Será que há milhões de uigures detidos na China?
As proclamações contra Pequim de uma ONG apoiada pelos EUA e de um
"investigador guiado por Deus"
por Ajit Singh e Max Blumenthal
[*]
As proclamações de que a China deteve milhões de
muçulmanos uigures são, em grande parte, baseadas em dois
estudos. Um exame mais aprofundado desses documentos revela o apoio do governo
dos EUA, absurdas metodologias e de má qualidade e um investigador
evangélico fundamentalista chamado Adrian Zenz.
A Câmara dos Deputados dos EUA aprovou, em 3 de Dezembro, a lei sobre a
política uigure em matéria de direitos humanos, diploma que insta
a administração Donald Trump a impor sanções contra
a China, com base em alegações de que Pequim deteve
milhões de uigures, na sua maioria muçulmanos, na região
oeste de Xinjiang.
Para suscitar apoio ao programa de sanções, os governos
ocidentais e os media têm retratado a República Popular como um
violador dos direitos humanos, idêntico à Alemanha nazi. O
representante republicano, Chris Smith, por exemplo, denunciou o governo
chinês pelo que chamou o
"internamento em massa de milhões de pessoas, numa escala nunca
vista,
desde o Holocausto"
em
"modernos campos de concentração".
A proclamação de que a China deteve milhões de pessoas da
etnia uigure na sua região de Sinkiang repetiu-se com crescente
frequência, mas os factos não são verificados. Todavia, uma
análise mais aprofundada dos números e da forma como foram
obtidos revela uma grave lacuna nos dados.
Ainda que esta extraordinária proclamação seja considerada
como incontestável no Ocidente, ela é, de facto, baseada em dois
muito duvidosos
"estudos".
O primeiro, proveniente da Rede de Defensores dos Direitos Humanos Chineses,
apoiados pelo governo dos EUA, fez a sua estimativa entrevistando um enorme
total de oito pessoas.
O segundo, baseou-se em inconsistentes relatórios dos media e
especulações. Foi escrito por Adrian Zenz, um cristão
fundamentalista de extrema-direita que se opõe à homossexualidade
e à igualdade de género, apoia as
"palmadas bíblicas"
nas crianças e acredita que é
"guiado por Deus",
numa
"missão"
contra a China.
Enquanto Washington aumenta a pressão sobre a China, Zenz foi retirado
da obscuridade e transformado, quase da noite para o dia, em guru sobre
Sinkiang. Testemunhou perante o Congresso, fez comentários nos
média, desde o
Wall Street Journal
ao
Democracy Now!
e as suas citações são designadas como de perito no
recente relatório
"China Cables"
do Consórcio Internacional de Jornalistas de
Investigação. A sua biografia no
Twitter
observa que
"vem do outro lado do Atlântico",
da sua Alemanha natal.
Antes de o editor da
Grayzone,
Max Blumenthal, ter interrogado Zenz sobre a sua religiosa
"missão",
num recente evento sobre o Sinkiang no interior do Capitólio dos
EUA, tinha ele recebido uma promoção quase inteiramente
acrítica dos media ocidentais.
A Rede Chinesa de Defensores dos Direitos Humanos, que foi a primeira a
popularizar o número de
"milhões de detidos",
também conseguiu operar sem o mínimo escrutínio
dos media.
Uma ONG apoiada por Washington proclama que milhões foram detidos,
após ter entrevistado oito pessoas
O número de
"milhões de detidos"
foi popularizado, pela primeira vez, por uma ONG baseada em Washington,
DC, que é apoiada pelo governo dos EUA, a Rede de Defensores dos
Direitos Humanos Chineses (CHRD [sigla em inglês:
Network of Chinese Human Rights Defenders
]).
Num relatório de 2018, enviado ao Comité das Nações
Unidas para a Eliminação da Discriminação Racial,
muitas vezes erradamente referido nos média ocidentais como um
relatório das Nações Unidas , o CHRD
"estima[va] que, aproximadamente, um milhão de membros da etnia
uigure
foi enviado para campos de 'reeducação' e detenção
e cerca de dois milhões foram forçados a seguir programas de
'reeducação', em Sinkiang".
Segundo o CHRD,
esse número foi
"[b] baseado em entrevistas e dados limitados".
Enquanto o CHRD declara que entrevistou dezenas de uigures no decurso do seu
estudo, essa enorme estimativa era, afinal, baseada em entrevistas com,
exatamente,
oito indivíduos uigures.
