O problema da dívida do Brasil não foi resolvido:
no governo Lula agravou-se ainda mais
por Maria Lucia Fattorelli
[*]
entrevistada por Stéphanie Jacquemont
Stéphanie Jacquement (SJ): Esteve na Bélgica, como delegada da
Auditoria Cidadã da Dívida
, do Brasil, por 10 dias de atividades ao lado dos delegados da África,
Europa, Ásia e América
Latina. O que destaca destas reuniões com os membros da rede CADTM e das
atividades em que participou?
Maria Lucia Fattorelli (MLF) : O que destaco, antes de tudo, é a
semelhança do processo de endividamento em todas as experiências
relatadas pelos representantes das diversas partes do mundo, e o impacto do
endividamento nas economias, não somente nos países do Sul,
aprisionados em um processo histórico de dominação e
exploração, mas também, mais recentemente, nos
países europeus. Além dos contatos e importante troca com as
pessoas vindas das quatro partes do mundo o que é fundamental
para enriquecer nossas lutas as atividades organizadas pelo CADTM
permitiram ajudar a identificar tendências, tal como o avanço do
privilégio do setor financeiro, e pontos importantes ao nível de
análise política. O primeiro ponto, em minha opinião,
é o processo global de transformação da dívida
externa em interna. Esta dívida chamada de interna encontra-se, de fato,
nas mãos dos estrangeiros, o que nos obriga a rever o conceito de
dívida interna. A dívida interna é, de alguma forma, a
nova face da dívida externa. Outro ponto a ser lembrado: a
transferência líquida de capitais dos países do Sul para os
países do Norte, o que mostra que a dívida não foi usada
para financiar investimentos, mas que ela funciona, ao contrário, como
um mecanismo de extração das riquezas do Sul, que em muitos
casos, acabam nos bolsos dos bancos privados. Além disso, esses
países do Sul sofreram e sofrem ainda os efeitos da crise financeira que
exacerbou problemas sociais, como salientaram os testemunhos dos delegados do
CADTM presentes.
Durante estes dias, grande ênfase foi colocada no tema da auditoria da
dívida que, através dos exemplos da Auditoria Cidadã da
Dívida do Brasil e da auditoria oficial realizada com a
participação cidadã no Equador, que se apresenta como um
poderoso instrumento nas mãos dos movimentos sociais. As reuniões
destacaram também a importância da luta contra o câmbio
climático
[NR]
e o modelo de exploração extrativista que estão
estreitamente ligados ao endividamento público, em particular aos
empréstimos do Banco Mundial destinados ao setor privado,
responsável pela grande parte desta exploração
extrativista. Outro tema discutido ao longo do programa é a
relação entre o endividamento público e o sistema
tributário, o que levanta a questão da justiça fiscal, que
abrange tanto a arrecadação de impostos como a
utilização das receitas arrecadadas, cabendo destacar os
privilégios de que gozam os rentistas de títulos da dívida.
Dado o contexto atual, ficou evidente a gravidade da crise financeira, na
esteira da qual se desenvolveu uma terrível crise da dívida em
diversos países da Europa, principalmente em razão da
ausência de regulação do sistema financeiro privado
internacional. Assim, é necessário conduzir uma auditoria para
determinar a origem desta dívida, que tem provocado tanto
sacrifício aos povos da Europa de maneira injusta (aumento do
desemprego, supressão de direitos, reduções nas
aposentadorias, etc), pois não são os responsáveis por
essa dívida! Uma auditoria permitirá identificar os verdadeiros
culpados que devem responder pelos prejuízos causados. Não se
pode permitir que setores como estão fazendo atualmente os
grandes bancos continuem a embolsar lucros recordes, apesar da crise que
abala outros setores.
Finalmente, quero enfatizar o envolvimento total dos membros do CADTM,
particularmente dos jovens, o que nos dá confiança no futuro da
luta por justiça social.
SJ: A sua organização tornou-se, oficialmente, membro da rede
CADTM Internacional por ocasião da assembléia mundial da rede:
como considera o trabalho na rede? O que acha que sua organização
pode fazer para a rede e vice-versa?
