O agravamento da crise da dívida:
Quem nos pôs nesta confusão e quais são as
opções políticas reais?
por Michael Hudson
[*]
entrevistado por Mike Whitney
[**]
Mike Whitney: Na sexta-feira à tarde o governo anunciou planos para
colocar os dois gigantes hipotecários, Fannie Mae e Freddie Mac, sob
"conservatorship"
Os accionistas serão virtualmente eliminados (suas
acções já afundaram em mais de 90 por cento) mas o Tesouro
dos EUA intervirá para proteger a dívida das companhias. Em
alguma medida também protegerá suas acções
preferenciais, as quais o Morgan-Chase reduziu os preços para a metade.
Isto parece ser a mais arrasadora intervenção governamental nos
mercados financeiros da história americana. Se estas duas companhias
são nacionalizadas, isto acrescentará 5,3 milhões de
milhões
(trillion)
de dólares ao balanço do país. Assim, a minha primeira
pergunta é: por que o Tesouro está a salvar portadores de
títulos e outros investidores nas suas dívidas
hipotecárias? Qual é o interesse publico nisto tudo?
Hudson: O Tesouro enfatizou que estava pressionado para finalizar os pormenores
da tomada até domingo à tarde antes que os mercados
asiáticos abrissem para negócios. Esta preocupação
reflecte o balanço de pagamento e portanto a dimensão militar do
salvamento. Os bancos centrais da China, Japão e Coreia são
grandes possuidores destes títulos, precisamente devido à grande
dimensão da Fannie Mae e do Freddie Mac seus US$5,3
milhões de milhões em dívida apoiada por hipotecas que
você mencionou e os US$11 milhões de milhões totais do
mercado hipotecário estado-unidense.
Quando você olha para o balanço dos activos estado-unidenses
disponíveis para bancos centrais estrangeiros comprarem com os US$2,5 a
US$3,5 milhões de milhões que eles possuem, o imobiliário
é a única categoria de activos suficientemente grande para
absorver os fluxos de saída da balança de pagamentos que os
gastos militares dos EUA, o comércio exterior e a fuga de capital de
investimento estão a lançar. Quando os militares dos EUA gastam
dinheiro no exterior para travar a Nova Guerra Fria, estes dólares
são cada vez mais reciclados em títulos dos EUA apoiados por
hipotecas, porque não há outro mercado suficientemente grande
para absorver as somas em causa. Lembre-se que nós não
permitimos aos estrangeiros especialmente asiáticos
comprarem alta tecnologia, "segurança nacional" ou
infraestruturas chave. O governo preferiria vê-los comprar
troféus inócuos tais como o Rockfeller Center, ou
participações minoritárias em bancos com património
negativo tais como as acções do Citibank vendidas aos sauditas e
bahrainis.
Mas há um limite sobre quão abertamente o governo estado-unidense
pode explorar bancos centrais estrangeiros. Ele precisa manter a reciclagem de
dólares em andamento, a fim de impedir uma depreciação
aguda do dólar. O Tesouro portanto deu garantias informais a governos
estrangeiros de que garantirão pelo menos o valor do dólar do
dinheiro que os seus bancos centrais estão a reciclar. (Estes governos
ainda perderão quando o dólar afunda contra divisas duras
simplesmente quase toda divisa excepto o dólar nos dias que correm.) Um
fracasso em proporcionar garantias de investimento a estrangeiros frustraria a
continuação dos gastos militares dos EUA além mar! E uma
vez que os estrangeiros são salvos, o Tesouro tem de salvar
também os investidores americanos, simplesmente por razões
políticas.
MW: A Fannie e o Freddie têm estado a arcar com hipotecas de risco desde
há muito tempo, subdeclarando os riscos sobretudo para aumentar os
preços das suas acções de modo a que os seus
administradores possam pagar a si próprios dezenas de milhões de
dólares em salários e opções de
acções. Agora eles estão essencialmente insolventes,
quando o próprio principal está em causa. Houve crítica
generalizada quanto a isto, ano após ano. Por que nada foi feito?
Hudson: A Fannie e o Freddie eram bem conhecidos pelo seu lobbying pesado em
Washington. Eles compraram o apoio de congressistas e senadores que
conseguiram penetrar nos comités de supervisão financeira de modo
a estarem em posição de arrecadar financiamentos de campanhas
junto à Wall Street que queria assegurar que nenhuma
regulação real tivesse lugar.
