Parte 3: Ciência e Tecnologia na Coreia do Norte
Enriquecer o solo produzir para além da subsistência
Continuação das partes anteriores:
Introdução
,
1
e
2
por Kim Soobok
Junto ao Rio Chongchon, em Namhung, Província de Pyongan Sul,
está o grandioso Complexo Quimico da Juventude. Estabelecido
em 1979, é uma das maiores instalações produtoras de
fertilizantes da Coreia do Norte. Antes do período da
Marcha Árdua
, 1990-2000, a base material para a produção de fertilizantes
era a nafta, um subproduto residual da refinação de
petróleo.
O Complexo de Namhung, bem situado próximo da Fábrica
Química
Bonghwa em Sinuiju, uma das duas refinarias de petróleo da Coreia do
Norte, tinha assim acesso a uma fonte de nafta abundante. Também
está
próximo de Kaechon, o centro da produção de carvão
da Coreia do Norte e fornecedor de combustível para o complexo, bem como
do Rio Chongchon, fonte de água industrial. O complexo costumava
produzir 360 mil toneladas de ureia fertilizante, 25 mil toneladas de
polietileno e 10 mil toneladas de acrílico por ano.
Contudo, na década de 1990, o colapso da União Soviética e
o sufocamento económico imposto pelas sanções levaram a um
declínio drástico da capacidade da Coreia do Norte para importar
petróleo bruto. Com o fim do acesso à nafta, a
produção de fertilizantes estagnou. Foi então que o
líder norte-coreano Kim Jong-il propôs a produção de
um novo tipo de fertilizante a partir da antracite, abundantemente
disponível
naquele país montanhoso.
Entretanto, uma série de inundações catastróficas
em 1995 e 1997 paralisou indústrias extractivas da Coreia do Norte e a
tarefa de transformar carvão em fertilizante foi adiada indefinidamente.
O país levou muitos anos para se recuperar plenamente dos danos das
inundações e restaurar suas minas encharcadas em água.
Só em
2009, a RDPC foi capaz de restaurar suas indústrias
básicas, tais como o
vinalon
e a produção de aço. Animada pelos avanços
tecnológicos que permitiram uma produção acelerada, a
Coreia do Norte estabeleceu como objectivo tornar-se uma
"nação forte e próspera". Aumentar a
produção de fertilizantes a fim de promover a
produção de cereais era um ponto crítico para o
cumprimento deste objectivo.
Cientistas e engenheiros norte-coreano, incluindo peritos da Universidade de
Tecnologia Kimchaek, finalmente tiveram êxito em gaseificar a antracite e,
em 2009, o país pôde começar a produção em
massa de
fertilizantes a base de carvão. Trata-se de um processo complicado que
envolve pelo menos nove passos, incluindo a gaseificação, a
purificação do gás, a sua compressão e a
síntese do amoníaco. Eles também construíram um
separador de oxigénio de grande porte, componente essencial no processo
de gaseificação, e fornalhas alimentadas a carvão
pulverizado para aumentar a eficiência da produção.
De acordo com as notas que tomei na minha visita de Setembro de 2012, o Complexo
Namhung produziu 350 mil toneladas de ureia fertilizante em 2011-2012. E de
acordo com registos da Academia Nacional de Ciências da RDPC,
em Maio de 2015, todo o país produziu 700 mil toneladas de ureia, 300 mil
de fertilizante com fósforo e 300 mil de fertilizante com potássio, num total de
1,3 milhão de toneladas de fertilizante naquele ano. Cientistas e
engenheiros no Complexo Namhung continuam a investigar meios para aumentar a
produtividade e a eficiência enquanto reduzem o custo de
produção. E mais de quatro centenas de subprodutos
químicos do processo de produção de fertilizantes
são reciclados pela indústria química do país como
base para um vasto conjunto de produtos, incluindo tintas, fibra de
polipropileno e matérias-primas farmacêuticas.
Biotecnologia e fertilizantes orgânicos
A super-utilização de fertilizantes químicos pode devastar
o ambiente microbiótico natural do solo e torná-lo dependente
para sempre da fertilização artificial. Portanto, a Coreia do
Norte está agora a voltar o seu foco para a biotecnologia a fim de
produzir
fertilizantes orgânicos que ajudem os agricultores a revitalizar
micro-organismos e reconstruir o conteúdo orgânico do solo.
O nitrogénio, o fósforo e o potássio
macronutrientes essenciais para as plantas podem estar presentes no solo
mas em formas que as plantas não os podem absorver facilmente.
