As falsas esperanças no
shale oil
- A Shell encerra operações com shale oil 1.800 furos secos
- O Pico Petrolífero continua a assombrar o mundo
No princípio da semana passada a Shell Oil anunciou que estava a
encerrar o seu projecto de investigação do
shale oil
[petróleo de xisto] no Colorado ocidental. Ao combinar o seu
afastamento com o da Chevron, em Fevereiro de 2012, pode-se contar mais um
prego no caixão do
shale oil.
Mas uma vez que este recurso não convencional se alinha entre os maiores
do mundo, estimado em cerca de 1 milhão de milhões de barris de
energia líquida potencial, isto pode
não
ser o capítulo final nos esforços para desenvolvê-lo. Mas
provavelmente será.
O petróleo de xisto pode ser o ouro dos tolos no mundo da energia. Como
escreveu em 2005 Randy Udall, um velho amigo e analista de energia: "Se o
petróleo bruto é rei, o óleo de xisto é um
indigente. Faz parte dos restos. O mistério não é que
falte uma indústria do óleo de xisto; é que gastemos
milhares de milhões a tentar desenvolver uma". Sua mais incisiva
pergunta: serão tais esforços de desenvolvimento actos inspirados
ou de desespero?
Um segredo muito mal guardado é que não há petróleo
no óleo de xisto. A rocha chamada de marga
[1]
e o hidrocarboneto que ela contém é uma substância
cerúlea que nunca chegou a se transformar em petróleo o
calor e a pressão aplicados ao longo de milhões de anos para
transformar o sólido em energia líquida não foram
suficientes. Ao invés disso, empresas como a Shell cozeram o
querogéneo transformando-o em petróleo através da
injecção de energia calorífica. Um
bocado
de energia calorífica. Quantidades enormes de energia
calorífica. De facto, era necessária tanta uma nova
instalação muito grande de energia por cada 100 mil barris/dia de
líquido produzido que o processo, apesar da vasta I&D, nunca fez
sentido económico.
A Shell foi cautelosa com os pormenores da sua análise de balanço
energético, também conhecido como Energy Return on Energy
Invested (rácio EROEI). Mas parece provável que por cada unidade
de input de energia para produzir líquido a partir do querogéneo,
o output era de apenas duas unidades, talvez 2,5 unidades no melhor dos casos.
(Para comparação, o petróleo convencional nos EUA é
provável que proporcione aproximadamente 10 unidade de output
energético por cada unidade de input.) Além disso, apesar de a
Shell afirmar que possuía suficientes direitos de água para
abastecer as quantidades substanciais exigidas durante a
produção, residentes do árido Colorado ocidental esperam
grandes impactos no seu abastecimento de água.
As grandes exigências de energia e de água sem dúvida
contribuíram para a saída da Shell, embora a companhia tendesse a
falar em termos de "evolução de prioridades" e
"outras oportunidades". Em comentários da Shell para
jornalistas, eles não diziam exactamente, "isto acabou. Kaput.
Finito". Afinal de contas, isso seria reconhecer o facto de que suas
"dezenas de milhões de dólares" investidos desde meados
de 2005 na I&D do petróleo de xisto não foram suficientes
um jogo de alto risco tendo como subproduto apenas alguma aprendizagem, mas
principalmente dinheiro despejado num buraco de rato.
Se a miséria ama aquela companhia, a Shell tem abundância dela.
Durante a era 1915-1920, promotores do petróleo de xisto aguentaram o
primeiro dos muitos ciclos de ascensão e queda de investimento. Meio
século depois, o mais infame destes crashes atingiu duramente o Colorado
ocidental; foi o arder dos nossos US$8 mil milhões de investimento
federal em petróleo de xisto principiados durante o fim da década
de 1970. Quando a Exxon Mobil Corp. abandonou o seu projecto de US$5 mil
milhões em 2 de Maio de 1982 (chamado "Bloody Sunday), ela cortou
2.200 empregos e remeteu o Colorado ocidental e central para uma
depressão de uma década. Hoje, a decisão da Shell tem
impacto apenas em algumas dúzias de habitantes do Colorado. Mas
dá uma pancada no mais recente entusiasmo com o petróleo de xisto.
