por
Monthly Review
Ao comentar a condição declinante da economia dos EUA, no
número de Janeiro de 1973 da
Monthly Review,
Paul Sweezy trouxe de volta a questão da "estagnação
secular", avançada pela primeira vez pelo principal seguidor de Keynes,
Alvin Hansen, no fim da década de 1930. "A economia dos EUA",
escreveu Sweezy num artigo intitulado "Notas sobre a
situação dos EUA no fim de 1972", "está a
experimentar ao mesmo tempo um boom cíclico e uma
estagnação secular". O ressurgimento da
estagnação, sugeriu ele, resultava em parte da tentativa
estado-unidense de se desembaraçar da Guerra do Vietname, a qual
anteriormente estivera a ascender a economia. Eram tempos de protestos
generalizados de estudantes contra a guerra e de influência crescente de
ideias radicais e anti-capitalistas, particularmente entre a
geração de economistas mais jovens para os quais o
Capitalismo monopolista
(1966) de Baran e Sweezy que declarara que "o estado normal da
economia capitalista monopolizada é a estagnação"
foi uma grande inspiração.
Um par de meses após a publicação do artigo de Sweezy, em
Março de 1973, o
New York Times,
procurando aquietar a ampliação dos protestos anti-capitalistas,
publicou uma série de artigos de opinião sob o título
geral de "Capitalismo, para o melhor ou o pior". A série
concentrava-se nos dois fenómenos: o enfraquecimento da prosperidade
económica e o declínio dos gastos militares resultante da
retirada da Guerra do Vietname. Um destes artigos, enganosamente intitulado
"Inventariando a guerra", publicado em 14 de Março, foi
escrito por Paul Samuelson, considerado então o principal economista
neoclássico nos Estados Unidos. Sweezy foi duas vezes alvo de
crítica no artigo de Samuelson primeiro, como um
"crítico revolucionário" de um extinto
"capitalismo vitoriano", agora completamente ultrapassado na era
keynesiana e, segundo, por se recusar a reconhecer que o keynesianismo havia
resolvido os problemas do ciclo de negócios
(business cycle)
e do desemprego. Como escreveu Samuelson:
Estamos há quase quarenta anos dentro da Era de Keynes. Acredito que
Luxemburgo e Lenine (e Hobson e Alvin Hansen) estavam certos quando se
preocupavam com a sustentabilidade do pleno emprego no laissez-faire dos
orçamentos equilibrados de William McKinley. Contudo, nestes
últimos trinta anos nem uma única economia mista teve qualquer
problema com insuficiência crónica de poder de compra. (Veja a
lista abaixo: os Estados Unidos, Grã-Bretanha, França,
Japão, Alemanha, a pequena Bélgica).
Nem no século que está para vir 1973-2073 o antigo
flagelo da escassez intermitente de poder de compra se verificará outra
vez na velha forma.
("E acerca da recessão e da estagflação, professor?
Não negue que ainda acontecem!" Naturalmente acontecem. E em 1983 e
2013 ainda podem praguejar a economia mista. Mas Sweezy e Bowles sabiam o que
Lenine e Luxemburgo não podia saber que a doença da
inflação de custos na qual está envolvida a
estagflação nada tem a ver com insuficiência de mercados
internos e que escapadas de guerra fria ou quente nada podem fazer para
melhorar isto).
Samuelson prosseguiu argumentando que despesas militares e guerras já
não eram mais necessárias para estimular a economia, pois os
economistas keynesianos sabiam como administrá-la numa base
pacífica, garantindo virtualmente crescimento económico
rápido.
Sweezy a seguir escreveu uma carta a Herbert Mitgang, membro do gabinete
editorial do
New York Times,
solicitando que lhe fosse permitido escrever um artigo de opinião em
resposta ao de Samuelson, no qual apresentaria seus próprios pontos de
vista, uma vez que haviam sido deturpados no artigo de Samuelson
incluindo a declaração de Samuelson de que Sweezy concordaria em
que problemas económicos já não tinham nada a ver com uma
escassez de procura efectiva. Mitgang recusou-se a oferecer o espaço
para resposta solicitado por Sweezy, dizendo-lhe que ele podia ao invés
escrever uma carta ao editor, o que Sweezy se recusou a fazer (Paul M. Sweezy,
"Op-Ed Liberalism",
Monthly Review,
Maio 1973). Em 26 de Março, o
New York Times
publicou mais um dos seus artigos "Capitalismo, para o melhor ou o
pior", mais uma vez criticando Sweezy. Desta vez era de Kenneth J. Arrow,
não menos eminente do que Samuelson (ambos ganharam o Prémio em
homenagem a Nobel de teoria económica, que fora criado recentemente pelo
Banco da Suécia após os Prémios Nóbeis originais
estabelecidos por Alfred Nobel). Arrow escreveu:
As novas ideias económicas de Keynes e seus discípulos foram
traduzidas para a política com velocidade quase sem precedente... Em
todos os países avançados o registo económico pós
II Guerra Mundial é como o de uma nova economia. Economistas radicais
esclarecidos, tais como Paul Baran e Paul Sweezy, rapidamente reconheceram que
a solução keynesiana funcionaria mas argumentaram que num sistema
capitalista o governo podia gastar bastante para assegurar pleno emprego
só com finalidades socialmente dissipadoras
(wasteful)
e destrutivas, tais como a guerra e a preparação para a guerra.
