O terrível medo da estagnação e a guerra à
Segurança Social
David Wyss, economista chefe da Standard & Poor, iniciou recentemente o artigo
"Bom, sombrio ou amargo em 2005?" (Good, Gloomy or Grim in
2005?), com as seguintes palavras: "O crescimento encabeça a
lista dos desejos [para a economia americana], mas mesmo a recessão
não seria de todo tão má, uma vez que a ela sempre se
segue a recuperação. Qual o medo terrível? A
estagnação" (
Business Week Online,
10/Janeiro/2005).
Acreditamos que esta avaliação é suficientemente
importante para merecer um exame mais atento. Wyss sugere que um
período de baixa cíclica seria automaticamente seguido por um
período de alta do ciclo, o que representa uma ameaça menos
séria para o processo de acumulação do que a
continuação ou aprofundamento da estagnação que tem
infectado a economia americana e mundial nas últimas décadas. A
estagnação é habitualmente entendida como um longo
período de crescimento vagaroso, nível de emprego fraco e
investimento fraco. Ela é evidente nos ciclos de alta dos
negócios, os quais tendem a ser fracos e dependentes de estímulos
artificiais, como nos ciclos de baixa. A estagnação portanto
representa a tendência económica subjacente na qual ocorrem os
ciclos normais de altas e baixas dos negócios. Ela não conduz
automaticamente à sua própria reversão, e pode
prolongar-se indefinidamente não é de admirar que a
recessão constitua antes, segundo Wyss, "o cenário mais
amedrontador".
A economia americana está agora em meio a uma recuperação
da recessão de 2001 um ciclo de baixa que foi antecedido pela
explosão da bolha financeira da New Economy. Haverá
razões sob as actuais condições para temer que o motor
económico possa subitamente avariar-se ou simplesmente engasgar-se ao
longo de anos (ou mesmo décadas) sem produzir qualquer energia real?
Wyss sugere que sim. Primeiro embora não se incomode em
mencionar isto ao seu público do
Business Week Online
há a história dos últimos quatro anos (três
deles de recuperação), durante os quais o PIB real cresceu uns
anémicos 2,5 por cento. Segundo, há um certo número de
"grandes riscos" que incluem: "alta dos preços do
petróleo, a queda do dólar, taxas de juros mais elevadas e os
défices gémeos o défice do orçamento federal
e o défice em conta corrente na transações internacionais
que poderiam desestabilizar a economia. A maior
preocupação é a possibilidade de que uma nova crise
financeira provocada por tais factores venha a conduzir à espécie
de estagnação arraigada e inexorável que infectou a
economia japonesa desde a explosão da sua bolha financeira no fim de
1989. "Até agora", declara Stephen Roach, economista chefe do
Morgan Stanley, "a experiência pós-bolha da América
foi muito diferente simplesmente uma recessão e nada pior do que
um breve susto de deflação. Mas ainda pode ser prematuro
concluir que os EUA evitaram o temível síndroma
japonês" (Global Post-Bubble Pitfalls Yet Another Lesson
from Japan", www.morganstanley.com, 18/Fevereiro/2005).
Mas se o espectro da estagnação está a assombrar a
economia dos EUA e do mundo isto é subestimado na
avaliação de Bush, no 2005 Economic Report of the President. A
introdução assinada pelo presidente Bush proclama que "os
Estados Unidos estão a desfrutar uma robusta expansão
económica". No entanto, o crescimento económico de 3,3 por
cento, apenas um pouco acima da taxa anual média dos últimos 35
anos, é projectado pela administração para o resto da
década. Na verdade, se a taxa de crescimento de 2,8 por cento para os
anos 2000-04 (ver gráfico 1)
for combinada com as projecções da própria
administração para os cinco anos seguintes a taxa anual de
crescimento para a década 2000-09 seria de 3,1 por cento, ligeiramente
abaixo da média das últimas três décadas e muito
pior do que as da década de 1960. A história económica
recente e a projecções da administração apontam
portanto para a probabilidade do contínuo crescimento vagaroso nos anos
pela frente.
Ainda assim, as implicações disto são habilidosamente
evitadas no Economic Report of the President deste ano. Divulgado no fim de
Fevereiro pelo Council of Economic Advisors presidencial, ele atribui a fraca
recuperação dos últimos poucos anos à
superficialidade da recessão anterior. Numa óbvia tentativa de
por de lado a questão do crescimento lento, o relatório afirma
que tanto "as recessões como as expansões recentes foram
especialmente moderadas, sugerindo que a economia tornou-se de um modo geral
mais estável" (70). O que isto significa, naturalmente, é
que uma expansão sem brilho tem sido difícil de distinguir da
contracção relativamente superficial que a antecedeu. Numa
palavra, estagnação.
