Estratégia e Tática: as mediações
táticas da estratégia socialista
Teses à Conferência Política Nacional do PCB (13 e 14 de
novembro de 2011)
O Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro convoca Conferência
Política Nacional!
A Conferência terá sua etapa nacional nos dias 12 e 13 de novembro
deste ano, no Rio de Janeiro. O objetivo principal do evento, que será
precedido por seminários e conferências regionais, é
ajustar a tática dos comunistas brasileiros à estratégia
socialista definida pelo XIV Congresso do Partido (2009), com destaque para a
ação política no campo dos movimentos de massas e em
outras esferas e espaços de luta, debatendo os caminhos para o
avanço da construção da contra-hegemonia
revolucionária socialista.
Está aberta uma Tribuna de Debates em torno das Teses elaboradas pelo
Comitê Central. Os debates contarão também com a
colaboração de amigos do PCB convidados.
A Conferência Política é uma instância
intermediária entre o Comitê Central e o Congresso do Partido,
reunindo-se entre um e outro Congresso. Publicamos aqui a primeira parte das
Teses do CC à Conferência. Vamos ao debate!
I- Uma Estratégia Socialista
II - O capitalismo brasileiro
III - Hegemonia e contra-hegemonia
IV - As Mediações Táticas da Estratégia Socialista
V - Operações Táticas
PRIMEIRA PARTE
I- Uma Estratégia Socialista
1. O PCB, em seu XIV Congresso Nacional, em 2009, definiu sua estratégia
como uma estratégia socialista. Isso significa que afirmamos que o
desenvolvimento do capitalismo, no mundo e no Brasil, se encontra em um
estágio que define a burguesia monopolista como classe econômica e
politicamente dominante em uma ordem capitalista madura na qual as
contradições centrais são entre os interesses do capital e
os do trabalho.
2. A burguesia não luta mais para impor seu domínio contra
nenhuma classe ou fragmento de classe pré-capitalista, da mesma forma
que o seu domínio há muito tempo perdeu o caráter
progressista, tornando-se um poderoso entrave ao desenvolvimento das
forças produtivas e à produção social da vida. O
modo de produção capitalista tornou-se destrutivo e seu
desenvolvimento aprofunda as contradições que lhes são
próprias, na medida em que socializa radicalmente a
produção envolvendo todos os povos do mundo numa rede mundial de
produção, circulação e consumo, ao mesmo tempo em
que acumula privadamente a riqueza nas mãos de cada vez menos grupos
monopolistas internacionalizados como principais sujeitos do capital
imperialista.
3. O Brasil se insere no sistema capitalista/imperialista com uma economia
completa do ponto de vista das necessidades da acumulação de
capitais, subordinando todas as esferas da vida a estas necessidades,
mercantilizando tudo em escala nunca antes vista. Todos os grandes problemas da
formação social brasileira, as desigualdades regionais e sociais,
a falta de acesso a bens e serviços essenciais como
educação, saúde, moradia, saneamento básico,
transporte, segurança e outros não são causados pela
carência de recursos e baixo desenvolvimento econômico, mas pelo
próprio desenvolvimento do capitalismo como modo de
produção e distribuição e sua inevitável
mercantilização da vida.
4. Desta forma, o PCB defende que as diferentes lutas que se confrontam com as
mais diversas manifestações da injustiça e a desigualdade
se chocam hoje com a forma capitalista, seja na luta pelo acesso à
terra, seja pelo choque entre as formas de produção camponesa
contemporânea próprias da pequena propriedade ou do trabalho
associado nos assentamentos da reforma agrária incompleta e
insuficientemente realizada com a economia capitalista monopolista, que
desenvolveu uma estrutura agrária plenamente capitalista e monopolizada;
seja nas lutas sociais por moradia, emprego, saúde,
educação, segurança, diversas opressões
específicas (sobre os jovens, mulheres, negros, populações
originárias e outras), que enfrentam a ordem capitalista chocando-se com
suas manifestações mais aparentes através de uma
particular forma de ordenamento do espaço urbano e de uma particular
lógica opressiva e negadora da vida em sua plenitude humana.
5. Reafirmamos que a acumulação ampliada de capitais e suas
renovadas necessidades se fundamentam na exploração do trabalho
assalariado, na extração de mais valia no setor produtivo da
economia, o que impõe um aprofundamento da intensificação
do trabalho com sérias consequências para a classe trabalhadora.
Sua aparente passividade não deve obscurecer o grave aprofundamento da
exploração, assim como a fragmentação e
precarização dos trabalhadores não significa que, neste
novo perfil e composição, estes deixem de ser não apenas a
classe fundamental para a reprodução da acumulação
de capitais, como o grupo social que pode se opor, de maneira mais decisiva,
à ordem do capital, representando os interesses de todos aqueles que se
encontram oprimidos pela manutenção da forma capitalista de
organização societária.
6. Os problemas específicos do proletariado, entendido por nós
como o conjunto daqueles que são obrigados a viver da venda de sua
força de trabalho, seja produtiva ou improdutivamente, não se
resolverão pelo mero desenvolvimento econômico ideologicamente
apresentado como neutro ou adjetivado de "social",
"inclusivo" ou "sustentável". Os ganhos parciais,
momentâneos e insuficientes que o proletariado pode vir a auferir nos
momentos de crescimento são violentamente cobrados nos momentos de
crise, recaindo sobre seus ombros, novamente, o preço de
salvação do capital ciclicamente em crise. O mais grave é
que o apassivamento do proletariado e seu tenso e precário amoldamento
à ordem do capital desarmam não apenas os trabalhadores
assalariados mais ligados ao núcleo central da acumulação
de capital, mas toda a sociedade que se fragmenta em lutas específicas
pontuais, normalmente restritas às demandas imediatas e
econômicas, perdendo sua força para se contrapor à ordem do
capital.
7. Desta maneira, para nós, além de ser o principal interessado
na luta anticapitalista, o proletariado segue sendo a única classe que,
através de sua particularidade, pode expressar os interesses de toda a
sociedade por sua emancipação. Assim, o PCB define que a
revolução brasileira é, pelo seu caráter, pela
época histórica em que se insere, pela classe que se apresenta
como sujeito histórico e contra as classes que formam o bloco dominante
e hegemônico contra o qual ela se opõe, uma
revolução socialista.
8. A construção dessa estratégia depende, em primeiro
lugar, de uma análise rigorosa e profunda da realidade brasileira
contemporânea, do processo mundial e local de desenvolvimento das
relações capitalistas, das articulações do
capitalismo brasileiro com o imperialismo e do entendimento de como se
dá a afirmação da hegemonia burguesa em nosso país.
A partir de tais reflexões e da crítica às demais
visões estratégicas que disputam conosco a hegemonia no campo da
luta socialista, será possível desenvolver propostas de
mediação tática consoantes às necessidades e
possibilidades concretas de pavimentação do caminho
revolucionário no Brasil.
II - O capitalismo brasileiro
A necessidade da discussão implicações
estratégicas e táticas para a Revolução brasileira
9. O correto entendimento das mediações é de fundamental
importância para garantir a aplicação da
formulação estratégica do Partido na perspectiva de
realização dos objetivos da revolução socialista no
Brasil. O entendimento dos diversos eixos táticos, em sua natureza
interna, sua dinâmica e seu peso relativo no conjunto das
ações do Partido, deve levar em conta a avaliação
do quadro atual de desenvolvimento das forças produtivas e das
possibilidades concretas de aprofundamento das relações
capitalistas no Brasil.
10. No campo das esquerdas, alguns grupos acreditam que ainda há
espaço para um significativo crescimento econômico, para uma forte
expansão do mercado interno e para o fortalecimento da democracia
burguesa capaz de atingir a um padrão de desenvolvimento semelhante ao
dos atuais países capitalistas desenvolvidos. Para estas correntes
reformistas, importantes segmentos da burguesia brasileira teriam interesse
real, também, no oferecimento de mais garantias sociais para a classe
trabalhadora. No extremo oposto, alguns grupamentos esquerdistas apontam para o
esgotamento desta possibilidade, baseando-se na constatação de
que o capitalismo brasileiro teria atingido o seu "teto" e que,
assim, não haveria espaço para um processo de
acomodação da classe trabalhadora via reformas ou
concessões no campo da capacidade de consumo e condições
de vida e trabalho, chegando a acreditar que uma crise econômica do
capitalismo levaria à imediata crise de suas instituições
e à possibilidade de uma ruptura revolucionária.
11. As principais implicações estratégicas e
táticas desses dois entendimentos opostos são, por um lado, a
proposta de alianças interclasses e pactos sociais, fundada na
crença da existência de um pensamento "nacional" voltado
para a construção de justiça social e democracia tendo por
base um certo tipo de neodesenvolvimentismo social, liderado por parte de
importantes segmentos burgueses e, por outro, a convocação da
classe trabalhadora para o confronto aberto e imediato, sem
mediações de nenhuma natureza, para a insurgência
revolucionária e a derrota final do capitalismo e da democracia burguesa.
12. O PCB, pensando a revolução brasileira, não
compartilha de nenhuma dessas duas análises e vem buscando construir,
nos últimos anos, um caminho político balizado na perspectiva
estratégica da revolução socialista, rompendo, pois, com a
alternativa nacional libertadora (ou democrático-burguesa), assim como
evita cair nas armadilhas do esquerdismo. Daí a convocação
de toda a militância para o aprofundamento da discussão sobre as
mediações táticas necessárias à
concretização do caminho revolucionário, pois, ao
afirmarmos que a estratégia no Brasil é socialista, não
pretendemos com isso dizer que a revolução está à
vista.
13. A formulação da "revolução burguesa"
ou democrático-burguesa como uma necessidade histórica presente
em todas as formações sociais tem origem em leituras
mecânicas e atemporais dos clássicos do marxismo, em
transposições igualmente mecânicas dos processos europeus e
norte-americano dos séculos XVIII e XIX, estimulando as visões e
proposições "etapistas" para o processo
revolucionário. A partir do pós-guerra, esta
formulação ganha o reforço de simplificações
manualísticas do processo revolucionário, vindas do PCUS e
voltadas, em especial, para os países do então denominado
terceiro mundo, onde assumia também o caráter
"nacional".
14. Um dos problemas desta generalização é que havia
grande diversidade entre os países do chamado "terceiro
mundo", em que se incluía desde a Argentina, o México e o
Brasil até o país menos desenvolvido. Na imensa maioria dos
países da África, da Ásia e do Oriente Médio, foi
correto os comunistas fazerem da luta anticolonial, portanto anti-imperialista,
o aspecto mais importante do caminho revolucionário, com a decisiva
solidariedade da União Soviética. Até porque, em muitos
deles não existia "burguesia nacional" ou esta não
tinha peso significativo. Em alguns destes países, este aspecto ainda
continua atual. Mas no caso do Brasil, por exemplo, a contradição
capital x trabalho já se evidenciava a partir dos anos 1950. Portanto, a
questão nacional não poderia ter sido entendida pelos comunistas
como apenas uma "etapa", na qual a unidade com setores da burguesia,
na maioria das vezes sem autonomia e identidade, acabava por tornar
secundárias a luta de classes e a agitação do socialismo.
15. No PCB e na esquerda brasileira em geral, a luta anti-imperialista era
entendida como o aspecto mais importante da estratégia
revolucionária em que, numa franca distorção da teoria
marxista, a contradição fundamental, no caso brasileiro, deixava
de ser capital x trabalho, para se fixar na fórmula imperialismo x
nação, pela qual se estabelecia, como questão central, a
oposição entre os interesses dos capitais estrangeiros aos
interesses nacionais. Como consequência desta visão, era proposta
a aliança da classe trabalhadora com a "burguesia nacional"
para o enfrentamento do inimigo imediato: o imperialismo, identificado na
presença das empresas estrangeiras no país. O segundo entrave era
relacionado ao latifúndio, símbolo maior do atraso (por
representar a sobrevivência de "restos feudais" em nossa
formação social). Criava-se, assim, a falsa expectativa de que a
"burguesia nacional" viesse a comandar um processo de
modernização do capitalismo, com a realização da
reforma agrária, do fortalecimento da democracia e a garantia de mais
direitos sociais para os trabalhadores, ou seja, as chamadas "tarefas
inconclusas", que caberiam à burguesia.
16. Esta visão predominou no PCB nos anos 1950, tendo estado presente no
Partido, ainda que com outras denominações e ênfases,
até 1992, quando os reformistas e liquidacionistas criaram um novo
partido. Esta análise influiu, assim, na política de
alianças e nas ações dos comunistas do PCB no contexto da
fase final da ditadura e nos anos que se seguiram. Mas trata-se de um debate
que passou a envolver grande parte da esquerda brasileira, principalmente a
partir dos últimos anos do regime implantado pelo golpe de 1964, quando
se discutiu o caráter da "redemocratização" do
Brasil e os rumos desejados para a transformação socialista.
Hoje, depois da vitória eleitoral de um PT já desfigurado de seu
conteúdo socialista dos primeiros anos, setores que ainda se afirmam
como de esquerda voltam a apresentar formulações
"desenvolvimentistas" ou "neodesenvolvimentistas", para
justificar a ampla aliança de classes voltada à
sustentação de um governo "progressista", inaugurado
por Lula e, agora, continuado por Dilma.
17. O caráter socialista da Revolução brasileira vem sendo
afirmado pelo PCB desde o X Congresso, em 1992, e se consolida majoritariamente
no XIV Congresso, em 2009. As principais razões apontadas para esta
definição são as contradições
intrínsecas ao modo capitalista de produção, associadas ao
processo crescente de mundialização do capital: a tendência
por gerar mais e mais concentração de capital,
desvalorização contínua da força de trabalho,
desemprego ou subemprego e depreciação das
condições de vida da imensa maioria da população,
havendo sempre o acirramento dessas contradições pela
introdução maciça de novas tecnologias na
produção. Estas condições eliminam, praticamente,
em muitos países e no Brasil, em particular, a possibilidade de uma
aliança interclasses envolvendo uma suposta burguesia nacional, dona de
um projeto de desenvolvimento que, centrado nas empresas nacionais, pudesse, ao
se contrapor aos interesses estrangeiros presentes no país, oferecer
melhores condições de vida e trabalho à classe
trabalhadora.
