Sobre o anúncio do Governador do Banco de Portugal de uma nova
canalização de recursos públicos para a banca privada
por Agostinho Lopes
O anúncio pelo Governador do Banco de Portugal sobre a
intervenção no Banco Espírito Santo constitui uma
peça mais no escandaloso processo dirigido para fazer pagar aos
trabalhadores e ao povo português os custos da especulação
e da gestão danosa dos principais grupos financeiros, desenvolvidas e
alimentadas ao longo de anos com a conivência dos governos e dos supostos
reguladores.
1. O anúncio ontem realizado começa por ser um rotundo desmentido
às sucessivas e solenes declarações, nas últimas
semanas, do Primeiro-Ministro, Ministra das Finanças e do próprio
Governador do Banco de Portugal (BdP) do não recurso a fundos
públicos para a resolução do colossal buraco
económico e financeiro do BES/GES. Na verdade, o Governo escondeu-se
atrás do Governador do BdP, para iludir que é por sua
decisão e responsabilidade que, invocando a defesa dos depositantes,
serão canalizados novamente para as mãos do grande capital
milhares de milhões de euros para tapar os buracos e continuar a
alimentar a lógica dos grupos financeiros e a especulação
a que se têm dedicado.
2. O PCP denuncia a colossal mistificação que, a coberto de um
alegado recurso ao chamado Fundo de Resolução, tem em vista
esconder a verdadeira natureza e consequência da
intervenção agora decidida. A ideia de que residiria nesse Fundo
de Resolução (tutelado pelo Ministério das Finanças
e Banco de Portugal) a solução encontrada cujo montante
ascende a escassas centenas de milhões de euros - constitui um embuste
dirigido a enganar os portugueses.
Trata-se de esconder e iludir a drenagem, de facto, de 4,4 mil milhões
de euros de empréstimo do Estado português como é
claramente referido pelo comunicado da Comissão Europeia - do chamado
Fundo de Recapitalização que, inserido no pacote da troika, os
portugueses e o País estão duramente a pagar com desemprego,
cortes de salários e pensões, restrições nos
direitos à saúde e à educação e aumento de
impostos, inseparáveis de um insuportável custo do serviço
da dívida.
Ao contrário dos que difundem a ideia de que esta operação
não trará custos para o Estado, a verdade é que, para
além dos custos que o País está a pagar com o fundo de
recapitalização e de desenvolvimentos imprevisíveis, a
não realização no futuro com a venda do Novo Banco do
dinheiro público agora emprestado, terá como consequência
adicional, face à responsabilidade que a Caixa Geral de Depósitos
tem no Fundo de Resolução, uma perda de recursos públicos
que, independentemente de apuramento mais rigoroso, poderá representar
uma elevada participação.
3. O PCP denuncia a operação de chantagem que, a pretexto da
acalmia dos mercados, dos riscos de contaminação e da
recuperação da confiança dos accionistas e depositantes,
visa uma vez mais - depois do buraco do BPN, da recapitalização
com dinheiros públicos no BCP, BPI e BANIF - canalizar milhares de
milhões de euros para cobrir o que devia ser coberto com a
mobilização do incomensurável património, dos
recursos e activos dos principais accionistas do Grupo e do Banco
Espírito Santo.
Chantagem que, em nome da salvaguarda dos depositantes e dos trabalhadores do
Grupo e do Banco, mais não visa do que cobrir uma decisão
dirigida a substituir as obrigações que competiriam aos
accionistas e a disponibilizar meios que serão utilizados para planos de
reestruturação que, entre outros aspectos ainda não
totalmente esclarecidos, visam não só o despedimento de milhares
de trabalhadores do Grupo e do Banco já em preparação, mas
também a continuação, por via de uma
Administração do agora designado Novo Banco -
constituída com o apoio dos principais accionistas do BES, incluindo a
família Espírito Santo que não tem no centro das
suas preocupações a defesa dos interesses nacionais.
4. A situação agora verificada no BES vem confirmar a
falsificação que Governo e Banco de Portugal têm semeado,
designadamente a propósito dos testes de stress, sobre a solidez e
solvibilidade da banca. Um exercício deliberado para esconder os
créditos mal parados e os produtos tóxicos e outras
operações financeiras que beneficiam da
liberalização da circulação de capitais, do sigilo
bancário e dos paraísos fiscais.
5. O PCP insiste na denúncia da mistificação do governo
sobre as consequências do recurso à linha de 12 mil milhões
de recapitalização que integrado no empréstimo da troika,
que para o governo não seriam dinheiros públicos e alegadamente
sem custos para os contribuintes. De facto, é um empréstimo
contraído pelo Estado português que os portugueses estão a
pagar com o seu empobrecimento, o saque dos seus rendimentos e
liquidação de direitos, com uma profunda recessão
económica e a destruição do tecido económico.
Como o PCP tem sublinhado, esse montante deveria ter sido posto à
disposição das pequenas e médias empresas, ao
serviço da dinamização da actividade económica e do
investimento público e não do apoio ao capital financeiro e
às suas práticas especulativas e corruptas.
O que a situação que se desenvolveu no BES/GES veio confirmar
é que não há razões para confiar nem no Governo nem
na actuação do BdP. Quem permitiu e foi cúmplice ao longo
destes anos destes desenvolvimentos, quem esteve e está ao lado do
grande capital, não pode vir clamar em defesa dos interesses nacionais.
A realidade revela que a continuação da
subordinação do sistema financeiro à lógica do
lucro e da especulação conduzirá a mais problemas, a mais
sacrifícios dos trabalhadores e do povo, a mais comprometimento do
interesse nacional.
6. O PCP sublinha que esta nova «ajuda do Estado» destroça
toda a propaganda que, em torno da União Bancária (aprovada por
PSD, CDS e PS), vinha repetindo que tinha acabado o tempo do uso dos recursos
públicos para resolver problemas da banca privada.
7. O PCP reafirma a defesa de recuperação do comando
político e democrático do processo de desenvolvimento do
País, com a subordinação do poder económico ao
poder político, que coloca na ordem do dia a necessidade de um sector
público forte e dinâmico, especialmente em sectores
estratégicos da economia, como é o caso do sector financeiro e,
designadamente, em relação à banca comercial.
04/Agosto/2014
O original encontra-se em
www.pcp.pt/...
Este documento encontra-se em
http://resistir.info/
.
|