Que crise económica? Os lucros aumentam!
Enquanto os progressistas e os esquerdistas escrevem sobre as "crises do
capitalismo", os industriais, as companhias petrolíferas, os
banqueiros e muitas outras grandes empresas de ambos os lados do
Atlântico e da costa do Pacífico encaminham-se sorrateiramente
para a banca.
A partir do primeiro trimestre deste ano, os lucros das empresas dispararam
entre vinte a mais de cem por cento (
Financial Times,
10/Agosto/2010, p. 7). Na realidade, os lucros das empresas subiram mais do
que antes do início da recessão em 2008 (
Money Morning,
31/Março/2010). Contrariamente aos
bloggers
progressistas as taxas dos lucros estão a subir em vez de descer,
principalmente entre as maiores empresas (
Consensus Economics,
12/Agosto/2010). O acréscimo dos lucros empresariais é
consequência directa do agravamento das crises da classe trabalhadora,
dos funcionários públicos e privados e das pequenas e
médias empresas.
No início da recessão, o grande capital eliminou milhões
de postos de trabalho (um em cada quatro americanos ficou desempregado em
2010), conseguiu recuos dos patrões dos sindicatos, beneficiou de
isenções de impostos, de subsídios e de empréstimos
praticamente sem juros dos governos locais, estaduais e federal.
Quando a recessão bateu no fundo temporariamente, os grandes
negócios duplicaram a produção com a restante
mão-de-obra, intensificando a exploração (maior
produção por trabalhador) e reduziram os custos passando para a
classe trabalhadora uma fatia muito maior dos encargos com os seguros de
saúde e com os benefícios de pensões a aquiescência
dos responsáveis milionários dos sindicatos. O resultado é
que, embora as receitas tenham diminuído, os lucros subiram e os
balancetes melhoraram (
Financial Times,
10/Agosto/2010). Paradoxalmente, os directores-gerais utilizaram o pretexto e
a retórica das "crises" oriunda dos jornalistas progressistas
para impedir os trabalhadores de exigirem uma fatia maior dos lucros
florescentes, ajudados pela reserva cada vez maior de trabalhadores
desempregados e sub-empregados como possíveis "substitutos"
(amarelos) no caso de acções de protesto.
A actual explosão de lucros não beneficiou todos os sectores do
capitalismo: a sorte grande saiu sobretudo às maiores empresas. Em
contrapartida, muitas pequenas e médias empresas registaram altas taxas
de falências e de prejuízos, o que as tornou baratas e presa
fácil para aquisição pelos "grandes
chefões" (
Financial Times,
01/Agosto/2010). As crises do capital médio levaram à
concentração e centralização do capital e
contribuíram para a taxa crescente de lucros das empresas maiores.
O diagnóstico falhado das crises capitalistas feito pela esquerda e
pelos progressistas tem sido um problema omnipresente desde o fim da II Guerra
Mundial, quando nos foi dito que o capitalismo estava 'em
estagnação' e se dirigia para um colapso final. Os recentes
profetas do apocalipse viram na recessão de 2008-2009 a queda definitiva
e total do sistema capitalista mundial. Cegos pelo etnocentrismo
euro-americano, não viram que o capital asiático nunca entrou nas
"crises finais" e a América Latina teve uma versão
suave e passageira (
Financial Times.
09/Junho/2010, p. 9). Os falsos profetas não conseguiram reconhecer que
os diferentes tipos de capitalismo são mais ou menos susceptíveis
às crises
e que algumas variantes tendem a sofrer rápidas
recuperações (Ásia, América Latina, Alemanha)
enquanto outras (EUA, Inglaterra, Europa do Sul e do Leste) são mais
susceptíveis a recuperações anémicas e
precárias.
Enquanto a Exxon-Mobil arrebanhou mais de 100% de aumento de lucros em 2010 e
as empresas de automóveis registaram os seus maiores lucros dos
últimos anos, os salários dos trabalhadores e o seu nível
de vida diminuíram e os funcionários públicos sofreram
pesados cortes e despedimentos maciços. É óbvio que a
recuperação de lucros empresariais se baseia na mais dura
exploração da mão-de-obra e de maiores
transferências de recursos públicos para as grandes empresas
privadas. O estado capitalista, com o presidente democrata Obama à
frente, transferiu milhares de milhões para o grande capital
através das operações de salvamento, empréstimos
praticamente isentos de juros, cortes nos impostos e pressionou a força
de trabalho a aceitar salários mais baixos e reduções na
saúde e das pensões. O plano da Casa Branca para a
'recuperação' resultou para lá de todas as expectativas
os lucros empresariais recuperaram; "só" a grande
maioria dos trabalhadores é que se afundou mais nas crises.
As previsões falhadas dos progressistas quanto à morte do
capitalismo são consequência directa da subavaliação
da dimensão com que a Casa Branca e o Congresso iria pilhar o
erário público para ressuscitar o capital. Subavaliaram o grau
com que o capital iria ser aliviado para sacudir toda a carga da
recuperação de lucros para cima das costas dos trabalhadores.
Neste aspecto, a retórica progressista sobre a "resistência
da força de trabalho" e o "movimento sindical"
reflectiram a falta de compreensão de que praticamente não tem
havido qualquer resistência à redução dos
salários sociais e monetários porque não existe
organização da força de trabalho. O que se intitula como
tal está completamente ossificado e ao serviço dos defensores da
Wall Street do Partido Democrata na Casa Branca.
PROCESSO PRECÁRIO
O que o actual impacto desigual e injusto do sistema capitalista nos diz
é que o capitalismo consegue ultrapassar as crises aumentando apenas a
exploração e anulando décadas de "ganhos
sociais". Mas o actual processo de recuperação de lucros
é altamente precário porque se baseia na exploração
de inventários actuais, taxas de juros baixas e cortes nos custos da
mão-de-obra (
Financial Times,
10/Agosto/2010, p. 7). Não se baseia em novos investimentos privados
dinâmicos nem no aumento da capacidade produtiva. Por outras palavras,
são "ganhos ocasionais" não são lucros
provenientes de receitas de vendas acrescidas nem de mercados de consumo em
expansão. Como poderiam ser se os salários estão a
diminuir e o desemprego, o sub-emprego e a redução da
mão-de-obra é maior do que 22%? Obviamente, esta explosão
de lucros a curto prazo, com base em vantagens políticas e sociais e num
poder privilegiado, não é sustentável. Há limites
para os despedimentos maciços de funcionários públicos e
para os ganhos de produção a partir da exploração
intensificada da mão-de-obra
alguma coisa tem que ceder. Uma coisa
é certa: O sistema capitalista não vai cair nem ser
substituído por causa da sua podridão interna
ou"contradições".
15/Agosto/2010
[*]
Sociólogo. Ver
obras do autor.
O original encontra-se em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=20620
.
Tradução de Margarida Ferreira.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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