Se a estagnação persistente e prolongada constitui o "grande
terror" daqueles que dirigem a economia de hoje, como pode ela ser
explicada? E como estará ela ligada ao actual ataque à
Segurança Social e outros programas sociais, simbolizando aquilo que
é claramente um novo cenário na guerra de classe dos que
estão acima?
ESTAGNAÇÃO, O ESTADO NORMAL
De acordo com uma perspectiva teórica que já apresentámos
muitas vezes nestas páginas, o estado normal da economia capitalista
é a estagnação e não o crescimento rápido.
Isto é particularmente verdadeiro no estágio do capitalismo
monopolista (incluindo o mundo corporativo mais globalizado de hoje) no qual
firmas gigantes tentam maximizar o excedente económico à sua
disposição procurando controlar e regular cuidadosamente a
expansão da capacidade de produção. A
super-acumulação, reflectida no crescendo de excesso de
capacidade não desejada, devida em última análise ao
consumo restrito das massas, tem o efeito de travar o investimento pois as
corporações procuram evitar o acréscimo de fábricas
e equipamento ocioso. O resultado é uma tendência rumo a um
amortecimento geral do crescimento.
Na raiz deste problema está o banimento efectivo da
competição de preço nas indústrias mais maduras e
consolidadas. Os preços como um todo tendem a seguir apenas um caminho
para cima. Isto significa que a competição não
é eliminada mas canalizada para áreas como
inovações na economia de custos e no marketing. As
corporações respondem a quedas na procura não
através da redução de preços mas na maior parte
através da redução da capacidade de
utilização juntamente com o emprego a fim de defender as suas
margens de lucro. Aumentos na produtividade geralmente não conduzem a
preços mais baixos ou a salários reais acrescidos (os quais
aumentam decisivamente só quando a economia se aproxima de picos de
pleno emprego), ao invés disso eles acabam por alimentar o excedente
nas mãos das corporações e dos ricos. O resultado disto
tudo, contudo, é criar super-acumulação e uma escassez de
procura efectiva na economia como um todo. Um crescente excedente à
procura de investimento controlado por uma número relativamente pequeno
de corporações gigantes e indivíduos ricos é
incapaz de encontrar saídas de investimento lucrativo, reduzindo a taxa
de expansão económica. Estes booms de investimento que se
verificam sob tais circunstâncias tendem a ser de vida extremamente curta
e auto-limitada.
Estes problemas de acumulação típicos do capitalismo
monopolista precisam ser entendidos num contexto histórico mais amplo e
mais vasto no qual se reconhece que em todos os períodos de crescimento
rápido sob o capitalismo entraram em jogo factores históricos
externos não compreensíveis em termos processos de
acumulação interna (poupanças-e-investimento). No
período inicial da industrialização havia uma procura
aparentemente insaciável por novas fábricas e equipamentos uma
vez que a indústria tinha de ser construída virtualmente desde o
início. Mas numa economia madura, rica em capital, na qual existe ampla
capacidade produtiva tanto para cumprir as necessidades correntes como para
expandir o nível de produção, apenas com o investimento
necessário para substituir fábricas e equipamentos desgastados,
faltam estímulos fortes a novo investimento na escala que se verifica
numa revolução industrial. Como observou Joseph Schumpeter no
fim da sua obra em dois volumes sobre Ciclos de Negócios (1939):
"A atmosfera das revoluções industriais do progresso
é a única na qual o capitalismo pode sobreviver".
Sem isto o capitalismo tende a cair na estagnação. A Grande
Depressão da década de 1930 representou um longo período
de oportunidades de investimento desaparecidas na qual economistas de todas as
tendências foram finalmente obrigados a agarrar a questão da
estagnação.