MLF : Nossa organização Auditoria Cidadã da
Dívida do Brasil mantém com o CADTM uma
relação estreita desde o ano de 2002, data em que conheci Eric
Toussaint e Denise Comanne no 2º Fórum Social Mundial de Porto
Alegre. Desde então, temos participado de vários projetos juntos.
Agora que somos membros efetivos da rede CADTM, creio que podemos lançar
iniciativas da auditoria cidadã da dívida em outros países
onde o CADTM está presente. Com a nossa longa experiência de dez
anos em auditoria cidadã da dívida no Brasil, da auditoria
oficial da dívida equatoriana (2007-2008) e da recente experiência
na CPI da Dívida (Comissão Parlamentar de Inquérito sobre
a dívida pública) no Brasil, programamos organizar conjuntamente
grupos de trabalho para iniciar auditorias cidadãs, mas também
impulsionar as auditorias oficiais, onde for possível.
A auditoria da dívida tem sido um instrumento importante para chegar
à verdade dos fatos. É necessário difundir e reproduzir a
experiência para que os Estados possam enfrentar o problema da
dívida, devidamente amparados em provas de sua ilegitimidade e de sua
ilegalidade. É importante lembrar que a experiência recente no
Equador
[2]
permitiu uma revisão do orçamento e um aumento
significativo dos recursos destinados aos setores sociais (saúde,
educação, criação de empregos,
construção de rodovias...).
SJ.: A propósito do Brasil, explicou-nos como o Lula chegou a divulgar a
idéia que o problema da dívida foi resolvido. Eric Toussaint nos
falou do sentimento de euforia injustificado de certos países devedores,
entre os quais o Brasil figura em bom lugar. Pode nos explicar como Lula
conseguiu essa proeza?
MLF: A parte da dívida externa que foi paga corresponde somente à
que devíamos ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e outras
pequenas partes desta dívida, sendo que os laços com o Fundo
não foram rompidos. Quando, em 2005, o Brasil saldou sua dívida
com o FMI, o ministro das Finanças da época, Antonio Palocci, fez
publicar no sítio da internet do ministério uma carta explicando
que as obrigações relativas ao artigo IV
[3]
do estatuto do FMI permaneceriam na agenda, isto é, o Brasil manteria a
agenda
econômica imposta pelo FMI, permitindo que ele examine as contas do
país a cada três meses. Em 2005, a dívida externa
pública excedeu os 200 mil milhões de dólares e somente
15,5 mil milhões de dólares foram pagos antecipadamente ao FMI.
É evidente, portanto, que toda a dívida não foi
reembolsada. Ademais, este pagamento foi muito desfavorável em termos
financeiros, dado que a dívida com o FMI era relativamente barata, com
taxas de juros de 4% por ano. Para saldar esta dívida, o Brasil emitiu
de maneira acelerada: títulos da dívida externa a taxas de juros
bem mais elevadas, de 7,5 a 12% ao ano, e títulos da dívida
interna, remunerada a taxas muito altas de 19% ou mais à época.
Ocorreu, portanto, uma grande contradição, que qualificamos de
inexplicável: pagamos antecipadamente, e sem qualquer benefício
ou redução, uma dívida a 4% de taxa de juros e a
substituímos por uma dívida muito mais onerosa (com taxas de 7,5%
no mínimo para a dívida externa e mais de 19% para a
dívida interna). Resumidamente, a dívida tem simplesmente mudado
de mãos. Paramos de dever ao FMI para dever àqueles que
adquiriram os títulos da dívida interna e externa. E como se
não fosse o suficiente substituir uma dívida barata por uma
dívida mais cara, não estamos livres dos ditames do FMI, tal como
a obrigatoriedade de produzir um superávit primário
[4]
(que não visa outra coisa que a reserva de recursos para o pagamento
dos juros da dívida), as privatizações, a
manutenção da liberdade de circulação dos capitais,
entre outros.
