Chegou a tempestade financeira prevista
As contradições agora arruínam o sistema financeiro
mundial, e existe um consenso crescente tanto entre os seus apoiantes como
entre aqueles
que contestam o status quo de que ele é simultaneamente propenso a crises
como imoral. Se quisermos acreditar nas instituições e
personalidades que têm estado na linha de frente da defesa do
capitalismo, estamos à beira de uma crise séria se
não for já, será então no futuro próximo.
O Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco de Pagamentos
Internacionais (BIS), a British Financial Services Authority, o
Financial Times,
e inumeráveis comentadores dos media dominantes manifestam-se cada vez
mais preocupados e advertiram publicamente contra muitas das
inovações financeiras que agora implodiram. Warren Buffett, que
a revista
Forbes
classifica como o segundo homem mais rico do mundo, no ano passado chamou aos
créditos derivativos apenas uma das muitas novas
invenções da banca "armas financeiras de
destruição maciça". Instituições e
pessoas muito conservadoras previram o cataclismo nas finanças globais
que estamos agora a experimentar.
O FMI tomou a dianteira na crítica à nova estrutura financeira
internacional, e ao longo dos últimos três anos publicou numerosas
razões pormenorizadas a explicar porque esta se tornou tão
perigosa para a estabilidade económica mundial. Os acontecimentos
confirmaram o seu prognóstico de que a complexidade e a falta de
transparência, a obscuridade dos riscos e a incerteza universal,
especialmente quanto à dívida colaterizada e
obrigações de empréstimo, provocarão uma fuga para
a segurança que secará grande parte da liquidez bancária.
"...a própria inovação financeira", como disse
um colunista do
Financial Times,
"é o problema". O sistema ultra-criativo está preso
porque ninguém entende onde se localizam os riscos e como ele funciona.
O pânico começou este Verão e o conserto
não é muito provável.
É impossível medir a extensão das perdas. Os resultados
finais deste dilúvio têm ainda de ser calculados. Até
mesmo muitos dos jogadores que têm apostas nos misteriosos instrumentos
de investimento são absolutamente ignorantes. As somas são
enormes.
Apenas umas poucas das muitas medidas dão-nos uma estimativa grosseira.
A crise actual começou e ali ainda não acabou com
os empréstimos hipotecários subprime nos EUA, os quais foram
avaliados em mais de US$ 1,3 milhão de milhões
(trillion)
no princípio de 2007 mas que, para fins práticos, valem hoje
muito menos. Podemos ignorar o impacto desta crise sobre os preços da
habitação nos EUA, mas algumas projecções
são de um declínio de uns 10%. Indirectamente, naturalmente, a
crise hipotecária também introduziu muitos milhões de
pessoas
dentro do mundo financeiro mais amplo e elas saem seriamente feridas.
O que o mercado subprime fez foi desencadear um turbilhão geral muito
maior que envolve bancos na Alemanha, França, Ásia e por todo o
mundo, pondo em causa grande parte do sistema financeiro mundial tal como ele
foi desenvolvido ao longo da última década.
Os bancos de investimento detêm cerca de US$ 300 mil milhões em
dívidas
private equity
que planeavam colocar sobretudo em
leveraged
buy-outs.
Eles serão forçados a vendê-los com descontos ou
a mantê-los nos seus balanços em qualquer dos casos
perderão.
A quase falência do banco alemão Sachsen LB, que teve de ser salvo
da bancarrota através de um crédito de 17,3 mil
milhões, revelou
que bancos europeus possuem mais de US$500 milhões de milhões
(trillions)
nos chamados activos suportados por papel comercial, grande parte disto nos
EUA e em hipotecas subprime. O fracasso nos EUA levou a que a Europa
também enfrentasse uma crise. O problema está mal isolado.
A principal vítima deste cataclismo são os
hedge funds.
O que
são eles? Existem cerca de 10 mil e, dizem todos, eles fazem tudo.
Alguns
hedge funds,
contudo, fornecem capital às companhias e competem
com êxito com bancos comerciais porque assumem riscos muito maiores. Uma
proporção substancial é de simples jogadores, alguns
apostam mesmo nas previsões de clima. Muitos olham para os seus
computadores e para as matemáticas dos modelos a fim de conduzir os seus
investimentos, e estes foram os que perderam mais dinheiro, mas fundos com base
em outras estratégias também perderam durante o mês de
Agosto. O fracasso espectacular do Long-term Capital Management, em 1998,
deveu-se também à sua confiança em engenhosas
proposições matemáticas, mas ninguém aprendeu as
lições disto o que prova que apelos à razão
bem como a experiência caem em ouvidos moucos se houver dinheiro a fazer.