18. O PCB reafirma que o capitalismo brasileiro é monopolista e completo
(dotado de todos os segmentos da produção, com uma estrutura
monopolista em todos os setores e dispondo de todas as
instituições do capitalismo desenvolvido). O capitalismo
brasileiro, ainda que possa vir a crescer bastante, não passará
por "etapas naturais" em seu desenvolvimento e não
chegará ao patamar idealizado e "prometido" de uma sociedade
cujos problemas serão resolvidos através da
ampliação do consumo de massas. Esta é a crença
presente na política de Estado praticada hoje pelo PT, cuja
lógica é a de que as desigualdades sociais serão
resolvidas com o pleno desenvolvimento do capitalismo e o consequente
crescimento da capacidade de consumo das massas no mercado formal, ao passo
que, para os mais miseráveis, são reservadas políticas
compensatórias e focalizadas.
19. O PCB, pelo contrário, reafirma que as contradições
sociais presentes na sociedade brasileira, ou seja, as condições
precárias de vida da maioria da população e o
padrão historicamente desigual do desenvolvimento brasileiro são,
exatamente, os resultados do processo de aprofundamento das
relações capitalistas em nosso país. Conforme afirmamos
nas resoluções do XIV Congresso (Livro das
Resoluções, página 44, § 46):
"As contradições objetivas que estão na base das
demandas
imediatas das massas trabalhadoras não se devem ao baixo desenvolvimento
de forças produtivas capitalistas, mas exatamente pelo próprio
desenvolvimento e natureza de uma sociedade hegemonizada pelo capital".
20. Ao adotar a formulação da revolução de
caráter socialista para o caso brasileiro, no entanto, o PCB não
deixa de reconhecer a complexidade da nossa formação social. O
PCB tampouco desconhece a presença de interesses capitalistas no Brasil
que, dinamizando a economia, acabam por, de forma direta ou associada ao
Estado, incidindo sobre a qualidade de vida e oferta de trabalho para parte da
população, qualificando a força de trabalho, ampliando os
mercados de consumo, em função do próprio crescimento da
demanda. Tais investimentos, entretanto, requerem e induzem sempre à
criação de condições cada vez mais
favoráveis para a reprodução do capital, sobretudo pela
via da "flexibilização" de entraves (gastos
previdenciários, encargos sociais, garantias trabalhistas e outros),
voltada para a maior extração de mais-valia, não estando
excluída a possibilidade de a burguesia utilizar-se do aparelho de
Estado para este fim, em especial dos bancos públicos.
21. A burguesia pensa, se articula e atua organizadamente. Por isso, devemos
buscar a compreensão acerca de todo o seu repertório de
ações e iniciativas na perseguição de seu objetivo,
que é a garantia da reprodução do capital. Assim, é
fundamental indagarmos se, no Brasil, há espaço para uma
aliança entre a burguesia, a pequena burguesia e setores do proletariado
no sentido de promover um tipo de desenvolvimento socialmente mais justo?
O capitalismo tardio e / ou periférico: o caso brasileiro
22. A partir das mudanças na estrutura da sociedade e do Estado
brasileiro advindas da chamada Revolução de 1930, com a chegada
ao poder político de grupos da então incipiente burguesia
industrial, e impulsionadas pelo novo contexto do pós II Guerra,
desenvolveram-se, nas décadas de 1950, 60 e 70, na ótica dos
interesses burgueses, teorias sobre a possibilidade e o caráter do
desenvolvimento capitalista no chamado terceiro mundo, ao qual o Brasil
supostamente pertencia. Muitos pensadores e grupamentos políticos
nacionalistas e de esquerda participaram ativamente deste debate.
23. No período JK e nos anos seguintes, entre outras discussões
presentes, destacaram-se as polêmicas em torno da
participação ou partilha do poder de Estado entre as classes
sociais nos arranjos desenvolvimentistas e a questão das
relações (de parceria, complemento ou subordinação)
entre o capital nacional e o capital estrangeiro. Unidos pela busca de um
modelo de desenvolvimento autônomo para o Brasil, intelectuais de
diversos matizes teóricos, reunidos em torno do Instituto Superior de
Estudos Brasileiros (ISEB), realizaram discussões e debates dos quais
resultaram proposições aproximadas à
formulação da "revolução
democrático-burguesa."
24. As posições variavam entre a defesa da liberdade total para a
entrada do capital estrangeiro, defendida pelos liberais, à
oposição total à entrada de investimentos externos
(defendida pelo PCB e outros grupos à esquerda, numa postura de
nacionalismo radical), passando pelos que defendiam esta possibilidade, desde
que devidamente controlada. A aliança de classes entre a burguesia e os
trabalhadores era defendida por diversas forças políticas e por
inúmeros intelectuais, que visavam à maior
participação do proletariado nas decisões políticas
e nos frutos do desenvolvimento, com uma melhor distribuição da
renda.
25. O que acabou prevalecendo na política econômica então
adotada pelo Estado brasileiro e que se consolidou com a ditadura
empresarial-militar instalada em 1964 foi a abertura ao capital
estrangeiro, eliminando, na prática, a possibilidade histórica do
nacionaldesenvolvimentismo, e a exclusão dos trabalhadores do processo
decisório e dos frutos do desenvolvimento econômico. A burguesia
brasileira (ou, ao menos, o setor mais dinâmico da classe, formado pelos
grandes grupos empresariais), a partir de então, abria mão de seu
possível caráter nacional e associava-se, como parceiro
subordinado, ao capital internacional.
26. Para além do período de JK, nos anos 1950, foram colocadas em
prática algumas das formulações desenvolvimentistas, a
seguir, nos governos militares. Sob intensa repressão política,
com o amordaçamento da vanguarda operária e dos movimentos
sociais, os governos militares abriram de vez a economia aos capitais externos,
criando as condições para a maior extração de
mais-valia para as empresas. No período chamado de "milagre
econômico" pela ditadura burguesa, foram criadas grandes empresas
privadas nacionais, o Estado se fez fortemente presente na
produção direta, com as grandes empresas estatais, a
serviço do capital; o crescimento econômico teve caráter
mais planejado. Cresceu a indústria de base e de bens de capital e o
sistema financeiro levando à ascensão política os
respectivos segmentos burgueses , fortaleceu-se a indústria de
bens de consumo duráveis, expandiram-se a infraestrutura produtiva e a
urbanização, formou-se um novo proletariado industrial e novas
camadas médias assalariadas, forjando-se uma imagem de modernidade e
construção nacional. No entanto, manteve-se, desde os anos 1950,
o perfil de distribuição de renda caracterizado pela elevada
concentração.
27. No terreno social, houve ampliação da escola pública
no ensino fundamental, do sistema de saúde pública e de uma
assistência previdenciária abrangente (inclusive no campo, com o
Funrural), fortemente marcada pela concepção contributiva e
não universal. Mas, além de alguns poucos outros exemplos,
praticamente não se alterou o quadro geral de desenvolvimento social no
Brasil. A ditadura acabou com a estabilidade no emprego e implantou o arrocho
salarial, indexando os reajustes salariais aos índices de
inflação do ano anterior, em alguns casos manipulados.
28. O final dos anos 1970 e a primeira metade dos anos 1980 marcaram a retomada
da ofensiva dos movimentos sociais em luta pela redemocratização,
por salários e melhores condições de vida. Houve uma
tentativa de impulsionar um padrão de desenvolvimento econômico
voltado para o aumento da produção interna e baseado na conquista
da estabilidade da economia, materializada no Plano Cruzado. No entanto, a
derrota deste plano, na segunda metade dos anos 1980, abriria o caminho para
uma fase de estagnação econômica e a entrada do
neoliberalismo no Brasil, que levaria, na década seguinte, ao desmonte
da estrutura produtiva e do aparelho de Estado até então
construída.
29. A eleição do Congresso Constituinte, ocorrida em um
período de grande mobilização popular, geraria a
expectativa de avanços democráticos e de promoção
de justiça social. O texto constitucional produzido refletiu, de fato, a
relativa hegemonia dos grupos de centro-esquerda, em vários temas, com
base nas pressões populares havidas, que convergiam na
proposição de um Estado de Direito, com amplas liberdades
democráticas, com a presença de diversas estruturas estatais e
públicas para o provimento de direitos sociais. Manteve-se também
a presença do Estado na condução da economia e na
produção direta. Avançou-se, assim, no texto, para um
arranjo inspirado nas experiências socialdemocratas, com a
sinalização de que as tarefas inconclusas para o desenvolvimento
do capitalismo seriam enfim concretizadas, com a única
exceção da reforma agrária, cuja proposta não
obteve a maioria dos votos, ainda que fosse amplamente apoiada no conjunto da
sociedade.
30. No entanto, a correlação de forças expressa naquele
momento revelava não apenas o auge das mobilizações
sociais abertas no final da década de 1970, mas também o
início de seu refluxo, ao mesmo tempo em que acabava por demonstrar que
o poder burguês não estava tão na defensiva, como alguns
imaginavam. O resultado foi um texto constitucional que revelava
intenções reformadoras de caráter social, mas, no
essencial, mantinham os interesses burgueses, fazendo com que a possibilidade
da socialdemocracia e do sistema de bem-estar social se esgotasse antes mesmo
de ser implementada.
31. Nos anos de 1990 em função da queda da URSS e de
diversos outros fatores -, acelerou-se a mundialização do
capitalismo, o que veio a fortalecer a plena hegemonia do pensamento chamado
neoliberal, levando à eleição de governos de direita e
à desarticulação e cooptação da
organização dos trabalhadores e do movimento de massas em geral,
além das crises e divisões no movimento comunista internacional.
Passou, então, a predominar a visão de que o desenvolvimento
é uma possibilidade que depende do "ambiente", da
ausência do Estado na economia e da liberação de todos os
"entraves" ao livre movimento do capital, da competitividade das
empresas, da plena liberdade de comércio internacional. Estabelece-se o
império do mercado. No Brasil, a busca da "estabilidade"
econômica a qualquer preço, a partir da introdução
do Real, com a maior autonomia do Banco Central, a abertura da economia ao
comércio exterior, as privatizações de empresas estatais,
o desmonte dos sistemas públicos de seguridade social e a retirada de
direitos dos trabalhadores foram os grandes eixos de ação
econômica e política deste período.
32. Desde então, o tripé de sustentação da
política econômica do Estado burguês no Brasil baseia-se no
câmbio flutuante, nos superávits primários e nos juros
elevados, para garantir o pretenso controle da inflação. Esta
política foi responsável pela maior concentração da
renda, pelo desaparecimento de inúmeras pequenas e médias
empresas e pelo consequente avanço do poder dos oligopólios, que
passaram a dominar cadeias inteiras do processo produtivo. Outro aspecto
importante do período foi a incorporação de investidores
individuais ao mercado financeiro, por meio de uma agressiva campanha de
estímulo à compra de ações, a qual, apoiada pela
mídia burguesa, levou setores de camadas médias e trabalhadores
com maior poder aquisitivo a buscarem ganhos nas bolsas de valores. Isso
representou de fato um forte elemento de convencimento ideológico
às práticas neoliberais.
33. Nos anos 2000, os dois governos Lula mantiveram os eixos básicos da
política neoliberal, realizando também pequenas
ações compensatórias, como os programas de auxílios
à população de baixa renda, como o
"bolsa-família". No entanto, retomou-se, em caráter
bastante rebaixado, principalmente a partir do segundo mandato, a
discussão sobre a necessidade de um processo ordenado de
desenvolvimento, de um possível "neodesenvolvimentismo" no
Brasil. Algumas poucas ações foram tomadas, nesse sentido, como
no caso do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, que se
centra no provimento de infraestrutura para a acumulação de
capital.
34. Hoje, o capitalismo está plenamente mundializado, em todas as
esferas, com a predominância das grandes empresas e dos grandes grupos
conglomerados internacionais. A mundialização já se
estende, para além do comércio e das finanças, às
cadeias produtivas. O capitalismo brasileiro é completo em sua estrutura
e integrado ao imperialismo. Está em fase de consolidação
no plano interno e de plena integração internacional, com a
criação de grandes empresas multinacionais de matriz brasileira,
a compra de ativos no exterior, a consolidação dos grupos
financeiros e a adequação dos aparelhos de Estado e das leis a
este fim.
35. A conjuntura brasileira atual é marcada pela
presença e forte tendência de permanência de uma hegemonia
conservadora, com uma base material definida, gerada, na economia, pela entrada
de capitais e pela realização de mais investimentos e pela
expansão das camadas médias de baixa renda; na esfera
política, reforçam esta hegemonia a identificação
de um padrão de melhoria das condições de vida como
possível para as camadas médias e de renda mais baixa, a
permanência, ainda que mitigada em relação aos anos FHC,
das ideias do Estado mínimo (apenas um indutor do desenvolvimento), da
supremacia do mercado e da privatização como
soluções "naturais".
36. O relativo recuo dos movimentos sociais e a continuidade do processo de
cooptação de seus militantes e lideranças, pelo bloco do
poder, comprovam esta hegemonia. Mas há, também, no interior dos
movimentos sociais, atitudes que indicam uma retomada da resistência e
contraposição à ordem, assim como há fissuras e
desgastes no bloco do poder, inclusive no campo da pequena burguesia
política, oriunda da esquerda.
O processo de monopolização e de
internacionalização do capitalismo brasileiro
37. A sociedade brasileira viveu um período de crescimento
econômico virtuoso nas décadas de 1950, 60 e 70, cujos resultados
provocaram grandes transformações na sociedade brasileira. A
intensidade, o ritmo e a grandeza do desenvolvimento registrado nesse
período podem mesmo ser considerados os mais expressivos da
história econômica brasileira. O país desenvolveu-se a
taxas de crescimento anuais médias acima de 7%, com um aumento
também acentuado do produto per capita. Nesses 30 anos, o Brasil saiu da
condição de uma nação onde a agricultura era
responsável pela maior parte do emprego e da renda, para outra onde a
indústria de transformação passou a comandar a
dinâmica da economia, inclusive na área da
exportação.
38. Nessas três décadas construiu-se uma
industrialização integrada e dinâmica, realizada a um ritmo
superior ao da maioria dos países capitalistas, o que transformou
quantitativamente a economia brasileira na oitava economia do mundo e no
país de maior produção industrial do antigo Terceiro
Mundo. Formaram-se, nesse período, grandes conglomerados industriais nas
áreas de metalurgia, eletro-eletrônica, siderúrgica,
química, plásticos, entre outros.
