A ascendência de uma elite financeira criminosa
As duas faces de um estado policial: Abrigar evasores fiscais,
trapaceiros
das finanças e lavadores de dinheiro enquanto policia os cidadãos
por James Petras
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"O coração apodrecido das finanças".
The Economist
"Há um grau de cinismo e cobiça que é realmente
bastante chocante"
Lord Turner, Bank of England, Financial Service Authority
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Nunca na história dos Estados Unidos testemunhámos crimes
cometidos na escala e do âmbito dos dias actuais, tanto pela elite
privada como estatal.
Um economista de credenciais impecáveis, James Henry, antigo economista
chefe na prestigiosa firma de consultoria McKinsey & Company, investigou e
documentou evasão fiscal. Ele descobriu que os super-ricos e suas
famílias têm até US$32 milhões de milhões
(trillion)
de activos escondidos em paraísos fiscais offshore, o que representa
mais de US$280 mil milhões de receita perdida no imposto sobre o
rendimento! Este estudo excluía activos não financeiros tais como
imobiliário, metais preciosos, jóias, iates, cavalos de corrida,
veículos de luxo e assim por diante. Dos US$32 milhões de
milhões de activos escondidos, US$23 milhões de milhões
pertencem a super-ricos da América do Norte e da Europa.
Um relatório recente do Comité Especial das Nações
Unidas sobre Lavagem de Dinheiro descobriu que bancos dos EUA e da Europa
têm lavado mais de US$300 mil milhões por ano, incluindo US$30 mil
milhões apenas dos cartéis de droga mexicanos.
Novos relatórios sobre trapaças financeiras de muitos milhares de
milhões envolvendo os grandes bancos dos EUA e Europa são
publicados a cada semana. Os principais bancos da Inglaterra, incluindo o
Barclay's e um bando de outros, foram identificados como tendo manipulado o
LIBOR, ou inter-bank lending rate, durante anos a fim de maximizar lucros. O
Bank of New York, JP Morgan, HSBC, Wachovia e Citibank estão entre a
multidão de bancos acusados de lavar dinheiro da droga e de outros
fundos ilícitos segundo investigações do Comité
Bancário do Senado dos EUA. Corporações multinacionais
receberam fundos federais de salvamento e isenções fiscais e
então, em violação dos acordos publicitados com o governo,
relocalizam fábricas e empregos na Ásia e no México.
Grandes casas de investimento, como a Goldman Sachs, enganaram investidores
durante anos investindo em acções "lixo" enquanto os
correctores puxavam e afundavam
(
pumped and dumped
)
acções sem valor. Jon Corzine, presidente do MF Global (bem como
antigo presidente da Goldman Sachs, antigo senador dos EUA e governador de Nova
Jersey) afirmou que "não podia explicar" os US$1,6 mil
milhões de perdas de clientes investidores de fundos no colapso de 2011
do MF Global.
Apesar do enorme crescimento do aparelho policial do estado, da
proliferação de agências de investigação, das
audiências no Congresso e dos mais de 400 mil empregados do
Ministério da Segurança Interna
(Department of Homeland Security),
nem um único banqueiro foi para a cadeia. Nos casos mais chocantes, um
banco como o Barclay pagará uma pequena multa por ter facilitado a
evasão fiscal e efectuado trapaças especulativas. Ao mesmo tempo,
de acordo com o princípio "canalha" [implícito] na
trapaça LIBOR, o Director de Operações
(Chief Operating Officer, COO)
do Barclay's Bank, Jerry Del Missier, receberá uma
indemnização de 13 milhões de dólares pelo seu
afastamento.
Em contraste com a complacente aplicação da lei praticada pelo
florescente estado policial em relação a trapaças da
banca, das corporações e das elites bilionárias, tem-se
intensificado a repressão política de cidadãos e
imigrantes que não cometeram qualquer crime contra a segurança e
ordem pública.
Milhões de imigrantes têm sido agarrados nas suas casas e lugares
de trabalho, presos, batidos e deportados. Centenas de bairros hispânicos
e afro-americanos têm sido alvo de raids policiais, tiroteios e mortes.
