A quem lucram os grandes projectos?
por Luís Vicente
O comité de negócios do grande capital que é o
"Governo Sócrates" insiste no desvario delirante dos grandes
projectos. Ele é o TGV, ele é o novo aeroporto, ele é a
terceira auto-estrada Lisboa-Porto.
Mas o que acontece é que as exigências de financiamento a prazo
(avales do Estado ou exigências das empresas em parcerias
público-privadas) para pagar o dito "investimento", os
défices operacionais de exploração e as
indemnizações compensatórias absorverão montantes
imensos de financiamento, reduzindo o crédito necessário e
fundamental às PMEs e às famílias. Mais, Portugal apenas
ficará mais fraco em resultado desse excessivo endividamento. Um Estado
endividado é sempre um Estado fraco.
Quanto à incorporação de produção nacional,
nada, ou quase nada e mesmo um eventual "quase nada", a existir,
será insignificante para o desenvolvimento nacional. Antes pelo
contrário.
Mas os ricos, os grandes senhores do capital, rejubilarão com o
óbvio enfraquecimento económico do Estado. Estado que, pela
necessidade de pagar o que lhes ficará a dever, terá que
desprezar as situações sociais pungentes. E o aumento da
dívida do Estado fará obrigatoriamente cair o seu
rating,
os bancos nacionais, que se financiam no exterior, irão pagar mais pela
dívida passada e terão dificuldades acrescidas na
obtenção de mais financiamentos, portanto, menos crédito e
mais caro para as empresas, em particular as PMEs e as famílias mais
pobres, sempre os mesmos a arcar com os custos.
Não sendo rentáveis os investimentos megalómanos e
delirantes do "Governo Sócrates" a mando do grande capital,
imediatamente baixarão a qualidade de vida do nosso povo, hoje para
investir, amanhã para pagar os défices de
exploração.
Os chamados "grandes investimentos" não são criadores
significativos de emprego, em particular se se considerar o imenso volume de
capital a investir a expensas públicas. E, de qualquer forma, a reduzida
criação de emprego, a existir, apenas se notará, de forma
insignificante, daqui a alguns anos.
Reflectindo sobre os "grandes projectos" é de referir, em
primeiro lugar, a terceira auto-estrada Lisboa-Porto. Privilegiará o
transporte privado quando há duas vias alternativas muito longe de
estarem congestionadas, sem tráfego que a justifique, em particular se
se realizar uma melhor ligação ferroviária. Em segundo
lugar o TGV Lisboa-Porto. Facilmente se entende que será
preferível um alfa-pendular; consome metade da energia e é mais
eficiente para a mesma velocidade e muito mais barato. Sendo para transporte de
passageiros, não se perspectiva que os haja em quantidade suficiente
para o justificar. Em terceiro lugar, a quem serve o TGV para Madrid?
Estrategicamente significa reconhecer Madrid como o centro da Península
Ibérica. Levará inevitavelmente à
deslocalização de algumas empresas que sairão de Portugal
para concentrarem as suas actividades na cidade maior e mais central, Madrid.
Em quarto lugar, o Novo Aeroporto. Pode e deve ser adiado
[NR]
, nomeadamente se se vier a concretizar uma boa alternativa ferroviária
para o Porto e Madrid. Em termos aeroportuários a real necessidade
é uma nova gare bem gerida, essa sim geradora de emprego. Como se
vê os vários projectos não fazem sentido como um todo: umas
vezes dá-se prioridade ao automóvel privado, para a seguir fazer
a ligação em TGV e mais tarde facilitar a ligação
por avião. Tanta confusão cheira mal.
E o imenso montante de capital público a despender nestes projectos pode
alternativamente ser investido no desenvolvimento do nosso País e no
bem-estar do nosso povo. Pequenos investimentos com ligação
às autarquias, requalificação dos centros das cidades,
reordenamento do território. Requalificação do nosso
património construído e arqueológico com pequenos centros
interpretativos geradores de emprego e atractores de visitantes, investimento
na conservação da biodiversidade e do nosso património
natural no sentido de uma relação sustentável entre as
comunidades humanas e o ambiente natural ou construído, melhor
país para todos e maior atractividade de visitação,
nacional ou estrangeira. Tudo isto é promotor de muito mais emprego,
pois trata-se de projectos geradores de trabalho, de financiamento fácil
e expedito, rápidos de pôr em prática, e socialmente
rentáveis. Reaproveitamento de pequenas linhas ferroviárias para
o turismo e para apoio às populações esquecidas do
interior. Apoio sério, socialmente eficiente e real apoio ao
desenvolvimento das forças produtivas, em particular às micro,
pequenas e médias empresas, bem como às famílias mais
carenciadas.
Resta interrogarmo-nos: a quem interessam os projectos megalómanos do
"Governo Sócrates"? Obviamente aos grandes monopólios
da construção civil, aos grupos capitalistas da indústria
e tecnologia multinacionais que aqui vêm mais uma oportunidade de chorudo
negócio, à banca privada (veja-se a título de exemplo o
empenho do BES através das palavras de Ricardo Salgado). E toda a nossa
produção ficará empenhada numa gigantesca dívida ao
grande capital internacional.
O financiamento de Bruxelas poderá sempre ser renegociado e aplicado aos
interesses reais do nosso povo, ao desenvolvimento da sua qualidade de vida e
do seu bem-estar.
Por tudo isto, pelo desenvolvimento de Portugal, pela recuperação
e crescimento do sector produtivo nacional, pela viabilização e
fortalecimento das micro, pequenas e médias empresas, pelo bem estar do
nosso povo, não à megalomania delirante de um governo que
não é mais que um comité de negócios do grande
capital!
[NR] Ao dizer que a construção do novo aeroporto deve apenas ser
"adiada", o autor está a ser demasiado suave perante tamanha
enormidade (talvez por
desconhecimento da realidade do Pico Petrolífero). Seria
preferível afirmar que tal projecto ruinoso deveria ser total e
definitivamente cancelado. Continua a ser válido assinar a
Petição contra a construção de qualquer novo aeroporto em Portugal
.
O original encontra-se no semanário
Avante!
, edição Nº1884
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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