As primorosamente balanceadas conversações de Minsk sobre a
Ucrânia
A missão da chanceler Angela Merkel em Kiev era longe de fácil.
Merkel ali foi
sob a pressão
do presidente Barack Obama, efectuada na véspera da sua viagem.
Bastante obviamente, os EUA sentiram-se excluídos dos esforços
para o estabelecimento da paz. Washington imediatamente condenou no Conselho de Segurança da ONU a
decisão do Kremlin para evitar as tácticas de adiamento dos EUA, afirmando que a entrega de abastecimentos
humanitários ao Leste da Ucrânia era um acto em
"violação do direito internacional" e retoricamente
exigiu
que o comboio retornasse à Rússia (embora ele realmente
já tivesse retornado).
Merkel no entanto continuou a sua missão. Sua escolha do dia 23 de
Agosto para visitar Kiev foi, afinal de contas, altamente simbólica. Ela
observou publicamente que um chancelar alemão visitou a Ucrânia
numa data tão pungente da história, o que mostrava como as coisas
haviam mudado no período de 75 anos decorrido desde o pacto de
não agressão Molotov-Ribbentrop de 23/Agosto/1939.
Moscovo ficará satisfeita com o resultado da missão de Merkel.
Ela
endossou fortemente as conversações em Minsk
na quinta-feira entre o presidente russo Vladimir Putin e seu homólogo
ucraniano Petro Poroshenko, ela enfatizou a necessidade de um cessar-fogo no
Leste da Ucrânia. Ainda mais importante: ela apelou a
mudanças constitucionais
na Ucrânia que permitissem autonomia para o Leste da Ucrânia. Aqui
há uma identidade de vistas entre Moscovo e Berlim.
As observações da chefe da política externa da
União Europeia, Catherine Ashton, também são muito
oportunas e enormemente significativas que nas
conversações de Minsk pretendia aconselhar Poroshenko a que a
Ucrânia mantivesse "boas relações com seus vizinhos
russos". (
aqui
)
O cenário das conversações de Minks parece prometedor.
Naturalmente, nenhuma mudança radical é provável, como
acautelou Merkel, mas um cessar-fogo nas operações militares no
Leste da Ucrânia é provável, o qual está no topo da
agenda da Rússia. Merkel insistiu na necessidade do cessar-fogo.
Poroshenko, que esta constantemente a ser incitado pelo vice-presidente dos
EUA, Joe Biden, a avançar com as operações militares no
Leste da Ucrânia, nesta altura também estaria a sentir que o
conflito está a tornar-se demasiado sangrento e que é do seu
próprio interesse político efectuar as eleições
parlamentares em Outubro numa atmosfera de calma. Em suma, como
sugerem as notícias
, as coisas estão um tanto quanto delicadamente equilibradas.
Contudo, a grande questão permanece. Será que os EUA
desistirão de minar o processo de Minsk? Claramente, é uma
desmoralização que os EUA fiquem do lado de fora da tenda. Mas
então, este embaraço é uma situação
difícil auto-infligida e uma correcção de rumo ajudaria.
A maior parte dos peritos concorda que as três suposições
sobre as quais as políticas dos EUA foram baseadas revelaram-se
ilusórias que Putin ficaria "isolado" e render-se-ia ao
diktat do Ocidente; que as sanções aterrorizariam o Kremlin e o
forçariam a gritar "ó tio"; e que os militares
ucranianos teriam êxito em tomar o controle do Leste da Ucrânia. (
aqui
)
A parte mais triste é que os EUA nada alcançaram em nome da
"democracia" ao derrubarem o governo eleito de Viktor Yanukovish. Um
conjunto de oligarcas detestados foi substituído por outro igualmente
repulsivo. Disto simplesmente, os oligarcas
continuam a clamar por tiros
na Ucrânia e desta vez sob todos os aspectos é o Ocidente que
está a ter de carregar com a embrulhada
(can of worms).