39. Construiu-se, paralelamente, um setor de serviço moderno e
dinâmico, cuja expressão mais significativa são os grandes
grupos bancários e comerciais. Mesmo sem cumprir sua
função clássica de alavancagem do setor industrial, os
bancos contam hoje com redes nacionais de agências (alguns,
internacionais) e um nível de informatização semelhante
aos países centrais. Na área estritamente comercial, formou-se um
conjunto de oligopólios que são responsáveis pela maior
parte do abastecimento dos produtos do setor moderno da economia.
Desenvolveu-se ainda uma poderosa estrutura de telecomunicações e
comunicação social, que alterou profundamente os hábitos e
a cultura de várias regiões, e cujas expressões mais
significativas são as redes nacionais de rádio e TV.
40. As relações capitalistas modernas avançaram em
expressivas áreas do campo, destruindo velhas relações
sociais de produção e modernizando as grandes propriedades, que
se especializaram na produção de commodities principalmente para
o mercado externo. Mesmo nas médias propriedades e até nas
pequenas (que funcionam em sistemas de concessão ou cooperativas)
ocorreu um intenso processo de modernização, mediante o uso de
insumos industriais que garantiram elevados ganhos de produtividade. Essa
modernização promoveu a expulsão de milhares de camponeses
de suas terras e a destruição de grande parte da pequena
propriedade isolada, fazendo com que, hoje, a agricultura brasileira esteja
incorporada ao processo de desenvolvimento capitalista. A relação
capital x trabalho é hoje predominante no campo brasileiro.
41. As modificações precedentemente elencadas alteraram
profundamente a fisionomia do país. Verificou-se uma crescente
urbanização: em 1980 mais de 70% da população
já viviam em áreas urbanas, das quais mais de 40% em cidades com
mais de 250 mil habitantes. Aumentou ainda extraordinariamente o número
de trabalhadores industriais e de serviços em função do
ritmo do crescimento econômico. O crescimento econômico verificado
no período resultou em elevada concentração de renda e na
ampliação das desigualdades sociais e dos níveis de
pobreza urbana e rural.
42. A performance da economia brasileira mudou radicalmente com a crise da
década de 1980. Esta crise teve seu epicentro nas políticas
tipicamente imperialistas desenvolvidas pelos países centrais,
especialmente os Estados Unidos, e trouxe em seu bojo a imposição
de ajustes econômicos predatórios que desorganizaram a estrutura
econômica brasileira, resultando na mais grave e continuada crise da
história contemporânea. Esta fase, caracterizada pela
implantação de políticas ortodoxas, significou um profundo
retrocesso para a economia brasileira e a ampliação das
dificuldades para os trabalhadores, expresso numa violenta recessão
entre os anos de 1981 e 1983, queda no crescimento econômico, aumento do
desemprego, redução da renda e das condições de
vida da população.
43. A economia brasileira acompanhou o movimento de
"financeirização" do capitalismo e, por conta das
"crises do petróleo" da década anterior e por
razões internas, enredou-se com o pagamento de juros da dívida
pública externa e interna e estagnou-se economicamente. No
campo burguês, o grande beneficiado foi o setor financeiro, que acumulou
um volume de lucros extremamente elevado, dado o quadro de altas taxas de
inflação.
44. Essa política reduziu o nível da atividade econômica,
aumentou o desemprego, sucateou vários ramos industriais, resultando
numa deterioração da qualidade de vida da
população, especialmente entre seus setores mais pobres. A
economia brasileira, pelo seu porte, e os trabalhadores, pela extensão
do arrocho, foram os mais prejudicados nesse processo. O país regrediu
no processo de inserção internacional, tornou obsoletos
vários ramos da economia, reduziu o poder de compra dos salários
e, consequentemente, o seu já relativamente reduzido mercado interno, e
ampliou a barbárie social.
45. No entanto, as políticas neoliberais propriamente ditas não
puderam ser implementadas nos anos '80 em função de algumas
características especiais da conjuntura brasileira: a retomada das
mobilizações políticas contra a ditadura, que
encontrava-se nos seus estertores, e em torno das discussões sobre a
Assembleia Nacional Constituinte funcionaram como um anteparo à
imposição das políticas neoliberais orientadas pelos
governos Reagan e Thatcher, pois não existia clima política para
medidas dessa ordem.
46. Os ajustes neoliberais propriamente ditos só começaram a ser
realizados na década de 1990, fase que marca uma mudança de
qualidade no processo de acumulação de capital no Brasil e uma
nova forma de relacionamento entre o grande capital internacional, a grande
burguesia associada e o Estado. Consolida-se, no plano internacional, o poder
dos blocos de forças sociais mais ligados ao capital financeiro. Esses
setores, hegemônicos na economia mundial, foram os principais
impulsionadores da globalização financeira e da
especulação mundial.
47. A privatização de empresas públicas, o desmonte das
estruturas estatais de seguridade social e a retirada de direitos e garantias
trabalhistas, entre outros elementos, somados à
internacionalização da economia, favoreceram sobremaneira as
grandes empresas financeiras e industriais e os setores exportadores, com
destaque para os segmentos extrativista e agroexportador, e fortaleceu-se o
processo de internacionalização da economia brasileira. Nesse
período, aumentou a entrada de capital estrangeiro, seja na forma direta
com a instalação de empresas , seja na forma de
investimento financeiro em ações nas bolsas de valores e na
compra de títulos públicos e privados. Com empregos mais
precarizados, reduziram-se, mais uma vez, os ganhos da classe trabalhadora.
48. Nos anos 2000 (dois anos de FHC e oito de Lula), novos ajustes foram
feitos, e um novo padrão de acumulação consolidou-se, nos
marcos do neoliberalismo, com a manutenção do grande peso, na
composição do PIB, dos setores financeiro, de
extração mineral e agroexportador. Outro elemento importante foi
a expansão, para o exterior, da ação das grandes empresas
brasileiras, juntamente com a internacionalização de seu capital.
49. Mesmo mantendo os privilégios do capital financeiro nacional e
internacional, o primeiro governo Lula incorporou ao bloco de poder setores
burgueses que antes estavam sem condições de influir na
política econômica do país, como o capital industrial e o
agronegócio. Se antes esses grupos tinham as empresas públicas
como âncora e ferramenta para o processo de acumulação de
capital, com a privatização das estatais, foram obrigados a
buscar novas opções de sobrevivência, num ambiente de
acirrada concorrência, com competidores ávidos para
incorporá-los aos seus portfólios societários.
50. No segundo mandato de Lula, o setor produtivo da economia passou a exercer
maior influência na gestão da política industrial do
país. A maior expressão política dessa nova fase é
a ação agressiva do BNDES, voltada a fortalecer os grandes grupos
privados brasileiros, com sucessivos aportes de capital tanto para operar um
ambicioso processo de fusões e aquisições, de forma a
criar "as campeãs nacionais", quanto para estruturar a
internacionalização dos grupos mais fortes (as chamadas
multinacionais verde-amarelas), com vistas a torná-los competitivos no
mercado mundial. A política de Estado adotada visava não
só estabelecer uma parceria entre as várias frações
das classes dominantes, com um aumento expressivo da participação
dos grandes grupos do setor produtivo industrial e do agronegócio nas
decisões econômicas do governo, muito embora o setor financeiro
continuasse obtendo lucros extraordinários e com largas parcelas de
poder na formulação das políticas econômicas,
especialmente no Banco Central.
51. Do ponto de vista internacional, o governo também acentuou sua
política de autonomia relativa em relação à
economia norte-americana, buscando uma atuação que, ao mesmo
tempo em que não contrariava os interesses estratégicos dos EUA,
tentava estabelecer áreas de influências, especialmente em zonas
da periferia, como a América Latina e a África, visando
conquistar mercados para os grandes grupos brasileiros nestas regiões.
52. O governo Lula, conscientemente, buscou estabelecer um novo posicionamento
do Brasil no cenário internacional, apostando, para tanto, numa
diplomacia mais ativa (inclusive no que se refere à
prospecção de mercados) e no fortalecimento de um conjunto de
grandes grupos econômicos para atuar nas novas áreas de
influência. Para realizar esses objetivos, o governo Lula desenvolveu uma
estratégia forte no sentido de capacitar instituições,
empresas e bancos do Estado para tornar realidade o novo papel do Brasil no
cenário internacional. Esta estratégia pode ser expressa nas
seguintes ações:
1) Um ativo papel do Estado,
através dos bancos públicos (especialmente o BNDES), dos fundos
de pensões paraestatais e das empresas públicas, com especial
ênfase para a Petros (Petrobras) e o Previ (Banco do Brasil), no sentido
de coordenar, financiar, articular e reunir condições para a
formação de grandes conglomerados nacionais, com o objetivo de
influir num novo patamar de inserção do Brasil nas
relações econômicas internacionais;
2) A reorganização societária dos grandes grupos,
mediante concentração e centralização de
capitais, expressos em um acelerado processo de fusões e
aquisições, criando as chamadas empresas "campeãs
nacionais", com capacidade de acumular sinergias e economias de escala, de
forma a que esses grandes grupos unificados pudessem enfrentar em melhores
condições a concorrência das empresas maduras do capital
internacional.
3) Estímulo à internacionalização dos grandes
grupos unificados do país, tanto do setor público quanto privado,
visando a ocupar espaços em aberto em áreas da periferia nas
quais o Brasil exerce influência econômica e política;
4) Esses vetores estratégicos foram coadjuvados por uma política
externa com certo grau de autonomia relativa que buscou, de um lado, realizar
um conjunto de iniciativas com certo grau de autonomia (apoio a Chávez
na Venezuela, busca de acordo sobre a crise Irã-EUA,
criação da Unasul, do G-20, entre outros), mas que não
entraram em choque aberto com os interesses dos países centrais,
especialmente os Estados Unidos.
Os números da monopolização e
internacionalização da economia brasileira
53. O faturamento bruto dos 100 maiores grupos econômicos que atuam no
Brasil correspondeu, em 2009, a cerca de 60% do Produto Interno Bruto (PIB).
Levando-se em conta o universo de seis milhões de empresas formais no
Brasil, pode-se dizer que a economia brasileira é altamente concentrada.
Analisando apenas os 20 maiores grupos, a monopolização da
economia brasileira fica mais evidente: apenas duas dúzias destes
grandes conglomerados econômicos obtiveram, em 2009, um faturamento que
correspondeu a cerca de 37% do PIB brasileiro do período, o que torna
ainda mais impressionante o grau de monopolização da economia
brasileira.
54. Se estendermos a mesma investigação para os 10 maiores
grupos, chegaremos a uma constatação ainda mais surpreendente:
esses conglomerados registraram um faturamento em 2009 de 26% do PIB, mais de
um quarto de todo o resultado da atividade econômica do Brasil em 2009.
Avaliando um universo ainda mais reduzido, a constatação é
chocante: os cinco maiores grupos econômicos que atuam no Brasil
registraram um faturamento de 19% do PIB. Ou seja, a Petrobrás,
Itaúsa, Bradesco, Banco do Brasil e JBS Friboi registraram um
faturamento anual em 2009 que corresponde a cerca de um quinto do PIB
brasileiro no mesmo período.
55. Trata-se, portanto, de um capitalismo completo, desenvolvido, integrado e
com elevado grau de monopolização em praticamente todos os
setores da economia. Um sistema com capacidade de suprir de bens e
serviços todas as necessidades do mercado, com uma infraestrutura e uma
logística à altura da acumulação do capital.
Além disso, o capitalismo brasileiro possui uma agricultura
desenvolvida, com elevado grau de produção utilizando intensa
tecnologia e grande parte dela voltada para a exportação de
commodities.
O trabalho assalariado é hegemônico no campo e a pequena
propriedade familiar e as economias de subsistência estão
integradas no circuito do grande capital monopolista no campo.
56. O capitalismo monopolista brasileiro vem também avançando
crescentemente no exterior. Levantamento realizado por
publicações especializadas indicam que pelo menos 50 grandes
empresas brasileiras podem ser consideradas como multinacionais, ou seja,
têm parcelas expressivas de seus negócios no exterior. Esse
movimento do capitalismo brasileiro foi realizado de maneira bastante
acelerado. Até 1982 os investimentos brasileiros no exterior eram de
pequeno porte: o estoque de capitais no exterior correspondia a apenas U$ 900
milhões. Atualmente esse estoque é de U$ 170,4 mil milhões
(Tabela).
57. As 10 maiores empresas multinacionais brasileiras apresentam um conjunto de
características típicas de um capitalismo monopolista
desenvolvido. Parcelas expressivas de seus ativos e receitas são
oriundas do exterior, bem como parte substantivas dos seus empregados trabalham
no exterior. Três dessas empresas, a Odebrecht, JBS Friboi e Coteminas,
têm respectivamente 70,9%, 85% e 90,3% de suas receitas obtidas no
estrangeiro. (Tabela).
58. Outro dado relevante para compreendermos a atuação do
capitalismo brasileiro no exterior é o fato de as multinacionais
brasileiras estarem presentes em praticamente todos os continentes. Vejamos a
performance dos cinco maiores grupos: a Vale está presente em 33
países; a Petrobrás em 25; a WEG em 22; a Camargo Corrêa em
17 e a Ordebrecht em 16, ressaltando-se que a presença
majoritária desses grupos se dá na América Latina, com um
índice de regionalização de 46,2, seguido da Europa com
20,6% e da América do Norte com 17,3% (Tabela).
Para onde vai o capitalismo brasileiro?
59. Assim, a evolução do quadro recente da economia brasileira
confirma a consolidação de um novo modo de
acumulação do capitalismo brasileiro, centrado na
internacionalização da economia, no crescimento dos segmentos
agro e mineroexportadores, do setor financeiro e das grandes indústrias,
de capital internacionalizado. Este padrão é sustentado pela
elevada taxa de exploração da força de trabalho hoje
vigente refletida nos baixos salários e na
precarização das relações de trabalho e na
dependência da entrada de capitais externos para o seu equilíbrio.
60. A manutenção, por quase uma década, de taxas moderadas
de expansão do mercado interno demonstra existência de um
componente de autossustentação do processo de crescimento
econômico, capaz de expandir o mercado interno e promover uma pequena
elevação da parcela de renda destinada para as camadas de renda
média baixa. No entanto, há que se reafirmar que esta
tímida melhoria na distribuição da renda não tem
sido acompanhada de qualquer alteração significativa no que diz
respeito ao acesso aos direitos sociais básicos ou a melhores
condições de habitação, transporte público e
a outros componentes do bem-estar social.
