Keynes e a crise
1.
A vida e obra de um burguês "esclarecido"
2.
Subinvestimento ou sobreinvestimento?
3.
A tendência marginal do Estado a endividar-se
4.
Depois dos déspotas iluminados, eis os capitalistas preocupados com o interesse geral
5.
Conclusões
Três grandes teorias debatem a explicação das crises. A
corrente liberal atribui-as à chegada brusca de um elemento perturbador
(atentado, subida dos preços do petróleo, acontecimentos
políticos e sociais...) que se torna necessário eliminar com
urgência para que o mercado reencontre o seu funcionamento naturalmente
são. Keynes não acredita neste mecanismo auto-regulador. Para
ele, o capitalismo
conhece excessos que é necessário corrigir de forma indireta pela
intervenção do Estado. Sem isto, não poderia produzir os
seus efeitos benéficos. Por fim, a doutrina marxista analisa o sistema
com maior profundidade para examinar a recessão. Esta é inerente
ao capitalismo. Para a ultrapassar, é necessária uma outra
economia, uma outra sociedade, o socialismo.
Com a amplitude dos problemas, a duração de um fraco crescimento
e a existência de um desemprego elevado, as teses puramente liberais
têm o chumbo na asa. Os governos menos intervencionistas tiveram de se
precipitar em socorro dos bancos, sem o que seria a catástrofe
financeira. Tal como escreveu um economista francês:"
Na crise, somos todos keynesianos
". Uma maneira de dizer que não restam senão duas
explicações convincentes: a proposta por Keynes
e a do marxismo. E como "
não se pode ser contra o sistema
", então é o keynesianismo.
Daí, a importância que tem para os marxistas interessarem-se por
esta teoria concorrente de análise da crise. Será ela pertinente?
Terá ela um valor científico? As soluções que ela
propõe merecem que as analisemos?
1. A vida e obra de um burguês "esclarecido"
John Maynard Keynes
nasceu em Cambridge em 1883, ano da morte de Karl Marx. Fazia parte das
famílias burguesas relativamente desafogadas da Inglaterra vitoriana.
Isso iria facilitar-lhe o seu percurso escolar, que foi considerado como
brilhante: em 1897, entra em Eaton, um dos colégios mais prestigiosos
das ilhas britânicas, depois no King's College
da Universidade de Cambridge, em 1902. Estuda matemática e acaba o curso
coroado de sucesso. Em seguida dedicar-se-á à economia e
tornar-se-á professor em Cambridge. Passa a fazer parte de numerosos
clubes elitistas que reúnem jovens intelectuais um pouco críticos
da sociedade capitalista e da sua moralidade muitas vezes hipócrita.
No início da guerra alistou-se no departamento do Tesouro. Foi nessa
situação que participou na Conferência de Versalhes
para discutir as compensações impostas à Alemanha, em
1919. Ficou horrorizado pela lógica seguida pelas potências
aliadas que pretendiam esgotar o país vencido. Pediu a demissão e
publicou um primeiro trabalho que se tornaria célebre:
As consequências económicas da paz.
Lénine utilizará o seu conteúdo para denunciar a
rapacidade dos países imperialistas para aumentarem a sua pilhagem e as
suas colónias.
[1]
Keynes lança-se em seguida nos negócios. Depois de momentos
difíceis, poderá constituir uma pequena fortuna que lhe
permitirá comprar numerosas obras artísticas e culturais (como as
memórias de Isaac Newton). Tornar-se-á por outro lado
administrador e mesmo presidente de várias companhias de seguros.
Nos anos 20 liga-se essencialmente ao partido liberal, que está
moribundo. A questão de aderir ao partido trabalhista chegou a
colocar-se, mas ele rejeitou essa ideia, explicando: "
Para começar, é um partido de classe, e essa classe não
é a minha. Se tiver que reivindicar vantagens para uma
fração da sociedade, será para aquela à qual
pertenço. Se isto levar à luta de classes como tal, o meu
patriotismo local e pessoal, como todo ou cada um de nós, fora certas
exceções de um zelo desagradável, ligar-se-á ao meu
próprio meio. Posso ser sensível ao que eu creio ser a
justiça e o bom senso, mas a guerra de classes encontrar-me-á do
lado da burguesia culta
[2]
." De resto, ele mantém-se membro de vários grupos de
reflexão do regime que debatem, em pequeno comité, as grandes
orientações da sociedade.
No entanto, em 1929, torna-se conselheiro económico do governo
trabalhista de Ramsay MacDonald. Foi aí que começou a
interessar-se pela crise económica que começa com o crash de
Outubro de 1929. Consagrar-lhe-á dois grandes trabalhos, o
Tratado sobre a moeda
e, sobretudo em 1936, a
Teoria Geral do Emprego, do lucro e da moeda.
O que é que ele defende? É necessário que nos coloquemos
no contexto da época. Não existe teoria macroeconómica que
aborde as questões num plano nacional. O estudo da economia é
essencialmente microeconómico, quer dizer baseado no jogo individual dos
atores, tornando as estatísticas deficientes, o que coloca dificuldades
aos governos. Keynes
irá então propor conceitos que irão fundar a macroeconomia
tal como se pratica ainda hoje (nomeadamente no plano estatístico).