Não há dúvida, a Ucrânia destaca-se como um dos mais
bizarros fracassos de política externa da administração
Obama. Mas por outro lado, as raízes são profundas e se há
um par de pessoas a serem responsabilizadas, não é tanto o
próprio Obama, pode-se argumentar, mas o duo do antigo presidente Bill
Clinto e sua famosa "mão russa" (e amigo dos dias de Oxford)
Strobe Talbott, o qual arruinou as infinitas possibilidade da era pós
Guerra fria de criar uma ordem mundial harmoniosa.
John Mearcheimer, o respeitado académico especializado em Rússia
da Universidade de Chicago, escreveu um ensaio brilhante intitulado
"Porque a crise na Ucrânia é a falha do Ocidente; As
ilusões liberais que provocaram Putin"
("Why the Ukraine Crisis Is the West's Fault: The Liberal Delusions That
Provoked Putin)"
no último número da revista
Foreign Affairs,
delineando como de uma perspectiva histórica e no contexto imediato da
Ucrânia, o conluio Clinton-Talbott na Casa Branca deveria ser considerado
responsável pela crise de hoje.
Mearsheimer cita nada menos que a figura icónica da era
soviética, o diplomata-académico George Kennan, a advertir contra
a desastrosa ideia brilhante de Talbott de pressionar pela expansão da
NATO para Leste "Penso que os russos reagirão gradualmente
de modo bastante adverso e isto afectará suas políticas. Penso
que é um erro trágico. Não havia qualquer razão
para isto. Ninguém estava a ameaçar o outro".
A questão hoje reduz-se a se Obama tem o desejo, o capital
político (ou o temperamento) para forçar sua vontade sobre a
estranha aliança entre os neocons e os liberais em DC e para desactivar
a bússola dos laços com a Rússia. Mearsheimer escreve:
"Entretanto, há uma solução para a crise na
Ucrânia embora exigisse que o Ocidente pensasse acerca do
país de um modo fundamentalmente novo. Os EUA e seus aliados deveriam
abandonar seu plano para ocidentalizar a Ucrânia e, ao invés, dela
fazer um amortecedor
(buffer)
entre a NATO e a Rússia, semelhante à posição da
Áustria... Isto não significaria que um futuro governo ucraniano
teria de ser pró russo ou anti NATO. Ao contrário, objectivo
deveria ser uma Ucrânia soberana que não caia nem no campo russo
nem no ocidental. Para alcançar este fim, os EUA e seus aliados deveriam
publicamente descartar a expansão da NATO tanto à Geórgia
como à Ucrânia... E o Ocidental deveria limitar consideravelmente
seus esforços de engenharia social no interior da Ucrânia.
Já é tempo de acabar com o apoio ocidental a outra
Revolução Laranja".
Isto pode soar como uma abordagem razoável e certamente factível,
mas ela parece enganosamente simples e pode, portanto, permanecer
improvável na medida em que a questão da expansão da NATO
também envolve o futuro da parceria transatlântica e o papel de
liderança dos EUA no século XXI.
Certamente Merkel está a andar numa linha fina. Na sua
conversação telefónica com Obama pouco antes de sair para
Kiev, este último não disse nem uma palavra de apoio às
próximas conversações em Minsk. Ao contrário, Obama
parecia fazer-lhe uma exortação.
Dito isto, Obama é um pragmático por excelência. De forma
alguma é um guerreiro frio no molde ideológico de Talbott.
Segundo Patrick Cockburn do jornal
Independent,
aqui
, Obama permitiu que informações da inteligência dos
EUA chegassem ao regime sírio para suas operações
militares contra o Estado Islâmico do Iraque e do Levante. Por uma
estranha coincidência, os EUA aparentemente utilizaram o canal da
inteligência alemã para alcançarem o regime sírio.
25/Agosto/2014
Ver também:
Pourquoi les Ukrainiens ne se soulèvent-ils pas dans le reste de l’Ukraine? Où en est la contre-offensive de la Nouvelle Russie?
O original encontra-se em
blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2014/08/25/minsk-talks-on-ukraine-finely-poised/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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