61. O quadro atual da economia demonstra que a classe dominante brasileira tem
sabido tirar proveito da crise mundial do capitalismo contemporâneo,
cujos efeitos mais explosivos incidiram diretamente, até agora, sobre
setores da economia estadunidense e de países europeus menos
desenvolvidos, como Portugal, Espanha, Grécia, Itália e Irlanda.
O Brasil tem aproveitado os espaços deixados em aberto pelas economias
em crise, principalmente no que concerne à expansão dos capitais
de empresas monopolistas brasileiras plenamente integradas ao capitalismo
internacional em áreas periféricas, como a própria
América Latina e a África.
62. A crescente integração com a economia internacional
também abre espaço para a produção interna e para
ganhos financeiros importantes. O campo de crescimento do capitalismo
brasileiro pode ser confirmado na existência de segmentos sociais
não atendidos pela oferta de bens de consumo duráveis e
não duráveis, de áreas geográficas inexploradas
pelo capital, além de um grande "estoque" de possibilidades de
investimento que correspondem às limitações e
incompletudes no desenvolvimento do país. Nas áreas sociais,
exemplos são a insuficiência de emprego qualificado, a
precariedade da moradia e das condições de vida na cidade, os
serviços urbanos, a saúde, a cultura, a pequena dimensão e
o caráter excludente dos sistemas sociais públicos, como os de
seguridade social saúde, previdência, assistência
social , o caráter limitado do sistema educacional e muitos outros.
63. Assim, podemos apontar que há, efetivamente, um componente interno
de crescimento autossustentado, suportado pelo crescimento populacional, pela
atividade de exploração e produção de
petróleo e pela expansão das cadeias produtivas internas dos
setores exportadores, entre outros segmentos, que demandam máquinas e
equipamentos, pela resposta dada pelo sistema produtivo às demandas de
bens de consumo duráveis e não duráveis (que, por sua vez,
gera empregos e renda), pelo surgimento de novas regiões a serem
exploradas como os antigos territórios (Acre, Amapá,
Rondônia e Rodônia), áreas do Nordeste e do Centroeste. Os
efeitos da aposentadoria dos trabalhadores rurais, dos programas sociais como o
Bolsa-família e dos aumentos reais do salário mínimo
oferecidos nos últimos anos vêm produzindo certa expansão
da renda nas camadas menos favorecidas, gerando novos contingentes de consumo
de primeira necessidade.
64. Conjunturalmente, a economia brasileira tem recebido aportes de capital
externo, seja na forma financeira ou de investimento produtivo direto, e, para
enfrentar a crise internacional, o governo vem recorrendo a políticas de
crédito e renúncias fiscais, que estimulam o consumo. No entanto,
a maior parte das ações do Estado vem se dando na
adaptação às demandas do mercado, tendo havido poucas
iniciativas de planejamento econômico. O mesmo se pode dizer das
políticas sociais, que vêm se restringindo àquelas de
caráter emergencial ou "compensatório", focalizado e
fragmentário.
65. Para dar suporte a esta expansão e à reprodução
do capital, em geral, o capitalismo brasileiro necessita, em certa medida, de
mais trabalhadores qualificados, mais técnicos de nível
médio e profissionais de nível superior em muitas áreas.
Necessita de infraestrutura estradas, portos, geração e
distribuição de energia, de energia, comunicações e
dispõe de grupos econômicos interessados nestas obras e
também em áreas como saneamento, habitação,
infraestrutura urbana. Como elemento ordenador, o sistema precisa de uma
estrutura política estável e de bases fortes de
sustentação financeira. Mas em que medida estas necessidades
serão atendidas e em que medida este atendimento corresponderá
à realização, pela burguesia, hoje no poder, das tarefas
voltadas à modernização e ao aprofundamento das
relações capitalistas no Brasil?
66. No que diz respeito à formação de trabalhadores,
é possível que prevaleça a tendência de
universalização do ensino fundamental e que aconteça uma
expansão significativa dos sistemas de ensino médio e superior,
pois já é notória a falta de trabalhadores qualificados no
país. O ensino público deverá receber mais investimentos e
deverá crescer mais. No entanto, é pouco provável que esta
expansão seja acompanhada de uma valorização dos
profissionais da Educação ou na elevação da
qualidade geral do sistema, com a manutenção da clara assimetria,
hoje existente, entre as escolas da "elite" (públicas e
privadas) e as instituições voltadas para a maioria da
população.
67. Como o campo brasileiro está plenamente integrado ao capitalismo,
com o amplo predomínio do trabalho assalariado, ainda que
permaneçam resistentes setores do campesinato reatualizados na forma de
uma nova produção camponesa contemporânea, isto é,
integrada e associada ao mercado e à produção industrial,
não parece provável que qualquer processo significativo de
reforma agrária seja empreendido, por iniciativa da burguesia.
68. Deverá seguir expandindo o atual padrão de consumo, com a
extensão das camadas médias e a entrada de novos contingentes de
consumidores no mercado. Não haverá, no entanto, nenhuma
alteração significativa do perfil da distribuição
da renda, no que depender das iniciativas da burguesia. Neste cenário
uma redução na pobreza absoluta pode significar, inclusive, um
aumento na pobreza relativa, ou seja, a diferença entre a parte da
riqueza nacional destinada ao fundo de consumo da força de trabalho e
aquela acumulada privadamente como capital, como, aliás, já
aconteceu nos anos 50 e no ciclo ditatorial.
69. Nos setores de infraestutura em geral e, em particular, nos segmentos
ligados à construção civil, é provável que o
interesse das grandes empresas construtoras se traduza em investimentos em
saneamento, provimento de água encanada e mesmo em programas
habitacionais mais abrangentes; nos transportes, pouco ou nada deverá se
alterar quanto ao predomínio do modo rodoviário.
70. No plano democrático, ainda que possam surgir avanços como
nos direitos civis, na estrutura da Justiça ou na transparência da
gestão do Estado, o interesse burguês se concentra na
restrição à organização e à
ação partidária, principalmente da esquerda, apontando
para a "americanização" do processo eleitoral e da vida
política. No plano dos direitos trabalhistas e previdenciários,
nada aponta, a manter-se o padrão atual de desenvolvimento, para uma
retomada dos direitos retirados ou apara a oferta de novas garantias aos
trabalhadores.
71. Nas demais áreas sociais, como na saúde e cultura, tende a
prevalecer o modelo privado, reservando-se as redes públicas para o
atendimento dos mais carentes em sistemas precários, além de se
intensificarem as práticas privatistas, diretas e indiretas,
através da ação das organizações sociais e
fundações públicas de direito privado como forma de
atendimento. No plano das políticas urbanas, é pouco
provável que haja mudanças nos padrões atuais, com
exceção das áreas de segurança, no que diz respeito
ao controle dos territórios.
72. A exceção, nas áreas sociais, deverá ser a
educação, cuja expansão é necessária para a
sustentação do processo de crescimento e
modernização capitalista. No entanto, não se pode esperar
que este crescimento aponte para a estatização e a
universalização do acesso a todos os níveis, tampouco para
o provimento de alta qualidade a todo o sistema. A saúde, a
previdência, a cultura e outras áreas não deverão
tornar-se públicas / estatais ou receber maior atenção ou
prioridade por parte da burguesia, devendo manter-se, assim seu caráter
excludente.
73. É importante frisar que o crescimento econômico, mesmo
limitado, pode trazer algumas melhorias na qualidade de vida da
população, pelo acesso à renda e ao consumo, além
de promover o apoio ao governo e a reprodução da hegemonia
capitalista. No entanto, no que diz respeito às possíveis
iniciativas da burguesia para o provimento de melhores condições
de vida para os trabalhadores, é muito provável que estas se
restrinjam a alguns programas de habitação, á
expansão das redes de água e de saneamento, e a grandes obras
viárias.
74. Há que se ressaltar, também, que a maior parte das conquistas
e melhorias obtidas pela classe trabalhadora, em todos os contextos, no
capitalismo, se deu pela luta, pela ação organizada dos
sindicatos, dos grandes movimentos de massa. Na atual conjuntura, entretanto,
há pouco espaço para o crescimento das demandas sociais
organizadas, para a retomada dos direitos dos trabalhadores e para o
avanço da democracia no sentido da participação direta de
todos no processo decisório. Pelo contrário, estamos numa fase de
mais ataques aos direitos trabalhistas, previdenciários e sociais em
geral, à democracia participativa e ao direito de
organização. O Brasil não é uma ilha imune à
crise sistêmica do capitalismo. Assim, entendemos que devemos promover e
organizar as lutas do proletariado e dos trabalhadores em geral, apontando para
a inequívoca necessidade de superar os limites do capitalismo e
ultrapassá-lo, construindo, revolucionariamente, o Socialismo.
III - Hegemonia e contra-hegemonia
A Hegemonia Burguesa
75. As transformações ocorridas no capitalismo
contemporâneo exigem de nós uma análise acurada sobre o
fenômeno, com o propósito de, em primeiro lugar, compreender os
mecanismos de reprodução e expansão do capitalismo no
mundo e, em particular, no Brasil, associados à construção
e manutenção da hegemonia burguesa; em segundo lugar, projetar a
ação revolucionária do PCB, para o que será
necessária a organização da contra-hegemonia
proletária.
76. Sob a égide do capital financeiro, intensifica-se a
ocupação capitalista do planeta, introduzindo novas formas de
exploração do proletariado e de dominação de
classe. Ao contrário do que pensam certos analistas de esquerda, a
financeirização do capital não representa o seu
descolamento da cadeia produtiva e a dedicação apenas a
atividades especulativas, como se fosse possível reproduzir mais
dinheiro do próprio dinheiro. O capital, como já havia explicado
Marx, é uma relação de exploração. De fato,
a expansão do capital monetário contemporâneo corresponde a
um processo agudo de expropriação dos trabalhadores em todo o
mundo.
77. A expropriação fundamental corresponde à
contínua produção social de trabalhadores
disponíveis para o capital. Cada vez mais, os imperativos do mercado
forçam a que os trabalhadores não encontrem alternativa para se
manterem vivos a não ser vendendo a sua força de trabalho.
Portanto, a ação do capital será sempre no sentido de
formar novos e amplos contingentes de trabalhadores "livres", ou
seja, liberados da capacidade de sobreviverem fora da venda da força de
trabalho ou recorrendo a ela apenas de forma eventual.
78. A expropriação original a que Marx se referiu como
"a chamada acumulação primitiva", quando analisou o
processo de formação do capitalismo agrário na Inglaterra
permanece incidindo sobre enormes massas camponesas em todo
mundo. Essa expropriação prossegue ativa e pressiona enormes
massas camponesas na América Latina, África, Índia e
China, que se sustentam reproduzindo formas de trabalho as mais variadas,
dedicadas à produção agrícola de
subsistência. Certo é que prevalece, no capitalismo
contemporâneo, a tendência à destruição de
tais formas de economia familiar ou doméstica pela grande propriedade
voltada ao agronegócio. Mas o campesinato e os trabalhadores rurais
constituem, ainda hoje, grande parcela da população mundial a ser
"liberada" para o trabalho assalariado.
79. Mas o fenômeno mais característico do capitalismo
contemporâneo é a incidência de novas formas de
expropriação no interior das populações cuja
expropriação original já foi concluída, isto
é, nos países e regiões onde o capitalismo já se
desenvolveu plenamente, como é o caso dos países centrais e mesmo
de nações em que as relações capitalistas
consolidaram-se tardiamente, a exemplo do Brasil. Nestes espaços,
amplas massas de trabalhadores são compulsoriamente reduzidas à
condição de plena disponibilidade "liberdade"
para o mercado de força de trabalho, como consequência da
destruição sistemática de todos os anteparos que puderam
(ou possam) atuar como redutores dessa disponibilidade.
80. Como resultado da generalização das práticas
neoliberais implementadas, com maior virulência, a partir dos anos 1990,
várias formas de intensificar a extração do valor passaram
a ser utilizadas pelo capital. Uma das formas que mais incidiram e incidem
diretamente sobre a capacidade de organização e de
resistência do proletariado à exploração é a
que promove a fragmentação do espaço produtivo e a
separação dos trabalhadores em inúmeras unidades fabris.
Trata-se da expropriação da resistência operária por
proximidade no local de trabalho, decorrente da introdução de
novas tecnologias produtivas (telemática, informática,
robótica, entre outras) e de outros mecanismos que permitem aprofundar a
cooperação entre os trabalhadores dispensando sua reunião
física.
81. Outras formas de expropriação estão ligadas à
retirada dos anteparos legais que, como resultado histórico da luta de
classes, funcionam como garantia social para impedir a ilimitada
exploração da força de trabalho. A
expropriação e a precarização contratuais consistem
na eliminação, em escala internacional, dos direitos ligados ao
contrato de trabalho. Com ela são introduzidos diferentes formatos
jurídicos criados para disciplinar a relação de trabalho
em favor de sua plena utilização pelo capital:
subcontratações, terceirizações,
formação de "cooperativas", trabalho
"informal" ou até mesmo sobre a pura e simples ausência
de contrato formal. Há também o chamado trabalho
"voluntário", cuja remuneração decorre de formas
precárias, também sem direitos, como "bolsas" ou
"projetos" ou, ainda, o trabalhador "pessoa
jurídica", que, mobilizado pela falácia do
"empreendedorismo", se converte individualmente numa empresa
fictícia para vender sua força de trabalho, sem os direitos
associados legalmente à contratação tradicional.
82. Tais exemplos de "reestruturação produtiva" e de
"desregulamentação do mercado de trabalho", com vistas
à plena "empregabilidade" ou "trabalhabilidade"
(para usar termos recorrentes no jargão burguês
pós-moderno) do sujeito obrigado a vender sua força de trabalho
para sobreviver, nada mais são do que formas atualizadas de
dominação, com o duplo sentido de disponibilizar grandes
contingentes de pessoas para o trabalho assalariado e de fazer valer a
hegemonia do capital, por meio de um processo alienante de difusão da
ideologia burguesa. Isto porque tais mecanismos de expropriação
do trabalho vêm acompanhados de intensa campanha ideológica
voltada a convencer a todos de que se trata da conquista da liberdade
individual perante a opressão do trabalho (não do
proprietário dos meios de produção). Propala-se a
conquista da iniciativa individual e da possibilidade de que cada um possa ser
"patrão de si mesmo".