A depressão acabou finalmente não através de qualquer
processo interno associado à acumulação, mas em resultado
do boom resultante do enorme aumento em gastos militares com o estalar da
Segunda Guerra Mundial na Europa. Quando acabou a guerra a
estagnação parecia ter-se desvanecido. Teve lugar um crescimento
rápido, que perdurou mais de duas décadas. A força e
duração desta "era dourada", como tem sido chamada, foi
claramente o produto de factores históricos especiais. Eles incluem:
(1) a acumulação de poupanças dos consumidores durante a
guerra; (2) a reconstrução das economias europeias e japonesa a
seguir à devastação da guerra; (3) a
extraordinária expansão da papel do automóvel na vida
americana numa onda de crescimento neste sector que também incluiu a
construção do sistema de rodovias inter-estaduais e a
suburbanização do país; (4) a ascensão dos Estados
Unidos e do estatuto hegemónico do dólar na economia mundial;
(5) a criação de uma economia de guerra permanente justificada
pela Guerra Fria (a qual incluiu guerras quentes na Ásia); (6) a
comercialização de quase todos os aspectos da vida americana com
os consequentes esforços de vendas e a estrutura da dívida do
consumidor; e (7) os princípios de um boom/bolha na superestrutura
financeira da economia.
O PNEU FURADO
O perturbador é que todas estas forças foram temporárias
ou simplesmente não podiam actuar suficientemente. Uma economia com
tendência para a estagnação é como um pneu furado;
está sempre em processo de esvaziar-se. Portanto é preciso estar
constantemente a injectar-lhe ar. Uma vez que aquilo de que estamos a falar
é do sistema de crescimento, podemos além disso dizer que tanto a
dimensão do pneu como do furo estão a expandir-se de modo que
só um compressor cada vez maior e mais activo servirá para
mante-lo inflado (ver Harry Magdoff e Paul Sweezy,
The End of Prosperity,
1977, 22).
Na década de 1970 a economia diminuiu de velocidade, o que representou
um retorno à estagnação. A produção com
pleno emprego não foi atingida novamente durante qualquer período
extenso e a taxa anual média de crescimento da economia afundou durante
mais de um trimestre durante as últimas três décadas do
século, quando comparadas com a década de 1960
(gráfico 1). Além disso, a taxa de crescimento parece estar
vagarosamente a
deslizar ainda mais. A fuga do fluxo de rendimento exigiu uma bomba sempre
maior e cada vez mais activa. E enquanto isto se verificou em alguma
extensão assentar numa enorme explosão financeira, a bolha (ou
bolhas) financeira(s) resultante(s) geraram temores de eventos súbitos
de explosões de bolha, conduzindo a uma série de incumprimentos
(defaults)
da espécie que tem antecedido estagnações profundas.
A resposta do capital a estas situações de emergência tem
sido tríplice: (1) um incremento da guerra de classe; (2) uma
tentativa de aumentar a dimensão e a actividade do compressor (mas
consistente com a guerra de classe acima em termos que sirvam primariamente o
capital); e (3) um crescimento do imperialismo (incluindo a
globalização económica) e da guerra.
Todos estes três métodos de enfrentar a crise têm sido
utilizados pela Casa Branca de Bush, a qual tem ido mais longe do que qualquer
outra administração na promoção da guerra de
classe; inflou a economia de todos os modos possíveis que fossem
compatíveis com a adesão directa aos interesses da classe
dominante; e lançou uma guerra global para respaldar uma
estratégia de dominação mundial.
Internamente, a Casa Branca de Bush tem seguido uma política iniciada
pela administração Reagan, de pressão contínua
sobre os trabalho e os pobres enquanto estimula a economia pela
geração de défices maciços. Estes tornaram-se mais
aceitáveis para o sistema desde que associados com gastos militares e
com cortes fiscais, sobretudo para as corporações e o ricos. Os
défices orçamentais, como parte de uma estratégia de
"subalimentar a besta", são então usados para
justificar agudas reduções em programas sociais que ajudam os
pobres bem como a classes trabalhadora e média (Paul Krugman,
Spearing the Beast,
New York Times,
Op-Ed, 08/Fevereiro/2005). O supremo objectivo reaccionário desta
guerra de classe é eliminar ou estripar os grandes programas sociais
não só o Medicare, Medicaid e Segurança Social como
também assistência à habitação e à
nutrição, etc que ajudam o povo a enfrentar as muito duras
realidades do capitalismo.
