por
La Jornada
(editorial)
Como consequência directa dos votos recebidos por George W. Bush nas
eleições de 2 de Novembro último, os Estados Unidos
amanheceram hoje [4 de Fevereiro] com um secretário da Justiça
partidário das violações de direitos humanos como
política regular de Estado. Trata-se de Alberto Gonzales, advogado
texano que fez carreira quando o actual ocupante da Casa Branca era governador
do seu estado natal, e que trabalhou para a mafia empresarial do círculo
presidencial, como a fraudulenta Enron. Mas o antecedente político mais
escandaloso e indignante do novo secretário da Justiça é o
seu trabalho para justificar a tortura como procedimento aceitável pelas
instituições estadunidenses e a sua opinião de que
Washington poderia por de lado as obrigações que a
Convenção de Viena estipula para o tratamento dos prisioneiros de
guerra.
No primeiro mandato de Bush, com efeito, Gonzales foi o artífice do
argumento de que os supostos terroristas capturados pelas tropas estadunidenses
que invadiram o Afeganistão não tinham o estatuto de prisioneiros
de guerra, que não havia razão para tratá-los como tais e
que, em consequência, os Estados Unidos podiam violar à vontade os
seus direitos humanos, como vem ocorrendo com o meio milhar de detidos que
ainda permanecem nas instalações navais de Guantánamo e
que estão há mais de três anos em regime de absoluto
isolamento, enjaulados como animais, sem enfrentar nenhuma
acusação legal específica e submetidos, de acordo com
diversos testemunhos publicados nestas páginas, a tratos desumanos e
cruéis.
As políticas atrozes formuladas por Gonzales tiveram, no Iraque ocupado,
uma consequência igualmente atroz que indignou o mundo civilizado: os
maus tratos sistemáticos perpetrados por soldados e mercenários
estadunidenses contra os iraquianos presos, particularmente no presídio
de Abu Ghraib, e pelos quais os governo de Washington só julgou os
militares de baixa graduação que tiveram a má ideia e a
má fortuna de se fotografarem no momento mesmo das torturas ou junto ao
cadáver de um prisioneiro assassinado. Mas, ainda que Bush e a sua
equipa insistam em que se tratou de factos isolados e excessivos, a
nomeação de Gonzales como novo procurados obriga a pensar que as
violações das garantias individuais, a tortura e o assassinato de
detidos são uma política de Estado vigente e aceite.
Com estes antecedentes à vista, é lógico que organismos
internacionais como Human Rights Watch e locais, como a União pela
Liberdades Civis, e figuras políticas, dentre elas o senador Ted
Kennedy, se hajam manifestado contra a designação de Gonzales
como procurador desde que esta foi anunciada por Bush em Novembro
último, alguns dias após a sua reeleição.
Com base nas circunstâncias assinaladas, torna-se claro que não
há motivo para celebrar dois factos que, isolados do seu contexto,
poderiam ser considerados positivos: a chegada ao Departamento de
Justiça do seu primeiro titular de origem latino-americana e mexicana,
para maior precisão, e a saída desse cargo do fundamentalista
cristão John Ashcroft, o inquisidor nato que encabeçou durante os
últimos quatro anos a severa distorção autoritária
do sistema estadunidense de justiça. Se o integrismo religioso perdeu
essa posição, ganhou uma ainda mais importante, se
possível, com a designação de Condoleeza Rice como
secretária de Estado.
Diz a tradição que os presidentes estadunidenses reeleitos
moderam, no seu segundo período, as posturas que sustentaram no
primeiro. No caso de Bush, essa tradição, se existiu, perdeu o
vigor. A formação da equipe presidencial para o segundo
quatriénio o posicionamento de personagens como Rice e Gonzales, e a
preservação de outros nos seus cargos, como o vice-presidente
Dick Cheney e o secretário da Defesa, Donald Rumsfeld, demonstra que o
unilateralismo, o corporativismo mafioso-empresarial, o desdém pela
legalidade internacional e o desprezo para com os direitos humanos vão
incrementar-se e isso constitui uma péssima notícia para todo o
planeta.
04/Fev/2005
O original encontra-se em
http://www.jornada.unam.mx/edito.php
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Este artigo encontra-se em
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