Os fertilizantes orgânicos introduzem micro-organismos que transformam os
nutrientes em formas acessíveis às plantas. A Fábrica
Patriota de Fertilizante Microbiano Composto é um instituto de
investigação que utiliza nova tecnologia bioquímica para a
produção em massa de fertilizantes microbianos compostos que
fazem exactamente isso. O instituto tem instalações
manufactureiras em todos os municípios do país para produzir
fertilizantes com micro-organismos nativos nos solos locais. Agricultores
locais também são estimulados a produzir localmente o seu
próprio fertilizante orgânico utilizando métodos de baixa
energia. Eles fazem compostagem de resíduos de plantas e esterco animal,
a seguir por vezes aumentam o material composto com alguma forma de
fertilizante químico.
A Fábrica Patriota de Fertilizante Microbiano Composto também
é louvada pelo seu desenvolvimento de um acelerador inteiramente natural
do crescimento de plantas , o Bonghwasan 1, fabricado
através da extracção de componentes bioactivos de uma
vasta variedade de plantas nativas da Coreia do Nortes. Em
tempos de seca, as raízes das plantas precisam aprofundar-se no solo em
busca de humidade e nutrientes. O Bonghwasan 1 promove o crescimento das
raízes e promove a fotosíntese. O tratamento de sementes com
Bonghwasan 1 antes da semeadura permite às plantas aguentarem secas
através do aumento do comprimento das raízes em mais de 16
polegadas [41 cm] o
que lhes permite absorver humidade e nutrientes no subsolo profundo.
Raízes
mais fortes e mais profundas também permitem às plantas
suportarem chuvas e ventos fortes durante a época das
monções.
A Cooperativa Agrícola Ryongjin, no município de Kaechon, que
reforçou a fertilidade do solo com a adição de algas azuis
ao composto químico, informou que depois de acrescentar Bonghwasan 1 ao
tratamento das sementes as suas colheitas mal foram afectadas pela seca. Ela
agora depende menos de fertilizantes químicos e é capaz de
aumentar ainda mais o rendimento das colheitas. A Cooperativa Agrícola
Gwanbong, no município Chunghwa, que sofria de crónica escassez
de água devido à distância a que se encontrava do reservatório mais
próximo, também relatou colheitas com êxito após
a utilização do Bonghwasan 1. O seu milho não é
afectado pela seca, informaram os agricultores, permanece saudável e
intacto. A cooperativa antecipa um aumento no rendimento de 50 a 100 por cento.
A nova inovação da Fábrica Patriota de Fertilizante
Microbiano Composto também está a revolucionar a
produção de fertilizante orgânico. O processo de
decomposição habitualmente envolve a perda de 80 a 90 por cento do
resíduo orgânico na forma de dióxido de carbono e
água. Portanto, produzir uma tonelada de composto normalmente exige dez
toneladas de resíduo orgânico. Mas o instituto criou um novo tipo
de catalisador bio-orgânico com resíduos de farelo de arroz e
leguminosas como substrato que impede a perda de resíduos
orgânicos no processo de decomposição e aumenta
significativamente o rendimento do composto. Segundo Kim Seon-ok, o
engenheiro-chefe da Cooperativa Agrícola Boseong, no Distrito Rangrang
de Pyongyang, com a utilização deste novo catalisador "o
que costumava exigir vinte toneladas de inputs agora exige apenas cinco".
Rumo à auto-suficiência alimentar
Graças a avanços na produção de fertilizantes, a
cada ano a Coreia do Norte progride mais no rumo do seu objectivo da
auto-suficiência alimentar. Segundo estimativa da
Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO)
das Nações Unidas, a produção de cereais da Coreia
do Norte, a qual afundara-se para menos de 3 milhões de toneladas em
meados da década de 1990, tem estado a aumentar constantemente. Em 2013
e 2014, o país produziu anualmente cerca de 5,3 milhões de
toneladas de cereais o suficiente para alimentar toda a
população norte-coreana em níveis básicos de
subsistência. (Tabela 1)
Outros indicadores também assinalam melhorias na qualidade de vida da
Coreia do Norte. Segundo o Banco Mundial, a taxa de mortalidade infantil da
Coreia da Norte, a qual ascenderá a quase 60 mortes por milhar de
nascidos vivos no período da Marcha Árdua, caiu gradualmente e
agora aproxima-se das 20 por mil, muito mais baixo do que a média
mundial e apenas ligeiramente mais alta do que a dos seus vizinhos no Extremo
Oriente e no Pacífico. (Tabela 2)
A esperança de vida na Coreia do Norte, a qual caira para menos de 65
anos no período da Marcha Árdua, também aumentou
firmemente. Segundo o Banco Mundial, agora está a par da média
mundial de 70 anos. (Tabela 3)
Diversificar a dieta da nação
Tendo cumprido seu objectivo de aumentar a produção
cerealífera, a Coreia do Norte agora é capaz de voltar sua
atenção para a melhoria da dieta nacional
através da diversificação das suas fontes de
proteína, lacticínios e vegetais. A Colina Sepo, na região
norte da província Gangwon, por exemplo, está a ser transformada
num complexo agro-pecuário para o fornecimento de lacticínios a todo o
país.
