A fuga de petróleo no Golfo "pode perdurar anos" se não
for travada
por F. William Engdahl
[*]
A administração Obama e responsáveis superiores da BP
estão a trabalhar freneticamente não para travar o pior desastre
petrolífero do mundo, mas sim para esconder a verdadeira extensão
da catástrofe ecológica real. Investigadores experientes
contam-nos que o furo da BP atingiu um dos canais de migração do
petróleo e que a fuga poderia continuar durante anos a menos que passos
decisivos sejam tomados, algo que parece longe da estratégia actual.
Numa discussão recente, Vladimir Kutcherov, professor do Instituto Real
de Tecnologia da Suécia e da Universidade Estatal Russa do
Petróleo e do Gás, previu que a actual fuga de petróleo
que inunda as praias da Costa do Golfo dos EUA "poderia perdurar durante
anos e anos ... muitos anos"
[1]
Segundo Kutcherov, um importante especialista na teoria da origem
abiogénica
do petróleo, "O que a BP furou foi o que chamamos um 'canal de
migração', uma falha profunda na qual hidrocarbonetos gerados nas
profundidades do nosso planeta migram para a crosta e são acumulados em
rochas, algo como Ghawar na Arábia Saudita"
[2]
Ghawar, o campo
petrolífero mais prolífico do mundo, tem estado a produzir
milhões de barris de petróleo por dia durante quase 70 anos sem
nenhum término à vista. Segundo a ciência abiótica,
Ghawar tal como todos os depósitos gigantes de petróleo e
gás do mundo, está localizado sobre um canal de
migração semelhante àquele no Golfo do México rico
em petróleo.
Como escrevi já em Janeiro de 2010 no momento do desastroso terramoto do
Haiti
[3]
, este país foi identificado como tendo potencialmente enormes
reservas de hidrocarbonetos, assim como a vizinha Cuba. Kutcherov estima que
todo o Golfo do México é um dos mais acessíveis locais do
planeta para extrair petróleo e gás abundante, pelo menos antes
do acidente do Deepwater Horizon no mês de Abril.
"Na minha visão, os chefes da BP reagiram com o pânico face
à escala do petróleo expelido para fora do furo", acrescenta
Kutcherov. "O que é inexplicável nesta altura é
porque eles tentam uma coisa, fracassam, então tentam uma segunda,
fracassam, então uma terceira. Dada a escala do desastre eles deveriam
tentar toda a opção concebível, mesmo se a décima,
tudo ao mesmo tempo na esperança de que uma funcione. Caso
contrário, esta fonte de petróleo poderia vomitar óleo
durante anos dados os volumes que já vieram à
superfície"
[4]
Ele enfatiza: "É difícil estimar quão grande é
esta fuga. Não há informação objectiva
disponível". Mas tendo em consideração a
informação acerca da última descoberta 'gigante' da BP no
Golfo do México, o campo Tiber, a umas seis milhas [9,66 km] de
profundidade, Kutcherov concorda com Ira Leifer, um investigador do Instituto
de Ciência Marinha da Universidade da Califórnia, Santa
Bárbara, o qual diz que o petróleo pode estar a ser expelido a
uma taxa de mais de 100 mil barris por dia.
[5]
Tal enormidade da fuga de petróleo vem mais uma vez desacreditar
claramente o mito das companhias petrolíferas do "peak oil"
[NR]
, o qual afirma que o mundo já está ou está próximo
do "pico" da extracção económica de
petróleo. Este mito, o qual tem sido propagandeado nos últimos
anos por círculos próximos ao antigo homem do petróleo e
vice-presidente de Bush, Dick Cheney, foi efectivamente utilizado pelas
principais companhias gigantes do petróleo para justificar preços
mais elevados do petróleo que de outra forma seriam politicamente
impossíveis, com a afirmação de uma escassez de
petróleo não existente.
Obama & BP tentam esconder
Segundo uma reportagem do jornalista de investigação de
Washington Wayne Madsen, "a Casa Branca e a British Petroleum estão
a encobrir a magnitude do desastre petrolífero de nível
vulcânico no Golfo do México e a trabalhar em conjunto para
limitar a responsabilidade da BP pelos danos causados pelo que pode ser chamado
um mega-desastre".
[6]
Madsen cita fontes dentro do US Army Corps of Engineers, FEMA e Departamento
de Protecção Ambiental da Florida para corroborar a sua
afirmação.
Obama e a sua equipe senior da Casa Branca, bem como o secretário do
Interior Salazar, estão a trabalhar com o executivo chefe da BP, Tony
Hayward, sobre legislação que elevaria o limite superior de
responsabilidade por reclamações de danos daqueles afectados pelo
desastre petrolífero de US$75 milhões para US$10 mil
milhões. Contudo, segundo estimativas informadas citadas por Madsen, o
desastre tem um custo potencial real de pelo menos US$1000 mil milhões
(um milhão de milhões de dólares). Esta estimativa
apoiaria a avaliação pessimista de Kutcherov de que a fuga, se
não for rapidamente controlada, "destruirá toda a linha
costeira dos Estados Unidos".
