por Rui Namorado Rosa
"Os japoneses já estavam derrotados".
Almirante Leahy, da U.S.Navy
A INVENÇÃO DAS ARMAS NUCLEARES E O PROGRAMA NUCLEAR
NORTE-AMERICANO
Não existem armas de destruição em massa como as nucleares.
A possibilidade de libertar energia nuclear foi descoberta pouco antes dos
inícios da Segunda Guerra Mundial por cientistas europeus, sobretudo
alemães e ingleses. Em 1942, foi concebido e decidido pela
administração norte-americana o projecto de
invenção e fabrico de armas com combustíveis nucleares,
cerca de um milhão de vezes mais potentes que os combustíveis e
explosivos químicos tradicionais. Esse projecto denominado Manhattan,
dirigido pelo general Leslie Groves e o físico Robert Oppenheimer, foi
realizado por uma equipa de dezenas de alguns dos melhores cientistas
norte-americanos, vários deles europeus emigrados nos EUA, em
colaboração com cientistas ingleses e canadianos. Os
laços de cumplicidade político-militar entre os EUA e o RU foram
mantidos desde então até à actualidade. O projecto foi
conduzido secretamente nos Laboratórios de Oak Ridge (Tennessee) e de
Los Álamos (Novo México), e em Hanford (Washington) e algumas
outras instalações mais, mobilizando mais de cem mil
trabalhadores que desconheciam os objectivos concretos de tal projecto militar
e secreto.
O complexo responsável pelo programa nuclear alargou-se depois ainda
mais. Ao longo de quarenta anos, as armas foram concebidas e montadas nos
Laboratórios Nacionais de Los Álamos, no Novo México (a
larga maioria), de Lawrence Livermore, na Califórnia, e Sandia, em
Albuquerque, com o apoio de uma rede de outras infra-estruturas, com relevo
para os Laboratórios de Oak Ridge, em Tennessee, Savannah River Site, na
Carolina do Sul, Rocky Flats Facility, no Colorado. As principais
variações ensaiadas na concepção das bombas foram a
forma química/metalúrgica e a combinação
proporção/geometria entre combustíveis físseis
(plutónio 139 e urânio 235) e fusíveis (deutério e
trítio). A evolução procurou incrementar o poder
explosivo; da primeira bomba operacional lançada em Hiroshima até
às maiores super-bombas termonucleares ensaiadas, o poder destrutivo foi
multiplicado mais de 1.000 vezes. A evolução procurava
também incrementar a eficiência (poder explosivo por quantidade de
carga combustível) e a compacticidade; entre o primeiro teste de Trinity
e uma comparável bomba actual de 20 quilotoneladas TNT, vai a
diferença de 5 toneladas para 100 kg, ou seja, de um bombardeiro para
uma mala de viagem.
O programa nuclear norte-americano envolveu um longo rol de ensaios de armas.
Desde 1945 até Setembro de 1992 (quando foram suspensos), realizaram-se
o espantoso número de 1.054 testes (dos quais 24 conjuntos com a
Grã-Bretanha), a larga maioria num perímetro reservado no deserto
do Nevada (928 testes) não muito longe de Las Vegas. Desde 1957 os
testes são subterrâneos. Mas enquanto foram acima do solo, os
testes foram minuciosamente examinados não só do ponto de vista
da potência libertada por carga explosiva, como também dos pontos
de vista dos efeitos do choque das ondas de pressão e térmica
sobre estruturas físicas, como edifícios e veículos, e das
radiações ionizantes e substancias radioactivas sobre seres
vivos, incluindo homens.
A ARMA NUCLEAR NO CURSO DA GUERRA MUNDIAL
Inicialmente, a arma nuclear foi desenvolvida pelos EUA para antecipar o seu
eventual desenvolvimento pela Alemanha. Porém, com a vitória dos
aliados na Europa e a rendição da Alemanha a 8 de Maio de 1945, e
perante a perspectiva iminente de a União Soviética
avançar então na frente do Pacífico contra o Japão
de facto essa declaração de guerra ocorreu a 8 de Agosto
, os EUA decidiram precipitar a rendição do Japão a
todo o custo. Deu-se uma viragem dramática no curso da história:
o que seria uma arma dissuasora frente à Alemanha tornou-se em arma
táctica para derrotar o Japão e arma estratégia para
"conter" a União Soviética na frente Oriental.