83. O novo consenso burguês traveste a feroz concorrência entre os
trabalhadores de uma subjetividade "pós-moderna": deve-se
desvencilhar das identidades coletivas, entendidas como "opressivas"
e "ultrapassadas", tais como "classe operária",
sindicato, partido político, buscando alcançar a mais pura
"mobilidade" e "liberdade". A ideologia dominante investe
na ótica meramente individualista, ao depreciar a luta pelos direitos
coletivos, associada às "burocracias" sindicais, à
legislação e ao conjunto de normas controladas pelo Estado,
direitos duramente conquistados que passam a ser vistos como obstáculos
à plena afirmação do indivíduo.
84. A hegemonia do capital se constrói a partir mesmo das
relações de produção e busca envolver a totalidade
social. Ao mercantilizar tudo e todos à sua volta, o capital expande
seus domínios para o conjunto das relações sociais: as
expropriações avançam sobre diversas formas de
solidariedade comunitária e cultural, sobre conquistas sociais tais como
a saúde e a educação públicas (direitos sociais que
se transformam, cada vez mais, em produtos e serviços disponíveis
no mercado, como quaisquer mercadorias), sobre os movimentos sociais, que
sofrem renovados processos de criminalização, sobre os direitos
políticos, com a redução das conquistas
democráticas ao mero jogo eleitoral.
A hegemonia burguesa no Brasil
85. Como afirmamos nas Resoluções do XIV Congresso (outubro de
2009),
"sob todos os aspectos, o ciclo burguês consolidou-se plenamente no
Brasil. A economia capitalista desenvolveu-se até o estágio
monopolista, tendo se constituído uma sociedade civil-burguesa e um
Estado de Direito"
(Livro das Resoluções, página 44, § 45). O
período da ditadura empresarial-militar imposta pelo golpe de 1964
marcou a consolidação do bloco dominante, formado pela
aliança de classes entre a burguesia monopolista, o latifúndio
tradicional e o imperialismo, bloco este responsável pelo aprofundamento
do processo de construção do Estado burguês no Brasil.
86. O auge deste processo ocorreu com a abertura política nos anos 1980
e com a incorporação das amplas massas urbanas ao ordenamento
jurídico-político burguês, de que são
expressões significativas a afirmação de um conjunto de
regras democráticas e, em especial, a ampliação do direito
ao voto, sacramentadas na Constituição de 1988. Formou-se,
portanto, uma sociedade civil-burguesa com um conjunto de normas e
instituições próprias de um regime formalmente
democrático. A consolidação da hegemonia liberal burguesa
completou-se com o estabelecimento de um poderoso monopólio capitalista
nos meios de comunicação de massa e na organização
e difusão da cultura, aprimorando e fortalecendo a
dominação ideológica a serviço do capital.
87. Este processo não se deu sem conflitos. Nos estertores da ditadura
empresarial-militar, travou-se uma luta entre os grupos burgueses dominantes e
o bloco de forças políticas e sociais formado pelos trabalhadores
e setores das camadas médias, capitaneados à época pelo PT
e outros setores de esquerda, à frente das entidades de massas e dos
movimentos reivindicatórios que se destacaram na resistência ao
regime ditatorial e nas lutas democráticas do período anterior.
Mas o resultado final deste embate, em meio a um contexto internacional de
crise do movimento socialista e de ofensiva neoliberal, foi o amoldamento das
instituições forjadas na luta democrática à ordem
liberal burguesa.
88. A progressiva inflexão das principais organizações de
esquerda do período (à frente o PT e a CUT) a uma postura de
abandono das propostas socialistas e de limitação da luta dos
trabalhadores aos marcos impostos pela ordem dominante, num claro processo de
transformismo, representou, na esfera política, a sanção
ao movimento de consolidação da hegemonia burguesa, culminando,
na década de 1990, com a franca afirmação de uma
democracia reduzida às estratégias ditadas pelo capital. Esta
situação se explica em parte pela cooptação das
direções sindicais e partidárias, pela
burocratização e acomodação das
organizações representativas dos trabalhadores e da juventude
(vide UNE) e, por outra, pela tendência a considerar a
participação em espaços institucionais e no interior do
Estado burguês (em cargos nas esferas de governo e do parlamento) um fim
em si mesmo.
89. O processo de institucionalização da democracia burguesa
transformou, ao longo dos últimos trinta anos, a legitimidade
conquistada através das lutas democráticas e sociais contra a
ditadura em formas de apassivamento das massas trabalhadoras às regras
de um jogo eleitoral calcado nos velhos vícios fisiológicos, na
corrupção, na manipulação ideológica, no
mercado de votos e no
marketing
elaborado por grandes empresas de publicidade, que passam a vender candidatos
como produtos ligados à competência administrativa e à
capacidade de melhor gerenciar a crise produzida pelo capital. Para além
dos períodos dedicados às campanhas eleitorais, a
participação política restringe-se ao modelo de cidadania
incapaz de abalar as estruturas do sistema, pois dedicado à
administração de problemas de maneira não conflituosa, por
meio de mecanismos institucionais, iniciativas legislativas e
ações judiciais.
90. O apassivamento das lutas sociais ocorre com o amplo espaço dado
às chamadas organizações não governamentais (ONGs),
que visa a estimular um ativismo cidadão, desprovido de qualquer
horizonte de transformação consequente da realidade existente.
Transformam-se em verdadeiros aparelhos privados de hegemonia, a serviço
da ordem dominante. De acordo com a visão de mundo liberal, a
"sociedade civil" ou "terceiro setor", onde se concentram
as chamadas ONGs, seria o espaço reservado às atividades sociais,
para promoção da participação comunitária e
cidadã. Faria o contraponto ao Estado (lugar, por excelência, da
política) e ao mercado (espaço reservado às
relações econômicas).
91. A esse terceiro setor caberia implementar as "políticas
públicas", já que tanto o Estado (pesado,
burocrático, ineficiente), quanto o mercado (sem qualquer tipo de
regulação) falharam na resolução dos problemas
vivenciados pela população em seu dia-a-dia. Aí devem
atuar instituições filantrópicas, fundações
empresariais e associações comunitárias, organismos
voltados a praticar o altruísmo e a solidariedade em nome do
"interesse público", da eficácia das
ações e da modernidade. O termo "sociedade civil"
é apropriado ideologicamente, passando a designar um espaço
harmonioso, distante das disputas políticas e ideológicas
(próprias das lutas pela conquista do poder e do aparelho de Estado) e
dos interesses particulares (afeitos à concorrência
econômica no mercado).
92. Essa nova estratégia de dominação, seguindo as
diretrizes do FMI e do Banco Mundial, aliada a todo o processo de
internacionalização da economia, das privatizações,
de precarização das condições de trabalho e de
retirada de direitos sociais nos anos 1990, foi implantada a partir de uma
violenta propaganda ideológica voltada a desqualificar a atividade
política, os políticos em geral e o sindicalismo autônomo
dos trabalhadores, movimentos e práticas identificados com a defesa de
interesses meramente corporativos e particulares. Passam então a
proliferar os "novos movimentos sociais", articulados não mais
às reivindicações envolvendo as relações de
trabalho, muito menos às lutas políticas atadas a projetos
globais de transformação da sociedade.
93. Os dois governos de Fernando Henrique Cardoso deram início à
viabilização de programas com o objetivo de desenvolver
estratégias governamentais de coesão social e de
educação para uma nova cidadania "ativa e
responsável", baseada na prestação de
"serviços sociais" por indivíduos e entidades
associativas (as ONGs). O Programa Comunidade Solidária, criado com o
intuito de promover o combate a "situações agudas ou
extremas de pobreza", cumpriu importante papel de difusor das ideias e
práticas neoliberais e de "fortalecimento da sociedade civil",
no sentido do estímulo ao associativismo prestador de serviços de
"interesse público", em oposição à
militância política e social dos anos 1980, reivindicativa de
direitos e de contestação à ordem.
94. A ascensão do PT ao poder e os governos de Lula não
modificaram o quadro. Pelo contrário, só fizeram avançar a
proposta de realização de um "pacto nacional", ou seja,
de submissão consentida do conjunto da sociedade à hegemonia
burguesa, por meio de programas como o Fome Zero e outros, que deveriam
mobilizar ONGs, empresas, instituições religiosas, sindicatos e
escolas num mutirão de combate à fome, instituindo a parceria da
"sociedade civil organizada" com o Estado. O apelo ao tratamento
compensatório à fome e à miséria de parte da
população integrava a estratégia de
construção do consenso em torno do projeto de
transformação do Brasil em um país de capitalismo
avançado com "face humana". Deste projeto, passaram a
participar grandes grupos empresariais, o monopólio das
telecomunicações, bancos e inúmeras
fundações, que, que, por meio de programas como o
Ação Global, Telecurso 2000, Canal Futura, etc, da
produção de cartilhas e de projetos pedagógicos nas
escolas, contribuem para difundir a "nova pedagogia da hegemonia".
95. Todo o discurso produzido no sentido da difusão de uma nova
"cultura cívica" e de uma "cidadania
responsável" não passa de uma grande cortina de
fumaça para encobrir, de um lado, o processo avançado de
privatização dos serviços públicos e de
transferência da responsabilidade do Estado para a esfera privada
(através de contratos com Organizações Sociais OSs,
por exemplo), acompanhado da retirada dos direitos sociais. De outro,
percebe-se a tentativa de evitar o acirramento da luta de classes, criando
espaços institucionais de participação dos
indivíduos e entidades associativas para o encaminhamento de
reivindicações e a resolução de problemas de forma
pragmática, na lógica da colaboração e sem resvalar
para o campo da contestação ao
status quo.
Estimula-se ainda que os movimentos sociais articulem-se em torno de lutas
fragmentadas, isoladas, ligadas ao atendimento a demandas específicas,
como as de gênero, etnia, opção sexual, culturais, etc.,
desvinculadas das lutas gerais contra a exploração capitalista.
Estas bandeiras têm sua importância, inclusive para os comunistas,
que devem atuar nelas combatendo o corporativismo e buscando
contextualizá-las na luta contra o capital.
96. O "novo consenso pragmático", expressão utilizada
pelo Banco Mundial para designar as renovadas estratégias de
conformação social em países como o Brasil, com a
difusão de um "novo individualismo" e o estímulo a
formas despolitizadas de associativismo, predomina hoje nas ações
desenvolvidas por entidades e organizações de caráter
comunitário. Conforme texto publicado pelo Banco Mundial:
"as ONGs vêm vivenciando transformações profundas em
seus paradigmas conceituais e estruturas organizativas, transformando-se em
entidades mais propositivas, especializadas e voltadas para a
obtenção de resultados".
97. O sindicalismo oficial cutista também foi e continua sendo
profundamente influenciado por esta lógica
"pragmática", voltada essencialmente à
obtenção de resultados através não mais de
ações contestatórias de massa, greves ou protestos
abertos, mas pelo caminho da negociação e dos acordos de
cúpula. É o velho peleguismo revestido de uma roupagem
pós-moderna, sob a forma de "sindicalismo cidadão".
Esses dirigentes sindicais passaram mesmo a se comportar como sócios
minoritários do capital, difundindo e defendendo teses como a PLR e o
banco de horas, assim como disputando verbas públicas para cursos de
"requalificação" do trabalhador. De igual modo, os
fundos de pensão, comandados pela alta direção dos
conciliadores de classe, participam ativamente do processo de convencimento
ideológico, incutindo a ideia de que é possível "se
dar bem" jogando o jogo do capital. O consenso burguês é
reforçado ainda pelas máquinas patronais assistencialistas
gestadas pelo sistema "S" (SESC/SENAC, SESI/SENAI, SEST/SESNAT).
98. A burguesia também organiza seu poder combinando instrumentos de
participação política pelos quais busca,
essencialmente, exercer o consenso com a coerção, fazendo
uso da violência aberta, sempre que necessário para evitar que
seus interesses sejam contestados. A criminalização dos
movimentos sociais é o primeiro passo para, por intermédio de uma
campanha insidiosa de desmoralização dos lutadores sociais
através do aparato midiático, justificar em seguida a
ação repressora do Estado.
99. A burguesia articula, portanto, coerção e consenso para
garantir o exercício da dominação capitalista. O Estado
burguês contemporâneo não se apresenta apenas como um
aparato político-militar pelo qual a classe dominante organiza a
coerção sobre o conjunto dos indivíduos, mas como um
instrumento ampliado da dominação de classe que, além de
dispor do monopólio da repressão e da violência, é
capaz de fazer valer os interesses da classe dominante através do
convencimento, da manipulação, da cooptação, da
persuasão, da conquista do consentimento por parte dos dominados, para o
que muito contribuem organismos não estatais, como as escolas, as
igrejas, os sindicatos, os meios de comunicação de massa, etc
na elaboração e difusão da ideologia burguesa.
100. No entanto, tais aparelhos privados ou paraestatais não podem ser
identificados apenas como reprodutores do discurso dominante, pois em seu seio
dá-se, mesmo que em escala reduzida, a mesma luta ideológica que
se trava no conjunto da sociedade, podendo, portanto, haver tanto a
difusão da ideologia dos "de cima" quanto a
circulação de idéias e projetos que apostem em uma
alternativa para os "de baixo".
A construção da contra-hegemonia proletária
101. A superação revolucionária do capitalismo, no sentido
da construção da sociedade socialista no rumo do comunismo
dependerá de uma ação permanente dos comunistas e
revolucionários para intensificar a luta política e
ideológica na sociedade atual e fazer avançar o projeto
contra-hegemônico do proletariado. Este projeto será
construído no calor da luta de classes, em meio aos embates sociais e ao
processo de conscientização das massas populares em torno de uma
nova visão de mundo que se contraponha ao consenso conservador
burguês.
102. No entanto, a luta pela hegemonia jamais será vitoriosa se encarada
apenas como uma batalha no campo das ideias, ou ainda se redundar numa
operação restrita ao campo institucional e à luta
política no parlamento burguês, onde é extremamente
limitada a ação do operariado e dos trabalhadores em geral. A
luta de classes tende a ser amortecida pelas discussões em torno de
negociações, que, no máximo, são capazes de obter
alguns ganhos pontuais e reformas em favor dos trabalhadores, cada vez mais
difíceis e improváveis em razão da crise sistêmica
do capitalismo que, longe de admitir conquistas novas, atua para retirar as
antigas.
