Em Portugal, os mais ricos entre os ricos não pagam os impostos devidos
e o prejuízo para o Estado estima-se na ordem dos 3 mil milhões
de euros!
A denúncia foi feita por um ex-Director da Autoridade Tributária
e Aduaneira numa recente entrevista a um órgão de
comunicação social e confirmada num Memorando enviado à
Assembleia da República pela própria Autoridade
Tributária. Não é nada que o PCP não venha
afirmando há muito tempo, mas agora temos a confirmação
deste facto pelo próprio organismo público que procede à
cobrança dos impostos.
A Autoridade Tributária, recorrendo às suas bases de dados e a
informação externa, procedeu ao levantamento dos contribuintes
que detêm um património superior a 25 milhões de euros e/ou
têm rendimentos anuais superiores a 5 milhões de euros, ou seja,
os mais ricos entre os ricos. Numa primeira abordagem, foram identificados
nesta categoria 240 pessoas, que, em 2014, pagaram em sede de IRS apenas 48
milhões de euros. Um valor verdadeiramente insignificante, tendo em
conta os elevadíssimos rendimentos e património destas pessoas.
Esta é uma situação escandalosa! Não se pode
aceitar que aqueles que mais têm fujam ao pagamento dos impostos,
sonegando ao Estado receitas fiscais essenciais para assegurar as suas
funções, em particular as funções sociais, e
exigindo aos restantes contribuintes, em particular aos trabalhadores, um
esforço fiscal desmesurado.
A Autoridade Tributária, com os seus escassos recursos, conseguiu
até ao momento identificar 240 contribuintes que se enquadram nesta
categoria dos muito ricos. Mas são mais, muitos mais! Um estudo
internacional, que a Autoridade Tributária identifica como sendo um
estudo de referência, estima que em Portugal são cerca de 930. Uma
empresa que vende serviços de consultadoria fiscal a estes
contribuintes, considera um universo de 1.000 pessoas. Um milhar de
cidadãos que, tendo um património e/ou rendimento muito elevado,
foge ao pagamento dos impostos devidos.
Um simples cálculo permite estimar em cerca de 3 mil milhões de
euros a receita fiscal anual que resultaria da tributação
adequada em sede de IRS deste grupo de 1.000 milionários. Mas esta
receita potencial tem sido desperdiçada, por opções
políticas que favorecem uma ínfima minoria de privilegiados
à custa da esmagadora maioria que vive do seu trabalho.
Importa recordar que, em 2013, o anterior Governo PSD/CDS impôs um brutal
saque fiscal sobre os rendimentos do trabalho, incluindo os rendimentos mais
baixos. Num só ano, a receita de IRS aumentou 35%, mais de 3.200
milhões de euros. Esta medida de ataque aos rendimentos de quem vive do
seu trabalho, acompanhada de muitas outras medidas de austeridade, contribuiu
para o alastramento da pobreza e para a degradação das
condições de vida de largas camadas da população.
Este brutal aumento de impostos não era inevitável. Foi uma
opção! Uma opção do anterior Governo PSD/CDS, que,
podendo tributar de forma adequada uma ínfima minoria de
milionários, arrecadando milhares de milhões de euros de receita
fiscal adicional, preferiu ir buscar esses milhares de milhões de euros
aos trabalhadores, aos reformados, às famílias e às micro
e pequenas empresas.
Estas opções são bem reveladoras da natureza da
política de direita tão diligentemente aplicada pelo anterior
Governo PSD/CDS, uma política que os portugueses, de forma tão
expressiva, rejeitaram nas eleições legislativas do passado dia 4
de outubro.
A falta de vontade política e de eficácia no combate ao
incumprimento fiscal dos mais ricos entre os mais ricos contrasta com a sanha
persecutória do anterior Governo PSD/CDS dirigida contra os pequenos e
médios contribuintes, sejam eles particulares ou empresas. Se os
milionários pagam de impostos uma pequeníssima
fracção do que deveriam pagar, encolhe-se os ombros e fala-se das
dificuldades e dos obstáculos a uma tributação adequada.
Se o pequeno contribuinte comete uma infracção, mesmo que
involuntária, ou se atrasa no pagamento dos impostos, aplica-se uma
coima exorbitante, penhora-se o salário, o carro e até a casa.
No que diz respeito aos contribuintes de elevada capacidade patrimonial, os
tais com rendimento anual superior a 5 milhões de euros e/ou
património superior a 25 milhões de euros, exigem-se medidas
urgentes que dotem a Autoridade Tributária e Aduaneira de meios e
instrumentos que lhe permitam proceder à cobrança dos impostos
devidos.
Porque não nos conformamos com uma política fiscal injusta e
iníqua, porque não nos conformamos com o esmagamento fiscal dos
trabalhadores e das pequenas empresas para favorecer um ínfimo grupo de
contribuintes milionários, o Grupo Parlamentar do PCP irá
apresentar na Assembleia da República uma iniciativa com um conjunto de
medidas decisivas no combate à fuga e evasão fiscais dos
contribuintes mais ricos.
É necessário considerar medidas ao nível da
legislação fiscal, mas também dos meios humanos e
tecnológicos colocados à disposição da Autoridade
Tributária e Aduaneira, da criação de parcerias com outras
organizações e entidades que acedam ou estudem
informação considerada sensível em termos do apuramento da
realidade patrimonial e de rendimentos dos contribuintes mais ricos, assim como
de uma intervenção no seio das organizações
internacionais, nomeadamente na União Europeia, FMI, ONU e
Organização Mundial do Comércio, de forma a combater a
chamada competitividade fiscal cujo objectivo é a captura de receitas
fiscais com origem em patrimónios e rendimentos obtidos em países
terceiros.
O PCP reafirma aqui a necessidade de uma nova e alternativa política
fiscal, mais justa e mais adequada às necessidades do País. Uma
política fiscal, articulada com a dimensão orçamental, que
tribute de forma adequada as grandes empresas, os grupos económicos e
financeiros, os rendimentos e patrimónios mais elevados, ao mesmo tempo
que desonere os trabalhadores, os reformados, as famílias, assim como as
micro e pequenas empresas.
É com esse objectivo que nos iremos bater por estas propostas.
[*]
Deputado. Intervenção na AR em 21/Janeiro/2016