Segundo a reportagem de Madsen, as declarações da BP de que uma
das fugas fora contida são "pura desinformação de
relações públicas destinadas a evitar o pânico e
exigências de maior acção por parte da
administração Obama, segundo fontes do FEMA e do Corps of
Engineers".
[7]
A Casa Branca tem resistido a divulgar qualquer "informação
danosa" acerca do desastre petrolífero. Peritos da Guarda Costeira
e do Corps of Engineers estimam que se o geyser oceânico de
petróleo não for travado dentro de 90 dias haverá danos
irreversíveis para os eco-sistemas marinhas do Golfo do México,
Oceano Atlântico Norte e mais além. Na melhor das
hipóteses, dizem alguns peritos do Corps of Engineers, levaria dois anos
para cimentar a fenda no fundo do Golfo do México.
[8]
Só depois de a magnitude do desastre tornar-se evidente é que
Obama ordenou ao secretário de Segurança Interna, Napolitano,
declarar o mesmo como uma "questão de segurança
nacional". Embora a Guarda Costeira e o FEMA seja parte do seu
departamento, a razão real de Napolitano para invocar a segurança
nacional, segundo Madsen, foi simplesmente para impedir a cobertura pelos media
da imensidão do desastre que está a desdobrar-se para o Golfo do
México, o Oceano Atlântico e suas linhas costeiras.
A administração Obama também conspirou com a BP para
esconder a extensão da fuga de petróleo, segundo o
repórter citado e fontes estatais. Depois de a plataforma
petrolífera ter explodido e afundado, o governo declarou que 42 mil
galões [158.987 litros] por dia estavam a jorrar da fenda no leito do
mar. Contudo, submersíveis que monitoram a fuga de óleo no leito
do Golfo estão a ver figuras no écran do que descrevem como uma
erupção de petróleo "tipo vulcânica".
Quando o Army Corps of Engineers tentou pela primeira vez obter da NASA imagens
da mancha de petróleo no Golfo, a qual é maior do que está
a ser relatada pelos media, foi-lhe segundo consta negado o acesso. Por acaso,
o National Geographic conseguiu obter imagens de satélite da
extensão do desastre e publicou-as no seu sítio web. Outras
imagens de satélite que consta estarem a ser retidas pela
administração Obama mostram que o que jaz sob a fenda escancarada
vomitando petróleo a uma taxa sempre alarmante é uma caverna que
se estima ser da dimensão do Monte Everest. A esta
informação foi dada uma classificação quase ao
nível de segurança nacional para mantê-la afastada do
público, segundo fontes de Madsen.
O Corps of Engineers e o FEMA são considerados serem altamente
críticos da falta de apoio para acção rápida
após o desastre petrolífero por parte da Casa Branca de Obama e
da Guarda Costeira dos EUA. Só agora a Guarda Costeira entendeu a
magnitude do desastre, despachando aproximadamente 70 navios para a área
afectada. Sob as frouxas medidas regulamentares implementadas pela
administração Bush-Cheney, o Minerals Management Service (MMS) do
Departamento do Interior dos EUA tornou-se um simples "carimbador",
aprovando tudo o que as companhias petrolíferas quisessem em termos de
precauções de segurança que poderia ter impedido tal
desastre. Madsen descreve um estado de "colusão criminal"
entre a antiga firma de Cheney, Halliburton, e o MMS do Departamento do
Interior, e que o potencial para desastres semelhantes existe com as outras 30
mil plataformas
(rigs)
offshore que utilizam as mesmas válvulas de bloqueio
(shut-off valves).
[9]
Silêncio dos grupos ecologistas?... Siga o dinheiro
Sem dúvida neste ponto estamos em meio do que poderia ser a maior
catástrofe ecológica da história. A explosão da
plataforma petrolífera teve lugar quase dentro do actual circuito
(loop)
onde se origina a Corrente do Golfo. Isto tem consequências
ecológicas e climatológicas enormes.
Um olhar superficial de um mapa da Corrente do Golfo mostra que o
petróleo não está apenas em vias de cobrir as praias do
Golfo, ele propagar-se-á para as costas do Atlântico até a
Carolina do Norte e então para o Mar do Norte e a Islândia. E
além do dano para as praias, a vida marinha e abastecimentos de
água, a corrente do Golfo tem uma química,
composição (organismos marinhos), densidade e temperatura muito
característica. O que acontece se o petróleo e os dispersantes e
todos os compostos tóxicos que eles criam realmente mudarem a natureza
da Corrente do Golfo? Ninguém pode descartar mudanças potenciais
incluindo mudança no caminho da Corrente do Golfo, e mesmo pequenas
mudanças poderiam ter enormes impactos. A Europa, incluindo a
Inglaterra, não é um deserto gelado devido ao aquecimento da
Corrente do Golfo.
Contudo, há um silêncio ensurdecedor por parte destas muito
ambientais organizações que deveriam estar nas barricadas a
exigir que a BP, o governo dos EUA e outros actuem decisivamente.