103. Não descartamos os campos institucional e eleitoral como
espaços a serem também ocupados pelos comunistas na luta de
classes, mas sabemos das suas limitações e precisamos determinar
com clareza como ocupá-los. Consideramos prioritária a
ação da militância comunista nos espaços onde seja
possível fazer avançar a organização dos
trabalhadores e da juventude na luta por seus interesses e necessidades,
contribuindo efetivamente para a formação e aprofundamento da
consciência de classe contra a dominação imposta pelo
capital. Para isto, é preciso estar colado com as massas, participando
ativamente dos embates diários da classe trabalhadora, seja por dentro
dos sindicatos, no interior das empresas e das escolas, nos bairros, por meio
dos movimentos sociais e comunitários, nas lutas políticas
gerais, etc.
104. No longo prazo, é preciso pensar a construção da
hegemonia proletária como a formação de um modo de
produção alternativo sob controle dos trabalhadores, o que
significa dizer que ela se assenta no mundo da produção,
não ficando restrita à sua dimensão política e
cultural. Daí a necessidade de se projetar o Bloco Histórico
alternativo ao bloco conservador burguês. Conforme apontam as
Resoluções de Estratégia e Tática do XIV Congresso
do PCB (parágrafos 63 e 64):
"o conceito de Bloco Histórico nos remete à
compreensão da sociedade como unidade orgânica entre a estrutura
econômica e a superestrutura, cimentada por uma determinada hegemonia, na
qual ocupam papel fundamental os intelectuais, artistas e organizadores da
cultura. (...) Os trabalhadores, em sua luta contra a ordem do capital,
devem apresentar-se como classe capaz de contrapor à atual sociedade,
desde formas de produção social da vida anticapitalistas, base
para novas relações sociais de produção, até
formas políticas que correspondam à profunda
socialização da produção e da vida social."
105. Contra o bloco histórico capitalista, devemos lutar pela
construção do
Bloco Revolucionário do Proletariado,
ou seja:
"o conjunto de ações e transformações
econômicas, políticas, jurídicas e formas de
consciência que apontem para a superação do
capitalismo"
e para a construção da sociedade socialista no rumo do
comunismo. Isto exige a formação de um bloco de classes e setores
sociais e suas representações político-organizativas, que,
nas lutas concretas específicas ou gerais contra a ordem
do capital, vá se constituindo como um poderoso instrumento de luta e de
organização dos trabalhadores, com uma ação que
extrapole o campo dos interesses econômicos para se apresentar como o
contraponto unitário de forças político-ideológicas
à hegemonia burguesa. A construção do bloco
contra-hegemônico, portanto, pressupõe a articulação
das dimensões econômicas e políticas na
conformação da proposta emancipadora, capacitando o proletariado
ao exercício do poder político e da direção
cultural de toda a sociedade.
106. Este será o momento mesmo da hegemonia, conceito que expressa a
capacidade de uma classe social unificar em torno de seu programa
político e seu projeto de sociedade um bloco de forças não
homogêneas, marcado por contradições no interior da classe.
O grupo ou classe que lidera este bloco é hegemônico porque
consegue ir além de seus interesses corporativos imediatos, para manter
articuladas forças contraditórias (expressões
políticas e sociais das diferentes frações de classe),
numa ação essencialmente política, que impeça a
irrupção dos contrastes existentes entre elas. Logo, a hegemonia
é algo que se conquista, fundamentalmente, por meio da
direção política e do consenso. Para além da
unidade em torno de objetivos econômicos e políticos, busca-se
construir a unidade ideológica, para se atingir a efetiva
direção do grupo social fundamental sobre grupos afins
subordinados.
107. O PCB precisa aprofundar a sua organização interna e dar um
enorme salto qualitativo no seu trabalho de inserção no interior
dos movimentos dos trabalhadores e da juventude, para poder assumir como
perspectiva futura um importante protagonismo na direção do bloco
contra-hegemônico. Não se trata de fazermos a
autoproclamação do Partido como organização
revolucionária da classe, mas de nos apresentarmos como uma vanguarda
que, no interior de um bloco amplo de forças políticas e sociais,
seja capaz de jogar todas as energias na direção da
construção do projeto revolucionário e na
contraposição às saídas reformistas, "nacional
desenvolvimentistas", "democrático-populares" ou outras,
que não levem às últimas consequências a ruptura com
a ordem capitalista. Todavia, tal objetivo somente será alcançado
se, na condição de parte integrante do proletariado e respaldado
pelas condições objetivas, soubermos agir no sentido de
conquistar o reconhecimento e o apoio das massas ao nosso Partido e ao projeto
revolucionário.
108. O Partido será capaz de participar da direção da
classe trabalhadora se penetrar nas organizações nas quais a
massa trabalhadora se agrupa, realizando nelas e através delas uma
sistemática mobilização de energias segundo um programa de
lutas anticapitalistas e anti-imperialistas. Lênin deixava claro
não existir uma única forma de luta capaz de conduzir à
vitória do socialismo, que pudesse ser copiada pelos movimentos
revolucionários em todo o mundo,
"na base de regras táticas de luta estereotipadas, mecanicamente
niveladas e idênticas".
Tampouco basta a ação isolada da vanguarda ou um trabalho
voltado apenas à agitação e à propaganda, pois
somente através da própria experiência política das
massas será possível desenvolver formas de abordagem da
revolução proletária, ou seja, formas de luta eficazes na
mobilização popular e no enfrentamento às classes
dominantes.
109. É necessário recorrer a Marx para explorar o pensamento
segundo o qual "
a teoria transforma-se em poder material logo que se apodera das massas
", isto é, uma idéia só se realiza plenamente se
é apoderada pelo movimento social concreto e se a transforma em
ação prática. Na luta hegemônica, o partido
revolucionário é o principal organismo social responsável
pela organização da consciência de classe pretendida, pois
configura-se como o núcleo ideológico em torno do qual se
aglomeram os sujeitos individuais (os trabalhadores) e coletivos (as
organizações populares) da transformação social a
ser conquistada. Neste processo, a vontade coletiva, dirigida pelo partido,
atua como a consciência prática da necessidade histórica,
galvanizando a vontade transformadora de amplos setores sociais.
110. O papel básico do partido proletário é contribuir
para a elevação da consciência de classe, superando os
marcos dos interesses puramente imediatos, economicistas, corporativos, para o
nível da visão global da realidade, forjando, por outro lado, uma
"
vontade coletiva"
capaz de hegemonizar um projeto político nacional de
construção da sociedade socialista no rumo do comunismo. O
trabalho de construção revolucionária somente será
efetivo se atuarmos no seio das massas, pois é desta
interação que os militantes partidários podem extrair a
fonte dos problemas a serem estudados e resolvidos, impedindo que o partido
descole-se da vida prática e caia em um intelectualismo estéril e
de gabinete.
111. Como diz Gramsci, trata-se de "
inovar e tornar 'crítica' uma atividade já existente
", produzindo-se uma nova concepção de mundo que, por estar
ligada à vida dos trabalhadores, tem maiores possibilidades de
difusão, tornando-se uma ideologia renovada por uma
concepção teórica que visa à ruptura radical com a
ordem dominante. Portanto, não nos interessa um Partido sem bases
ligadas efetivamente aos movimentos populares, que apenas se reúnam para
discussões no campo teórico e filosófico, ou apenas sobre
questões práticas ou corporativas, sem participar das lutas dos
trabalhadores e da juventude. Conforme afirmamos em nossas
resoluções de organização:
112.
"A Base não é um organismo voltado para si próprio.
Pelo contrário, tem a finalidade de ligar o Partido às massas, num
sentido de mão dupla. De um lado, devem participar da vida das massas,
procurando levá-las a conhecer, assimilar e por em prática a
linha política do Partido. De outro lado, devem recolher delas suas
experiências, reivindicações e tendências, para
capacitar o Partido a elaborar propostas políticas justas.
O grande desafio de uma Base é como levar a política do Partido
às massas em sua área de atuação. Se não
cumprir minimamente este papel, este conjunto de pessoas não é
uma Base do Partido: pode tratar-se apenas de um grupo de amigos, um clube de
debates ou uma organização que existe apenas para influir em
alguma outra instituição".
IV - As Mediações Táticas da Estratégia Socialista
113. A luta que o proletariado deve desenvolver contra a ordem burguesa se
dá num terreno histórico concreto e em um momento da luta de
classes historicamente determinado em nosso país. É deste terreno
concreto que brotam as determinações do desenho
estratégico e tático da revolução brasileira. Tanto
os princípios estratégicos mais gerais, como a
definição das linhas táticas principais e suas
ações operativas, devem responder às
determinações da realidade brasileira e da dinâmica da luta
de classes tal como se expressam em uma determinada conjuntura histórica
e numa certa correlação de forças entre as classes e
blocos de classes existentes.
114. Sinteticamente, podemos descrever os fundamentos da conjuntura e da
correlação de forças estabelecida através das
seguintes características:
1) O Brasil é um país capitalista completo e maduro integrado na
ordem do capitalismo imperialista, com uma burguesia monopolista e seus
diferentes segmentos assumindo o posto de uma poderosa classe econômica e
politicamente dominante.
2) Os problemas da dominação burguesa no Brasil se resolveram em
uma aliança de classes entre a burguesia monopolista e uma pequena
burguesa política que emerge de setores do proletariado e de suas lutas
e que transitou para uma política de centro fundada no pacto social para
um desenvolvimento econômico supostamente inclusivo, via políticas
sociais focalizadas, manutenção ou crescimento dos postos de
trabalho com precarização de direitos e incentivo ao consumo de
massas via programas assistenciais, crédito e acesso a fontes de renda
alternativas ou informais.
3) Esta aliança de classes se funda na aceitação da
economia capitalista de mercado como forma insuperável e a
aceitação das condições gerais para seu
funcionamento, inclusive no que diz respeito ao papel do Estado como gestor de
uma macroeconomia para o capital fundada na produção de
superávits primários, política fiscal e monetária,
controle da inflação, desoneração do capital,
subsídios à lucratividade do capital,
mercantilização e financeirização de
serviços, infraestrutura e logística para a
acumulação ampliada de capitais.
4) O vínculo da pequena burguesia política com as lutas
proletárias das décadas de 1980 e 1990 cerca de legitimidade as
ações governamentais fundadas na aliança com o grande
capital em seus diferentes setores, ações estas reforçadas
pelo intenso trabalho de cooptação e desarticulação
de organizações e lideranças da luta proletária e
popular, levando a um processo de apassivamento.
5) O conjunto destas características produz um cenário
conjuntural no qual forma-se um bloco conservador (no sentido da defesa,
garantia e reprodução das relações sociais de
produção capitalistas e da acumulação ampliada do
capital) não apenas dominante, mas hegemônico; ao mesmo tempo em
que a própria continuidade da forma capitalista produz tensões
que colocam os trabalhadores em conflito com a ordem, ainda que estes
não expressem tal descontentamento numa forma política mais clara
de contestação.
6) Esta característica implica em uma hegemonia necessariamente passiva,
isto é, o proletariado não respalda as ações do
governo ativamente e é obrigado mesmo, por vezes, a se mover na defesa
de seus interesses imediatos atacados pela perpetuação da ordem
do capital e suas exigências, situação agravada no momento
de crise.
7) O resultado direto deste cenário é um isolamento da esquerda
revolucionária, que expressa o momento de desarticulação
da própria classe através de uma profunda
fragmentação política. Entretanto, as
contradições do amoldamento momentâneo da classe em uma
ordem que se fundamenta na intensificação do trabalho, na
retirada de direitos, na precarização das condições
de trabalho, no vínculo do crescimento do consumo via endividamento, na
desmontagem das políticas públicas e sua
privatização direta ou indireta, geram, ao mesmo tempo, as bases
da necessária resistência e posterior ofensiva dos trabalhadores.
115. O conjunto destas características impõe o desenho geral de
nossos eixos táticos:
1) Estamos em um momento de defensiva da classe trabalhadora diante de uma
sólida hegemonia do bloco conservador, o que torna essencial a
ação política organizativa dos trabalhadores na luta por
seus interesses imediatos, ainda que estes, neste momento, não estejam
vendo a real vinculação destes problemas específicos com
as determinações mais gerais da ordem burguesa capitalista.
2) O isolamento e a fragmentação da esquerda
revolucionária não devem ser encarados como problemas de ordem
moral, de carência de formulação ou de falta de
entendimento político entre aqueles que hoje enfrentam a ordem burguesa
e aqueles que hoje a personificam. Tais problemas têm raízes
objetivas na própria fragmentação da classe trabalhadora,
o que nos impõe um esforço de aglutinação e unidade
no máximo que for possível e através da ação
concreta de enfrentamento contra os aspectos que vão se tornando mais
evidentes, derivados da contradição da ordem capitalista e do
caminho político trilhado pela aliança de classes de
centro-direita hoje hegemônica.
3) Uma vez que o domínio do bloco conservador construiu uma hegemonia,
ainda que passiva, que se expressa em todos os níveis da sociedade (na
aceitação da economia capitalista de mercado; no limite das
políticas sociais focalizadas como maneira possível de
enfrentamento das manifestações da questão social; na
privatização dos serviços e desmonte das políticas
públicas, etc.) torna-se necessário um intenso trabalho de
formação política e de ação cultural, no
sentido de desvelar os reais fundamentos da ordem do capital, apostando no
desenvolvimento de valores de resistência e de luta que resgatem a
história de nossa classe e seus objetivos históricos com
autonomia e independência.
4) O isolamento quantitativo e qualitativo da esquerda impõe a
necessidade de definir estrategicamente campos de atuação e
organização para que possa incidir qualitativamente em
ações políticas que não se diluam na
dimensão continental do país e no contexto de apassivamento da
classe. Desta forma, é urgente a definição de eixos
centrais táticos onde concentrar o trabalho partidário,
não apenas na dimensão regional, mas no que diz respeito aos
setores da classe trabalhadora que se tornam essenciais organizar.
5) Dada a natureza da hegemonia burguesa hoje consolidada, a
correlação de forças presente na luta de classes e o
caráter geral de nossa estratégia como socialista, torna-se
fundamental a vinculação das lutas específicas e seus
impasses e demandas próprios às determinações mais
profundas que as ligam à ordem capitalista, colocando a necessidade de
sua superação. Neste sentido é fundamental a propaganda e
intensa ação política na defesa da alternativa socialista,
sua atualidade e necessidade nacional e internacional.