Ao nível mais vasto, o secretário do Tesouro Paulson disse que
estas companhias estão a ser tomadas a fim de reflacionar o mercado
imobiliário. A Fannie e o Freddie eram quase sozinhas a suportar o
mercado das hipotecas lixo que estavam a enriquecer a Wall Street.
Os administradores afirmavam que pagavam-se a si próprios pela
"inovação". No vocabulário financeiro
orwelliano de hoje, "inovação" significa a
criação de privilégios especiais para a
extracção de renda. O privilégio estava a conseguir o
proverbial "almoço gratuito" (isto é, renda
económica) ao tomar empréstimos às baixas taxas de juro do
governo para comprar e reempacotar hipotecas a fim de vendê-las com uma
margem de juros elevados. Sua "inovação" repousa na
ambiguidade que lhes permitiu posar como sector público quando queriam
tomar emprestado a taxas baixas, e árbitros do sector privado quando
queriam obter uma arrecadação a partir de margens mais altas.
Os auditores do governo agora estão a descobrir que a sua
inovação era cozinhar os livros da contabilidade, estilo Enron.
Quando as hipotecas atrasadas e os incumprimentos aumentavam, a Fannie e do
Freddie não reduziram os valores dos seus haveres hipotecários
para preços realistas. Eles disseram que fariam isto aproximadamente
dentro de um ano em 2009, depois de os desreguladores da
administração Bush terem saído. A ideia era deitar as
culpas sobre Obama quando eles finalmente falissem.
Mas ao nível mais profundo, a "inovação" que
criou uma brecha para a extracção de renda era a fraude que fazia
com que cada vez mais empréstimos de más hipotecas pudessem
continuar por um período de tempo prolongado. A realidade é que
nenhum aumentos exponencial da dívida alguma vez pôde ser pago
durante mais do que uns poucos anos, porque nenhuma economia alguma vez foi
capaz de produzir um excedente com rapidez suficiente para manter o passo com a
"mágica do juro composto". Esta frase é em si
própria um sinónimo do aumento exponencial do crescimento da
dívida.
O caminho para a escravidão pela dívida
MW: Numa entrevista anterior você disse: "A economia atingiu o seu
limite de dívida e está a entrar na sua fase de
insolvência. Nós não estamos num ciclo e sim no fim de uma
era. O velho mundo da dívida a aumentar em pirâmide não
pode ser restaurado". Pode ampliar esta visão para os
desenvolvimento actuais?
Hudson: Até quando cada vez mais dinheiro pode ser bombeado para dentro
do mercado imobiliário, enquanto o rendimento pessoa disponível
não está a crescer o suficiente para pagar estas dívidas?
Como podem as pessoas pagar hipotecas que excedem o valor da renda da sua
propriedade? De onde virá a "procura do mercado"? Os
especuladores já se retiraram do mercado imobiliário no fim de
2006 e naquele ano eles representavam cerca de um sexto de todas as
compras.
O melhor que este salvamento do fim de semana pode fazer é adiar as
perdas de dívidas hipotecárias más. Mas isto é
muito diferente de realmente restaurar a capacidade dos devedores para pagar.
O sr. Paulson fala de mais concessões de empréstimos para apoiar
os preços imobiliários. Mas isto impedirá a
habitação de cair a níveis que as pessoas possam adquirir
sem incorrer em dívida hipotecária cada vez mais profunda. Os
preços da habitação ainda estão imóveis,
acima da tradicional definição de equilíbrio
preços cujos encargos são apenas iguais ao que custariam para
arrendar permanentemente.
O objectivo do Tesouro é ressuscitar a Fannie e o Freddie como entidades
que concedem empréstimos e portanto como veículos para a
economia dos EUA tomar emprestado dos bancos centrais estrangeiros e dos
grandes investidores institucionais que mencionei acima. Mais concessão
de empréstimos é suposto apoiar os preços
imobiliários para impedir que caiam demasiado como fariam de outra forma
e de facto o objectivo é manter a pirâmide da dívida
a crescer. O único meio de fazer isto é emprestar aos devedores
de hipotecas o suficiente para que paguem os encargos de juros e
amortização sobre o volume existente de dívida que eles
suportam. E uma vez que a maior parte das pessoas não está
realmente a ganhar mais e de facto estão a descobrir que os seus
orçamentos encolhem a única base para que assumam mais
empréstimos é inflacionar o preço do imobiliário
que está a ser comprometido como colateral para refinanciar a hipoteca.