Para contextualizar essa viragem histórica, recordemos dois marcos
importantes na preparação do termo da Segunda Guerra Mundial: as
Conferências de Yalta e de Postdam. Na Conferência de Yalta, de 7 a
14 de Fevereiro de 1945, Joseph Staline e Franklin Roosvelt haviam acordado que
a URSS entraria na guerra contra o Japão três meses após o
término da guerra na Europa. Mas com a morte de Franklin Roosevelt, que
fora o protagonista norte-americano na Conferência de Yalta, o
vice-presidente Harry Truman assumiu a presidência dos EUA a 12 de Abril
de 1945. A Alemanha capitulou a a 8 de Maio e Truman foi o novo protagonista
norte-americano na Conferência de Postdam, já em território
Alemão, de 17 de Julho a 2 de Agosto. Aí foi duramente discutida
a conclusão da guerra e equacionada a nova ordem internacional
emergente. A arma nuclear (ainda secreta) não foi formalmente referida
mas estava subentendida nas negociações diplomáticas; a
sua próxima utilização seria um acto intencional dos EUA
para
influenciarem em sua vantagem a configuração dessa nova ordem
internacional que estava para nascer.
Depois de um só teste de demonstração realizado no deserto
da Alamogordo (Novo México) a 16 de Julho de 1945 (com um dispositivo
denominado "Trinity") duas bombas foram pouco depois lançadas
sobre Hiroshima e Nagasaki no Japão, a 6 e 9 de Agosto a primeira
uma bomba de urânio enriquecido apelidada "Little Boy" a
segunda uma bomba de plutónio apelidada "Fat Man". A
Conferência de Postdam surge pois sinistramente entrelaçada com as
decisões secretas de os EUA testarem e lançarem essas bombas
sobre o Japão.
Os alvos então escolhidos foram cidades que não tinham especial
valor militar e estavam relativamente intocadas por anteriores bombardeamentos.
As muitas experiências que eram e continuaram a ser conduzidas sobre os
efeitos biológicos das radiações ionizantes e das
substancias radioactivas sobre cobaias humanas populações
prisionais, soldados e outras "amostras" desprevenidas ,
sugerem que os bombardeamentos daquelas cidades representaram também
mais uma mas gigantesca "experiência" sobre tais efeitos
biológicos. Esses bombardeamentos representaram também testes
sobre a capacidade de destruição física "em
condições reais". Sem esquecer que o grande objectivo
militar imediato era então, de facto, forçar a
rendição do Japão e evitar a entrada da União
Soviética na Guerra na frente Oriental e Pacífico. Com efeito, o
Japão rendeu-se aos EUA logo a 15 de Agosto.
A URSS, de acordo com a Conferência de Yalta, entraria na guerra contra o
Japão três meses após o término da guerra na Europa.
A declaração de guerra e o início dos combates tiveram
lugar a 8 de Agosto dois dias depois do bombardeamento de Hiroshima e um
antes de Nasgazaki. A nova arma secreta deixara de o ser e, em lugar desse
segredo, passaram a figurar dois actos de guerra inesquecíveis, duas
colossais tragédias.
O Império Japonês no final década de 1930 compreendia o
Arquipélago Nipónico, a Coreia, numerosas Ilhas e
Arquipélagos no Pacífico Ocidental (Sakalina, Kurilas, Marianas,
Okinawa, Guam, etc.) e detinha influência protectora sobre a
Manchúria.
Os inícios da Segunda Guerra Mundial foram assinalados, entre outros
conflitos e agressões, pela tentativa de o Japão invadir a URSS.