6) Este aspecto implica, ainda, na prioridade de procurar dar uma
dimensão política às lutas populares e sindicais que se
chocam com as manifestações mais aparentes da
contradição da ordem capitalista, seja na qualidade da
ação sindical e popular, seja nas disputas
político-eleitorais.
7) O caráter integrado do capitalismo brasileiro à ordem
internacional do capital imperialista implica numa interdependência da
luta contra-hegemônica. Este aspecto leva à tática de
aprofundar os laços de solidariedade internacional diferenciando aquelas
forças que atuam na perspectiva anticapitalista e anti-imperialista e,
ainda mais sólida e profundamente, àquelas forças
socialistas e comunistas.
8) A consolidação da hegemonia burguesa implica numa
institucionalização da luta de classes e na
definição de espaços "aceitáveis" e
controlados de manifestação do dissenso, não apenas no que
diz respeito ao limitado jogo eleitoral, mas também de uma ordem
instituída e em grande parte burocratizada de movimentos sociais,
sindicatos e centrais, associações diversas da sociedade civil
burguesa. Um dos maiores desafios de nossa tática é que, ao mesmo
tempo em que estamos obrigados a agir neste terreno, pois a ordem burguesa
organiza seu domínio instituindo uma sociedade civil burguesa que acaba
por perpassar praticamente todas as esferas da vida, exatamente aquelas onde
procuraremos atuar em nossa expectativa de organizar a classe e operar a
resistência, não podemos nos ater aos limites da permissividade
concedida pela ordem. Esta constatação impõe a necessidade
de organização autônoma e independente para que a
ação no interior da ordem seja elemento de contra-hegemonia e
não de reforço da hegemonia conservadora.
9) Estes diferentes princípios táticos se articulam na
formação do BLOCO REVOLUCIONÁRIO DO PROLETARIADIO e na
FRENTE ANTICAPITALISTA E ANTI-IMPERIALISTA, sendo que o primeiro é a
expressão política e o segundo a expressão prática
de nossa ação contra-hegemônica.
O Bloco Revolucionário do Proletariado
116. O Bloco Revolucionário do Proletariado consiste em um eixo
estratégico de nossa tática porque para ele conflui uma
série de ações: organização dos
trabalhadores através de suas demandas específicas, o trabalho de
formação política e propaganda socialista, o trabalho de
organização partidária, as ações
políticas institucionais sindicais, eleitorais, nos diferentes
campos de atuação dos militantes e quadros partidários.
117. Ele não pode ser confundido com uma aliança de classes e
muito menos com uma conformação de forças políticas
aliadas, mas é a meta de colocar em movimento a classe trabalhadora numa
perspectiva de autonomia e independência de classe para que possa lutar
por seus próprios interesses imediatos e históricos. Não
é uma instituição, uma frente ou uma
associação política, é a necessidade de contrapor
à hegemonia burguesa uma contra-hegemonia que apresente a necessidade de
ir além da ordem do capital, na perspectiva de uma sociedade socialista.
118. Assim, o Bloco Revolucionário do Proletariado não é
uma ação, mas a confluência de ações
táticas diversas que não se restringem e não podem se
restringir ao PCB. A hegemonia conservadora, ao capturar parte do proletariado
e produzir o apassivamento, impede a formação do Bloco do
Proletariado. Nossas ações de classe, mesmo aquelas limitadas e
contraditórias, como os efêmeros momentos de unidade de esquerda
(na luta eleitoral, na luta sindical ou de massas) são germes desta
contra-hegemonia e de constituição do Bloco Revolucionário
do Proletariado, tal como se manifestam na Frente contra a
Privatização da Saúde e na defesa do SUS, na luta em
defesa da educação pública, na luta por nenhum direito a
menos para os trabalhadores, na luta pela Reforma Agrária, na luta pela
redução da jornada de trabalho para 40 horas, na luta pelo
aumento do salário mínimo.
119. Assim como expresso no Manifesto Comunista de Marx e Engels, devemos
reafirmar que os comunistas do PCB não lutam para criar um partido
à parte do proletariado, mas devem apresentar, no conjunto da luta dos
trabalhadores, ali onde ela se expressar, os interesses gerais da classe. Esta
representação se associa à necessária
compreensão da sociedade capitalista e suas determinações
mais profundas, assim como se articula à dimensão internacional
da luta e do horizonte socialista e comunista de nossa proposta.
120. A principal ferramenta, portanto, da constituição do Bloco
Revolucionário do Proletariado, para os comunistas, é a
organização de nosso Partido, pois é ele que permite agir
no interior da luta de classes com uma perspectiva política que
vá além das reivindicações imediatas e
necessárias de nossa classe. Da mesma forma, a organização
do PCB só tem sentido se for ao mesmo tempo organização de
um setor da classe trabalhadora profunda e organicamente ligado às lutas
reais do proletariado.
121. Desta maneira, respondemos da seguinte forma a principal questão
tática: como organizar o Bloco Revolucionário do Proletariado?
Organizando os trabalhadores e suas lutas imediatas, ao mesmo tempo em que
organizamos o PCB como expressão de um setor dos trabalhadores
organizados que, compreendendo as determinações mais profundas da
sociedade capitalista, se dispõe a lutar pelo socialismo como
transição para uma sociedade sem classes e sem Estado: o
comunismo.
122. Assim, afirmamos que o eixo tático/estratégico de
constituição do Bloco Revolucionário do Proletariado e a
organização do PCB são elementos indissociáveis,
uma vez que não faz sentido organizar nosso partido fora do processo de
constituição da classe trabalhadora como um sujeito
histórico da revolução socialista. Não basta
organizar os trabalhadores sem que isso se vincule à radical
negação da ordem capitalista e à
apresentação da necessidade e atualidade da alternativa
socialista.
O Poder Popular
123. Um dos principais instrumentos para se realizar as
transformações econômicas, sociais e políticas no
Brasil é a construção do Poder Popular.
Construir o poder popular significa instituir a democracia direta, de forma a
que os trabalhadores e as massas passem a exercer a direção
política da sociedade, através dos
Conselhos Populares.
A construção do Poder Popular não acontecerá do
dia para a noite: trata-se de um longo percurso, no qual os trabalhadores devem
ir construindo no interior da velha ordem os elementos constitutivos e
organizativos da nova ordem. As lutas populares no âmbito do poder local,
que constituem o núcleo do Poder Popular, não serão
realizadas plenamente sem alteração das formas de propriedade e
das relações capitalistas de produção, mas a
construção deste instrumento funda-se na necessidade de colocar
na ordem dia o protagonismo dos trabalhadores e das massas populares e de criar
meios institucionais para que seus interesses sejam defendidos com
independência e autonomia, não se prendendo aos limites da atual
ordem institucional, mas inovando e criando novas formas de poder
político, no sentido da democracia direta.
124. Tendo como horizonte estratégico a Revolução
Socialista e, para a efetivação desta estratégia, a
construção do Bloco Revolucionário do Proletariado,
é preciso ter claro que tal construção somente será
concretizada através de um processo histórico que exige a
permanente disposição da militância comunista para
desenvolver, desde já, a configuração de um duplo poder,
forjado na luta de classes, na perspectiva dos interesses e necessidades dos
trabalhadores e conformador de uma nova cultura proletária e popular.
Como afirmamos nas Resoluções do XIV Congresso (parágrafo
80 em diante), será necessário ocupar ativamente
"todos os poros da institucionalidade atual",
criando novas formas de
"associação e sociabilidade através das
manifestações de resistência da classe trabalhadora".
Para tal, ainda que possua um caráter estratégico, mas
já fazendo parte das mediações táticas
necessárias à realização do projeto
revolucionário, está a proposta de construção do
Poder Popular.
125.
"Propomos a construção de órgãos de poder
proletário e popular que, atuando na forma de conselhos autônomos
da classe trabalhadora, exercitem o processo de gestão e
deliberação sobre os assuntos que dizem respeito diretamente
às massas trabalhadoras, além de ações diretas para
solucioná-los. Em todas as instâncias da sociedade, é
necessário organizar a resistência dos trabalhadores: por locais
de trabalho, para fazer frente à arbitrariedade do capital; nos locais
de moradia, para garantir a segurança e melhores condições
de vida; onde for preciso, tomar iniciativas de trabalho e
produção cooperativadas, lutar por acesso à saúde,
educação e serviços fundamentais, não apenas como
ampliação de serviços públicos, mas pelo controle
do processo e da qualidade da execução das políticas
públicas.
126.
Será preciso organizar formas de abastecimento e controle popular de
distribuição, potencializar as formas autônomas de trabalho
e vida e vinculá-las aos trabalhadores de diferentes campos e
profissões, desenvolver uma solidariedade ativa entre as categorias e
setores sociais, fomentar interesses comuns e a necessidade de uma nova forma
de organização da produção social da vida para
além do mercado e da lógica do capital. E ainda: organizar a
cultura proletária e popular como acesso e produção
universal de bens culturais, formação política,
conhecimento da história, do funcionamento da sociedade e da luta
internacional dos trabalhadores, e como capacitação
técnica e profissional".
127. A construção do
Poder Popular
será efetuada através de um longo percurso, ditado pela
correlação de forças na sociedade e outros fatores. Desta
construção faz parte a participação no movimento
sindical, associativo urbano, nas instâncias de poder local
institucionais, onde for possível e recomendável, em
construções diretas do movimento popular, de caráter
regional, local ou setorial, podendo evoluir para os planos estadual e mesmo
nacional, através de redes de entidades do movimento popular. Nesses
espaços, os comunistas devem buscar o reconhecimento cada vez maior dos
trabalhadores e da população que representam, tornar efetiva a
representação popular, lutar pelas reivindicações
reais dos trabalhadores e da população, buscando dar-lhes um
caráter político e educativo.
128. Estes instrumentos de hegemonia proletária, que deverão
atuar no sentido de fazer avançar a construção do poder
popular alternativo à ordem capitalista, nascerão das
experiências concretas de lutas dos trabalhadores, partindo mesmo de
organismos já existentes, como associações de moradores,
conselhos comunitários nos bairros, sindicatos,
organizações nos locais de trabalho, comitês da juventude,
movimentos de moradia, luta contra o desemprego, contra
privatizações, luta pela terra, fóruns comuns de
mobilização envolvendo bandeiras gerais como a saúde, a
educação, os transportes, a defesa do meio ambiente etc). Cabe
aos militantes comunistas a intervenção organizada nestes
espaços, promovendo sempre a denúncia da ação do
capital em todas as esferas da sociedade e da vida e apontando para a
solução radical dos problemas vividos pelos trabalhadores.
129. Os limites da institucionalidade liberal burguesa com certeza
impedirão a plena afirmação dos reclamos populares, o que,
dependendo da capacidade de organização e de unidade dos
movimentos, forçará a radicalização da luta.
Daí ser necessário ter como norte a difusão de
experiências de ação que já ocorrem em várias
cidades do país, mas que hoje ainda possuem um alcance localizado e
disperso: a ocupação de fábricas e empresas, com a
formação de comitês voltados à
organização da produção sob o controle dos
trabalhadores; a invasão de espaços ociosos (a serviço da
especulação imobiliária) para a moradia popular; a
ocupação dos latifúndios, com o propósito de
organizar a produção cooperativada, sob a direção
dos trabalhadores rurais,
rompendo-se gradativamente com a ilusão de que será
possível no estágio atual de pleno desenvolvimento das
relações capitalistas no campo, com hegemonia do
agronegócio implementar um programa de distribuição
e expansão da pequena propriedade. Diante dos problemas concretos que
surgirem será preciso radicalizar as ações, com o poder
popular assumindo para si a tarefa de enfrentar tais problemas, denunciando a
omissão criminosa do Estado burguês e buscando construir outra
institucionalidade.
130. O grande desafio será costurar nacionalmente a
organização do conjunto de iniciativas desenvolvidas no
âmbito local, municipal, regional e estadual, superando as
divergências entre as diversas forças políticas e
organizações que abraçam a perspectiva da luta
anticapitalista, para que, então, seja criado um Poder Popular que tenha
caráter de um duplo poder alternativo ao bloco liberal burguês.
Depende de muita luta e organização a possibilidade de se
constituir tal realidade, em que sejam colocadas frente a frente as
alternativas antagônicas de ordenamento da sociedade: de um lado, o
Estado burguês e os diversos mecanismos e aparelhos responsáveis
pela reprodução e manutenção da ordem capitalista;
de outro, as forças políticas e organizações
sociais e populares, reunidas em torno do Poder Popular, defendendo uma nova
ordem socialista. É preciso criar as condições para que o
debate político se dê em torno das questões
programáticas e do conteúdo histórico e ideológico,
superando qualquer tentativa de conduzir a luta por caminhos reformistas ou
pelo pragmatismo oportunista.
A Frente Anticapitalista e Anti-imperialista
131. O XIV Congresso aprovou que é papel do PCB incentivar a
elaboração de um calendário nacional de lutas centrado na
resistência dos trabalhadores à ofensiva do capital.
Paralelamente, devemos lutar pela criação de comitês e
organismos de mobilização que se transformem em germes do Poder
Popular e que, ao mesmo tempo, contribuam para a construção da
Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, com a constituição de
uma plataforma política capaz de dar unidade à ação
contra-hegemônica como base para uma alternativa real de poder dos
trabalhadores.
132. A Frente não pode ser confundida com uma frente eleitoral. A
vitória eleitoral e as possibilidades de governabilidade de
forças de esquerda somente ocorrerão se estiver fincada sobre um
forte movimento de massas. Portanto, o projeto de constituição da
Frente Anticapitalista e Anti-imperialista depende da formação de
um amplo movimento de caráter permanente, estruturado por partidos
políticos, organizações de massa e movimentos populares
reunidos em torno do programa contra-hegemônico, no qual esteja prevista
a ruptura com o capitalismo. O grande objetivo é criar as
condições para a disputa pelo poder na perspectiva do socialismo,
incorporando amplos setores de massa desgarrados tanto do projeto conciliador
que hoje propõe um pacto com o capital, quanto do projeto reformista.
Para a conformação desta Frente, devemos priorizar o
diálogo com as forças políticas e sociais que têm se
posicionado, nas inúmeras frentes de luta, em franca
oposição ao Estado burguês e sua opressão de classe,
mesmo aquelas que hoje ainda se mantêm reticentes a abraçar a
ideia de um movimento com caráter anticapitalista.
