Não podemos esquecer
Faz seis anos que o Iraque foi bombardeado e ocupado.
Perante uma derrota militar que não previram, os EUA mais a Inglaterra e
seus pares tentam, sorrateira e silenciosamente, fazer esquecer os crimes
cometidos. Como se nada se tivesse passado. Como se não fossem culpados.
Mas não podemos esquecer os governos e forças políticas
que foram cúmplices no desencadear da agressão a um povo, muito
embora a oposição e a denúncia, feita por milhões
de pessoas em todo o mundo, dos verdadeiros motivos de mais uma agressão
imperialista.
Não podemos esquecer as mentiras com que tentaram justificar a
agressão, nem as violações do Direito Internacional, dos
Direitos Humanos e da Convenção de Genebra que esta
agressão representou.
Não podemos esquecer que o Iraque não agrediu nem os EUA, nem a
Inglaterra, nem Espanha, nem Portugal, e que o único crime daquele povo
é habitar uma das regiões mais ricas de hidrocarbonetos.
Não podemos esquecer que o Iraque, que foi considerado, em
relatórios do PNUD e da OMS, como o país na região de mais
elevado nível nas áreas da saúde, da
educação e dos direitos sociais, e de elevado nível no
âmbito mundial é, neste momento e como consequência da
ocupação, um país destruído, dividido por
questões sectárias e religiosas, vivendo uma
situação de catástrofe social, económica,
educacional e sanitária.
Desde a criação em 1920 do seu Estado que os iraquianos se
têm evidenciado pelo seu espírito de independência em
relação às potências imperialistas, primeiro da
Inglaterra e depois dos EUA, nomeadamente em referência à sua
maior riqueza natural, o petróleo. Também não podemos
esquecer que, em 2001, o governo iraquiano se tentou libertar da ditadura do
dólar americano começando a vender o petróleo em euros.
E não obstante as vicissitudes da sua história politica,
inclusive da época negra da ditadura de Saddam Hussein, o Iraque
conseguiu ser o Estado da região em que as mulheres tinham mais
direitos, em que a cobertura de escolas e de cuidados de saúde igualava
muitos países da Europa e ultrapassava largamente a maioria dos do
mundo. Era uma sociedade aberta em que conviviam sem problemas
muçulmanos (xiitas e sunitas), cristãos, judeus, fossem europeus,
árabes ou persas.
E não podemos esquecer o embargo de 12 anos que vinham sofrendo, imposto
pela ONU, mas por proposta e insistência dos EUA e Inglaterra, e que
provocou imenso sofrimento ao povo iraquiano e foi causa, directa e indirecta,
de cerca de 1,5milhões de mortes, conforme relatórios
vários e dados da UNICEF e da OMS. Embargo que, lembrando von Sponeck
(coordenador humanitário da ONU para o Iraque durante o embargo),
configurou um genocídio, foi uma violação do Direito
Internacional e uma segunda forma de guerra,
Também não devemos esquecer a violação do Direito
Internacional e as graves consequências para a economia e mobilidade
causadas pela criação das chamadas zonas de exclusão
aérea, que os EUA e Inglaterra vinham mantendo, ao arrepio da ONU,
e que permitiam a estes dois agressores bombardearem frequentemente
o Iraque.
Querem que nos esqueçamos que o Iraque está ocupado e o seu povo
envolvido numa guerra contra exércitos ocupantes de 150mil militares
além de milhares de mercenários, altamente armados com os mais
sofisticados e proibidos armamentos como bombas de fósforo, de
fragmentação e urânio empobrecido.
Assim como não falam e tentam passar como legítimo
eleições efectuadas sob ocupação e controladas
pelos ocupantes, e uma Constituição Política
redigida pelos EUA e feita à medida dos seus interesses. Pois não
podemos esquecer que uma das primeiras medidas de P. Bremer, 1º vice-rei
do Iraque nomeado pelos EUA, foi roubar a exploração do
petróleo ao povo iraquiano e entregá-la às grandes
petrolíferas capitalistas, assim como abrir as empresas estatais
iraquianas ao grande capital dos EUA.
E é preciso lembrar que só ao povo iraquiano, em
condições de liberdade, é legítimo escolher o seu
governo, redigir e votar uma Constituição Política e
decidir sobre as suas riquezas naturais. Nunca isto poderá ser
legítimo sob ocupação, pressão e decretos de
ocupantes.
Querendo fazer esquecer a destruição de escolas, de hospitais, de
cidades inteiras, os roubos de museus, as prisões arbitrárias e
torturas, os assassinatos, o caos provocado, os EUA e Inglaterra declaram agora
que vão retirar do Iraque. Mas a Administração dos EUA
(versão B. Obama) deixa no entanto cerca de 50mil militares, nas bases
que entretanto construiu, para defender os seus interesses.
Pretende justificar essa presença como um auxílio á
segurança no Iraque e legalizá-la com um acordo (o SOFA) com o
governo iraquiano. Mas não podemos esquecer que o caos e
insegurança são consequência e promovidos pela
ocupação, seguindo o princípio de dividir para reinar, e
que a plena soberania do Iraque só se verificará com a
anulação de todos os actos promovidos pelos ocupantes.
Não podemos esquecer nem o crime exercido sobre um povo, nem a
violação das regras de respeito pelo Direito Internacional e
Tratados Internacionais, sob pena de sermos cúmplices desse crime e de
não defendermos a paz internacional.
Não podemos esquecer a responsabilidade de governos e forças
políticas que conscientemente mentiram, apoiaram e continuam a apoiar, a
política de guerra e de rapina.
A paz não se defende com a militarização, nem com os
raptos, nem com as cadeias clandestinas, nem com guerras preventivas sejam elas
mascaradas de intervenções humanitárias ou de
defesa da democracia.
Esquecer o que se passou, e continua a passar-se, no Iraque, e não
só, é dar cobertura a novas aventuras guerreiras, é deixar
condições para incendiar o mundo.
É necessário punir os responsáveis pela
situação criada, no Iraque e pela instabilidade e
insegurança no mundo. É necessário responsabilizar a
União Europeia pelo colaboracionismo, político e militar e
económico, com a política de colonização do Iraque.
E é preciso não esquecer e não permitir que, sob os mesmos
pretextos mentirosos e com os mesmos interesses, se faça o mesmo no
Afeganistão.
Mas ainda é mais necessário impedir que as mesmas forças e
interesses que desencadearam e defenderam a guerra continuem a comandar o mundo.
E isso é tarefa possível e necessária.
É imperativo que os portugueses exijam que o Governo Português e
os seus representantes nos órgãos internacionais em que
participam e a Assembleia da República sejam coerentes com a
Constituição Política e com as propaladas
intenções de paz e cooperação com os povos.
Lisboa, 20/03/2009
[*]
Conselho Português Para a Paz e Cooperação
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