É uma indicação da força do capital na luta de
classe que a Segurança Social, o mais popular de todos os programas
governamentais americanos, tenha sido escolhida como o primeiro alvo de uma
ofensiva renovada na batalha pela eliminação de todos os
programas do New Deal e da era social da década de 1960. Apesar de
décadas de propaganda conservadora cujo propósito era facilitar o
assalto, a Segurança Social até então fora geralmente
impenetrável (embora alguns cortes de benefícios tenham sido
iniciados no período Reagan) pois o suporte das suas próprias
contribuições regressivas descontadas nas folhas de pagamento
dava aos trabalhadores a sensação de que os benefícios da
sua Segurança Social lhes são devidos. O plano para a
privatização parcial da Segurança Social através da
criação de conta privados, as quais seriam baseadas em recortes
(carve-outs)
das contribuições à Segurança Social nas folhas de
pagamentos e implicariam cortes correspondentes em benefícios, é
um cavalo de Troia introduzido pela Casa Branca de Bush como um dispositivo
para destruir por dentro a Segurança Social. Mas a fim de amedrontar o
público, levando-o a apoiar uma tão grande revisão de um
programa governamental imensamente popular, era necessário afirmar que a
Segurança Social estava a enfrentar uma crise severa, tornando-a
insustentável a longo prazo.
Actualmente considera-se conhecimento comum que o fundo fiduciário
(trust fund)
da Segurança Social não será mais capaz de cumprir suas
obrigações totais em 2042 (pois prevê-se que os seus fundos
caiam uns 25 por cento abaixo daquilo deverá aos seus
beneficiários naquele ano). Contudo, este "facto" é
baseado em previsão a longo prazo da administração da
Segurança Social afirmando (nas projecções de custos
intermediários) que a taxa média anual de crescimento da economia
cairá precipitadamente de 3 por cento em 2005-10 para 2,2 por cento em
2010-15 e para um abissal 1,8 por cento em 2015-80 (ver gráfico 2).
O crescimento de 1,8 por cento previsto aqui é inferior à taxa
de crescimento em quaisquer duas décadas da história dos EUA,
incluindo 1920-39, o que inclui a Grande Depressão e é encarado
como o período clássico de estagnação sob o
capitalismo monopolista.
[1]
. com taxas de crescimento económico apenas um pouco acima disto, a
Segurança Social não correria qualquer perigo e disporia dos
fundos para cobrir os seus beneficiários indefinidamente. Na verdade, a
data em que a Segurança Social é suposta esgotar os fundos tem de
ser continuamente empurrada para trás pois as taxas de crescimento real
demonstram ser maiores do que aquelas projectadas.
Mais notável, contudo, é o facto de que se uma
estagnação tão profunda como a da década de 1930
fossem realmente estender-se durante décadas (com a taxa de crescimento
caindo para menos de 2 por cento durante a maior parte do século), em
conformidade com o que é considerado a melhor previsão estimativa
da administração da Segurança Social, o capitalismo
americano como um todo estaria em sério risco e a luta de classe seria
enormemente intensificada. A Segurança Social, a qual ainda poderia
cobrir três quartos dos seus benefícios em tal
situação, seria o menor dos problemas do sistema e seria mesmo
considerada como recurso de salvação. Na verdade, dado o
Armagedão económico que uma tão abissalmente baixa taxa de
crescimento a longo prazo anunciaria para uma sociedade capitalista, é
difícil imaginar como ir muito longe no caminho projectado por esta
administração da Segurança Social sem grandes
levantamentos sociais daquela espécie que desafia todas as
suposições sobre o futuro.
DESONESTIDADE EXTREMA
A verdade é que, com uma taxa de crescimento a longo prazo deste
espécie, aquilo que seria posto em causa não seria a
Segurança Social e sim o próprio capitalismo. Estará isto
dentro do leque de possibilidades? Sim, pensamos que é o caso. Mas
projectar um tal futuro, no qual o capitalismo americano como um todo
mergulharia nas profundezas, com estagnação perpétua e
crises infindáveis e guerra de classe, e a seguir, sem falar desta
crise mais ampla, apresentar isto simplesmente como uma crise da
Segurança Social resultante de meras tendências
demográficas é de uma desonestidade extrema.
A extensão do engodo revela-se no facto de o então presidente do
Council of Economic Advisors da administração Bush, N. Gregory
Mankiw, ter declarado redondamente: "O fundo fiduciário da
Segurança Social estará esvaziado em 2042, ponto no qual o
sistema estará insolvente" (The Economic Agenda,
The Economists' Voice,
vol. 1, no. 3 [2004], 4). Isto foi declarado claramente com a
intenção de enganar uma vez que naquela data a Segurança
Social terá fundos suficientes para cobrir três quartos das suas
obrigações conforme suposições conservadoras da sua
administração mesmo que não fossem efectuadas
absolutamente nenhumas alterações ao sistema. Na verdade,
é adequado perguntar como a Segurança Social poderia tornar-se
insolvente de todo, uma vez que é parte do orçamento do governo
americano. Se a Segurança Social estivesse sempre com fundos escassos
estes poderiam ser retirados do imposto geral sobre rendimentos como em outros
países industriais avançados. Não há razão
para que a Segurança Social tenha de ser internamente mais
autónoma do que o Pentágono.