Em tais bairros, a polícia local e federal opera com impunidade
como foi ilustrado por vídeos chocantes dos tiros e brutalidade da
polícia contra civis desarmados em Anaheim, Califórnia.
Muçulmanos, asiáticos do Sul, árabes, iranianos e outros
são racialmente perfilados, arbitrariamente presos e processados por
participarem em obras de caridade, de fundações
humanitárias ou simplesmente por participarem de
instituições religiosas. Mais de 40 milhões de americanos
empenhados em actividade política legal são actualmente vigiados,
espionados e frequentemente molestados.
As duas faces do governo dos EUA: Impunidade e repressão
Documentação esmagadora confirma a deterioração
total da polícia e do sistema judicial dos EUA no que respeita à
aplicação da lei quanto a crimes entre a elite financeira,
bancária e corporativa.
Evasores fiscais de triliões de dólares, trapaças
financeiras bilionárias e lavadores de dinheiro multi-bilionários
quase nunca são enviados para a cadeia. Se bem que alguns paguem uma
multa, nenhum deles têm os seus ganhos ilícitos apreendidos,
apesar de muitos serem criminosos reincidentes. A reincidência entre
criminosos financeiros é comum porque as penalidades são leves,
os lucros são altos e as investigações pouco frequentes,
superficiais e sem consequências. O United Nations Office on Drugs and
Crime (UNODC) informou que, só em 2009, foram lavados US$1,6
milhão de milhões, principalmente em bancos ocidentais, um quinto
vindo directamente do comércio de droga. O grosso do rendimento do
comércio de cocaína foi gerado na América do Norte (US$35
mil milhões), dois terços dos quais foram lavados em bancos
locais. O fracasso em processar banqueiros empenhados numa
ligação crítica do comércio da droga não se
deve à "falta de informação", nem tão
pouco à "frouxidão" por parte dos reguladores e
aplicadores da lei. A razão é que os bancos são demasiado
grandes para processar e os banqueiros demasiado ricos para prender. A
aplicação efectiva da lei levaria a serem submetidos a processo
todos os principais bancos e banqueiros, o que reduziria lucros drasticamente.
Encarcerar banqueiros de topo fecharia a "porta giratória", o
portão dourado através do qual reguladores do governo asseguram a
sua própria riqueza e fortuna pela entrada em casas de investimento
privadas depois de deixarem o serviço "público". Os
activos dos dez maiores bancos nos EUA constituem uma porção
apreciável da economia estado-unidense. Os gabinetes dos directores dos
maiores bancos entrecruzam-se com todos os principais sectores corporativos. Os
responsáveis de topo e médios e seus confrades no sector
corporativo, bem como seus principais accionistas e possuidores de
títulos, estão entre os maiores evasores fiscais do país.
Se bem que a Security and Exchange Commission, o Departamento do Tesouro e o
Comité Bancário do Senado finjam publicamente que investigam
altos crimes financeiros, a sua função real é proteger
estas instituições de quaisquer esforços para transformar
a sua estrutura, as suas operações e o seu papel na economia
estado-unidense. As multas recentemente impostas são altas pelos
padrões anteriores mas ainda assim seus montantes, na maior parte,
correspondem aos lucros de um par de semanas.
A falta de "vontade judicial", o colapso de todo o sistema
regulamentar e a ostentação do poder financeiro manifestam-se nos
"pára-quedas dourados" habitualmente concedidos a presidentes
de conselho de administração criminosos após sua
revelação e "renúncia". Isto se deve ao enorme
poder político que a elite financeira exerce sobre o estado, o
judiciário e a economia.
Poder político e morte da "lei e ordem"
Em relação a crimes financeiros, a doutrina que guia a
política do estado é "demasiado rico para encarcerar,
demasiado grande para falir", o que se traduz nos salvamentos pelo
tesouro, com muitos triliões de dólares, de
instituições financeiras cleptocráticas em bancarrota e
num alto nível de tolerância do estado para com evasores fiscais,
trapaceiros e lavadores de dinheiro. Devido ao colapso total da
aplicação da lei em relação a crimes financeiros,
há altos níveis de delinquentes contumazes. É o que um
responsável financeiro britânico descreve como "cobiça
cínica (e cíclica)".
