Venezuela e China Rumo a um mundo multipolar
por Michael Locker
[*]
e Dave Hancock
[**]
A Venezuela actualmente está a tentar romper as cadeias de ferro dos
Estados Unidos e das corporações multinacionais que continuam a
desempenhar um papel dominante na sua economia. O objectivo a longo prazo
é criar um sistema internacional alternativo que promova o
desenvolvimento social além do lucro, promova a soberania produtiva e a
cooperação bilateral além das exigências de vistas
curtas das finanças internacional. A fim de mudar o equilíbrio
global de poder e alimentar o desenvolvimento económico da Venezuela no
interesse do seu próprio povo, Chavez procura forjar fortes
ligações internacionais com outros países em
desenvolvimento para assegurar o capital, tecnologia e perícia
tradicionalmente fornecidos pelas corporações multinacionais e
instituições que ele procura neutralizar. O crescente
relacionamento estratégico da Venezuela com a China é apenas um
exemplo desta tendência emergente.
Movendo-se nesta direcção, a China e a Venezuela anunciaram
recentemente a assinatura de pelo menos oito grandes acordos destinados a
desenvolver laços mais fortes na energia e na economia. Num valor de
aproximadamente US$ 11 mil milhões, cobrem um certo número de
questões estratégicas incluindo o acesso ao petróleo,
à banca e ao transporte.
Em termos de energia, a China investirá cerca de US$ 2 mil
milhões na indústria petrolífera da Venezuela
através da criação de uma
joint venture
chinesa-venezuelana, segundo a Bloomberg News. Esta nova entidade
explorará as reservas de petróleo não aproveitadas da
região de Zumano e da cintura petrolífera do Orinoco. Zumano tem
reservas da ordem dos 400 milhões de barris de petróleo
light
e 4 milhões de milhões
(trillion)
de pés cúbico de gás natural. A PDVSA, companhia
petrolífera estatal da Venezuela, possuirá a maioria do capital
nesta joint venture. Os dois países também formarão uma
joint venture para explorar e certificar uma porção das reservas
de petróleo pesado não aproveitadas da Venezuela, as quais Chavez
diz que podem conter um 235 mil milhões de barris adicionais.
O objectivo explícito deste empreendimento é elevar as
importações chinesas de petróleo venezuelano para 500 mil
barris/dia em cinco anos, uma subida em relação aos actuais 150
mil barris/dia importados pela China. Este relacionamento é
benéfico para a China, que procura uma fonte estável e abundante
de petróleo para atender ao disparo das suas necessidades internas. O
trato também está de acordo com os melhores interesses da
Venezuela pois esta procura diversificar suas exportações de
petróleo, afastando-se da sua dependência em relação
ao mercado dos EUA, os quais actualmente compram aproximadamente 3/4 das suas
exportações diárias de 2 milhões de barris.
Ainda mais importante, este novo empreendimento conjunto permitirá
à Venezuela fazer investimentos dolorosamente necessários na sua
indústria petrolífera. Este investimentos necessários mas
extremamente caros em tecnologica, na infraestrutura e na
exploração de novos, não aproveitados, campos de
petróleo pesado serão conduzidos sem recurso à
perícia e ao apoio financeiro de companhias de petróleo privadas,
as quais estão cada vez mais avessas a fazer investimentos a longo prazo
no contexto da crescente intervenção estatal. Além disso,
os chineses estão numa posição perfeita para ajudar a
Venezuela a explorar as suas difíceis reservas não aproveitadas
devido à sua experiência na 'recuperação de
petróleo aprimorada de campos mais antigos, já com uma longa
vida, segundo Gavin Thompson, consultor de energia da firma Wood Mackenzie.
Os acordos bilaterais assinados pelos governos chinês e venezuelano
têm implicações de grande alcance que vão
além da indústria petrolífera. Além dos US$ 2 mil
milhões reservados para investimento em energia o governo chinês
comprometeu uns US$ 9 mil milhões na construção do sistema
ferroviário da Venezuela, um plano de infraestrutura ligado
intrinsecamente aos ambiciosos objectivos do governo venezuelano de substituir
importações e promover o rápido desenvolvimento industrial
interno.