O conflito desencadeou-se na fronteira entre a Mongólia e a
Manchúria, entre as forças soviéticas e aliados
mongóis e as forças japonesas e aliados manchus, na dura batalha
de Halhin Gol, durante os meses de Julho e Agosto de 1939. O Japão
sofreu uma pesada derrota que teve grande alcance, pois levou-o a desistir de
atacar a URSS para, em alternativa, dirigir o seu esforço de guerra para
o Sudeste Asiático, na procura de fontes de abastecimento. Como
consequência, a URSS e o Japão assinariam um pacto de não
agressão em Abril de 1941, válido por cinco anos, que libertou
forças soviéticas para o esforço de guerra na frente
Ocidental.
Em Abril de 1945 a URSS notificara o Japão do
cancelamento do tratado de neutralidade e, após o fim da guerra na
frente Ocidental, as tropas soviéticas estacionadas na Mongólia
foram reforçadas com um milhão e meio de soldados e 5.500 carros
de combate, transportados a partir da frente Ocidental. Iniciado o ataque
soviético na frente Oriental a 8 de Agosto de 1945, justamente
três meses após o termo da guerra na frente Ocidental, como
acordado em Yalta, em oito
dias apenas as tropas soviéticas progrediram 400 km e a 16 de Agosto
estabeleceram contacto com o Exército Vermelho Chinês, que
resistia à invasão japonesa. O Japão rendeu-se formalmente
perante as tropas soviéticas a 2 de Setembro. O avanço fulgurante
das tropas terrestres, com apoios aéreos e navais, assegurou a
ocupação da Manchúria, parte Norte da Península da
Coreia, Ilha de Sakalina e Ilhas Kurilas e comprovou que o Japão estava
militarmente derrotado independentemente dos inopinados bombardeamentos
nucleares. Essa intervenção da
URSS, tendo decorrido conforme os acordos de Yalta, conferiu à URSS o
direito a reter os territórios da Ilha Sakalina e das Ilhas Kurilas, em
disputa com o Japão, e ainda Porto Arthur.
A Manchúria, sob influência soviética, serviu como base de
operações preciosa para o Exército Vermelho de Mao Zedong,
que quatro anos mais tarde, em Dezembro de 1949, saiu vitorioso da longa guerra
civil Chinesa. Todos os territórios inicialmente ocupados pelas
forças soviéticas na China foram depois entregues à nova
República Popular da China.
Infelizmente, ficou provado da forma mais trágica que a utilidade
militar da arma nuclear passa pelo genocídio de grandes
populações civis. Fora inventada e utilizada a maior arma de
destruição maciça.
AS ARMAS NUCLEARES NA GUERRA-FRIA
Os EUA procuraram manter o segredo e o monopólio nuclear. Porém
uma bomba nuclear soviética veio a ser testada a 29 de Agosto de 1949 no
Cazaquistão. Perdido o monopólio, a reacção dos EUA
foi a de preocupação e, mais sinistramente, a da caça
às bruxas o macartyismo - e a decisão de desenvolver
rapidamente uma arma nuclear muito mais poderosa ainda a bomba
termonuclear ou bomba de hidrogénio. A caça às bruxas foi
expressão extrema de campanha de propaganda e de agressão
ideológica, em que foram imoladas as carreiras de dezenas de cientistas,
de centenas de homens e mulheres progressistas e as vidas do casal Rosenberg.
O primeiro teste do novo conceito termonuclear foi levado a cabo a 1 de
Novembro de 1952, num atol das Ilhas Marshall que ficou apagado do mapa, e
contaminou milhares de pessoas entre populações vizinhas e
japoneses. Todavia, menos de um ano depois, a União Soviética
realizou um teste comparável (12 Agosto de 1953). Estava em curso uma
corrida a armas capazes de aniquilar não só cidades inteiras mas
extensas áreas metropolitanas e causar mesmo impactos a nível
planetário "O Inverno Nuclear".