Gastos socialmente construtivos necessariamente competiriam com o sector
privado e finalmente o solapariam... [Mas] descobriu-se ser possível, ao
longo da última década, alcançar um nível de gastos
governamentais muito mais elevado com objectivos sociais e diminuir gastos com
defesa, pelo menos relativamente... Há pouca razão, portanto,
para aceitar a versão Baran-Sweezy da contradição do
desemprego embora talvez seja demasiado cedo para encarar definitivamente este
assunto controverso.
No ano seguinte, Leonard Silk, membro do conselho de editores do
New York Times
e seu principal colunista económico, publicou o livro intitulado
"Capitalismo: o alvo móvel" (Capitalism: The Moving Target),
constituído pelos artigos da série "Capitalismo, para o
melhor ou o pior" e alguns outros, incluindo um de Sweezy. Silk reconhecia
com isso a recusa do
New York Times
em permitir uma réplica de Sweezy e oferecia-lhe a oportunidade para
uma refutação. A contribuição de Sweezy para o
livro, intitulada "
Capitalismo, para o pior",
também apareceu na
Monthly Review,
em Fevereiro de 1974.
Sweezy respondia àqueles a que se referia como seus "amigos
keynesianos" (ele tivera boas relações com Samuelson quando
ambos estavam em Harvard na década de 1930 e relacionava-se bem com
Arrow) destacando com base na investigação que havia
efectuado com Harry Magdoff que se o aumento na fatia de emprego
relacionada com o sector militar em 1970 em comparação com a de
1938 fosse eliminado, a economia dos EUA teria níveis desemprego real
(incluindo sub-emprego) iguais àqueles da Grande Depressão. Os
muitos celebrados êxitos da teoria económica keynesiana estiveram
fortemente dependentes de gastos militares. Confrontado com a
alegação de Samuelson de que o próximo século seria
de prosperidade sem par e que a estagnação secular seria
tão desconhecia em 2013 como era irrelevante em 1973 juntamente
com a alegação de Arrow de que o keynesianismo havia ultrapassado
amplamente o espectro do desemprego Sweezy discordou. "A
questão real", escreveu ele, "a qual os economistas devem
tratar, mas recusam-se firmemente a fazê-lo, é porque o
capitalismo no século vinte tem uma tendência tão poderosa
para a estagnação que exige cada vez mais formas maciças
de dissipação pública e privada a fim de se manter em
andamento". Aqui, mais uma vez, Sweezy instava a um retorno à
questão da estagnação secular.
Um salto rápido para os dias de hoje. Grande parte da mística que
sempre cercou o antigo secretário do Tesouro Larry Summers, no interior
da profissão da ciência económica, tem a ver com o facto de
que além de ter dois economistas como pais (Robert e Anita Summers,
ambos professores de teoria económica na Universidade da Pennsylvania)
ele tinha dois tios vencedores do Prémio Nobel, um de cada lado da sua
família: Samuelson e Arrow. Hoje Summers está a atrair enorme
atenção intelectual por ter recuperado a noção de
"estagnação secular", escutando outra vez as ideias de
Hansen na década de 1930.
Tudo isto faz-nos perguntar: Será que Summers, então um
economista importante no MIT, leu as duas colunas escritas no
New York Times
pelos seus dois tios, a criticar Sweezy? Estava ele consciente do livro
Capitalism: The Moving Target,
de Leonard Silk, que inclui todos os três protagonistas e onde Sweezy
mais uma vez detonou o problema da estagnação? Será que
Summers compareceu à conferência de Sweezy "Por que a
estagnação?" no Harvard Economics Club em Março de
1982? (Nós lhe perguntámos previamente e a sua resposta inicial
foi que podia ter estado; mais disseram-nos seus representantes que era
improvável.) Será que Summers leu o artigo de Samuelson na
Newsweek
em 1970 sobre o debate Sweezy-Schumpeter sobre a estagnação, em
Harvard na década de 1940? (Ver John Bellamy Foster, "On the Laws
of Capitalism: Insights from the Sweezy-Schumpeter Debate",
Monthly Review,
Maio/2011.)
Não é provável que surjam respostas directas a estas
perguntas. No entanto, tudo isto destaca que a
Monthly Review
e a Monthly Review Press foram os principais desaguadouros para
discussões sérias da estagnação secular nos anos
1970 e nas décadas seguintes. O que o próprio Summers sabia de
tudo isto é incerto para nós pelo menos. Mas os seus dois
tios fizeram parte do debate sobre a questão da estagnação
que ressurgiu, ainda que brevemente, no princípio dos anos 1970, e foram
inflexíveis na oposição a Sweezy sobre esse assunto.
Summers, se está consciente de tudo isto, agora acredita que os seus
dois famosos tios estavam errados e que Sweezy estava certo.
O original encontra-se em
monthlyreview.org/2016/07/01/mr-068-03-2016-07_0/
(Julho/2016)
Este editorial encontra-se em
http://resistir.info/
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