Os carris com aço de alto teor necessários à
execução deste plano serão produzidos estrategicamente
numa instalação industrial de propriedade do estado chamada
Cidade do Aço
. Localizada no estado de Bolivar, a capital do ferro e do
aço da Venezuela, a Cidade do Aço conterá um certo
número de instalações industriais estratégicas que
um dia compreenderão o "núcleo" do "sector
transformativo" da economia, segundo o governo.
Incluída na Cidade do Aço haverá uma fábrica
moderna de concentração de minério de ferro, a qual
processará o minério para utilizar na produção de
aço. Cerca de US$ 350 milhões foram reservados para esta
fábrica, cuja concepção e construção
estão actualmente a ser supervisionadas por firmas da Espanha e do
Canadá. Toda a fábrica será pronta no fim de 2007, mas
primeira fase está em vias de ser acabada em 1 de Novembro de 2006
antes das próxima eleição presidencial.
Além da fábrica de concentração do minério
de ferro, o governo planeia construir uma siderurgia, uma fábrica de
tubos sem costura e a fábrica de carris. A siderurgia será
destinada a substituir importações e não competirá
com produtores internos. A fábrica de tubos sem costura
abastecerá a indústria de gás natural e petróleo
com os materiais necessários aos seus planos de expansão, os
quais estão intrinsecamente ligados ao empreendimento conjunto
venezuelano-chinês acima mencionado. A fabrica de carris estará
voltada para as necessidades do planeado sistema ferroviário nacional, o
qual, como foi mencionado, está a ser financiado em parte com os US$ 9
mil milhões de investimento directo do governo chinês.
Além de financiarem o projecto, os chineses estão numa
posição forte para contribuírem com a sua própria
perícia técnica e experiência prática no
desenvolvimento de redes ferroviárias extensas.
Organizados como Empresas de Produção Social, cada um destes
negócios estará sujeito à co-administração
operária e modos menos hierárquicos de organização
interna. O governo estima que a Cidade do Aço gerara uns 2770 empregos
directos e outros 8310 empregos indirectos e acabará por custar mais de
US$ 2 mil milhões.
Estas empresas estatais na Cidade do Aço constituirão uma parte
essencial da política do governo venezuelano de "desenvolvimento
endógeno", a qual procura alcançar "soberania
produtiva" através da promoção da
substituição de importações e do desenvolvimento da
indústria interna. Segundo Victor Alvarez, antigo ministro venezuelano
das Indústrias Básicas e Minas, "o objectivo é que
não importemos nem um grama de alumínio ou um quilograma de
madeira", acrescentando: "Em 2012... deveríamos estar a
processar 100 por cento dos nossos materiais primários, dos nossos
produtos básicos neste país".
Em acréscimo aos acordos já analisados, a China e a Venezuela
estão em conversações para criar um mecanismo permanente
para outra assistência bilateral ao desenvolvimento na forma de um
"fundo estratégico de cooperação bilateral".
Este fundo seria concebido para contornar a influência de
instituições financeiras americanas e europeias e seria
semelhante ao fundo conjunto de US$ 2 mil milhões de dólares
criado recentemente pelo Irão e a Venezuela.
Ao contrário das afirmações dos seus críticos, a
visão de Chavez do "desenvolvimento endógeno"
não é de anti-globalização ou de isolamento
internacional. Ao invés disso, como demonstrado pelo desenvolvimento
das suas relações coma China e outros países, o modelo
venezuelano rejeita o papel tradicional do capital financeiro ocidental e do
poder das corporações multinacionais a fim de promover uma nova
ordem internacional fundada sobre os princípios da
cooperação bilateral, da assistência mútua, da
soberania produtiva e do desenvolvimento social.
16/Outubro/2006
[*]
Presidente da
Locker Associates Inc.
, firma de consultoria económica com sede em Nova York.
[**] Estudante na Gallatin School of Individualized Study, na New York
University.
O original encontra-se em
http://www.venezuelanalysis.com/articles.php?artno=1853
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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