Com base nesta amostra, absurdamente pequena, de sujeitos de
investigação numa área cuja população total
é de 20 milhões de habitantes, o CHRD
"extrapola estimativas"
segundo as quais
"pelo menos 10% dos aldeões [
] estão detidos em campos
de
reeducação e detenção, e 20% são obrigados a
participar em campos de reeducação durante a tarde, nas aldeias
ou nos cantões, totalizando 30% nos dois tipos de campos".
Aplicando estas taxas estimadas a todo o Xinjiang, o CHRD chegou aos
números, apresentados à ONU, de um milhão de uigures
detidos em
"campos de reeducação e detenção"
e de mais dois milhões
"forçados a participar, durante a tarde, em sessões de
reeducação".
Graças a fontes duvidosas como o CHRD, o governo dos EUA acusou a China
de
"deter arbitrariamente 800 mil, ou, possivelmente, mais de dois
milhões
de uigures, de cazaques e outros muçulmanos em campos de internamento
destinados a apagar as identidades religiosas e étnicas".
Testemunhando perante o Comité de Relações Exteriores do
Senado, em 2018, o responsável pelo Departamento de Estado, Scott Busby,
declarou que esta
"é a avaliação do governo dos EUA, apoiada pela nossa
comunidade de inteligência e relatórios de fonte aberta".
O governo chinês rejeitou as alegações dos EUA e diz que,
de facto, criou
"centros de educação e de formação profissional
[...] para impedir a proliferação e disseminação do
terrorismo e do extremismo religioso".
O Ministério dos Negócios Estrangeiros da China afirmou
que
"não há, de todo, nenhum chamado 'campo de
reeducação' em Sinkiang. Os centros de educação e
formação profissional que trabalham legalmente em Sinkiang visam
auxiliar um pequeno número de pessoas afetadas por ideologias
terroristas e extremistas e dotá-las de competências que lhes
permitam tornarem-se autónomas e reintegrarem-se na sociedade".
Na sua campanha de crescente pressão contra a China, os EUA não
confiam apenas no CHRD para obter dados; financiam diretamente as suas
operações. Como Ben Norton e Ajit Singh anteriormente mencionaram
a
The Grayzone,
o CHRD recebe um apoio financeiro significativo do braço das
mudanças de regime de Washington, o
National Endowment for Democracy
(NED).
A ONG passou anos a fazer campanhas em nome de figuras da
oposição de extrema-direita, que celebram o colonialismo e apelam
à
"ocidentalização"
da China.
O
"perito líder"
sobre Xinjiang apoia-se em especulações e num
questionável relatório dos media
A segunda principal fonte para proclamar que a China prendeu milhões de
uigures muçulmanos é Adrian Zenz. É um membro
sénior de estudos sobre a China na Fundação Memorial das
Vítimas do Comunismo, de extrema-direita, criada pelo governo dos EUA,
em 1983.
A Fundação Memorial das Vítimas do Comunismo é uma
excrescência do Comité Nacional das Nações Cativas,
um grupo fundado pelo nacionalista ucraniano Lev Dobriansky, para pressionar
contra qualquer esforço de desanuviamento com a União
Soviética. O seu co-presidente, Yaroslav Stetsko, foi um dos principais
dirigentes da milícia fascista OUN-B, que combateu ao lado da Alemanha
nazi durante a sua ocupação da Ucrânia, na Segunda Guerra
Mundial. Juntos, ambos ajudaram a fundar a Liga Mundial Anticomunista, descrita
pelo jornalista Joe Conason como
"o paraíso organizacional para os neonazis, fascistas e extremistas
anti-semitas de duas dezenas de países".
Hoje, a filha de Dobriansky, Paula, integra a administração
daquela Fundação. Ex-funcionária de Reagan e de George HW
Bush e signatária do documento original
Projeto para um Novo Século Americano
, Paula Dobriansky tornou-se uma referência nos círculos
neoconservadores do Capitólio.
No seu escritório em Washington, a Fundação Memorial das
Vítimas do Comunismo agita-se por mudanças de regime, desde a
Venezuela até à periferia da China, avançando com a
teoria do
"duplo genocídio",
que reescreve a história do Holocausto e coloca o comunismo como
um mal mortal, ao mesmo nível do fascismo hitleriano.
As politizadas investigações de Zenz sobre o Sinkiang e o Tibete
tornaram-se uma das armas mais eficazes desse grupo de direita.
Em Setembro de 2018, Zenz escreveu um artigo publicado na revista
Central Asian Survey,
concluindo que
"o número total de internamentos de reeducação no
Sinkiang
pode ser estimado em pouco mais de um milhão".
(Uma versão resumida do artigo foi publicada originalmente pela
Fundação Jamestown, um grupo de reflexão neoconservador
fundado durante o auge da Guerra Fria pelo pessoal da
administração Reagan, com o apoio do então Diretor da CIA,
William J. Casey).