Este silêncio ensurdecedor das principais organizações
verdes ou ecologistas tais como Greenpeace, Nature Conservancy, Sierra Club e
outras pode muito bem ser ligado a um rastro de dinheiro que leva directamente
à indústria petrolífera, nomeadamente a BP.
Organizações ambientalistas importantes tiveram significativos
subornos financeiros nos últimos anos da BP a fim de que a companhia
petrolífera pudesse refazer-se a si própria com uma "cara
ambientalmente amistosa", como na nova marca da companhia "para
além do petróleo"
("beyond petroleum").
A Nature Conservancy, descrita como "o mais poderoso grupo ambiental do
mundo"
[10]
concedeu à BP um assento no seu Conselho Internacional
de Liderança depois de a companhia petrolífera dar à
organização mais de US$10 milhões nos últimos anos.
[11]
Até recentemente, a Nature Conservancy e outros grupos ambientais
trabalhavam com a BP numa coligação que fazia lobby junto ao
Congresso sobre questões de mudança climática. Um
empregado da BP Exploration serve como administrador
(trustee)
não pago da Conservancy no Alasca. Além disso, segundo um
relatório recente publicado pelo Washington Post, a Conservation
International, outro grupo ambiental, aceitou US$2 milhões em donativos
da BP e trabalhou com a companhia num certo número de projectos,
incluindo um que examinava métodos de extracção de
petróleo. De 2000 a 200 6, John Brown, então executivo chefe da
BP, sentou-se na administração da CI.
Além disso, The Environmental Defense Fund, outra influente
organização ecologista, juntou-se à BP, Shell e outras
grandes corporações para formarem um Partenariado para a
Acção Climática, a fim de promover "mecanismos
baseados no mercado" (sic) para reduzir emissões de gases com
efeito de estufa.
Grupos ambientais não lucrativos que aceitaram donativos ou aderiram a
projectos com a BP incluem Nature Conservancy, Conservation International,
Environmental Defense Fund, Sierra Club e Audubon. Isto podia explicar porque o
clamor político até à data por acção
decisiva no Golfo tem sido tão em surdina.
[12]
Naturalmente estas organizações por si sós não
vão resolver esta catástrofe. O ponto central nesta altura
é quem está preparado para colocar os recursos científicos
federal e internacionais urgentemente necessários para a
resolução desta crise. Acções ulteriores do
género daquelas da Casa Branca de Obama até à data ou da
BP só podem levar à conclusão de que algumas pessoas muito
poderosas querem que esta derrocada continue. As próximas semanas
serão críticas para esta avaliação.
12/Junho/2010
Notas:
(1) Vladimir Kutcherov, discussão telefónica com o autor,
09/Junho/2010.
(2) Ibid.
(3) F. William Engdahl, The Fateful Geological Prize Called Haiti, Global
Research.ca, January 30, 2010,
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=17287
(4) Vladimir Kutcherov, op. cit.
(5) Ira Leifer, Scientist: BP Well Could Be Leaking 100,000 Barrels of Oil a
Day, June 9, 2010,
http://www.democracynow.org/2010/6/9/scientist_bp_well_could_be_leaking
(6) Wayne Madsen, The Coverup: BPs Crude Politics and the Looming Environmental
Mega Disaster, May 6, 2010, accessed in
oilprice.com/Environment/Oil-Spills
(7) Ibid.
(8) Ibid.
(9) Ibid.
(10) Tim Findley, Natures' Landlord, Range Magazine, Spring 2003.
(11) Joe Stephens, Nature Conservancy faces potential backlash from ties with
BP, Washington Post, May 24, 2010,
www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2010/05/23/AR2010052302164.html
(12) Ibid.
[NR] Peak Oil: O Pico Petrolífero não é um mito e sim uma
realidade objectiva. O desastre do Golfo do México vem confirmar que
é cada vez mais difícil o acesso e a
extracção do petróleo: ele tem de ser buscado em
águas cada vez mais
profundas, em lugares cada vez mais inóspitos, etc. Ao
contrário
do que diz o autor, as companhias de petróleo pouco falam (publicamente)
do Pico Petrolífero e algumas tentam mesmo negar a sua realidade.
É incorrecto contrapor a escola geológica que defende a
origem abiótica do petróleo
ao Pico Petrolífero. A teoria do Pico de Hubbert
nunca pretendeu que algum dia seria esgotado absolutamente
todo o petróleo existente no planeta e sim a fracção do
mesmo recuperável pelo homem sob as condições
técnicas e económicas existentes. Em termos de economia
política, a base teórica para a análise do esgotamento
relativo de recursos está no Livro III de
O Capital,
no capítulo que trata da renda diferencial de explorações
mineiras. JF
Ver também:
BP Official Admits to Damage Beneath the Sea Floor: Dim Prospects for Stopping the Leak
(Responsáveis da BP admitem dano abaixo do leito do mar: Escassas perspectivas
de travar a fuga).
[*]
Autor de
A Century of War: Anglo-American Oil Politics and the New World Order
O original encontra-se em
http://en.fondsk.ru/article.php?id=3094
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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