Segundo ele, o produto nacional de um país (como de resto o seu
rendimento) pode ser decomposto em duas partes: a que corresponde à
procura do consumo e a que vai para o investimento. Nomeando Y o produto
nacional (em inglês a primeira letra de
yield
, produto), C o consumo das famílias e I o investimento, obtém-se
portanto Y=C+I. Como evoluem estes dois componentes?
[3]
O consumo varia parcialmente com o rendimento nacional: consumir-se-á
mais se os rendimentos aumentam. Em contrapartida, o investimento é
imprevisível e difícil de determinar. É uma aposta a longo
termo. Ora, há o que Keynes
chama a preferência pela liquidez, a saber: que os intervenientes
preferem ter os ativos líquidos para poderem dispor deles.
O investimento depende da poupança (designada pela letra S de
savings
em inglês). Ora, os capitalistas podem investir, mas também
entesourar ou especular nos mercados financeiros. O mecanismo económico
bloqueia-se quando demasiado dinheiro não é reinvestido no
aparelho produtivo para que se reproduza e aumente a riqueza. Pode resumir-se
isto sob a forma do esquema seguinte. Nós recuperamos uma forma mais
marxista de apresentação, distinguindo os assalariados que
consomem a totalidade dos seus rendimentos e os capitalistas vivendo dos lucros
das empresas e podendo quer consumir, quer poupar.
O funcionamento normal é que a poupança seja investida para
aumentar o nível da produção e assegurar o crescimento
económico que permite o desenvolvimento do emprego.
Somente, Keynes
constata que as decisões capitalistas são cumulativas. Quando a
conjuntura é boa, ela é para todos e portanto todos querem
investir. Há sobreinvestimentos. Inversamente, quando ela é
má, todos suspendem as suas despesas ao mesmo tempo. Há
subinvestimento e bloqueio que perduram. Isto tem efeitos desastrosos ao
nível do desemprego.
Ao mesmo tempo, o investimento tem um efeito multiplicador sobre o
desenvolvimento nacional. Com efeito, engendra o contrato de efectivos
suplementares que consomem, portanto geram novas atividades, impulsionadoras de
novos investimentos, etc. Por outras palavras, se forem investidos 10
(milhões ou milhares de milhões de euros), o impacto global sobre
o crescimento económico pode ser de 15, 20, 30...em função
desse multiplicador.
Este terá consequências tanto mais benéficas quanto o
consumo for mais elevado, proporcionalmente ao rendimento, dado que ele
engendrará uma maior atividade derivada. Isto pode ser facilmente
concebido. Se o consumo se situar a 25% do rendimento nacional, um investimento
terá um efeito de consumo equivalente a estes 25% mais os efeitos que
daí decorrem (pelo facto de que o consumo gera ele próprio
atividades que elevam de novo o consumo e assim de seguida). Se o consumo
representar 50%, o impacto atingirá os 50% (e ainda mais com as
atividades que isso engendra).
Que é necessário fazer, segundo Keynes? Ele tem um programa em
quatro pontos.
[4]
Em primeiro lugar, é preciso consumir e aumentar a parte do consumo no
rendimento, porque isso tem consequências positivas no crescimento. Keynes
vai lançar às famílias numerosos apelos para consumirem
mais.
Em seguida, é necessário organizar o afluxo de investimentos para
uma política monetária adequada: taxas de juros baixas permitem
recorrer ao crédito e favorecem portanto o investimento. Mas,
reconhecerá Keynes
no seu trabalho de 1936, a situação dos anos 30 é tal, que
a política monetária de baixas taxas de juro se torna ineficaz.
Hoje também, com taxas de 0% nos Estados Unidos e no Japão, de 1%
na Europa, é difícil ir mais baixo para tentar um
relançamento do crédito. É preciso outra coisa.
Por isso, Keynes
enuncia a sua terceira proposta: investimento público. Se o privado
falta, é necessário que os poderes públicos o substituam.
A intervenção do Estado deve, no espírito de Keynes, atuar
inversamente aos movimentos de investimento privados. Não se trata de
substituir em permanência o público pelo privado. Este deve
manter-se a dominar o jogo. Mas em presença de decisões
capitalistas que conduzam seja a um sobreinvestimento e portanto a um
sobreaquecimento da economia, seja a um subinvestimento e a uma crise, o Estado
deve conduzir uma política contracíclica: multiplicar as despesas
quando o privado estiver friorento; parar tudo e mesmo desinvestir quando os
empreendedores forem muito ativos. Assim, esta intervenção
permitiria estabilizar em maior grau os investimentos. É aquilo a que se
chama uma regulação macroeconómica de tipo
keynesiano.
Em quarto lugar, pretende Keynes, o Estado deve regulamentar os mercados
financeiros para impedir que eles tenham um efeito perturbador. Escreve
nomeadamente: "
Os especuladores podem ser tão inofensivos como bolas de ar numa
corrente regular de empresa. Mas a situação torna-se séria
quando a empresa não for senão uma bola de ar no turbilhão
especulativo. Quando num país o desenvolvimento do capital se torna o
subproduto da atividade de um casino, arrisca-se a realizar-se em
condições defeituosas".
[5]
Desde logo, a profissão de banqueiro deve ser controlada para que ele
sirva a economia "real" e portanto o capitalismo.