Como o CHRD, Zenz chegou à sua estimativa de
"mais de um milhão"
de forma contestável. Baseou-a numa única reportagem da
Istiqlal TV,
uma organização mediática uigure no exílio, com
base na Turquia, que foi republicada pela
Newsweek Japan.
Longe de ser uma organização jornalística imparcial,
a
Istiqlal TV
avança a causa separatista enquanto hospeda uma série de
personalidades extremistas.
Um desses personagens que aparece frequentemente na
TV Istiqlal
é Abdulkadir Yapuquan, um declarado líder do Movimento
Islâmico do Turquestão Oriental (ETIM), um grupo separatista que
visa estabelecer uma pátria independente no Sinkiang, apelidada
Turquestão Oriental.
O ETIM foi designado como organização terrorista, com
ligações à Al Qaeda, pelos EUA, União Europeia e
pelo Comité de Sanções contra a Al Qaeda do Conselho de
Segurança das Nações Unidas. A Associated Press informou
que, desde
"2013, milhares de uigures ... viajaram para a Síria, para treinar
com o
grupo militante uigure Partido Islâmico do Turquestão e lutar ao
lado da Al Qaeda",
com
"várias centenas de membros do Estado Islâmico".
O Partido Islâmico do Turquestão (TIP) esteve entre as
forças mais recalcitrantes que operam na província de Idlib,
controlada pela Al Qaeda, rejeitando todos os esforços de cessar-fogo,
enquanto doutrina crianças no militantismo. A direção do
TIP apelou aos muçulmanos estrangeiros para que realizem a jihad na
Síria, publicando um vídeo de recrutamento
online,
em 2018, que celebrou os ataques de 11 de Setembro como
retaliação sagrada contra uns decadentes Estados Unidos inundados
de homossexualidade e pecado.
Segundo o
Los Angeles Times,
Yapuquan é
"um convidado regular na TV Istiqlal ... onde as suas entrevistas se
prolongam
frequentemente em tiradas emocionais de várias horas contra a
China".
O jornalista turco Abdullah Bozkurt mencionou que a
Istiqlal TV
também acolheu fanáticos anti-semitas, como Nureddin
Yildiz, que numa entrevista nessa rede
"apelou à jihad armada, não só na região
autónoma de Xinjiang, da China, mas também em todo o mundo, e
descreveu a China como uma nação de selvagens, pior do que os
judeus".
A reportagem da
Istiqlal TV,
sobre a qual Zenz se apoiou, publicou um quadro não confirmado de
"números de detidos em reeducação",
alegadamente
"divulgados"
pelas autoridades chinesas, totalizando 892 mil pessoas em 68
municípios de Xinjiang, na primavera de 2018.
Zenz compila esses dados, citando relatórios da Rádio Ásia
Livre, uma agência de notícias financiada pelos EUA, criada pela
CIA durante a Guerra Fria para fazer propaganda contra a China. (A Lei uigure
sobre os direitos humanos, recentemente aprovada pelo Congresso, mandata a
agência dos EUA para os média mundiais a empresa mãe
da Radio Ásia Livre para fazer um relatório sobre o
Xinjiang, incluindo
"avaliações das estratégias de propaganda
chinesas").
Com o seu ramalhete de fontes questionáveis, Zenz extrapola uma
estimativa extremamente ampla
"entre várias centenas de milhares e pouco mais de um
milhão".
Embora admitindo que
"não há certeza"
na sua estimativa, concluiu que é todavia
"razoável especular".
Contudo, tentou iludir a responsabilidade pessoal pela duvidosa
fiabilidade do número, afirmando que
"[a] exatidão desta estimativa é, bem entendido, baseada na
suposta validade das fontes indicadas".
Ao longo do tempo, Zenz continua a insuflar a sua especulativa estimativa de
detidos uigures. Falando num evento organizado pela missão dos EUA em
Genebra, em março de 2019, Zenz declarou:
"Embora seja especulativo, parece apropriado estimar que até 1,5
milhão de minorias étnicas [foram presas pela China em
Xinjiang]".
Zenz aumentou mais uma vez a sua estimativa numa entrevista à
Radio Ásia Livre, em novembro de 2019, afirmando que a China
detém 1,8 milhão de pessoas.
Numa entrevista à
Der Spiegel,
Zenz afirmou que a China interditou, efetivamente, a prática do
Islão em Xinjiang.