O desenvolvimento das armas nucleares acelerou também o desenvolvimento
de vectores para o seu lançamento, no decurso da década de 1950,
primeiro, os aviões bombardeiros de longo alcance, depois, os
mísseis balísticos ICBM com os EUA tomando a
dianteira nos bombardeiros e a URSS nos mísseis. Essa corrida esteve na
origem da "exploração do espaço", cujo
início ficou assinalado com o lançamento do primeiro
satélite artificial da Terra Sputnik, em 1957. O espaço
exterior revelou-se ser um novo terreno da maior importância militar.
Em breve, outros países procuraram desenvolver armas nucleares. O RU,
dada a sua íntima ligação aos EUA, realizou o seu primeiro
teste logo em 1952, e a França em 1960. A R. P. China realizou o seu
primeiro teste nuclear e termonuclear, em 1964 e 67. A Índia encenou um
primeiro teste em 1974; tanto a Índia como o Paquistão ensaiaram
bombas reais em 1998, quase em simultâneo. Os EUA acusam a R.I.
Irão e a R. Coreia do Norte de estarem a dotar-se de capacidades para o
desenvolvimento de armas nucleares. Mas sabe-se que Israel desenvolveu (desde
1957) e detém um arsenal de algumas centenas de tais armas, e que a R.
África do Sul dispôs já delas, para posteriormente a elas
renunciar (1991). Entretanto, estes vários países adquiriram
já capacidade de lançamento (mísseis) ou estão a
desenvolvê-la.
Na década de 1960, face à multiplicação de
"novos actores", foram prosseguidos esforços
diplomáticos e alcançados progressos significativos no sentido de
disciplinar, conter e eventualmente fazer regredir a corrida às armas
nucleares, e de facto foi acordado o importante Tratado de Não
Proliferação NTP.
Nas décadas de 1970 e 1980, no quadro da dissuasão mútua
entre os dois grandes blocos político-militares, pouco progresso foi
registado no sentido do desarmamento e da desnuclearização. A
década de 70 foi caracterizada pela "détente", em que o
equilíbrio de forças e o início da recessão
económica encorajou a redução (temporária) das
despesas militares e dos arsenais nucleares. Os tratados SALT I e II e START
limitavam numericamente os arsenais militares e o âmbito de ensaio e
utilização das armas nucleares (nomeadamente sistemas
anti-balísticos e armas no espaço); mas o cumprimento e os
resultados destes tratados foram insatisfatórios e o curso dos
acontecimentos iria regredir.
No fim da década de 70, os EUA retomaram a iniciativa da corrida
armamentista; rejeitaram o desarmamento, relançaram novas armas e
lançaram o sistema anti-balístico baseado no espaço
Iniciativa de Defesa Estratégica, mais conhecido por "guerra das
estrelas" (Março de 1983). A par da modernização de
mísseis de alcance intermédio com ogivas múltiplas
(SS-20), por parte da URSS, a NATO estacionou na Europa mais de meio milhar de
ogivas nucleares tácticas, veiculadas por mísseis de cruzeiro
(GLCM) e mísseis balísticos Pershing II. A inicio da
década de 80 seria de grande tensão na Europa, que mobilizaria os
esforços de movimentos pacifistas e anti-nucleares, tensão
só atenuada pelo Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance
Intermédio (INF) que, após laboriosas negociações,
em 1987 proibiu a instalação de mísseis terrestres
balísticos e de cruzeiro com ogivas nucleares com alcance entre 500 e
5.500 km.
No quadro de recessão económica mundial (que persiste até
hoje) e pressionada por esta corrida armamentista, a URSS entrou em profunda
crise político-económica, que contribuiu para o colapso do bloco
socialista no início da década de 90.
Iria iniciar-se a ainda mais perigosa época do poderio capitalista
unipolar a Pax Americana.