O efeito das políticas preconizadas pelo economista britânico
pôde parecer extremamente importante. Estas políticas estão
associadas às medidas decididas pelo presidente Roosevelt
e reagrupadas sob o nome de
New Deal.
Na realidade, a influência não foi senão parcial e
é recíproca. À partida, os planos de Roosevelt
servem sobretudo para salvar o sistema da bancarrota. Não existe um
projeto levado a bom termo que tivesse sido realizado com conhecimento de
causa. É um processo de tentativas e de erros.
Em contrapartida, o impacto dos escritos de Keynes
será mais importante depois da Segunda Guerra mundial. Foi ele quem
definiu em parte a arquitetura financeira internacional quando dos acordos de
Bretton Woods, em 1944. Ele representou o governo britânico e elaborou as
principais disposições a levar a cabo: conversão em ouro
de uma moeda central internacional, o
bancor
; estabelecimento de uma taxa de câmbio fixa de todas as moedas em
bancor
; impossibilidade de desvalorização (salvo acordo dos parceiros);
ajuda às nações em dificuldade por um organismo criado
especialmente para isso, o FMI (Fundo Monetário Internacional). A Casa
Branca aceitará tudo, salvo o conceito do
bancor
, que ela substituirá pelo dólar.
Neste quadro, os diferentes Estados aplicam políticas
macroeconómicas abertamente
keynesianas
de intervenções para estimular o crescimento. Esta
situação continuará até aos anos 70... quando os
acordos de Bretton Woods
são rasgados por Richard Nixon.
Quando desta conferência internacional, Keynes
estava já doente. Morreu de uma crise cardíaca, em 21 de Abril de
1946. A sua origem, o seu percurso, a sua vida mostram que é como ele
escreveu de si mesmo, um membro da burguesia. O que ele quer é perpetuar
o capitalismo e eliminar o que é excessivo no seu funcionamento. Tem um
desprezo profundo pelas massas populares e pelos sistemas que se apoiam nelas.
Quando de uma viagem à URSS,
[6]
escreveu: "
Como poderia tornar meu um credo que, preferindo a lama aos peixes, exalta o
proletariado grosseiro acima dos burgueses e da intelectualidade que, sejam
quais forem os seus erros, encarnam o bem-viver e transportam neles os
progressos futuros da humanidade?
[7]
"
2. Subinvestimento ou sobreinvestimento?
Para Keynes, o elemento central da crise situa-se ao nível do
investimento. Se os capitalistas adotassem um plano racional a longo prazo de
aumento das capacidades de produção, talvez não surgissem
problemas. Mas as decisões não seguem nenhum plano racional e
é isso que engendra a recessão, segundo Keynes. Não
haveria crise se os empreendedores continuassem a investir. O problema vem de
um subinvestimento privado relativo.
É incontestável que a crise surge com o bloqueio do processo de
investimento. A produção é assim parada e os assalariados
considerados como excedentários são lançados no
desemprego. Mas tudo isto não diz nada de preciso sobre as razões
profundas destes disfuncionamentos. Keynes
refere-se, quer às incertezas que surgem nos mercados, quer aos excessos
financeiros que abrem perspectivas de lucros desmesurados.
O problema é que é muito difícil de provar empiricamente
as alegações keynesianas.
Pode mesmo demonstrar-se o contrário. Esse é o objetivo do
seguinte gráfico, que compara a evolução anual
[8]
do PIB real (portanto corrigido do efeito da subida de preços) e do
stock real de ativos fixos nos Estados Unidos, desde 1960. Estes últimos
são constituídos por todo o aparelho de produção
(terrenos, construções, máquinas, ferramentas...). Uma
variação anual positiva destes representa portanto um
investimento real efectuado na base produtiva, o que permite efetivamente
aumentar o conjunto da produção do país.
É o PIB que sofre flutuações importantes e o investimento
que surge como relativamente estável. Mais interessante ainda é
notar que os investimentos seguem a evolução da atividade e
não que a precedem. Nos anos 60, o crescimento do PIB não
desenvolve senão progressivamente a taxa de acumulação dos
ativos fixos à alta. Nos anos 70, apesar dos resultados em dentes de
serra da produção, o stock progride em níveis recorde (4,3
% em média, entre 1964 e 1981, inclusive). Baixa sempre que a economia
se endireita, nos anos 80.
A evolução em seguida é mais paralela. Mas há
sempre crescimento da atividade antes do aumento dos investimentos. É o
caso dos anos 90. Em seguida, em 2000, o PIB começa a contrair-se antes
que o stock de ativos fixos evolua da mesma maneira. Ele retoma desde 2002,
enquanto o investimento só chega em 2004. Com a crise de
subprimes
[9]
este não começa a subir senão em 2008, enquanto a
produção só se lança desde 2007.
Nestas condições, parece-nos arriscado pretender que a
recessão vem essencialmente da falta de investimentos. É um facto
que, quando da crise, os capitalistas reduzem ou param as suas despesas em
ativos fixos. Não há dúvida de que é porque eles
compreendem que não podem vender mais e que é impossível
continuar a esse ritmo.