Ainda em 2005, um congressista da Califórnia que deve ter sido ou
cego, ou tolo ou perturbado entoava que se simplesmente
avançássemos com o programa do petróleo de xisto, como
afirmava um relatório do Departamento da Energia, os EUA podiam estar a
produzir 10 milhões de barris por dia num par de décadas. Uma vez
que a nossa produção de petróleo do tipo US$3/barril
realmente atingiu o pico perto dos 10 milhões de b/d há uns 40
anos atrás, a noção de que podíamos alguma vez
produzir tanto do muito mais caro petróleo de xisto era ilusória.
Randy classificava-se na primeira linha dos cépticos do petróleo
de xisto. A nossa visita conjunta ao sítio de investigação
Mahogany Creek, da Shell, em Agosto de 2005, deu o pontapé de
saída às suas preocupações. Ao longo dos oito anos
seguintes ele escreveu numerosos artigos brutalmente francos, inclusive:
"Illusive Bonanza: Pulling the Sword from the Stone", e
começou a falar publicamente acerca dos desafios e aspectos negativos do
petróleo de xisto. Ele raramente poupava palavras.
Durante a nossa visita ao sítio de I&D da Shell, o pessoal da companhia
mostrou-nos a pequena área, um local do tamanho de uma garagem para dois
carros, a partir da qual haviam produzido 2000 barris de líquidos de
petróleo de alta qualidade. Aquilo era a culminação de 25
anos de esforços de I&D. Eles opinavam que depois de mais outros cinco
anos de I&D, em 2010, deveriam ser capazes de tomar uma decisão de
avançar ou não avançar a comercialização.
Mas em 2010 a Shell admitiu que precisava de mais tempo. Agora temos a sua
resposta: vamos sair daqui.
Antes de Randy ter morrido, em Junho último, talvez a sua última
publicação tenha sido um artigo questionando uma viragem recente
na história do petróleo de xisto: a entrada da companhia Enefit,
de propriedade do governo da Estónia, na saga do petróleo de
xisto estado-unidense. A Estónia aparentemente concordou em subsidiar
esforços da Enefit para exportar sua tecnologia do petróleo de
xisto para os EUA e alhures. Um engenheiro de minas estoniano quis saber porque
os contribuintes estonianos estavam a subsidiar com 500 milhões de
kroons um tal desenvolvimento. Randy continuou assim:
"Mas o que é um "kroon", alguém pode perguntar.
Kroons foram outrora a divisa local na Estónia. Então, quando o
país adoptou o Euro, as velhas notas bancárias foram comprimidas
em tijolos e queimadas como combustível de aquecimento. Foi mais
inteligente queimá-las assim, na minha opinião, do que
queimá-las no petróleo de xisto".
Mas a simples dimensão deste objectivo ilusório e os altos
preços dos produtos petrolíferos tornam provável que
continue algum nível de I&D, com ou sem grandes companhias de
petróleo como a Shell e a Chevron. Assim, como poderia ter dito Yogi
Berra
[2]
, isto não está acabado até estar acabado... embora
provavelmente já devesse estar.
[1] Marlstone: Rocha marga, tipo de marga que contém argila e
carbonato de cálcio.
[2] Yogi Berra: Jogador de beisebol dos EUA.
Ver também:
A indústria petrolífera relança o conto falso da abundância
, 01/Ago/12
O arrumar de poltronas no tombadilho do Titanic
, 30/Mar/12
Produção de petróleo: Os retornos decrescentes e as previsões irrealistas da AIE
, 22/Nov/12
Pico Petrolífero: Desafios e oportunidades para os países do CCG
, 17/Abr/13
Combustíveis fósseis e nuclear a perspectiva da oferta
, 08/Mai/13
[*]
Consultor e analista de energia, aposentado.
O original encontra-se em
Peak Oil Review
, 30/Set/2013
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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