A CORRIDA ARMAMENTISTA E A LUTA PELO DESARMAMENTO NUCLEAR
A luta pela Paz, contra o militarismo e a corrida armamentista, ganhou
acrescida urgência com e emergência de novas armas de
destruição maciça, as armas nucleares à frente de
todas as demais. Havendo razão histórica, não há
fundamento moral para que alguns países tenham reconhecido o direito
à posse de armas nucleares e outros não, para mais quando o poder
ciclópico de destruição dessas armas é uma
ameaça à sobrevivência da humanidade. A diplomacia e o
direito internacional, no quadro das Nações Unidas, procurou
rectificar essa assimetria e essa ameaça intoleráveis, e promover
o desarmamento gradual, equilibrado e completo mas só enquanto a
correlação de forças o permitiu. Vivemos presentemente um
intervalo entre parêntesis na história humana, de que só
pela Paz poderemos escapar.
O primeiro tratado internacional, condicionante de ensaios com armas nucleares,
foi o Tratado de Banimento Parcial de Testes Nucleares (PTBT), formulado e
subscrito em 1963, visando limitar o alcance dos graves danos que muitas
centenas de testes entretanto realizados, sobretudo na atmosfera, haviam
já provocado. Eram excluídos testes na atmosfera,
subaquáticos e no espaço exterior; só testes
subterrâneos seriam doravante autorizados. Porém alguns
países, particularmente a China e a França, não
subscreveram.
Um passo importante no sentido da não proliferação foi
dado cinco anos mais tarde, com o TNP. O Tratado de Não
Proliferação (NTP), que visa a
não-proliferação, o desarmamento, e o direito à
utilização pacífica da energia nuclear; teve como primeiro
signatário a Irlanda em 1968 e congrega actualmente 189 estados.
Porém três estados que detêm tais armas persistem até
hoje em recusar assinar este tratado: Índia, Paquistão e Israel;
a R. África do Sul, renunciou ao seu arsenal e subscreveu o tratado em
1991.
Com o termo da "Guerra-Fria", no novo contexto geopolítico
mundial a Assembleia-Geral da ONU, em 1993, promoveu o início de
negociações conducentes ao desarmamento nuclear, procurando
conciliar a divergência e tensão entre os que argumentavam contra
a proliferação "vertical" (mais e novas versões
de armas por parte de potências nucleares) e os que argumentavam contra a
proliferação "horizontal" (novos países aderindo
ao desenvolvimento ou acolhendo armas nucleares). Essas
negociações conduziram finalmente ao CTBT em 1996. Este Tratado
para a Proibição Integral de Testes Nucleares (CTBT),
proíbe novos ensaios em quaisquer ambientes e para fins tanto militares
como civis. Ele responde positivamente ao desejo mais fundo de banimento
completo dos explosivos nucleares, pela primeira vez enunciado por Nehru em
1954 (só vinte anos mais tarde o seu país embarcou no
desenvolvimento de tais armas). Foi subscrito por 71 estados em 10 de Setembro
de 1996; uma vez mais, Índia e Paquistão declinaram. Os EUA, que
não aceitam o respeito pelos compromissos internacionais anteriormente
assumidos nem a sujeição a novos compromissos que limitariam a
sua "liberdade" de desenvolver e testar novos tipos de armamentos,
consequentemente recusaram a ratificação do CTBT
(deliberação do Senado norte-americano de 13 de Outubro de 1999).
Na mais recente conferência das partes do TNP, em Maio de 2005,
confrontou-se de novo a posição unilateral dos EUA, que focaram a
atenção na proliferação horizontal, e concretamente
alegaram contra o Irão e a Coreia do Norte, contra a
posição da maioria dos países, que conferiu prioridade ao
desarmamento das potências nucleares e denunciou a ilegalidade da
partilha de meios entre países no seio da NATO (que corresponde, de
facto, a uma forma de proliferação horizontal).
A "NOVA" ESTRATÉGIA NUCLEAR NORTE-AMERICANA
A
Nuclear Posture Review
NPR (iniciado em Outubro 1993, e parcialmente revelado ao Congresso em
Janeiro 2002) redefine com renovado entusiasmo o papel central das armas
nucleares na defesa dos EUA, incluindo a intenção de desenvolver
e mesmo testar novas armas com novas finalidades tácticas e
estratégicas, e a assumpção do princípio de "
first strike
" (primeiro a utilizar), o que significa a adopção das armas
nucleares como armas ofensivas e não mais como dissuasoras ou
preventivas.