A palavra de ordem sob a qual a elite financeira tomou o controle total do
estado, do orçamento e da economia foi "mudança". Isto
refere-se a desregulamentação do sistema financeira, à
expansão maciça dos alçapões fiscais, a fuga livre
de lucros para paraísos fiscais além-mar e a dramática
comutação da "aplicação da lei" da
prossecução dos bancos que lavam os ganhos ilícitos da
droga e de cartéis criminosos para a perseguição dos
chamados "estados terroristas". O "estado da lei" tornou-se
um estado sem lei. "Mudanças" financeiras permitiram e mesmo
promoveram trapaças reiteradas, as quais defraudaram milhões e
empobreceram centenas de milhões. Há 20 milhões de
hipotecados que perderam seus lares ou não são capazes de manter
pagamentos; dezenas de milhões de contribuintes da classe média e
da classe trabalhadora que foram forçados a pagar impostos mais altos e
a perder serviços sociais vitais devido à evasão fiscal da
classe superior e corporativa. A lavagem de milhares de milhões de
dólares de cartéis da droga e de riqueza criminosa pelos maiores
bancos levou à deterioração de bairros inteiros e à
ascensão do crime, o que desestabilizou a vida familiar da classe
média e trabalhadora.
Conclusão
A ascendência de uma elite financeira criminosa e a cumplicidade do
estado complacente levaram ao colapso da lei e da ordem, à
degradação e ao descrédito de toda a rede regulamentar e
do sistema judicial. Isto levou a um sistema nacional de "injustiça
desigual" onde cidadãos críticos são perseguidos por
exercerem seus direitos constitucionais ao passo que elites criminosas operam
com impunidade. As mais duras sanções do estado policial
são aplicadas contra centenas de milhares de imigrantes,
muçulmanos e activistas de direitos humanos, ao passo que trapaceiros
financeiros são cortejados por colectores de fundos de campanhas
presidenciais.
Não é de surpreender que hoje muitos trabalhadores e
cidadãos da classe média considerem-se "conservadores"
e serem "contra a mudança". Na verdade, a maioria quer
"conservar" a Segurança Social, a educação
pública, pensões, estabilidade de emprego e planos médicos
federais tais como o MEDICARE e o MEDICAID em oposição aos
advogados da "mudança" da elite "radical" que quer
privatizar a Segurança Social e a educação, acabar com o
MEDICARE e amputar o MEDICAID. Trabalhadores e classe média pedem
estabilidade no emprego e nos bairros habitacionais, assim como preços
estáveis contra a disparada de inflação nos cuidados
médicos e na educação. Cidadãos assalariados apoiam
a lei e a ordem, especialmente quando isto significa o processamento de
evasores fiscais bilionários, banqueiros lavadores de dinheiro criminoso
e trapaceiros, os quais, na maior parte, pagam uma pequena multa, emitem uma
"desculpa" e a seguir prosseguem a repetição das suas
trapaças.
As "mudanças" radicais promovidas pela elite devastaram a vida
de milhões de americanos em todas as regiões,
ocupações e grupos etários. Elas desestabilizaram a
família ao minarem a segurança de emprego enquanto minavam
bairros habitacionais com a lavagem dos lucros da droga. Acima de tudo elas
perverteram totalmente todo o sistema de justiça no qual "os
criminosos são tornados respeitáveis e os respeitáveis
tratados como criminosos".
A primeira defesa da maioria é resistir à "mudança da
elite" e conservar os remanescentes do estado previdência
(welfare state).
O objectivo da resistência "conservadora" será
transformar todo o corrupto sistema legal de "criminalidade
funcional" num sistema de "igualdade perante a lei". Isto
exigirá uma alteração fundamental no poder
político, ao nível local e regional, dos gabinetes dos banqueiros
para os conselhos dos bairros populares e lugares de trabalho, dos
juízes e reguladores acomodatícios nomeados pela elite para
representantes reais eleitos pela maioria que geme sob o nosso actual sistema
de injustiça.
05/Agosto/2012
O original encontra-se em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=32220
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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