Há por outro lado um ligeiro atraso de adaptação, porque
certas operações precisam de uma longa imobilização
que é difícil impor brutalmente. Entre a decisão de
construir uma fábrica automóvel e o primeiro carro que sai
efetivamente das cadeias de produção decorre por vezes um
período de dois a três anos. Não se pode parar este
processo ou mesmo abrandá-lo se não for verdadeiramente
necessário, portanto quando a crise estiver mesmo lá e se
apresente como suficientemente longa.
É necessário portanto compreender, não porque razão
os capitalistas cessam os seus investimentos, mas porque é que eles
não conseguem escoar as suas mercadorias. Podemos retomar o pequeno
esquema que permite explicar onde Keynes
situava o problema, simplificando-o ao máximo.
A produção reparte-se em rendimentos, quer dizer em
salários e lucros, que servem para o consumo e para o investimento.
Parece-nos inútil estabelecer aqui uma distinção entre
poupança e investimento.
Os investimentos servem para aumentar a produção e portanto para
assegurar o crescimento económico. É esse esquema que Keynes
considera perfeitamente são e que é pervertido, segundo ele, pelo
entesouramento ou a especulação.
Para nós, é este funcionamento que, num quadro capitalista,
está fundamentalmente viciado. Porquê? Porque a
produção é dirigida pelos capitalistas cujo objetivo
é, ao mesmo tempo, aumentar os seus lucros e acumular capital para
ganhar ainda mais no futuro.
A partir daí, os dirigentes das empresas não deixarão
nunca de, nos rendimentos, aumentar a parte dos lucros em relação
à parte recebida pelos assalariados. Isto é o objeto de uma luta
(de classes). Eles nem sempre o conseguem, mas o seu objetivo é esse. Da
mesma forma, com um lucro aumentado (ou mesmo sem isso), eles terão
tendência para aumentar a proporção que vão
consagrar ao investimento, porque esse é um meio de crescerem e
tornarem-se poderosos e, se não o fizerem, a concorrência
obrigá-los-á a isso.
Tomemos um exemplo em números. A produção de 100 é
repartida em 60 para os salários e 40 para os lucros. Nestes, 20
são consagrados ao consumo dos capitalistas e 20 ao investimento. Isto
corresponde, grosso modo, a uma situação estável da
economia num dado momento. Vende-se portanto 80 em bens de consumo e 20 em bens
de produção. Mas os 20 investidos aumentam a
produção que passa, digamos, para 140. Os empresários
irão ficar com uma parte maior e apropriar-se, por exemplo, de 63 e os
assalariados do resto, ou seja, 77. A parte de cada um, que era de 60 % para os
trabalhadores e de 40 % para o patronato, passa para uma relação
menos elevada, de 55 contra 45 %, sem que os assalariados vejam os seus
rendimentos diminuídos. Pelo contrário, eles ganham globalmente
77 em lugar de 60. Os dirigentes decidem aumentar ligeiramente o seu consumo
para 23 e reservar 40 para o investimento. Assim, a massa de dinheiro destinado
ao consumo sobe a 100 (77+23).
O que é que as firmas podem propor? Maiores quantidades. Porquê?
Porque, se na situação de origem os bens de
produção de 20 podem fornecer um montante de 80 em produtos de
consumo e se os primeiros passam a 40, pode considerar-se que normalmente as
mercadorias de consumo final deveriam atingir o nível de 160. Ou seja,
bastante mais do que a população pode comprar. Chama-se a isto a
sobreprodução.
Estes números não são senão exemplos. Mostram
simplesmente um mecanismo que decorre permanentemente. Por um lado, as
forças para aumentar a produção manifestam-se para gerar
os rendimentos das empresas, os lucros dos acionistas, os prémios dos
dirigentes, de maneira cada vez mais importante. Mas, ao mesmo tempo, elas
provocam uma baixa relativa dos meios consagrados ao consumo, e isto em dois
tempos: primeiro, comprimindo o mais possível os salários que
servem para o consumo, mas também e isto é frequentemente
esquecido reduzindo os montantes relativos do consumo dos capitalistas.
É o conjunto dos meios destinados ao consumo que é reduzido,
enquanto as capacidades de produção são forçadas
constantemente a aumentar. Daqui decorre necessariamente um grande desvio: a
sobreprodução.
Pode acontecer que os capitalistas entesourem ou especulem e que o dinheiro
investido nos mercados financeiros não retorne ao circuito habitual.
Isto engendrará ainda maiores problemas. Mas, fundamentalmente, é
no coração do sistema e no seu funcionamento que se situa a
crise, como Marx o tinha analisado no seu tempo.
3. A tendência marginal do Estado a endividar-se
A análise de Keynes
é essencialmente baseada em considerações de curto prazo.
É de facto a partir do ciclo económico que ele considera o efeito
do investimento privado e a necessidade de substituí-lo, num determinado
momento, pelo do Estado. A recessão prolongada é, segundo ele,
uma derrapagem infeliz, ligada a um excesso do capitalismo, mas ao qual os
poderes públicos podem opor-se directamente por meio de uma
política chamada contracíclica. O investimento que falta
será fornecido momentaneamente pelo Estado, o que permitirá sair
do impasse e relançar a máquina económica. É isto
que Keynes
escreve.