133. Temos encontrado dificuldades para convencer determinados setores da
esquerda acerca da necessidade de formação da Frente
Anticapitalista e Anti-imperialista. Alguns se opõem à ideia
porque acham que farão sozinhos a revolução socialista.
Outros, por entendimento de que ainda há "tarefas nacionais" a
cumprir no Brasil, e que estaríamos (nós, do PCB) nos adiantando
ao processo histórico, propondo a luta anticapitalista como central.
Estes grupos partem do princípio de que é preciso, primeiro,
desenvolver a luta antilatifúndio e antimonopólio e que,
portanto, o atual estágio da luta de classes no Brasil demandaria um
movimento primordialmente anti-imperialista. Trata-se, de fato, de uma
concepção "etapista" disfarçada. Entendemos que
todas as lutas populares no Brasil, seja contra a exploração,
seja contra o poder do latifúndio ou contra os monopólios,
são lutas anticapitalistas, pois o capital exerce seu domínio em
todas as esferas da vida social, assim como a hegemonia burguesa é
acachapante. Qualquer "tarefa nacional" ou
"popular-democrática" a ser cumprida será uma tarefa
anticapitalista. Hoje todo e qualquer movimento popular encontra do outro lado
da trincheira a organização do capital, tentando obstaculizar as
conquistas por parte dos trabalhadores.
134. Para nós, as lutas sociais e a resistência dos trabalhadores
na defesa de seus direitos mais imediatos, como o salário, as
condições de trabalho, a aposentadoria, a assistência, os
direitos previdenciários, assim como a luta pela qualidade de vida e
pelo direito a uma educação pública de qualidade, ao
atendimento de saúde, à moradia digna, ao acesso aos bens
culturais e ao lazer se chocam hoje com a lógica privatista e de
mercado, que vê todos estes bens e serviços como mercadorias a ser
adquiridas prioritariamente no mercado privado, gerando lucros enormes para as
grandes corporações e, secundária e supletivamente, pelo
Estado, na forma de políticas públicas.
135. Mas não contrapomos a luta anticapitalista à luta contra o
imperialismo. No caso do Brasil, as duas lutas se unem no mesmo processo de
enfrentamento à ordem imposta pelo grande capital e pela burguesia. Pois
sabemos que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro está, de forma
profunda e incontornável, associado ao capitalismo internacional, sendo
impossível separar onde começa e onde acaba o capital
"nacional" e aquele ligado à internacionalização
das grandes empresas transnacionais. O desenvolvimento dos monopólios,
das fusões, da concentração e centralização
dos principais meios de produção nas mãos de grandes
corporações monopolistas, nos setores industrial, bancário
e comercial, torna impossível separar o capital de origem brasileira ou
estrangeira, assim como o chamado capital produtivo do especulativo, já
que, nesta fase, o capital financeiro funde seus investimentos tanto na
produção direta como no chamado capital portador de juros e flui
de um campo para outro de acordo com as necessidades e interesses da
acumulação privada, sendo avesso a qualquer tipo de planejamento
e controle. Por isso a luta anticapitalista hoje é, necessariamente, uma
luta anti-imperialista.
136. A afirmação do caráter anti-imperialista não
advém de nenhuma afirmação de um capitalismo nacional em
contraposição à dominação estrangeira de
potências desenvolvidas, o que poderia nos levar a reapresentar um
elemento essencial da estratégia das etapas ou do desenho mais geral de
uma estratégia democrático nacional ou popular. O caráter
anti-imperialista da frente proposta, pelo contrário, parte da
constatação do caráter internacional do capitalismo
monopolista e daí seu caráter imperialista, de forma que as lutas
anti-capitalistas que se desenvolvem no Brasil, na América Latina e no
mundo se chocam necessariamente com a ordem capitalista/imperialista mundial o
que aumenta a necessidade de articulação política ativa e
solidariedade internacionalista.
137. A hegemonia burguesa só pode se impor e se prolongar no Brasil pela
divisão das forças socialistas, populares e
revolucionárias. É hora, pois, de dar um salto de qualidade na
busca pela unidade de ação dos movimentos populares, das
forças de esquerda e entidades representativas dos trabalhadores, no
interior e para além do mundo sindical corporativo, promovendo
iniciativas práticas e conjuntas de resistência e de
confrontação que sejam os passos necessários para a
constituição de um bloco proletário capaz de contrapor
à hegemonia conservadora uma real alternativa de poder popular e
socialista em nosso país. Nosso papel é continuar insistindo,
junto a todas as forças políticas e organizações
sociais que se contraponham ao poder do capital, sobre a necessidade de
conformação da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, que
não necessariamente terá este nome, mas que tenha, em
essência, o caráter de um amplo movimento político
permanente de lutas, voltado a enfrentar os ditames do capital e da ordem
burguesa em nosso país, preparando o caminho para a disputa pelo poder e
a construção da sociedade socialista.
V - Operações Táticas
138. É necessário primeiramente distinguir formalmente entre a
tática e a operação tática. No corpo de nossa
elaboração estratégica definimos linhas táticas
gerais, que acabamos de expor, para orientar nossa ação com
vistas ao desenvolvimento de atividades e iniciativas que possam resultar nas
metas propostas e na implementação de nossa estratégia.
139. Assim, o trabalho partidário deve incluir a análise sobre as
diversas realidades locais, para detectar os caminhos e meios que nos permitam
efetivar as linhas táticas definidas através de
ações práticas. No campo da análise da realidade e
da conjuntura, por exemplo, é tarefa das diferentes instâncias do
PCB avaliar como o capitalismo se expressa concretamente nas áreas de
atuação da militância, que setores de classe ali se
expressam como dominantes e determinantes, como se produz na realidade dada a
aliança de classes do bloco hegemônico, que forças
políticas regionais ou locais expressam a grande burguesia monopolista e
seus aliados da pequena burguesia política, assim como as forças
de esquerda e os diferentes movimentos e organizações dos
trabalhadores.
140. Desta análise, deriva a necessidade de identificar as
contradições que marcam a forma particular de
acumulação do capital que ali se expressa (pode ser no acesso
precário aos serviços educacionais, de saúde ou outros; na
contradição entre a agricultura familiar ou outra forma de
produção camponesa contemporânea e o agronegócio, ou
na contradição explícita entre capital e trabalho numa
região industrial, etc.).
141. É preciso definir os setores de classe e segmentos
estratégicos a se organizar, desenvolver políticas de
arregimentação, organização e
formação inseridas no fortalecimento das ações e
lutas sociais. Deve-se fazer presente na vida da classe nos espaços de
atuação profissional ou de moradia de nossos militantes,
traduzindo a política do PCB para propostas concretas de
organização da luta sindical na especificidade de cada
inserção, nas lutas populares e sociais, nos movimentos de
resistência da classe trabalhadora. Este trabalho de diagnóstico e
organização é a base para passar à
ação, integrando as lutas existentes e tomando iniciativa
daquelas que se vejam como necessárias, mas que ainda não se
transformaram em iniciativas práticas.
142. Tais iniciativas práticas devem se articular aos nossos eixos
táticos e estratégicos, ou seja, devemos permanentemente avaliar
se nossa prática política está de fato contribuindo para
ações unitárias e contra-hegemônicas que contribuam
para a ação independente da classe na constituição
da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista e do Bloco Revolucionário
do Proletariado, colocando sempre acima das pequenas divergências e
problemas imediatos nossas tarefas políticas mais amplas de
organização e politização dos trabalhadores.
143. O mais importante em nossa operação tática é a
postura de nossos militantes. De nada adianta termos uma
formulação política consistente e correta se nossos
militantes se portam de maneira desqualificada, em contradição
com os valores revolucionários, ou seja, sem disciplina, sem
formação política capaz de compreender nossa
estratégia, nossas táticas e a realidade em sua complexidade.
Além disso, que não é senão o dever de todo o
militante comunista, a postura deve também se pautar pelo respeito
às divergências, uma postura pela unidade naquilo que for
essencial, sem mascarar divergências de concepções e
princípios, expondo seus pontos de vista com firmeza e serenidade.
144. Devemos guardar os combates para nossos inimigos de classe e seus aliados,
preservando o debate para nossos aliados e para o conjunto dos trabalhadores,
mesmo aqueles submetidos à hegemonia apassivadora do bloco dominante. A
operação tática implica no trabalho coletivo e, portanto,
em disciplina e organização na condução das tarefas
estabelecidas e na aplicação consequente do centralismo
democrático, enfatizando que ele só pode ser de fato centralismo
se for construído pelo debate profundo e o conhecimento crítico
de nossas formulações e não pela imposição
burocrática e administrativa.
Pontos centrais da operação tática
145. A Conferência sobre Tática não poderia ter a
pretensão de traçar o conjunto das ações que
construirão nossa intervenção na realidade da luta de
classes pois, como dissemos, isso depende de um diagnóstico local,
regional e setorial (sindical, da juventude, político-eleitoral, etc.).
No entanto, é fundamental que apontemos alguns pontos centrais de nossa
operação tática:
1) Dada a nossa prioridade na organização da classe trabalhadora,
torna-se essencial a identificação dos segmentos principais da
classe nos diferentes contextos regionais e locais para definir formas de
aproximação e organização nos próprios
locais de trabalho. Não nos basta desenvolver uma política para
os trabalhadores, é essencial desenvolver uma ação com os
trabalhadores.
2) Este ponto coloca a ação e iniciativas de
intervenção no cotidiano da classe trabalhadora como
prática central do trabalho partidário, de onde deriva a
prioridade tática de intervir nas instituições onde
trabalhamos, detectando problemas e formulando ações
práticas, assim como na tarefa de organização sindical, se
for o caso, ou formas de associação adequadas à realidade
local ou setorial.
3) É fundamental manter autonomia desta ação associativa
ou sindical evitando a tentação de partidarizá-las. O PCB
não deve partidarizar as ações de
organização e luta da classe; seus militantes devem se destacar
pela sua firme e coerente atuação, compromisso, seriedade e
clareza, deixando que a ação partidária por
excelência se desenvolva nos âmbitos que lhes são
próprios, num consistente trabalho de arregimentação.
4) Dada a prioridade de articular e politizar as lutas imediatas, a
operação tática do PCB deve dar especial
atenção aos espaços de generalização das
lutas imediatas e das organizações que daí derivam.
Daí a importância de fortalecer a Unidade Classista como
ferramenta de organização sindical, da mesma forma que a UJC no
caso da juventude trabalhadora e os estudantes.
5) Neste mesmo sentido, deve-se buscar qualificar e fortalecer nossa
ação na construção da INTERSINDICAL, respeitando os
ritmos e diferentes concepções que hoje nela se abrigam e
apontando sincera e claramente a intenção de construí-la
como um espaço amplo de organização e luta sindical,
evitando, ao mesmo tempo, os sectarismos que tendem a isolá-la em torno
de uma unidade abstrata, amarrada numa casca institucional que tende a se
burocratizar antes mesmo de nascer. O PCB dará o melhor de seus
esforços no sentido de contribuir para a recomposição do
campo original da Intersindical, pondo fim à atual duplicidade de
representação, e sua ampliação com os demais
setores sindicais que têm a centralidade do trabalho como norte.
6) Diante da complexidade da conjuntura e da força de
atração e cooptação do bloco conservador no poder,
enfrentaremos, cada vez mais, a subordinação de segmentos da luta
social que, por diferentes motivos, tendem a ser capturados pela hegemonia
conservadora. Considerando as características da hegemonia passiva,
devemos desenvolver uma política cautelosa e coerente com estes setores,
nunca disfarçando nossas divergências e a clara
apreciação do equívoco de tal aproximação,
mas evitando a sectarização que tende a jogar estes setores na
vala comum da conciliação, desprezando as mediações
e contradições importantes na tentativa de
construção de uma contra-hegemonia.
7) A luta contra-hegemônica é, fundamentalmente, uma luta de
classes e, neste sentido, envolve necessariamente o campo da luta das ideias,
ainda que não possa se restringir a ele. Isso implica que, sem
ilusões com o trabalho educativo e seus limites, afirmamos como
essencial o trabalho de formação política. Trata-se de uma
exigência no que diz respeito à formação de nossos
militantes e quadros, e de uma necessidade quanto ao trabalho junto aos setores
mais amplos da classe trabalhadora, sempre em uma perspectiva de unidade, sem
dogmatismos e sectarismos que buscam instrumentalizar a formação
como instrumento de divulgação de uma linha ou da política
partidária. Seu papel central é fornecer aos trabalhadores
instrumentos teóricos necessários à
constituição de sua consciência de classe e da
compreensão crítica da realidade, para além das
aparências. Para isso, a divulgação e o estudo do marxismo
são essenciais.
8) A tarefa de constituir a classe como sujeito implica em uma postura diante
do atual perfil da classe trabalhadora e das forças que atuam
objetivamente em sua fragmentação. A lógica
pós-moderna pulveriza o pertencimento de classe em diversas identidades
(mulheres, negros, jovens, opções sexuais, etc.), como se estes
aspectos pairassem acima das determinações de uma sociedade
capitalista cindida por interesses antagônicos de classe. Nossa postura
não deve ser a negação da diversidade de identidades e da
especificidade das diferentes demandas que tal diversidade permite manifestar,
pois são manifestações legitimas. Cabe
compreendê-las à luz, também, de suas
determinações sociais e históricas e da funcionalidade das
opressões específicas constituintes da ordem capitalista/burguesa.
9) Nas diversas frentes táticas em que atua, o PCB deve buscar o campo
de alianças correspondente à possível e necessária
composição da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista e da
Intersindical, esta entendida pelo PCB como um espaço comum às
correntes que a reivindicam; no caso de impossibilidade, inviabilidade ou
inexistência de aliados deste campo atuando em determinada frente, PCB
pode participar de outras composições que representem setores
mais moderados da esquerda, desde que a nossa participação nas
eventuais gestões das organizações sindicais e populares
possa ser claramente diferenciada, que permita a efetiva
ocupação de espaços e a realização de
ações concretas que apontem para o desenvolvimento da luta de
classes. No espaço político de alianças aqui definido, o
PCB procurará estreitar relações mais consistentes com as
forças comunistas que se contrapõem ao reformismo e ao etapismo.
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