É pura hipocrisia de Hank Paulson da Wall Street afirmar que tudo isto
está a ser feito para "ajudar os proprietários de
casas". Eles são veículos para fazer dinheiro, não
os beneficiários. Eles estão na base de uma cadeia alimentar
cada vez mais carnívora e financeiramente extractiva.
Praticamente todos os peritos imobiliários concordam em que no
próximo par de anos muitos dos proprietários de casas de hoje
descobrir-se-ão bloqueados no lugar em que estão a viver. Sua
situação é em grande medida como a dos servos medievais
que estavam ligados à sua terra. Eles não podem vender, porque o
preço de mercado não cobrirá a hipoteca que possuem, e
eles não têm as poupanças necessárias para pagar a
diferença.
O assunto é agravado pelo facto de que as taxas de juro estão
escalonadas para serem reajustadas a taxas mais elevadas a partir do resto de
anos e até 2010, aumentando o fardo financeiro. Você pode
recordar que Alan Greenspan recomendou que os compradores de casas tomassem
hipotecas com taxas ajustáveis (ARMs) porque o americano médio
muda-se a cada três anos. No momento em que a taxa de juros saltasse,
explicou ele, eles podiam vender a um novo comprador nesta dança das
cadeiras presumivelmente com cada vez mais cadeira a serem acrescentadas.
Mas os compradores de casa hoje não podem mudar-se, de modo que eles se
encontram cravados com encargos de juros em ascensão a acumular com
encargos em ascensão em combustível, aquecimento e electricidade,
transportes, custos alimentares, seguro de saúde e mesmo impostos sobre
a propriedade quando estas começam a alcançar a Bolha de
Preços em aumento.
O governo evitou cuidadosamente nacionalizar as companhias e com isso
trazê-las para o seu próprio balanço. Ele criou uma
"conservatorship" (uma palavra que meu corrector ortográfico
não reconhece). Assim, o salvamento da Fannie e do Freddie dá a
entender que os republicanos estão simplesmente a tentar jogar o jogo do
faz de conta até que deixe o governo em Fevereiro, e depois disso podem
culpar o próximo Congresso democrata pelo fracasso do "milagre da
dívida a juros compostos".
Portanto, trata-se da política habitual: jogar para o curto prazo. No
longo prazo mesmo no próximo ano o mercado
imobiliário continuará a afundar.
MW: As notícias económicas continuam cada vez mais sombrias, mas
você nunca saberá disto ao ouvir os políticos na
Convenção Republicana. A única vez que a economia foi
mencionada de algum modo foi no contexto da louvação dos mercados
livres e da globalização. O crash habitacional e o colapso do
mercado de crédito não foram mencionados. Poderia você
contar-nos o que pensa significar para o futuro da América o crescimento
dos números do desemprego, da procura em queda do consumidor, do disparo
dos arrestos e das perturbações em curso nos mercados de
crédito? Será isto apenas uma mancha sobre o radar ou estaremos
nós em meio a um grande retrocesso que resultará na queda dos
padrões de vida e numa recessão profunda e prolongada?
Hudson: Os republicanos preferem distrair as atenções do
fracasso do regime Bush nos últimos oito anos. Se as
atenções forem voltadas para o Iraque e o terrorismo, para
personalidades e estilos, a discussão séria de tais assuntos pode
ser eliminada. É o que o noticiário dos media estão a
fazer.
Quando políticos falam acerca da economia, a estratégia
básica é disputar a eleição de Novembro em torno de
quem tem o mais lindo sonho que as pessoas gostariam de acreditar.
Espantosamente, um grande número de americanos realmente espera ter uma
boa oportunidade para se tornarem milionários. Eles simplesmente
não estão a olhar para o lado da dívida na folha do
balanço.
A mais notável dinâmica económica de hoje é a
polarização entre aqueles que vivem dos retornos da riqueza
(finanças e extracção de juros e renda de propriedades,
mais ganhos de capital quando os preços dos activos são
inflacionados) e aqueles que vivem daquilo que podem ganhar, lutando para
pagarem impostos e dívidas que assumiram. As contas do rendimento
nacional e do produto PNB e rendimento nacional nada dizem acerca
da polarização da propriedade, e não incluem ganhos de
capital, os quais constituem a maior parte da riqueza que está a ser
obtida nestes dias, não pelo investimento directo real para aumentar os
meios de produção como afirmam os lobbyistas com a teoria
económica do gotejamento.