Continuamos a reembolsar uma dívida pública externa que se eleva
atualmente a mais de 87 mil milhões de dólares a total
supera 340 mil milhões de dólares enquanto a propaganda
insiste que esta dívida está paga... No caso do FMI, o Brasil se
comprometeu a emprestar até 10 mil milhões de dólares
[5]
. A propaganda política foi intensa. Na mente das pessoas, o FMI
é o símbolo por excelência da dívida, sendo assim
fácil acreditar que reembolsar sua dívida ao FMI equivalia a
saldar a totalidade da dívida. O fato de que o Brasil dispõe de
reservas cambiais de mais de 250 mil milhões de dólares aumenta a
confusão. Estas reservas foram conseguidas de uma maneira muito onerosa.
Primeiro, elas decorrem da entrada em grande quantidade de dólares,
devido à valorização da moeda local, o real. Como o real
ganha valor nominal em relação ao dólar, os especuladores
internacionais compraram reais, para aproveitar as taxas de câmbio
favoráveis. Assim, quando os dólares entram no Brasil, para
limitar a quantidade de moeda em circulação e, portanto, a
inflação, o Banco Central vende títulos da dívida
interna emitidos com as taxas de juros mais elevadas do mundo. Com estes
dólares, o Banco Central compra, principalmente, bônus do Tesouro
dos Estados Unidos cuja remuneração é quase nula
[6]
. Por isso, o Banco Central acumula enormes perdas operacionais, que são
em parte devido às taxas de câmbio e de outra parte à
diferença entre os juros que paga e aqueles que recebe. Isso é
extremamente grave; a dívida interna cresce de maneira exponencial e as
reservas são expressas em uma moeda em depreciação, sem
trazer qualquer benefício para o país.
SJ: É evidente então que a dívida é um assunto
longe de ser concluído. Quais são as manifestações
do problema do endividamento no Brasil e quais são os desafios nesta
matéria?
MLF: Em primeiro lugar, é preciso assinalar que se a dívida
externa é um assunto longe de ser concluído, o maior problema
atualmente no Brasil reside na dívida interna que ultrapassa os dois
trilhões de reais, ou seja, um milhão de milhões e
duzentos mil milhões de dólares (ou 855 mil milhões de
euros). Ela explodiu via mecanismos tais como a acumulação de
reservas, como acabamos de explicar, ou ainda o anatocismo (pagamento de juros
sobre juros, ou capitalização de juros), como comprovaram as
investigações realizadas pela recente CPI na Câmara dos
Deputados. O problema da dívida no Brasil salta aos olhos se observamos
o orçamento nacional. As tabelas do orçamento são muito
complexas, bem difíceis de compreender; há uma falta absoluta de
transparência. É por isso que dentre os trabalhos da Auditoria
Cidadã da Dívida nós traduzimos esta multidão de
tabelas, buscando fazer um único gráfico, bastante esclarecedor.
Este gráfico demonstra qual parte é destinada ao pagamento da
dívida e qual parte é destinada ao social.
Em 2009, por exemplo, o Brasil destinou 36% de seu orçamento ao
pagamento dos juros e a uma pequena porção do reembolso do
capital (ou amortização
[7]
), quando somente 4,6% e 2,9%, respectivamente, foram alocados para a
saúde e a educação. Um setor tão fundamental como a
água e o saneamento representaram apenas 0,08% dos gastos em 2009! E
isto levando em conta que mais da metade dos cidadãos(ãs)
brasileiros(as) não têm acesso ao saneamento das águas
utilizadas! É um verdadeiro escândalo. O Brasil não
é um país pobre, sendo a oitava economia mundial, mas é
também um dos países onde a desigualdade e a injustiça
social são as mais fortes, e o país ocupa o 73º lugar na
classificação das Nações Unidas, segundo o Indice
de Desenvolvimento Humano (IDH)
[8]
. Mas isso vai mais longe ainda: se levarmos em consideração o
endividamento para o pagamento de amortizações, serão
então engolidos 48% do orçamento no serviço da
dívida! O governo brasileiro dissimula esta verdade constrangedora e
apresenta os números de tal forma que a emissão da dívida
para a amortização não seja incluída no
orçamento. Portanto, se quisermos alcançar justiça social,
não podemos deixar de enfrentar a dívida. Se observarmos, por um
lado, a evolução da alocação de recursos para o
serviço da dívida e, por outro lado, para a
educação, cultura, saúde, saneamento, segurança
social, salário dos funcionários públicos que prestam
serviços à população, etc, vemos que a cada ano
aumenta o serviço da dívida em detrimento destes gastos vitais. O
absurdo maior é que a dívida continua a crescer, como uma bola de
neve, apesar das somas cada vez maiores destinadas ao seu reembolso. E o
governo Lula não reverteu essa tendência, longe disso: o problema
tornou-se ainda mais grave durante o seu mandato. É preciso assim, para
enfrentar o problema, realizar uma auditoria, tal como previsto pela
Constituição de 1989, e que até hoje não foi
cumprida.