Alguns ganharam durante a crise de Agosto, mas a maior parte perdeu. No
conjunto, os
hedge funds
perderam um grande negócio sua
fascinação com a riqueza rápida foi-se. Entre eles tem
havido algumas bancarrotas e resgates
(bailouts)
espectaculares, incluindo
algumas das maiores firmas de investimento. Investidores que ficaram com medo
descobriam que retirar dinheiro de
hedge funds
era quase impossível. O
valor real dos seus haveres é contestado com irritação e a
avaliações variam loucamente. Na realidade, não há
meio de avaliá-los com realismo todos eles dependem em grande
medida do que as pessoas querem acreditar e assumirão, ou do mercado.
Estamos no fim de uma era, a viver o pior pânico financeiro em muitas
décadas. Neste momento principia a instabilidade financeira global.
É
impossível especular por quanto perdurará a confusão de
hoje mas agora existe uma incerteza e falta de confiança que
não tem paralelo desde a década de 1930 e esta
ignorância e medo são por si próprios factores cruciais.
Chegou o momento da contagem para banqueiros e patrões. Aquilo que
é muito claro é que as perdas são maciças e todo o
mundo desenvolvido está agora a experimentar a pior crise
económica desde 1945, uma crise na qual as perturbações de
um país agravam as dos outros.
Todos os bancos centrais estão confrontados com dilemas. Eles
não têm nem os recursos nem o conhecimento, incluindo poderes
legais, para remediar o presente turbilhão geral. Embora haja clamores
de financeiros e operadores variados a pedir socorro, o Federal Reserve
também deve pesar as consequências dos seus movimentos, acima de
tudo quanto à inflação. E há então a
questão dos "azares morais". Será da responsabilidade
do Federal Reserve salvar aventureiros financeiros das suas próprias
loucuras? Durante todo o mês de Agosto os bancos centrais americano e
europeus despejaram cerca de 500 milhões de milhões de
dólares dentro do sistema bancário numa tentativa de descongelar
créditos e empréstimos bloqueados a seguir à crise
subprime um acontecimento que disparou uma "fuga para a
segurança", a qual reduziu em muito a disposição dos
bancos para emprestar. Com efeito, o Federal Reserve fiou-se nos bancos para
restaurar a confiança no sistema financeiro, subsidiando os seus
esforços.
Apenas muito parcialmente tiveram êxito os esforços dos bancos
centrais, mas no conjunto eles fracassaram: bancos e investidores agora
procuram segurança ao invés de risco, e eles ainda sentam em cima
do dinheiro. O Federal Reserve reconhece em privado a sua incapacidade para
estar à altura de uma estrutura financeira desordenadamente complexa.
Os banqueiros centrais europeus têm exactamente o mesmo dilema: eles
simplesmente não sabem o que fazer.
Mas isto mal aflora o problema real, que é estrutural e invade tudo no
modo como evoluiu a estrutura financeira mundial ao longo das últimas
duas décadas. Tal como no passado, há uma divisão
crítica na banca e na finança mundial e cada uma tem alavancagens
política bem como choques de interesses. O mais importante: os bancos
centrais não foram concebidos para enfrentar as realidades de hoje e
não têm nem os poderes legais nem o conhecimento para
controlá-los.
Neste contexto, os bancos centrais terão problemas crescentes e as
soluções que propõem, tal como no passado, serão
absolutamente inadequadas, não porque as suas intenções
sejam erradas e sim porque é impossível regular um complexo
económico tão vasto ainda menos hoje do que no passado
porque não há mecanismo internacional para isso. A
internacionalização das finanças significou menos
regulamentação do que nunca, e a regulamentação era
muito pouco efectiva mesmo ao nível nacional.
Não só os de esquerda são ingénuos como
também aqueles conservadores que pensam poder falar a verdade ao poder e
assim mudar o curso dos acontecimentos. A única limitação
daqueles que ganham dinheiro é a cobiça. As
instituições internacionais existentes das quais o FMI
é a mais importante ou os conselhos bem intencionados não
mudarão esta realidade.
01/Setembro/2007
[*]
Historiador
.
O original encontra-se em
http://www.countercurrents.org/kolko010907.htm
. Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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