Somente, se o abcesso for mais profundo e não puder resolver-se a curto
termo, se a questão não for simplesmente a de uma falta de
investimento temporária, a autoridade investe a partir de recursos que
diminuem por causa dos lucros em baixa (por causa da crise), endivida-se, abre
défices orçamentais, e aumenta a amplitude da dívida
pública. Vemos que é isto que se passa em cada grande crise.
Já nos anos 30, foi o efeito das medidas decididas pelos diferentes
governos, em primeiro lugar o de Hoover, que estava longe de ser não
intervencionista, depois o de Roosevelt. Retomámos numa primeira fase a
subida das despesas estatais comparadas com o PNB (produto nacional bruto
[10]
)
entre 1920 e 1940, no gráfico seguinte.
Depois de uma primeira crise, em 1920, para reconverter a economia de guerra
saída do período 14-18, as despesas governamentais voltam a
descer ao nível de 3% do PNB. As primeiras medidas do presidente Hoover
reconduzem a proporção a 8% e o programa do
New Deal
leva-as a cerca de 10 %. É pouco, se tomarmos em conta a
situação atual (45 % do PIB antes do início da crise dos
subprimes
). No entanto, o montante utilizado triplica em relação ao PNB e
igualmente em valor absoluto (sendo o PNB de 1940 sensivelmente o mesmo que em
1929).
Consequentemente, a dívida pública aumenta. É o que mostra
o gráfico seguinte. Relacionámo-lo com o PNB para ter um termo de
comparação.
A dívida pública que tinha tendência a abater nos anos 20,
cresce de maneira vertiginosa entre 1929 e 1933. Na realidade, é a
conjunção de dois fenómenos: por um lado, o PNB cai para
metade entre essas duas datas; por outro lado, a dívida pública
aumenta um terço. Entre 1929 e 1940, esta última terá
duplicado em valor absoluto. O que se teria passado em seguida? Não o
saberemos nunca com precisão. A maior parte dos economistas reconhecem
que o que permitiu aos Estados Unidos sair desta situação foi a
guerra mundial.
Nota:
A União Europeia é composta por quinze países da Europa
ocidental: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha,
Finlândia, França, Grã-Bretanha, Grécia, Irlanda,
Itália, Luxemburgo, Holanda, Portugal, Suécia, salvo entre 1970 e
1976, anos para os quais nos faltam dados para a França, Holanda e
Portugal.
A progressão das despesas públicas é quase contínua
a partir de 1977 para a Europa e desde 1979 para os Estados Unidos, apesar de
Reagan
e Thatcher. Isto mantém-se até ao início dos anos 90, com
Clinton
na América e o pacto de estabilidade e de crescimento na Europa (ou
acordos de Maastricht, em 1991), visando impedir as ultrapassagens da
dívida pública acima de 60 % do PIB. Mas a nova crise a partir de
2007 levou a uma subida vertiginosa dos défices públicos.
Os keynesianos
podem argumentar que os programas governamentais apontam objetivos errados.
É sem dúvida verdade, em particular no período atual. O
que não impede que o impacto das medidas keynesianas,
em caso de recessão, tenha impacto imediato sobre as despesas
públicas, portanto sobre a dívida, enquanto é totalmente
incerto sobre a atividade económica, dado que elas não incidem
senão no relançamento e não na resolução dos
problemas fundamentais do processo económico. É um pouco como se
déssemos uma droga a um doente, afirmando que isso o vai fazer sair do
seu inferno.
Mas, como todo o produto dopante, uma política keynesiana
tem efeitos secundários não desejáveis. A dívida
estatal é uma criação monetária: coloca no mercado
meios monetários que não existiam anteriormente. Ora, a uma dada
produção (que não aumente senão fracamente com a
recessão), mais dinheiro em circulação traduz-se por uma
subida geral de preços, o que quer dizer inflação. De
facto é o que acontece nos anos 70. Ao mesmo tempo, a procura de
capitais pelos poderes públicos (o que significa endividamento), absorve
uma parte destes à custa das empresas que também necessitam
deles. Ora, no mercado, se a procura excede a oferta, o seu preço
aumenta. Esse preço, aqui, é a taxa de juros. Uma série de
razões para os capitalistas estarem descontentes.
Foram os bancos americanos que, em 1979, pediram à Reserva Federal,
banco central americano, e ao seu presidente, Paul Volcker, que paralisasse a
inflação. Ele elevou tão fortemente as taxas de juros, que
provocou uma importante recessão no início dos anos 80. Isso fez
parar a subida de preços, mas à custa dos assalariados que, ou
ficaram no desemprego, ou viram bloqueadas as suas remunerações.
Hoje, são as sociedades financeiras que atuam na compra das
dívidas públicas, degradando a classificação dos
países, por receio da falta de pagamento, e obrigam estes a pedir
empréstimos com taxas de juro cada vez mais proibitivas.
As políticas keynesianas
podem portanto ser uma solução de curto prazo, face aos problemas
de bloqueio económico. Mas se tiverem de prolongar-se constituem
soluções que podem ser piores que a doença, porque
não atacam a sua raiz. Assim, os Estados Unidos optaram, nos anos 80,
por compensar pelo endividamento o défice da procura e a
estagnação dos rendimentos da maioria da população.
Ao fazer isto, puderam relançar a máquina produtiva pelo consumo.
É o que Keynes apelava para ser feito em 1931.