"Qualquer pessoa em Xinjiang, que se envolva em qualquer tipo de
prática
religiosa, qualquer pessoa que tenha um único verso do Alcorão
gravado no seu telefone celular será submetida a um processo brutal de
reeducação, sem julgamento",
afirmou.
Estas proclamações incendiárias deram a Zenz o estatuto de
"perito"
internacional sobre Xinjiang, valeram-lhe convites para testemunhar
perante o Congresso dos EUA e o Parlamento canadiano e fazer comentários
nos principais média norte-americanos, incluindo o
New York Times
, o
Washington Post
, a
CNN
e
Democracy Now
!
Zenz também foi apresentado pelo Consórcio Internacional de
Jornalistas de Investigação (ICIJ) como a principal autoridade a
legitimar a sua recente investigação
"China Cables".
O relatório do ICIJ afirma que
"[os] linguistas e especialistas em documentos sobre Xinjiang, incluindo
Zenz,
que examinaram os documentos exprimiram confiança na sua
autenticidade".
Tendo em conta o hábito de especulação de Zenz e a
questionável fiabilidade do único relatório dos media,
da
TV Istiqlal,
onde apoia as suas estimativas, é preocupante que os governos e os
média ocidentais tenham aceitado e promovido as suas
afirmações, sem qualquer traço de ceticismo.
Um exame mais atento das próprios preconceitos de Zenz deveria ampliar
essas preocupações, pois ele é um integral
evangélico a tempo inteiro, que parece acreditar que Deus o enviou numa
santa cruzada contra a República Popular da China.
Um cristão fundamentalista "guiado por Deus" em missão
contra a China, a homossexualidade e a igualdade de género
Um renascido cristão, que pretende pregar na sua igreja local, Adrian
Zenz é professor na Escola Europeia de Cultura e Teologia. Este
anódino e sonante campus é, na verdade, a base alemã da
Universidade Internacional de Columbia, um seminário cristão
evangélico baseado nos EUA, que considera a
"Bíblia [como] o fundamento último e a verdade final em
todos os
aspetos das nossas vidas",
e cuja missão é
"educar as pessoas numa visão bíblica do mundo, para
promover nas
nações a mensagem de Cristo".
O trabalho de Zenz sobre a China é inspirado por esta visão
bíblica do mundo, como explicou recentemente numa entrevista ao
Wall Street Journal.
"Sinto-me muito claramente guiado por Deus para fazer isto",
disse.
"Posso dizê-lo assim. Não tenho medo de o dizer. Com o
Xinjiang, as
coisas realmente mudaram. Tornou-se como uma missão, ou um
ministério".
Em paralelo com a sua
"missão"
contra a China, orientações celestes têm,
aparentemente, incitado Zenz a denunciar a homossexualidade, a igualdade de
género e a proibição de castigos corporais contra
crianças como ameaças ao cristianismo.
Zenz realçou estes pontos de vista num livro de 2012, de que foi
coautor, intitulado
Worthy to Escape: Why All Believers Will Not Be Raptured Before the Tribulation
[Digno de escapar: por que todos os crentes não serão arrebatados
antes do sofrimento]. Nesse tomo, Zenz discutiu o regresso de Jesus Cristo, a
vinda da cólera de Deus e a ascensão do Anticristo.
Zenz diagnosticou que a futura queda do capitalismo trará o Anticristo
ao poder dentro de
"algumas décadas".
Identificou a força que
"conduzirá o anticristo ao poder"
como
"a queda económica e financeira de 'Babilónia', com a
'Babilónia' a representar, simbolicamente, o sistema económico
mundial (o capitalismo)".
Juntamente com a queda do capitalismo, Zenz considera igualmente o
"relativismo pós-moderno e o pensamento tolerante"
e a sua aparente promoção da homossexualidade, igualdade
de género e da parentalidade não violenta como ameaças ao
cristianismo e
"o poder enganador, como um leopardo atrás do Anticristo".
"É muito provável que a perseguição global dos
verdadeiros crentes se centre na acusação de que promovem
'opções intolerantes'",
escreveu Zenz,
"em particular no que diz respeito à pregação contra a
homossexualidade"
Zenz argumentou que
"leis contra o crime e discriminação virão,
provavelmente,
a desempenhar um importante papel na repressão do cristianismo
bíblico"
e fazem parte de uma
"campanha de 'tolerância' anticristã"
porque
"proíbem os empregadores de discriminar com base no género ou
orientações sexuais".
"O resultado desse processo é a aberta rebelião contra Deus
e as
estruturas de autoridade humana criadas por Deus",
disse Zenz, lamentando que "um crescente número de
países tenham banido todas as formas de punição
física das crianças, o principal método das escrituras
para incutir o respeito à autoridade na jovem geração e
protegê-la de tendências rebeldes. Zenz garante aos leitores que
"a verdadeira tareia bíblica é amor da disciplina e
não
violência".