SJ: Com relação a isto, já mencionou a
criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
sobre a dívida, que foi o resultado de uma grande batalha. Que
conclusões tirou dessa experiência? Acha que a questão da
luta contra o endividamento corre o risco de ser novamente enterrada ou existe
ainda a possibilidade de que outros passos sejam dados na direção
de uma verdadeira auditoria?
MLF: A CPI foi, de fato, o resultado de uma longa batalha. Conseguimos criar a
CPI, mas não sem grandes dificuldades políticas: nem o governo de
Lula, nem a oposição de direita queriam abordar o assunto. Apenas
alguns raros parlamentares apoiaram realmente a CPI. Esta comissão foi
importante, na medida em que introduziu o tema da dívida na pauta de
debates e na agenda política. A cada semana, tivemos uma reunião
pública da CPI com professores e especialistas convidados pela
Comissão. Estas reuniões foram transmitidas pela televisão
da Câmara dos Deputados e na web. Durante a Auditoria Cidadã da
Dívida, começamos a receber mensagens de todo o país, com
pedidos de explicações, esclarecimentos, entrevistas, etc. Houve
um grande interesse, particularmente por parte dos estados brasileiros, devido
ao fato de que, entre 1996 e 1998 (sob o governo de Fernando Henrique Cardoso),
as dívidas de estados e municípios com o governo federal foram
renegociadas. Após esta renegociação, as entidades
federais e municipais viram-se pesada e injustamente endividadas, com as taxas
de juros muito elevadas. O governo federal fez com que, de alguma maneira, os
componentes da federação sofressem do mesmo mal sofridos por ele
próprio a partir dos mercados financeiros. Após a
conclusão da CPI, dois relatórios foram produzidos
[10]
. Um relatório oficial que, embora aponte para uma série de
ilegitimidades e ilegalidades no seu diagnóstico, não faz as
recomendações que teríamos o direito de esperar. O
relatório reconhece que as taxas de juros vigentes no Brasil não
são "civilizadas" e que são um dos fatores-chave no
aumento da dívida, tanto do governo federal quanto dos estados e
municípios do país; que a dívida interna aumentou para
financiar a acumulação de reservas cambiais em dólares,
resultando em um custo significativo para as finanças públicas;
que o Senado Federal renunciou à sua competência ao permitir a
emissão de títulos da dívida externa sem especificar suas
características; que há uma falta de transparência na
divulgação dos valores da dívida e que estão
faltando certos documentos e informações solicitados pela CPI;
que o total dos juros pagos anunciado pelo governo é inferior ao total
dos juros efetivamente pagos, pois somente são tomados em
consideração os juros que ultrapassam a taxa de
inflação, ou seja, as taxas de juros chamadas "reais",
sendo o restante dos juros contabilizados equivocadamente como se se tratasse
da amortização do principal. O relatório oficial destaca,
portanto, coisas graves, mas sem tirar daí as
recomendações claras e decisivas que se impõem. O
relatório nem sequer recomenda a realização de uma
auditoria que, no entanto, é prevista nos termos da
Constituição. Ele não considerou desejável a
transmissão de informações ao Ministério
Público para o aprofundamento das investigações.
