à falência grandes bancos de investimentos e
instituições que aplicavam nos mercados de títulos
privados (principalmente nos mercados dos EUA e da Europa), os Estados usaram
seu arsenal monetário para salvar estes bancos e fundos. Na
prática, os Estados assumiram os títulos podres que apareceram
após a farra financeira do setor privado e transferiram as
dívidas privadas para o setor público. Agora, a burguesia quer
sacrificar ainda mais a população com ajustes fiscais por parte
dos Estados.
Naquele momento, havia quase uma unanimidade em pensar que começara o
início do fim do neoliberalismo e que as políticas
públicas keynesianas voltariam a dominar o cenário
econômico, com os Estados voltando a atuar fortemente na economia, com os
bancos centrais atuando como emprestadores de última instância.
Muitos alimentaram ilusões de que teríamos um novo ciclo de
crescimento econômico como o verificado no pós-guerra, quando os
mercados financeiros foram dominados por políticas públicas que
elevavam os salários e o bem-estar dos trabalhadores, além de
aumentar a lucratividade das empresas produtivas. Isso não ocorreu, a
farra especulativa continuou, e os reformadores não
conseguiram regular o livre mercado.
A crise é de todo o sistema capitalista, muito mais profunda do que a
simples oscilação das bolsas de valores permitem enxergar. O
capitalismo é um sistema em que a produção da riqueza
é coletiva e a apropriação é privada, cada vez mais
concentrada e, diante da concorrência em mercados livres, os capitais
competem por taxas de apropriação da riqueza cada vez mais
elevadas. Ocorre que o capital não se reproduz sozinho. É o
trabalho produtivo, humano e desempenhado no processo de produção
de mercadorias que produz a riqueza. Quanto mais se concentra o capital e se
esmaga o trabalho, menos valor novo é produzido, provocando crises de
acumulação que podem ser cíclicas, quando há
possibilidades de retomada dos investimentos produtivos e novos ciclos de
emprego e produção de valor, ou pode chegar a um estágio
em que as possibilidades de saída para a retomada da
acumulação de capital encontram entraves que, para serem
superados, levam à barbárie.
O que vemos hoje é a expressão de uma crise estrutural muito mais
séria que qualquer crise cíclica anterior.
É estrutural, pois possui um caráter universal. A crise
não é reservada a um ramo específico da
produção, ou estritamente financeira; e não envolve apenas
um número específico de países; assumiu uma linha
cronológica contínua e sequencial, diferentemente dos
períodos de crises cíclicas em que, após certo tempo, os
capitalistas conseguiam superar suas contradições mais imediatas.
Os capitais já não conseguem sair da pura
especulação fictícia e voltar à esfera da
produção do valor. Mesmo nesta esfera, dado o grau de
produção em escala mundial, utilização dos recursos
humanos e ecológicos em todo o mundo, a retomada do desenvolvimento
capitalista só ocorrerá com o aprofundamento da barbárie,
tanto ecológica quanto humana. Para se retomarem as taxas de lucros, o
capital vai procurar esmagar os trabalhadores em processos produtivos cada vez
mais intensos e brutais, a fim de extrair o máximo de mais-valia
absoluta e relativa. Se não for detido por forte resistência no
âmbito mundial, o imperialismo vai explorar os recursos naturais
até a impossibilidade da continuidade da reprodução da
vida humana na terra.
No plano da conjuntura, depois de se livrar das dívidas
impagáveis produzidas pelo ciclo de créditos baratos e
especulação desenfreada dos anos 2008/2010, os capitalistas agora
querem extrair dos fundos públicos dos Estados os recursos para
continuar seu caminho de acumulação fictícia. Querem que
os Estados honrem com suas dívidas públicas (aumentadas na
tentativa de salvar bancos e fundos), paguem juros e transfiram recursos
oriundos de tributação sobre os trabalhadores, para o setor
privado. Por isso, querem o ajuste fiscal, cortes nos gastos públicos
sociais, desoneração da folha de pagamento, redução
de salários e aposentadorias, mais privatização na
saúde e educação. Enfim, querem o Estado mínimo
para a população e máximo para o capital.
Os trabalhadores dos países centrais também estão pagando
pela crise. Já penalizados com o desemprego e o alto endividamento das
famílias, teriam que pagar ainda mais abrindo mão de uma
mínima estrutura de bem-estar, já bastante debilitada pelas
reformas nas políticas públicas. As manifestações
na Grécia, Espanha, França, EUA, Inglaterra demonstram a
insatisfação da população com estas
políticas. Trabalhadores e populares saem às ruas, depredam
prédios públicos, incendeiam casas e carros, marcham pelas
principais cidades e capitais.