A Segurança Social foi um produto da grande revolta dos de baixo, dos
trabalhadores durante a Grande Depressão da década de 1930. Foi
concebida para manter os mais velhos e incapazes de caírem num profundo
e infindável buraco de pobreza. Agora, ironicamente, com baixas
económicas a aproximarem-se daquelas da depressão já a
serem projectadas para este século, servem de justificação
para a efectiva eliminação da Segurança Social.
Dificilmente haverá um sinal mais dramático da grande
reversão na luta de classe e na economia política do capitalismo
verificadas nas últimas poucas décadas.
Dado o antecedente, segue-se que aqueles que, em conformidade com a actual
proposta da Casa Branca, afirmam que a Segurança Social pode ser
parcialmente privatizada através da criação de contas
privadas individuais e que tais contas renderão altas taxas de retorno
estão a misturar dois diferentes conjuntos de livros. Altas taxas de
retorno no mercado de acções são extremamente
improváveis numa economia severamente estagnada. "Se o crescimento
económico for suficientemente lento para termos um problema com a
Segurança Social, então também estamos a caminhar para
problemas com o mercado de acções. É tão simples
como isso", segundo Douglas Fore, director da análise de
investimentos do TIAA-CREF Investment Management Group (
Washington Post,
09/Fevereiro/2005). Como o deputado Peter DeFazio (D-OR) colocou, "Os
proponentes não foram capazes de mostrar como o mercado de
acções seria capaz de proporcionar retornos de 7 por cento no
futuro [como afirmado na administração Bush, em tom de venda,
quanto às contas privadas] quando o crescimento económico
é projectado para ser apenas a metade daquilo que foi no passado"
(Peter DeFazio Reports, January 2005). Como observámos nestas
páginas, mais de quatro anos atrás (Social Security, the
Stock Market and the Elections, November 2000), isto é "como
prever a Grande Depressão sem um crash do mercado de
acções".
Como não há base científica sobre a qual as
tendências de crescimento da economia possam ser previstas com
precisão mesmo por uns poucos anos (ou meses) à frente, as
actuais previsões da administração da Segurança
Social poderiam muito facilmente ser substituídas por outras
ligeiramente mais optimistas, o que deixaria o sistema totalmente
solvável. Mas há um certo grau de realismo corporificado nestas
projecções na medida em que elas reconhecem que a
estagnação está entranhada na economia americana.
Não só um nível de produção com pleno
emprego deixou de ser considerado provável como o sistema parece estar a
ficar cada vez mais distante daquele objectivo. A estagnação,
embora isto seja pouco reconhecido, é quase uma suposição
embebida dentro da maior parte das análises económicas hoje
dominantes, uma vez que aceitam com tranquilidade a noção de que
a plena capacidade de produção nunca será
alcançadas.
A resposta para a desaceleração económica, apresentada
cada vez mais frequentemente por decisores económicos e
políticos, é remover os constrangimentos sobre o capital impostos
ou fortalecidos pelo New Deal numa área após a outra
regulamentações na banca, indústria, previdência,
alimentação e remédios, e media. Mas o aprofundamento
inevitável é apenas o aprofundamento da crise económica e
social da sociedade capitalista. Os "grandes riscos" de Wyss indicam
quão frágil se tornou o processo de acumulação.
Altos preços do petróleo (não alheios às tentativas
americanas de ganhar o controle do mundo petrolífero por meio da
invasão do Iraque), taxas de juros ascendentes (a ameaçarem uma
explosão da bolha imobiliária que suporta o consumo americano), o
dólar cadente (associado com o crescente défice em conta corrente
decorrente devido uma deterioração da balança comercial e
a saída de dólares), e o défice do orçamento
federal (um resultado combinado de crescimento fraco, cortes fiscais para os
ricos e um boom no complexo armamentista-imperialista) tudo aponta para
os enormes perigos de uma estagnação económica.