Graças à pressão de alguns setores da sociedade civil
(sobretudo das entidades de servidores públicos), que foram ao encontro
dos parlamentares, participando das reuniões públicas da CPI,
agitando cartazes, etc, o relatório oficial foi aprovado por apenas oito
votos. É o mesmo número de votos que aprovou o relatório
paralelo elaborado pelo membro do PSOL deputado federal Ivan Valente
[11]
, e que integrou ao seu relatório todas as oito análises
técnicas que apresentei, na qualidade de assessora técnica da
CPI. Este relatório alternativo tem, portanto, o mesmo peso
político que o relatório oficial. O relatório de Ivan
Valente revela muitos indícios de ilegalidades, todas devidamente
documentadas, sendo os principais: o pagamento de juros sobre juros, dito
"anatocismo", que foi considerado ilegal pelo Supremo Tribunal
Federal do Brasil; os juros flutuantes da dívida externa, que podem ser
considerados como ilegais, segundo a Convenção de Viena sobre o
direito dos Tratados de 1969; a ausência de contratos e outros
documentos; a ausência de conciliação de cifras (por
exemplo, falta de identificação das dívidas objeto de
renegociações desde a década de 70); o caráter
ilegal da livre circulação de capitais, que está na origem
do aumento da dívida interna a partir de 1995; a violação
dos direitos humanos garantidos pela Constituição, em
função dos imensos recursos destinados ao pagamento da
dívida; o conflito de interesses entre o Banco Central e o setor
bancário privado e outros detentores de títulos da dívida,
que se reúnem para definir as previsões de inflação
e que determina, por sua vez, a taxa de juros. O relatório alternativo
foi apresentado ao Ministério Público Federal e agora há
uma pressão da sociedade civil para que um grupo de trabalho seja
formado, a fim de que as investigações sejam mais aprofundadas. A
CPI constituiu, portanto, uma etapa extremamente importante, uma vez que,
além de reabrir o debate sobre a dívida, nos permitiu ter acesso
a diversos documentos relevantes. Mas a luta não acabou. Continuamos a
exigir o respeito à Constituição de 1988 através da
realização de uma auditoria.
SJ: Dilma Roussef, do PT (Partido dos Trabalhadores), sucederá a Lula a
partir de janeiro de 2011. O balanço do governo Lula é pelo menos
decepcionante: nenhum progresso na reforma agrária, busca de um modelo
extrativista e agro-exportador destrutivo para a natureza, de uma
política fundamentalmente pró-capitalista, para não
mencionar o imperialismo brasileiro na América Latina ou na
África. Dilma vai seguir os passos de Lula?
MLF: Durante a campanha, Dilma disse que iria continuar a política de
Lula, e suas declarações sobre a política econômica
e monetária são consistentes com o regime de cumprimento das
metas de inflação. É uma forma de tranquilizar os mercados
em relação à continuidade do endividamento, pois o sistema
de metas de inflação é a garantia de que o Banco Central
compre o excedente de dinheiro em circulação para conter a
inflação. Um controle dos capitais que entram no país
poderia ser criado para limitar a inflação, mas não
é esse o caminho escolhido. Permite-se a entrada de capitais
especulativos, seja qual for a quantidade, e depois compra-se o excedente
transformando-o em reservas de um lado e de outro em dívida interna.
É realmente lamentável, porque as coisas poderiam ter mudado no
governo Lula, que se beneficiou do apoio popular e teve o mandato para
fazê-lo. Mas Lula tem seguido a política de seu antecessor,
Fernando Henrique Cardoso. Infelizmente, acho que Dilma vai fazer o mesmo. Mas
ela não tem o mesmo carisma que Lula, por isso tenho mais
esperanças nas atividades dos movimentos sociais que foram extremamente
enfraquecidos durante a era Lula. Acho que os movimentos sociais serão
mais ativos e menos complacentes do que o foram com Lula. Daí a
esperança por uma luta mais intensa, de uma pressão maior em
favor de uma mudança progressiva.