O NPR estabelece o quadro de referência para a estratégia nuclear
dos EUA, nível de forças e infra-estruturas no horizonte de dez
anos. Preconiza revisões substanciais quanto à dimensão e
composição das forças nucleares no sentido do
reforço da sua flexibilidade e prontidão, permitindo o
Pentágono criar novos planos de ataque e tê-los rapidamente
autorizados pelo Presidente em caso de "crise". Desde o
ressurgimento da Guerra-Fria aquando da primeira administração
Reagan, não havia comparável enfoque em armas nucleares na
estratégia da "defesa" norte-americana. O NPR conduz a novas
capacidades nucleares, ao possível recomeço dos testes nucleares,
e admite a utilização da arma nuclear contra estados não
nuclearizados na presunção da capacidade de fabricarem armas de
destruição em massa. Mas que outra arma de
destruição maciça se compara com a arma nuclear? Em
escala de vítimas humanas, no imediato e em diferido (vítimas das
radiações ionizantes e de contaminação
radioactiva), e em escala de destruição física de
infra-estruturas, tornando inabitáveis os seus alvos? Este plano de
política nuclear não poderá deixar de desacreditar os
esforços para persuadir outros estados a não prosseguirem os seus
próprios esforços para obterem também armas nucleares e a
aceitarem o tratado de Não Proliferação.
À luz desse documento de política nuclear, os EUA não
respeitarão compromissos internacionais já assumidos nem
tão pouco se sujeitarão a novos compromissos que possam limitar a
sua "liberdade" de desenvolver e testar novos tipos de armamentos.
Tudo indica, que sancionado pela
Nuclear Posture Review
e financiado pelo Congresso dos EUA, os laboratórios e demais
infra-estruturas do complexo nuclear norte-americanas recomeçarão
em breve a fabricar elementos de plutónio e trítio, para
renovação do velho" arsenal nuclear, e desenvolvimento de
novos conceitos de armas nucleares tácticas e estratégicas, que
implicarão e regresso aos testes nucleares.
Entretanto, já antes de o NPR ser presente ao Congresso norte-americano,
a administração havia anunciado o abandono do Tratado sobre
Mísseis Anti-Balísticos (ABM) e a recusa de ratificar o Tratado
de Proibição Integral de Testes Nucleares (CTBT). Com o novo
enunciado da política nuclear, a comunidade internacional já nem
pode presumir que os EUA cumprirão os seus compromissos de desarmamento
previsto no regime de não-proliferação. A credibilidade e
viabilidade dos instrumentos jurídicos internacionais estão
postas em causa. O perigo nuclear agravou-se em todo o mundo.
A "NOVA" NATO
Após o fim da "Guerra-Fria" a natureza da NATO não
mudou. Criada em 1949, foi então acto de constituição
formal do novo "império americano" que delineou as suas
fronteiras; afirmava o objectivo de contenção estratégica
da "ameaça" comunista, valendo-se da capacidade ofensiva
conferida pelo monopólio da arma nuclear. A aliança à data
reconhecia na URSS uma ameaça com grande vantagem em armamento
convencional para a ela contrapor a "vantagem" da ameaça de
armas nucleares. A disposição de a NATO tomar a iniciativa de
utilização da arma nuclear em caso de conflito está
patente desde os primórdios da aliança.
