Líbia: a intervenção dita "humanitária"
da NATO
por Viktor Dedaj
Enviar pirómanos para extinguir um incêndio, queimar a floresta
para salvar as árvores, bombardear a população para poupar
civis, lançar campanhas de terror em nome do combate contra o
terrorismo, promover a democracia apoiando ditadores, monarquias, terroristas e
outros gangsters de toda espécie... a lógica dos dirigentes
ocidentais é imparável.
Durante este tempo, a organização dos media de massa bombardeia
as consciências até obter a sua rendição. E é
assim que você acorda um dia com o sentimento de que sempre foi
favorável às privatizações. Com a crença de
que os Taliban sempre foram nossos inimigos. Que esta Europa é a
única que vale a pena. Que você compreende muito bem que
não se poderá pagar vossa aposentadoria. E que a NATO é
uma espécie de serviço internacional de ambulâncias.
Hoje, 21 de Agosto, a última notícia: "os rebeldes entraram
em Tripoli". Depois de semanas de "os rebeldes líbios
avançam", "os rebeldes controlam a cidade de...", os
"rebeldes anunciam...". É cómico como o actor principal
destes acontecimentos, a NATO, consegue tornar-se discreta nos
noticiários.
Para ver a dificuldade que estes rebeldes tiveram para avançar num
país plano, pouco povoado, onde os seus mestres tinham e têm o
domínio total do céu condições ideais para
uma tal campanha e onde (vantagem suprema) o povo seria "apoiante
da sua causa", é evidente e claro que os "rebeldes
líbios" jamais representaram grande coisa, chegando até a
matarem-se entre si e a eliminar o seu próprio comandante em chefe (e
isto nas condições "ideais").
Dito isso, a menos que haja um golpe de teatro, eles
"ganharão", cedo ou tarde, isto é certo. E como poderia
ser de outra maneira? Quando o bastão redondo da propaganda não
entra no buraco quadrado da realidade, a NATO encarrega-se de arredondar os
ângulos.
Apostamos que não faltarão nessa altura algumas sombras
embrutecidas para chafurdarem nos nossos écrans a gritarem
"ganhámos"! E dizer que há alguns meses eles mal sabiam
pronunciar o nome do país. Mas a verdade é que a história
já provou que eles haviam errado, que eles erram, e a questão do
"combate" não mudará isso.
Tripoli resistirá? Quanto tempo? Horas, dias? E subitamente as apostas
são abertas e eis-nos projectados na lotaria local. Eles falarão
sem dúvida de "partidários de Kadafi" (um certo
número) e nunca "dos líbios opostos à
intervenção imperialista" (provavelmente mais numerosos).
Eles nos mostrarão algumas imagens de multidões em regozijo.
Utilizarão eles imagem tomadas outrora em Bagdad? Encontrarão
eles finalmente os 6000 líbios assassinados "pelo regime" ou
mudarão de assunto, como no caso das armas de destruição
maciça?
Portanto, "se irá ganhar". A questão que me intriga
é saber quem é o "se" e o que é que terá
sido "ganho". É louco como se esquiva sistematicamente esta
questão interessante. Eu sei que este "se" não sou eu,
nem tão pouco você (qualquer que seja a vossa opinião sobre
esta operação da NATO). Sei também que não é
a imensa maioria da população líbia que certamente tinha
uma outra ideia da Primavera árabe.
Esta manha (21 de Agosto), a imprensa nos explica que uma brigada rebelde de
elite está impaciente às portas de Tripoli. Ela nos explica sem
pestanejar que alguns dos 600 homens têm a "dupla nacionalidade
americana e líbia"... que o seu chefe fala "com uma forte
pronúncia irlandesa", um "atirador de elite" que
"passou a maior parte da sua vida em Dublim", que está
"em contacto permanente com as forças da NATO". E eu me digo:
"aí está, nem um líbio para dirigir a brigada de
elite da rebelião?". E também: "se não se trata
de mercenários, eles parecem furiosamente". Mas a ideia não
perambula no meu espírito pois o lugar já estava ocupado por esta
outra ideia recentemente martelada pelos media: é Kadafi que emprega
mercenários ("negros e drogados").
Sim, doravante temos a indicação de que "se" ganhou: um
líbio puro, como já não há nas tribos. Ele usa Ray
Ban, masca chewing-gum, fala com uma forte pronúncia irlandesa e o seu
passaporte líbio é provavelmente muito belo, inteiramente novo e
ainda deve cheirar a tinta fresca. E tenho o sentimento confuso que se lhe
perguntasse "e Bagdad, como era?", ele responderia "no
comment".
Então, após meses de bombardeamentos de toda espécie,
tenho de me render... à evidência. E dizer que deixei de duvidar
desta história de intervenção humanitária.
PS: último minuto, na categoria do "eles ousam tudo". Um
porta-voz da NATO declara que a missão da Aliança é
proteger a população civil e não tomar partido por um dos
dois campos. Orwell, tu é um amador.
21/Agosto/2011
O original encontra-se em
www.legrandsoir.info/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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