08/Fevereiro/2011
Notas
[1] Ver por exemplo o Power Point em inglês realizado para IX
Seminário internacional sobre o direito e a dívida, no Senado
belga:
www.cadtm.org/9th-CADTM-International-Seminar
[2] A partir de Novembro de 2008 o Equador suspendeu o pagamento sobre grande
parte da sua dívida comercial, constituída por títulos
(títulos Global 2012 e 2030), cuja auditoria havia provado que estava
pejada de fraudes e de numerosas irregularidades. Em Junho de 2009, os
detentores de 91% dos títulos em causa aceitaram a proposta de recompra
dos mesmos a 35% do seu valor nominal. Isto representa par o governo uma
economia de 300 milhões de dólares por ano ao longo de 20 anos.
Ver
www.cadtm.org/Les-experiences-en-cours-au
[3] Pelo artigo IV dos seus estatutos, o FMI efectua consultas
periódicas com os países membros, analise a sua política
económica e faz-lhes recomendações.
[4] Nos acordos efectuados com os países membros que solicitam seu apoio
financeiro, o FMI geralmente exige a realização de excedentes
orçamentais primários, ou seja, que o orçamento, antes do
pagamento dos juros da dívida, seja excedentário, mesmo se isso
implicar cortes claros nas despesas sociais.
[5] Em Janeiro de 2010 o Brasil e o FMI assinaram um acordo pelo qual o Brasil
se compromete a emprestar até 10 mil milhões de dólares
através da compra de obrigações emitidas pelo Fundo. Ver o
comunicado de imprensa do FMI:
www.imf.org/external/np/sec/pr/2010/pr1014
[6] Para mais pormenores sobre este mecanismo, ver Éric Toussaint,
Banque du Sud et nouvelle crise internationale. Paris/Liège :
Syllepse/CADTM, 2008, capítulo 1, p. 38-39 e "Banque du Sud,
contexte international et alternatives",
www.cadtm.org/Banque-du-Sud-contexte,1998
http://www.cadtm.org/Banque-du-Sud-...
[7] O serviço da dívida, ou seja, as quantias consagradas ao seu
reembolso, compreende por um lado o reembolso do capital emprestado (diz-se
amortização) e, por outro, o pagamento dos juros.
[8] O IDH é um índice composto que faz a síntese dos
indicadores de esperança de vida, de nível de
instrução e de rendimento.
[9] O artigo 26 do Acto sobre as disposições da
Constituição de 1988, adoptado após duas décadas de
ditadura, dispõe que: "Num prazo de um ano a contar da
promulgação da presente Constituição, o Congresso
da Nação promoverá, através de uma comissão
mista, a análise e a perícia dos actos e factos geradores do
endividamento". Ele precisa que esta comissão terá o
carácter legal de comissão de inquérito parlamentar
associada ao Tribunal de Contas e que, em caso de irregularidade, o Congresso
emitirá uma declaração de nulidade e a transmitirá
ao Ministério Público.
[10] Para um balanço da CPI, ver igualmente "Brasil: que
contribuições da Comissão de parlamentar de
inquérito sobre a dívida?", por Virginie de Romanet:
www.cadtm.org/Bresil-Quels-apports-de-la
[11 Ivan Valente do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) foi do deputado na
origem da criação da CPI. Ver
www.cadtm.org/Bresil-la-Commission-d-enquete
[NR] Um falso problema, como já foi mostrado numerosas vezes por
resistir.info.
[*]
Coordenadora da organização brasileira Auditoria Cidadã da
Dívida. Foi membro da Comissão de Auditoria Integral da
Dívida Pública (CAIC) no Equador em 2007-2008 e participou
ativamente nos trabalhos da CPI (Comissão Parlamentar de
Inquérito) sobre a dívida realizada no Brasil. A entrevista foi
realizada durante a sua permanência na Bélgica. Ver também
o seu
Power Point
(em inglês) apresentado no IX Seminário Internacional sobre o
Direito e a dívida no Senado belga
O original encontra-se em
http://www.cadtm.org/O-problema-da-divida-no-Brasil-nao
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/
.
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