Papa Bento XVI vem a Fátima caucionar um crime
porventura ainda pior que o da pedofilia, que o clero de Ourém
cometeu, em 1917, contra três crianças daquela freguesia
por Padre Mário da Lixa
[*]
Pelos vistos, nos próximos dias 12, 13 e 14 de Maio, o papa Bento XVI,
vem mesmo a Portugal, concretamente, Lisboa, Fátima e Porto, sem querer
saber para nada de tudo o que ultimamente está a ser revelado na
comunicação social sobre os inúmeros e escabrosos casos de
pedofilia, ocorridos no interior da Igreja, inclusive, com clérigos em
cargos de grande visibilidade e cujos bispos, no passado, foram seus
cúmplices (o próprio papa, na qualidade de Cardeal Ratzinger,
à frente da Congregação para a Doutrina da Fé,
terá feito de conta, quando, há anos, foi sabedor de um desses
casos mais escabrosos).
No mínimo, é uma insensatez que o papa Bento XVI está a
cometer. Perante tudo o que está a ser divulgado (e, em muitos casos,
até já confirmado pelos Tribunais de cada país), o papa
Bento XVI, se tivesse um mínimo de pudor (o Poder monárquico
absoluto nunca será capaz de semelhante qualidade humana, habituado que
está a excomungar quem não diz com ele, quem dissente dele, mesmo
por fidelidade a Jesus, o Evangelho Vivo de Deus Criador, nosso Abbá,
entre nós e connosco) já teria anunciado, nesta data, urbi et
orbi, que essa e outras viagens "pastorais" de chefe de Estado do
Vaticano ficariam canceladas sine die. Tanto mais, quanto, que, no caso
presente de Fátima, das três crianças da freguesia,
escolhidas e arregimentadas em 1917 pelo clero de Ourém (o clero
não olhou a meios só para, com aquela montagem das
"aparições" de Maio a Outubro, tentar pôr de novo
as populações a rezarem o terço, todos os dias, a
frequentarem a missa ritualizada ao domingo e a regressarem à tenebrosa
prática das primeiras nove sextas-feiras de cada mês; já
agora, porque não as primeiras doze sextas-feiras do ano?! O que faziam
os clérigos confessores nos três meses restantes?!).
Sim. Em verdade, em verdade vos digo: o, teologicamente imbecil,
fenómeno das "aparições" de Fátima foi,
perversa e metodicamente, preparado pelo clero de Ourém, e, por isso,
perfaz uma barbaridade de todo o tamanho, certamente, pior, muito pior, que os
inúmeros casos de pedofilia, à excepção,
porventura, daqueles casos mais escabrosos. Hoje, sabemos bem quais foram os
resultados dessa barbaridade, com tudo de crime sem perdão (desculpem a
força da expressão literária, mas é a única
apropriada, neste caso): duas das três crianças, Jacinta e
Francisco, irmãos de sangue e primos direitos de Lúcia, a mais
velha das três e vizinha, porta-com-porta das outras duas (como se
vê, ficou tudo em família!), quando a Pneumónica, poucos
meses depois das "aparições", atingiu o concelho de
Ourém (como vêem, nem a senhora de Fátima lhe valeu!
Pudera! E como havia de lhe valer, se aquilo é tudo mentira e
invenção do clero de Ourém?!), não lhe resistiram,
de tão fraquinhas que andavam com todos aqueles estúpidos
"sacrifícios pela conversão dos pecadores". Morreram
ambas, num total abandono, por parte do clero de Ourém que, meses antes,
as havia utilizado para aqueles perversos fins moralistas. Morreram as duas
devoradas por indescritíveis dores e mergulhadas em horrendas
alucinações, sobretudo a Jacinta, sozinha no Hospital D.