As despesas deficitárias federais, embora uma ferramenta
necessária para manter a economia em andamento, tornaram-se uma
importante fonte potencial de instabilidade, ameaçando os mercados
financeiros. Testemunhando perante o House Budget Committee em
02/Março/2005, o presidente do Federal Reserve, Alan Greenspan,
declarou: "Quando você começa a fazer a aritmética do
que a elevação dos níveis de dívida implicados
pelos défices lhe dizem, e você acrescenta os custos dos juros
daquela dívida sempre a crescer, a taxas de juro sempre mais elevadas, o
sistema torna-se fiscalmente desestabilizador. A menos que façamos
alguma coisa para melhorá-lo de um modo muito significativo estaremos
num estado de estagnação".
A REFOCILAR NA RIQUEZA
Como Greenspan bem sabe, o défice federal poderia ser aliviado
através da reversão dos cortes fiscais destinados aos ricos que a
administração Bush introduziu (ou não permitindo que eles
se tornem permanentes). Além disso, uma pequena porção do
rendimento perdido através destes cortes fiscais seria suficiente para
colocar a Segurança Social sobre uma base sólida indefinidamente
mesmo com um crescimento abissalmente lento no futuro. A fatia do PIB agora
gasta com a guerra no Iraque também seria mais do que suficiente para
cumprir a mesma finalidade (Paul Krugman, Inventing a Crisis,
New York Times,
07/Dezembro/2004). Mas a classe dominante dos EUA, a refocilar na sua
riqueza, não está prestes a oferecer a minúscula quantia
do excedente à sua disposição que seria necessária
para fortalecer a Segurança Social ou dar um passo em frente e
tornar os benefícios da Segurança Social mais adequados aos seus
receptores, que cada vez mais dela dependem como fonte principal de rendimento.
Ao invés disso, o objectivo é usar a falsa crise da
Segurança Social (cozinhada parcialmente para esconder a crise fiscal
real) como uma desculpa para esmagar os trabalhadores ainda mais. Assim
Greenspan, avesso a restabelecer impostos sobre os ricos, fez no entanto um
forte apelo no Congresso à introdução de um imposto sobre
o consumo que atingiria duramente os trabalhadores. Esta política tem
um nome: guerra de classe.
Está na natureza deste jogo que o povo trabalhador ficará sob o
ataque de trapaceiros enquanto os défices continuarão a aumentar
com todos os problemas decorrentes. Como observaram Harry Magdoff e Paul
Sweezy em
Stagnation and the Financial Explosion
(1987), "o estímulo gerado pela tinta vermelha infindável e
sempre maior é auto-limitante. Défices acumulados sobre pilhas
de défices proporcionam combustível para novas espirais
inflacionárias e ajudam a sustentar altas taxas de juro; e ao mesmo
tempo elas põem em movimento forças que finalmente travam o
crescimento e conduzem a um novo declínio dos negócios. Em suma,
o capitalismo encontra-se diante dos cornos de um dilema: não pode
viver sem défices, e não pode viver com eles" (106). A
crise fiscal do Estado, ou, como Schumpeter a denominou, "a crise do
Estado fiscal", é portanto uma parte da lógica da
estagnação na sociedade do capitalismo monopolista.
Na realidade, neste ponto qualquer dos grandes riscos da economia tem o
potencial para sacudir todo o sistema, arrebentando bolhas financeiras e
levando o crescimento a uma paralisação ou pior. Nem tão
pouco estes problemas estão confinados aos Estados Unidos. O resto da
economia capitalista mundial está presa de vários modos nesta
crise duradoura. Guerra classe dos de cima, competição crescente
entre os principais Estados capitalistas, imperialismo, conflito militar
global, e a proliferação do desperdício são
consequências naturais do presente mal estar económico.
Qual é a resposta? Não há soluções prontas
para os problemas aqui levantados. Os fardos económicos do sistema
vão provavelmente tornar-se mais, não menos, esmagadores para a
população comum, nacionalmente e globalmente. Na busca de uma
sociedade racional e sustentável não há qualquer
alternativa senão o socialismo isto é, a luta por uma
ordem democrática e igualitária. É uma ideia antiga, mas
uma ideia que se recusa a morrer e que agora está a tomar novas formas
revolucionárias. Compreender as limitações do capitalismo
é apenas o primeiro passo; o segundo tem de levar-nos a
superá-lo.
Notas
1- A taxa média anual de crescimento do PIB real foi de 2,1 por cento de
1920-39 (1,8 por cento de 1920-38) (Historical Statistics of the United
States, 1970, 226, series F 31).
O original encontra-se em
http://www.monthlyreview.org/0405editors.htm
. Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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