O Pacto de Varsóvia foi constituído só em 1955 e
dissolver-se-ia em Julho de 1991. Pouco depois (Dezembro) a União
Soviética desintegrou-se numa "comunidade de estados
independentes". A NATO iria prosseguir, no novo contexto, o avanço
político e militar a Leste, ainda que confrontando-se com a
oposição de movimentos pacifistas e anti-militaristas e o
questionamentos por parte dos governos de alguns estados membros
(designadamente Alemanha e Itália). Dos países do anterior Pacto
de Varsóvia, três foram assimilados na NATO em 1997 e seis outros
em 2004. Mantém armas nucleares norte-americanas estacionadas na
Alemanha, RU, Bélgica, Países Baixos, Itália,
Grécia e Turquia, partilhando a responsabilidade de estacionamento e
utilização, assim contrariando o TNP, mas sob o alto comando
norte-americano. O alargamento a Leste, com a possibilidade de
instalação de armas nucleares em territórios anteriormente
não nuclearizados, só vem evidenciar e agravar o carácter
agressivo da NATO e a impotência do quadro legal internacional.
A NATO prevaleceu e, de aliança alegadamente defensiva, assumiu-se como
braço armado imperial e abertamente ofensivo. Em breve se envolveu em
hostilidades em clara violação do seu estatuto fundador. Em 1994,
iniciou uma primeira intervenção na Bósnia e Herzegovina,
visando a fragmentação da República Socialista Federal da
Jugoslávia, a que se seguirá, em 1999, uma
intervenção em larga escala na chamada guerra do Kosovo, visando
a subjugação da República Federal da Jugoslávia.
Por ocasião da celebração do 50º aniversário
da sua fundação, em Abril 1999, a NATO reinventou-se num
"Novo Conceito Estratégico" e atribuiu-se o direito de
intervir militarmente em qualquer parte do mundo. A velha aliança
à procura de um novo inimigo reencontrou-o em 11 de Setembro de 2001. O
artigo 5 do respectivo Tratado, redigido em 1949, ainda antes de a URSS dispor
de arma nuclear, artigo que compromete os aliados a acorrer em defesa de
qualquer estado membro em caso de agressão externa, só em 2001
seria invocado pelos EUA, significativamente logo no dia 12 de Setembro, a fim
de mobilizar os vários estados e comprometê-los como
súbditos em torno da renovada estratégia norte-americana. A
subsequente intervenção dos EUA no Afeganistão foi
sancionada pela NATO e, subserviente, esta assumiu a responsabilidade da
"pacificação" e "administração"
ulterior desse país.
As intervenções nos Balcãs e na Ásia Central
demonstram que a NATO está preparada para actuar militarmente fora da
sua área tradicional de influência (correspondente às duas
áreas de comando em que estava estruturada). Os argumentos, inscritos no
Novo Conceito Estratégico, são: a resolução de
conflitos, a gestão de crises, a promoção da democracia, a
defesa de princípios morais, a protecção de direitos
humanos. A NATO afirma também que prossegue tais fins sem
"arriscar" as suas tropas e minimizando efeitos colaterais sobre
populações civis inocentes. Dir-se-ia a NATO transvertida em
organização de governo supranacional, omnisciente e omnipotente
mas sem qualquer mandato conferido para tal e representando, de facto,
uma ameaça à Paz mundial.
Terminada, ao menos retoricamente, a "Guerra-Fria", começou,
de novo retoricamente, a "Guerra ao Terrorismo". Como o
"terrorismo" não tem morada nem hora, qualquer hora é
tempo de guerra em qualquer parte. O que está conforme com o quadro
geográfico e político-militar do novo conceito estratégico
da NATO.
E as armas nucleares prevalecem, como elemento central da estratégia de
agressão imperialista, que aproveitou a alteração da
correlação de forças para alargar os limites do seu
império e mudar de nome ao seu "inimigo" universal.
AS "NOVAS" ARMAS NUCLEARES
Os EUA e a Rússia dispõem de milhares de armas nucleares ditas
tácticas, isto é, para serem utilizadas no campo de batalha,
inicialmente desenvolvidas durante a Guerra-Fria para um eventual conflito em
teatro de guerra em solo europeu.