"Outra importante estrutura de autoridade dada por Deus, que Satanás
ataca através do espírito pós-moderno, é a das
estruturas da autoridade de género",
continuou Zenz.
"Através das noções de igualdade de género
[...] o
inimigo mina a atribuição única, mas diferente, de
papéis para os homens e as mulheres, feita por Deus".
Tendo em conta estes obscurantistas pontos de vista de direita, não
é surpresa que a proclamada preocupação de Zenz com as
condições dos muçulmanos na China não pareça
estender-se aos muçulmanos de outros lugares.
Uma pesquisa no perfil Twitter de Zenz não reencaminha nenhum tweet
sobre o crescimento da islamofobia no Ocidente, nem sobre as guerras e ataques
com drones dos EUA contra os países de maioria muçulmana. O
único tweet de Zenz sobre muçulmanos, não relacionado com
a China, é uma negação de que exista um duplo
padrão na forma como a violência é julgada quando é
cometida por brancos ou por muçulmanos.
"O fim dos tempos é um assunto muito fascinante".
No seu testemunho, em 10 de dezembro de 2019, perante do Comité de
Relações Exteriores da Câmara, Adrian Zenz fez uma
série de esforços, na semana anterior, para a passagem no
Congresso da lei uigure sobre direitos humanos, que impôs novas
sanções ao governo chinês. Citando o sucesso do projeto de
lei, apelou à abertura de uma nova frente contra a China, com uma
investigação dos EUA sobre
"o trabalho involuntário relacionado com Xinjiang".
Nesse mesmo dia, Zenz apareceu também num painel dedicado a Xinjiang,
organizado pela Fundação Memorial das Vítimas do
Comunismo, no Centro de Visitas do Capitólio dos EUA.
Por perto estavam pesos pesados republicanos como Sam Brownback, o
ex-governador do Kansas, ferozmente anti LGBT e anti-aborto, e o atual
embaixador itinerante dos Estados Unidos para a liberdade religiosa, assim como
os funcionários de topo do senador Marco Rubio, padrinho de,
virtualmente, todos os projetos de sanções contra China a serem
carimbados pelo Congresso, nas últimas semanas.
No decurso de uma sessão de perguntas e respostas, o editor-chefe de
The Grayzone,
Max Blumenthal, interrogou Zenz sobre as suas opiniões
fundamentalistas religiosas e a sua política de extrema-direita.
Zenz não se distanciou das suas declarações anteriores,
denunciando a igualdade de género e o
"pensamento tolerante",
nem da sua defesa das
"sovas bíblicas"
às crianças. Em vez disso, afirmou que não havia
incoerência entre essas opiniões e a qualidade das suas
investigações sobre a região chinesa de Xinjiang.
"Tenho bases diversificados e relações pessoais que
não
acredito serem incompatíveis com as minhas
investigações",
respondeu Zenz a Blumenthal.
"De qualquer modo, não apoio os métodos autoritários
da
China e acredito que há um Deus que julga de diferentes formas. O fim
dos tempos é um assunto muito fascinante, muito complexo e, penso, muito
pertinente. E penso que é bom viver ciente disso".
Momentos depois, um jovem visivelmente perturbado levantou-se de seu assento
para
"condenar o tankie
[termo depreciativo dado aos defensores do comunismo NT]
Max Blumenthal
". Desencadeando uma torrente de insultos a Blumenthal, ele não fez
qualquer tentativa para refutar a linha de questionamento do jornalista.
A condenação exibida e rigorosamente aplicada nas câmaras
politicamente herméticas do Capitólio dos EUA abrange
também o conjunto dos media ocidentais, onde, mesmo os supostamente
progressistas, apoiaram Zenz com uma plataforma acrítica.
Dos salões do poder de Washington às principais
redações, poucos estão preparados para permitir que factos
comprometedores atrapalhem uma nova cruzada da Guerra Fria, inegavelmente
baseada na fé.
10/Agosto/2020
[*]
Ajit Singh é advogado e jornalista. Ele é um autor contribuinte
de
Keywords in Radical Philosophy and Education: Common Concepts for Contemporary Movements
[Palavras-chave em filosofia radical e educação: Conceitos comuns
para movimentos contemporâneos] (Brill: 2019). Tuíta em
@ajitxsingh.
O original encontra-se em
thegrayzone.com/...
e a tradução em
pelosocialismo.blogs.sapo.pt/detem-a-china-milhoes-de-uigures-100777
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
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