Estas resistências espontâneas das populações
não encontram forças e frentes políticas organizadas
capazes de canalizar sua energia e revolta para um movimento realmente
transformador e revolucionário. Os partidos comunistas e
operários encontram-se em reconstrução e, em sua maioria,
ainda não se tornaram uma vanguarda que pudesse promover a
transformação de todo o sistema para um novo patamar de vida.
Desta forma, a repressão se faz brutal e o aparato repressor do Estado
é direcionado contra a população, provocando verdadeiras
guerras internas que podem resultar num movimento crescente de um espectro
político fascista, totalitário e ainda mais opressor.
A concentração de renda verificada em todo o mundo nas
últimas décadas tem contribuído para desviar a luta
política de parte despolitizada dos trabalhadores mais estáveis
contra seus próprios companheiros precarizados e desempregados.
Movimentos xenófobos, as intolerâncias religiosas, principalmente
a islamofobia e as ações contra os mais pobres
crescem em todo o mundo, criando um quadro propício para o crescimento
de organizações e ações fascistas.
Além disso, os Estados imperialistas centrais precisam cada vez mais
promover suas guerras contra países detentores de recursos naturais
valiosos. A guerra imperialista atual deixou de ser uma ação
coordenada pelos países centrais através da ONU, para assumir a
forma de guerras de interesses particulares de cada país, numa
federalização da ONU. Os EUA atacam o Iraque e o
Afeganistão, enquanto a França ataca a Líbia, e a
Rússia ataca as ex-repúblicas soviéticas. Mas a principal
guerra que se vislumbra são as novas guerras civis dentro dos
países, com os aparatos repressores dos Estados contra sua
população trabalhadora e a redução das liberdades
democráticas.
Essa nova ofensiva belicista e imperialista, por sua vez, assume um
caráter de redefinição da geopolítica de
dominação de mercados e reservas por parte das grandes
potências capitalistas, ao mesmo tempo em que cumpre o papel de fomento
de uma vasta cadeia produtiva ligada à indústria bélica e
à necessidade do controle ideológico das massas trabalhadoras,
transferindo as tensões para inimigos fabricados pela mídia.
A chamada Guerra ao Terror tem servido, desde 11/09/2011, como
instrumento de justificativa para o aumento de gastos com a indústria
bélica e válvula de escape das tensões internas causadas
pela crise capitalista. Republicanos e Democratas vêm se revezando no
poder nos EUA, mas mantêm a mesma tônica nesses últimos dez
anos.
Neste mundo conturbado, o Brasil não está imune à crise. A
diferença é que, neste momento, a crise sistêmica que
atinge os países centrais abriu espaço para um pequeno
período de crescimento econômico e oportunidade de investimentos
produtivos em alguns países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. O
Brasil está recebendo volumes expressivos de investimentos produtivos e
especulativos, tem saldo elevado de reservas internacionais e uma aparente
tranquilidade econômica.
Esse cenário é repleto de contradições
específicas, pois, em parte, o crescimento econômico está
ancorado na política de concessão de crédito fácil
a juros exorbitantes, os quais comprometem grande parcela dos rendimentos dos
trabalhadores, forçando a que muitos entrem em uma verdadeira ciranda de
endividamento pessoal.
Mesmo assim, os ideólogos do Capital pregam a barbárie quando, a
todo momento, clamam por ajuste fiscal, reformas trabalhista e
previdenciária, redução da participação do
fundo público para atender os trabalhadores, como forma preventiva de
criar um consenso entre a população brasileira de que
dias piores virão; portanto, devem desde já se conformar e
não agirem como os vândalos do hemisfério norte.
Desta forma, a ação política fica, aparentemente,
enclausurada entre políticas que aprofundam a barbárie ou
políticas reformistas para melhorar o capitalismo.
Nós não cremos nesta dicotomia, são dois lados de uma
mesma moeda e falaciosa. O capitalismo não tem mais nenhuma
contribuição a dar à humanidade e nem concessões a
fazer ao proletariado. Portanto, o enfrentamento desta crise é o
próprio enfrentamento do capitalismo, a luta política que devemos
enfrentar é a luta anticapitalista com a maior urgência. Em todo o
mundo, os trabalhadores devem se organizar e mobilizar suas ações
na perspectiva de, corajosamente, apresentar sua força na luta contra o
capitalismo e a barbárie produzida pelo sistema. Cada vez mais
ações radicais são necessárias, superando a
ilusão de que meras reformas institucionais ou que a luta exclusivamente
parlamentar ou restrita ao campo sindical levarão a um novo e melhor
patamar de vida. É preciso fazer avançar a luta pela
construção da sociedade socialista, no rumo do comunismo.
Ousar lutar, ousar vencer!
Setembro de 2011.
Comissão Política Nacional do Partido Comunista Brasileiro (PCB)
O original encontra-se em
http://pcb.org.br/...
Esta nota políca encontra-se em
http://resistir.info/
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