Somente, o crédito privado das famílias aumentou de tal modo que
se tornou hoje impossível de gerir. Atinge à volta de 100% do PIB
americano: isto quer dizer que os habitantes já consumiram o PIB que
será produzido no próximo ano. É insustentável e os
bancos exigem os reembolsos, daí as expropriações em massa
de casas, daí o aumento da pobreza, daí uma economia marginal.
Ganhou-se um pouco de tempo. Mas a que preço? A crise regressa
inexoravelmente e com uma força infinitamente superior.
4. Depois dos déspotas iluminados, eis os capitalistas preocupados com o
interesse geral
Keynes tem um último trunfo na manga: a moralização do
capitalismo. Evoluindo num meio intelectual e crítico, integrou a
noção do interesse geral. É difícil
censurá-lo. Isso leva-o às noções de honestidade,
de integridade, de dever, etc. É incontestavelmente melhor do que os
autores que fazem louvores à rapacidade dos capitalistas.
Somente a sua ideia do interesse geral é a do capitalismo. É
necessário, portanto, que este funcione em condições
normais; com a procura do seu interesse próprio, mas em
"harmonia" com o peditório dos outros; com a
motivação do ganho, mas não desprezando a
situação dos seus assalariados e dos seus concorrentes. Assim,
escreve ele em 1923: "A doutrina económica dos lucros normais,
doutrina vagamente apercebida por todos e cada um, é
indispensável à justificação do capitalismo. O
homem de negócios não é tolerável senão
enquanto os seus ganhos possam ser considerados como tendo uma certa
relação com o que corresponde grosseiramente à utilidade
das suas atividades para a sociedade
[11]
".
Isto conduz, como o fazem muitos keynesianos hoje, a distinguir no seio dos
capitalistas duas categorias: grosseiramente, os bons e os maus. Os primeiros
são aqueles que investem, os industriais que se preocupam com a
legalidade dos seus atos, e que eventualmente introduzem códigos
éticos. Os segundos são os especuladores, os patrões
ávidos, que não recuam perante nada por um ganho, desdenhando as
leis, os outros, a moral. Portanto, é preciso conceder vantagens aos
primeiros. É um dos papéis do Estado, composto, ele
próprio, por homens íntegros e movidos por este interesse geral.
Em termos que Keynes
não utilizou, mas que outros avançam: favorecer o capitalismo
industrial em relação ao capitalismo financeiro. Desta maneira,
deveria poder ser assegurado o crescimento perpétuo.
De novo, podemos pôr em dúvida a pertinência de uma tal
análise. Em primeiro lugar, a questão da moralidade é
muitas vezes apanágio de uma sociedade bem estabelecida. Com efeito,
é quando se está instalado no cume, que se pode pensar em ser
generoso. É mesmo uma estratégia inteligente, porque é uma
maneira de fidelizar clientes que poderão ser úteis numa ou
noutra ocasião (em caso de contestação do seu poder, por
exemplo). Em contrapartida, aqueles que querem subir na escala social,
têm todo o interesse em meter no armário os seus escrúpulos
e a sua eventual ética, porque precisarão provavelmente de
caminhar sobre cadáveres para vencer.
Portanto, são sobretudo as circunstâncias e a
posição sócio-económica que determinam a maneira
positiva ou não de funcionar, e não as ideias pessoais (embora
elas possam também influenciar). O capitalismo é antes de tudo um
sistema fundado sobre a razão do mais forte, como o eram antes dele o
esclavagismo, o feudalismo ou outras sociedades de classe. O que é
específico, é que o poder não provém do poderio
individual, do renome da família ou do luxo exibido, mas sim da
capacidade de acumular dinheiro, quer dizer, do capital. Um tal regime
não pode ser moral, ético, generoso por essência.
Não pode haver aí normalidade. Não há
benefício aceitável, É aquele que acumula mais que dita a
sua lei, pouco importa a maneira como ele adquiriu a sua fortuna (salvo se um
concorrente puder acionar o aparelho judicial para lhe contestar a legalidade).
Se ele tiver vantagem em precarizar o trabalho, ou, até, em
externalizar, em deslocalizar para o México, a Europa de Leste ou um
Estado asiático, cuidado com os capitalistas que não se conformam
com isso! Se o capital colocado na Bolsa render mais do que na
indústria, desgraçadas das empresas que não tiverem um
departamento financeiro para aproveitar esse maná!
Os keynesianos
podem reconhecer estes factos e este lado ávido inexorável sob o
capitalismo, mas eles chamam o Estado para controlar, regular e impedir que
seja a rapacidade que domina o mundo. O problema é que não se
consegue fugir à situação em que é o banqueiro que
fiscaliza as sociedades financeiras. Os dirigentes políticos
saíram do mesmo viveiro onde foram gerados os capitalistas. São
educados da mesma maneira. Têm uma ideologia similar e, hoje,
encontram-se nos mesmos
think tanks
[12]
onde se discutem e mesmo se elaboram as grandes orientações para
a sociedade de amanhã. Do mesmo modo Keynes, no seu tempo, fazia parte
de numerosos clubes privados em que se encontravam a alta sociedade ou os
membros da elite mais influentes. Por outro lado, numerosos homens do governo
passam, depois da sua carreira "
ao serviço do Estado
", para o conselho de administração de uma ou outra grande
companhia.