A
Nuclear Posture Review
(NPR) que chegou ao domínio público em Março de 2002
não abandona esse tipo de arma, pelo contrário alarga a sua
utilização ao baixar o limiar inferior da sua potência, e
alarga-a também no sentido da sua utilização em
projécteis com elevada capacidade de penetração. Admite
ainda o reinício de testes nucleares, com as novas armas, abandonando a
presente moratória, assim desacreditando o Tratado de
Proibição Integral de Testes Nucleares (CTBT) que aliás
nunca foi ratificado pelos EUA.
Entre as novas armas nucleares, as ogivas e bombas com elevado poder de
penetração, precisão e potência, visando atingir
alvos subterrâneos, surgem com particular destaque. Em particular,
Earth Penetrating Warheads
(EPW), são ogivas com capacidade de penetração no solo
antes de explodirem. A explosão no subsolo transmite muito mais energia
ao solo e a onda de choque tem poder destrutivo a muito mais
considerável profundidade do que caso a detonação
ocorresse à superfície. Os EUA dispõem de ogivas e bombas
EPW com cargas nucleares, as B61-11, desenvolvidas ao tempo da primeira Guerra
do Golfo, e tornadas operacionais em 1997; transporta uma carga nuclear de
até 340 quilotoneladas TNT. Uma tal bomba poderá destruir
através da onda de choque um alvo duro até 70 metros de
profundidade. Tal explosão produzirá uma cratera e
lançará para a atmosfera grande massa de rocha fragmentada e
vaporizada e produtos radioactivos.
Nas respostas militares propostas incluem-se ainda as
Robust Nuclear Earth Penetrator
(RNEP), armas nucleares com ainda maior alcance de penetração no
solo, cujo conceito se crê esteja desenvolvido mas ainda não
testado (pelo menos por enquanto).
Outra área de desenvolvimento e utilização de armas
nucleares, é a estratégia de defesa anti-míssil
intercontinental.
O conceito de um sistema nacional de defesa contra mísseis
balísticos --
National Missile Defense
(NMD) foi concebido pela primeira vez no fim da década de 50 e passou
desde então por sucessivas versões. A sua versão mais
conhecida foi a Iniciativa de Defesa Estratégica, proposta pelo
presidente Donald Reagan em Março de 1983; a sua versão mais
recente é designada
Ground-Based Missile Defense
(GMD) proposta pelo presidente George Bush em Dezembro de 2002, sendo o
programa mais dispendioso no orçamento do Pentágono. O conceito
é de viabilidade duvidosa e de sucesso questionável, por isso tem
passado por várias versões e é ainda incerto o seu futuro.
Ou baseado no espaço, numa constelação de satélites
militares, ou baseado no solo, numa ampla rede de bases de lançamento de
mísseis anti-mísseis, em qualquer caso as armas nucleares
serão aí elementos necessários para alcançar os
fins fixados.
A
Nuclear Posture Review
(NPR) expressamente invoca as armas nucleares para conter e responder a um
"largo leque de ameaças", incluindo convencionais,
químicas e biológicas e até "súbitos
desenvolvimentos militares"; nesta definição, tudo parece
ser passível de resposta nuclear. As consequências internacionais
desta política militar são gravíssimas. Ao banalizarem os
cenários de utilização de armas nucleares, incluindo a sua
utilização contra países não nuclearizados, os EUA
não só são o principal agente de
proliferação como induzem activamente que outros países
façam desenvolvimentos semelhantes e contribuam também para a
proliferação das armas nucleares. O Tratado de Não
Proliferação está seriamente ameaçado.
A NATO nasce com as armas nucleares e suporta a sua "autoridade" no
poder militar das armas nucleares que detém. É por ser assim que
a luta pela Paz é sinónimo de luta contra o Imperialismo.
01/Agosto/2005.
ALGUMAS FONTES NA WEB
http://www.doug-long.com/guide1.htm
http://www.doug-long.com/guide4.htm
http://www.doug-long.com/byrnes.htm
http://en.wikipedia.org/wiki/World_War_II
http://en.wikipedia.org/wiki/History_of_nuclear_weapons
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