Ela abrange 122 mil acres [49,3 mil hectares] em três municípios
Saepo, Ichon e Pyonggang mas antes era um deserto, terras
incultas inférteis com solos ácidos provocados pelas cinzas de
uma erupção vulcânica.
Em 2012, o recém empossado líder norte-coreano Kim Jong Un
começou a executar a visão do seu pai e
avô de transformar a área numa "exploração de
classe mundial" e instruiu responsáveis do partido a elaborarem um
plano. Depois de efectuar análises dos solos das terras ácidas, o
país começou a transformá-las em pastos. Membros do
Comité Central do Partido dos Trabalhadores, do Exército Popular
e do Gabinete lideraram o esforço e pessoas com todos os estilos de
vida, incluindo responsáveis do partido, funcionários do governo,
barbeiros, recepcionistas e donas de casa, de todos os cantos do país,
responderam ao apelo de apoiar Sepo Mound. Soldados puseram de lado suas armas
e empunharam pás ao juntarem-se ao projecto.
Milhares de voluntários araram e cultivaram 122 mil acres. A terra fora
abandonada durante tanto tempo que eles ainda encontraram fragmentos de bombas,
granadas e minas da guerra de 65 anos atrás. Depois de limpar a terra de
entulho e arrancar ervas daninhas, acrescentaram 60 mil toneladas de
calcáreo e fertilizante Hukbosan para melhorar o solo. Eles descobriram
turfa na base de reservatórios congelados e fizeram dezenas de milhares
de correcções do solo, às quais aplicaram o precioso
tónico para solos danificados. A seguir plantaram sementes de trevo e
capins ricos em outros nutrientes que produzem boa forragem para animais
de pasto. Quando novos brotos emergiram no ano seguinte, provocaram
lágrimas de alegria.
As equipes também construíram todas as instalações
necessárias para o pleno funcionamento do complexo: milhares de
residências, cercados para animais domésticos, um centro de
investigação científica, um centro de processamento de
animais, uma instalação de quarentena para animais doentes,
centenas de instalações de produção de gás
metano, instalações para forragens e manufactura de aditivos para
forragens, bem como um quarteirão residencial para 50 peritos em
pecuária do Instituto de Investigação Agrícola da
Coreia do Norte. Graças a estes esforços, Sepo Mound é
agora um vasto pasto fértil onde agricultores começaram a criar
animais de pastoreio para produzir queijo e leite para
distribuição por todo o país.
A Coreia do Norte também dispõe de pomares em grande escala, como
o Pomar do Rio Daedong e o Pomar Gosan. O de Daedong tem uma instalação
manufactureira automatizada para a produção de sumo de
maçã e uma loja de retalho que vende uma grande variedade de
produtos das macieiras, tais como sumo, champô e sabonetes.
Instalações de grande escala para o processamento de cereais e
fábricas regionais produzem o essencial da cozinha coreana, tal como
molho de soja, pasta de soja, pasta de pimenta vermelha, xarope maltado de
arroz e fécula, bem como uma grande variedade de confeitarias. Empresas
tais como as da Cerveja Rio Daedong, Cerveja Ryongsong e Cerveja Rason produzem
a bebida com sabores que são característicos das suas respectivas
regiões. Tornou-se habitual ver trabalhadores desfrutarem um copo de
cerveja a caminho do trabalho uma cena que não seria
possível sem suficiente produção de cereais.
O mais impressionante é que agora quase todas as unidades da sociedade
norte-coreana cooperativas, unidades agrícolas, fábricas,
negócios, etc já são auto-suficientes na
produção da carne e verduras para seu consumo. Com base no
princípio da auto-suficiência, elas produzem gado em pequena
escala e possuem cooperativas com jardins e estufas para a
produção de legume destinados ao consumo próprio. Isto será
analisado na próxima parte, a última, desta série.
20/Abril/2018
A seguir, Parte 4: Utilização de métodos agrícolas
sustentáveis para a auto-suficiência alimentar ao nível
local
Partes já publicadas:
Intro
Ciência e tecnologia como o caminho para o progresso económico
1
Ciência e tecnologia como o caminho para o progresso económico
2
Irrigar os campos uma luta de duas décadas
O original encontra-se em
www.zoominkorea.org/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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