Enfim, é cómodo designar os maus capitalistas, os rapaces, como
responsáveis das crises. Os keynesianos
não vão tão longe que nomeiem os culpados. Eles pensam
antes que é um sistema. É uma especulação
desenfreada nos anos 20 que provoca o crash de 1929. É um frenesim
imobiliário que leva ao afundamento dos
subprimes.
O problema é que, com esta interpretação, não se
compreende porque é que toda a atividade produtiva se encontra
paralisada. Se fosse um fenómeno somente da Bolsa, bastaria fechar as
praças financeiras e fazer com que as empresas fossem financiadas pelos
bancos públicos. Se não fosse senão uma catástrofe
imobiliária, deveria ser possível limitá-la e impedir que
ela gangrene o resto da economia. Seria sem dúvida necessário
enfrentar interesses particulares opostos a este género de medidas. Mas
isso seria no interesse geral do capitalismo...
É aí que se compreende que se deve inverter a perspectiva. A
finança e a especulação não se desenvolvem como
derivações do capitalismo "normal", mas porque
satisfazem os objetivos ou necessidades desse sistema num determinado momento.
Hoje, vê-se que os Estados Unidos funcionaram a crédito desde o
princípio dos anos 80 e que este endividamento privado engendrou todo um
mecanismo financeiro cada vez mais complexo, mas indispensável para
gerar os capitais e a liquidez do país. Se isto não tivesse
existido, o consumo americano teria sido muito menos forte e portanto o
crescimento teria sido fraco ou mesmo negativo.
É verdade que a crise estalou na esfera mais especulativa. Nem pode ser
de outra forma, pois é lá que os riscos são mais elevados.
Somente, a recessão repercute-se sobre os outros setores, porque a
especulação tinha uma função específica no
sistema, a de assegurar os empréstimos às famílias para o
seu consumo. Assim, se ela estala, não é a explosão de uma
simples bolha que vai empanar as finanças por causa de alguns
investimentos infelizes. É todo um mecanismo que cai em parafuso e,
portanto, também as condições do funcionamento do
capitalismo atual. O capital que se arrisca é todo o conjunto do sistema
e não um qualquer excesso, mesmo se, para além disso, os excessos
existem.
Isso conduz-nos à nossa explicação ligada ao segundo
esquema acima. Se a crise for engendrada pelas duas tendências
sublinhadas a saber: a de aumentar relativamente os lucros em
relação aos salários e a de investir mais do que consumir
, vemos os limites de um capitalismo controlado, jugulado,
desembaraçado dos seus desvios de rumo. Poder-se-á, com efeito,
agir sobre as duas tendências naturais do capitalismo? É caso para
duvidar.
A primeira tendência está ligada à luta de classes. Ora
esta é muitas vezes, no capitalismo, vantajosa para os patrões.
Eles dispõem de mais meios, entre os quais o aparelho do Estado
(governo, justiça polícia, exército...) para atingir os
seus fins. No entanto, em certas circunstâncias, é possível
que os trabalhadores obtenham vitórias, mesmo importantes.
Foi assim a seguir à Segunda Guerra mundial. A situação
era tal que a burguesia da época aceitou, em numerosos Estados, um
sistema de segurança social muito avançado, mecanismos de
progressividade de impostos muito desenvolvidos, medidas de
nacionalização de empresas e de planificação da
economia nunca vistos anteriormente. Resultou daí uma estabilidade
bastante longa na repartição dos rendimentos entre assalariados e
capitalistas. Isto favoreceu certamente o mais importante crescimento da
história da humanidade na maior parte dos países, nomeadamente na
Europa, na Ásia e na América.
Esta experiência mostra portanto que é possível, mas
somente em condições excepcionais, dominar um pouco este aspeto.
Mas, desde que a relação de forças se incline de novo para
o patronato, como no fim dos anos 70, vemos que este compromisso
precário vacila imediatamente e a desigualdade volta naturalmente a
dominar a situação.
Em contrapartida, é extremamente difícil, para não dizer
impossível, manter uma regulamentação da segunda
tendência, a saber: a de aumentar sem cessar o investimento, e portanto
as forças produtivas, a um grau que ultrapassa largamente o que as
populações podem comprar. Assim, um jornalista de
Trends-tendances
realça essa vontade, na indústria automóvel, de cada
construtor aumentar as suas partes de mercado e, portanto, adaptar em
consequência a sua produção. "
Ora, escreve ele, basta atualmente adicionar todas as capacidades na
praça, para compreender que seria necessário que o mercado
atingisse 115 % ou 120 % em relação ao que é hoje, para
satisfazer todo o mundo
". E pergunta como é possível enfrentar esta
situação ao presidente da Ford Belgium
da época, Allain Batty, que lhe responde: "
Esse problema de sobrecapacidade pode também ser abordado de outra
forma. Se nos mantivermos ao nível da capacidade global, podemos fazer
este cálculo e dizer que dez fábricas terão que fechar as
suas portas. Mas dez fábricas significa também a envergadura de
um grande construtor! Portanto, isso não acontecerá desta forma.