Estefânia, em Lisboa (é um facto histórico, senhoras,
senhores, não é invenção minha, nem do Jornal
Fraternizar). E quanto à outra menina sobrevivente, a mais velhinha,
é absolutamente obsceno o que o clero de Ourém e o próprio
Bispo auxiliar do Patriarcado, candidato a Bispo e, depois Bispo titular
efectivo, da restaurada Diocese de Leiria, lhe fizeram (já,
então, pelo andar da carruagem, era previsível que Fátima
viria a ser a galinha de ovos de oiro da Igreja em Portugal e da Cúria
Romana e, por isso, uma e outra se apressaram a restaurar a Diocese!...).
Obrigaram Lúcia, pela força e com um chorrilho de mentiras
clericais à mistura, de que ela era "vidente", etc e tal
a sair de Fátima e da família. Sequestraram-na até
à morte, primeiro, no então Asilo de Vilar, Porto, depois, num
convento de Doroteias em Tui, Galiza, onde lhe foi imposto pelo confessor que
tinha de ser freira, e, finalmente, freira de total clausura no Convento das
Carmelitas, em Coimbra. Horrendo! Só mesmo de clero celibatário
à força, eunuco à força, não, obviamente,
eunuco pelo Reino /Reinado de Deus!
A pobre rapariga tinha a terceira classe, quando a sequestraram, e assim ficou
(ou pouco mais!), pelo resto da vida. E à mãe dela, que sempre
disse que a conhecia bem e que aquela sua filha era compulsivamente mentirosa e
vaidosa (por isso, nunca acreditou nem na filha nem nas
"aparições"), nem mesmo na hora da sua agonia, deixaram
que ela visse a filha; tão pouco, permitiram que, pelo menos, a
mãe ouvisse a voz da filha pelo telefone! (Digam lá, se os
sacerdotes e as freiras do Ídolo Religioso não são
cruelmente vingativos e sádicos?!).
Ora, é este horrendo crime e esta mentira sem perdão, que o papa
Bento XVI vem caucionar com a sua visita de chefe de estado do Vaticano a
Portugal e a Fátima, numa altura em que sobem de tom e de número,
os clamores de inúmeras vítimas de casos de pedofilia, cometidos
por clero, inclusive, de grande visibilidade, todos funcionários
exemplares do Institucional Religioso-Eclesiástico católico. Haja
modos e pudor, meu irmão Ratzinger!
Mário, Presbítero da Igreja do Porto
P.S.
Meu irmão Ratzinger, Bispo de Roma: aceitas uma sugestão que aqui
te adianto?! Cancela esta viagem e todas as outras já agendadas para
outros países. E, em vez dessa montra de vaidade e de
ostentação de Poder Eclesiástico, que estás sempre
disposto a protagonizar, convida à conversão, a Igreja universal,
da qual és o principal animador. Não, obviamente, a estafada
conversão pregada ao longo dos séculos pelo Moralismo
Eclesiástico, hoje mais do que rançoso, mas a conversão
proclamada /exigida por Jesus, o do Deus do Reino /Reinado-de-Deus. Perdoa, mas
se calhar, nem tu saberás, sobretudo, por força dos
Privilégios de que desfrutas na Igreja e no Mundo, o que significa o
verbo CONVERTER-SE, utilizado por Jesus, logo a abrir a sua Missão na
Galileia, por meados do ano 28 desta nossa era comum. Humildemente, te digo:
Significa renunciarmos, duma vez por todas e por toda a vida, ao
Deus-Ídolo Religião, e abrirmo-nos alegremente ao Deus Criador,
nosso Abbá, o de Jesus, que nos habita e é mais íntimo a
nós do que nós próprios, os seres humanos todos, mulheres
e homens, em radical igualdade. És capaz de semelhante decisão?
Fico abraçado a ti, cheio de Esperança Teológica, a de
Jesus!
[*]
Autor de
Fátima nunca mais
(Campo das Letras, 1999),
Que fazer com esta Igreja
(Campo das Letras, 2001),
E se com o Papa enterrarmos também esta Igreja Católica Romana?
(Intervir/ArcaDasLetras Editora, 2005),
Fatimamente
e outros livros.
O original encontra-se em
Jornal Fraternizar
, edição n.º 177, de Abril-Junho 2010
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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