A noção de sobrecapacidade não é uma fatalidade. O
futuro di-lo-á, e sobretudo os clientes o dirão, comprando o que
lhes parece de melhor. Se você tem um produto que agrade, e aí
está o verdadeiro desafio, deixará de falar em sobrecapacidade e
poderá mesmo perspetivar aumentos de produção
"
[13]
.
É interessante ver como este patrão dá a volta à
questão macroeconómica da existência de sobrecapacidades
globais, transformando-as num desafio individual de produzir ainda mais. E
aí atingimos o fundo da justificação da anarquia
capitalista: a produção não é justificada
senão pela procura individual do produto (por empresa), pouco importando
as consequências societárias como as sobrecapacidades, as
recessões que elas podem engendrar, as perdas de emprego que elas podem
gerar. É isso que não pode ser controlado, regulado, jugulado e
é por isso que as crises são inevitáveis e aparecem
periodicamente no capitalismo.
5. Conclusões
John Maynard Keynes
tem, incontestavelmente, méritos. A sua análise é uma das
mais finas e mais ricas da teoria económica. Se for necessário
promover um programa de relançamento imediato no quadro do capitalismo
atual, a sua obra contém numerosas soluções adequadas e
frequentemente justificadas. É uma fonte de inspiração,
mas que merece também críticas.
Com efeito, aí termina o interesse que podemos dedicar-lhe. Se quisermos
ir mais longe, examinar em profundidade as causas e origens da crise e
encontrar soluções que curem verdadeiramente, o
keynesianismo
mostra-se mais limitado. Ora, parece-nos que é nessa
direção que seria necessário dirigir-nos face à
presente crise, tal como em relação à dos anos 30.
Não há verdadeiramente solução à atual
recessão, senão numa saída do sistema e na sua
substituição por uma sociedade fundada na base da igualdade e da
solidariedade, cuja economia seja gerida por um Estado que garanta os
interesses da maioria da população os que trabalham, a
partir de uma planificação relativamente centralizada, o que quer
dizer o socialismo. Se não for este o caminho que a humanidade tomar,
resultarão meias medidas, soluções que poderão
talvez melhorar temporariamente os efeitos mais dramáticos da
recessão, mas que arriscam agravar ainda o mal, como acontece hoje com
as políticas de competitividade, que permitirão eventualmente
àqueles que as levam à prática que se saiam melhor, mas em
detrimento dos outros. Isto não pode senão agudizar ainda mais as
tensões, as contradições e portanto as possibilidades de
conflito.
Socialismo ou barbárie! Nesta perspectiva, Keynes
tenta evitar o caos, sem recorrer ao socialismo. Mas tudo mostra que a sua
teoria, mesmo se está mais perto da realidade do que a da corrente
liberal, não permite aquilo que ele pretende. Mesmo com Keynes, o
capitalismo corre para o caos e a guerra.
Notas
1. "Informe sobre a situação internacional e as tarefas
fundamentais da I.C." 19 de julho de 1920, em Lénine, (Obras, vol.
31, p.226 e seguintes)
(http://www.marxists.org/francais/lenin/works/1920/07/vil19200719.htm
)
2. John Maynard Keynes,
A pobreza na abundância,
Gallimard, Paris, 2002, p.18.
3. A contabilidade nacional acrescentou dois elementos: as despesas
governamentais (G) e a balança comercial (se o X designar as
exportações e M as importações, a balança
comercial pode ser representada pela diferença X-M). Assim, o produto
interno bruto (PIB, designado ainda pela letra Y) pode decompor-se em: Y =
C+I+G+ (X-M).
4. Fomos nós que resumimos assim o seu programa. Keynes
não o formulou tão claramente.
5. John Maynard Keynes,
Teoria Geral do Emprego, do juro e da moeda
, Payot, Paris, 1979, p.171.
6. Que ele não considera negativamente no conjunto.
7. John Maynard Keynes,
A pobreza na abundância,
ob. cit., p.39.
8. Não é possível conseguir dados mais detalhados para o
stock de ativos fixos.
9 Créditos imobiliários negociados com as famílias que
não tinham meios de reembolso.
10. Não há cálculos do PIB senão a partir de 1929. A
diferença reside em poucas coisas: o PIB é uma estimativa da
riqueza mercantil e monetária de um território (os Estados
Unidos); o PNB da riqueza dos habitantes de um país (os americanos).
Assim, o lucro de uma filial estrangeira repatriada na nação de
origem será compatibilizado no PIB do país onde se encontra a
filial, mas para o PNB no país da casa mãe.
11. John Maynard Keynes,
Ensaios sobre a moeda e a economia
, Payot, Paris, 1972, p. 28.
12. Um
think tank
(literalmente reservatório de ideias) é um conjunto mais ou menos
informal de pessoas, muitos dos quais decisores, para debater problemas em
comum. É a Trilateral, o grupo de Bilderberg, o fórum de Davos...
13.
Trends-tendances
, 6 mai 1993, p. 22.
[*]
Doutor em economia, pesquisador no
GRESEA
e no Instituto de estudos marxistas, especializado no estudo das
multinacionais, das estratégias europeias do emprego e da crise
económica. (henri.houben7 (arroba) telenet.be)
O original encontra-se na revista
Études Marxistes,
nº 93, 2011/07/13, publicado em
http://www.marx.be/FR/em_index.htm
. A tradução para português encontra-se em
http://www.pelosocialismo.net
.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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