Aqui está como as coisas são hoje: Os 1 por cento mais ricos da
população recebem 57,5 por cento de todo o rendimento gerado pela
riqueza isto é, pagamento pelo privilégio, a maior parte
dele herdado. Estes retornos juros, renda e ganhos de capital
não são primariamente um retorno de empreendimentos. Eles
são inércia pura, deprimindo os mercados. Eles não
"libertam" mercados, excepto ao proporcionar um almoço
gratuito para as famílias mais ricas. Os 20 por cento mais ricos da
população recebem uns 86 por cento de todo este rendimento
isto é, o que realmente está a aumentar os balanços
familiares.
O que o povo ainda encara como uma democracia económica está a
tornar-se uma oligarquia económica. Políticos estão
à procura de apoio para a campanha principalmente junto a esta
oligarquia porque é aqui que está o dinheiro. Assim eles
conversam acerca de uma economia com uma cara feliz para apelar ao optimismo
americano, ao passo que são bastante pragmáticos para saber a
quem servir se quiserem ter êxito e não serem ostracizados.
Durante a década de 1990 a população dos 90 por cento da
base tentou recuperar o terreno perdido entrando em dívida para comprar
casas e outras propriedades. O que eles não viam era a necessidade de
um crescimento insaciável da dívida para manter uma bolha
imobiliária e financeira em expansão. Todo este crédito
impôs encargos financeiros, o qual tem sido amplamente responsável
por polarizar a riqueza tão agudamente nas últimas décadas.
Estes encargos de dívida têm crescido de uma forma tão
pesada que os devedores são capazes de pagar apenas tomando emprestados
os juros que são devidos. Eles conseguiram tomar emprestado durante os
últimos poucos anos através do comprometimento do
imobiliário ou de outros colaterais cujos preços estão a
ser inflacionados pela política do Federal Reserve. O Tesouro
também contribui para isso concedendo favoritismo fiscal, retirando
impostos sobre a propriedade e as finanças. Isto força o
trabalho e o capital industrial tangível a optar pela folga fiscal,
mesmo quando estão a ser forçados a arcar com um fardo de
dívida mais pesado.
Os proprietários das casas não ganham com este
"equilíbrio" de preços mais elevado no mercado
habitacional. Preços mais elevados significam simplesmente mais
encargos de dívida. A elevação dos rácios
preço/renda e preço/rendimentos para propriedades financiadas
pela dívidas, acções e títulos obriga os
assalariados a incidirem cada vez mais profundamente na dívida,
dedicando cada vez mais anos da sua vida de trabalho para pagar pela
habitação e comprar acções e títulos que
proporcionem rendimento para a sua aposentadoria.
A expansão da dívida para comprar propriedade parece
auto-justificada enquanto os preços dos activos estiverem a subir. Esta
inflação dos preços dos activos é eufemisticamente
chamada "criação de riqueza" quando foca os
preços do imobiliário, das acções e dos
títulos mesmo quando o rendimento pessoal e as
condições de vida e de trabalho são desgastados.
Assim, voltamos à sua questão mais vasta. Não vejo a
procura dos consumidores a subir muito, excepto pelos turistas estrangeiros em
visita a gastarem o seu dinheiro quando o dólar cai. Aqui em Nova York,
os compradores estrangeiros estão a suportar o mercado
imobiliário. A baixa da Wall Street já forçou a cidade a
adiar o seu prometido corte de impostos sobre a propriedade e a sua
expansão do metro. Minha esposa e eu acabámos de receber a nossa
conta do condomínio esta semana. Havia uma nota explicativa a dizer-nos
que os únicos cortes nos impostos serão para possuidores de
propriedades comerciais. As taxas dos impostos sobre a propriedade residencial
sobem.
Ficou pior. Sem melhores meios de transportes, os assalariados serão
espremidos por todo o país. Preços mais altos do gás,
electricidade, cuidados de saúde e alimentos estão a sobrepujar
os demais gastos e a forçar a pessoas a incidirem em ainda mais
dívida. Eis porque os atrasos nos pagamentos e os incumprimentos
estão a subir. Mesmo arrendamentos estão a subir, apesar da
queda nos preços imobiliários. É por isso que as casas
arrestadas não podem ser arrendadas, de modo que milhões de casas
podem ser removidas do mercado.
MW: O que quer dizer exactamente com "moderna escravidão pela
dívida"?
Hudson: É o que acontece quando os assalariados são obrigados a
entregar todo o seu rendimento, acima das necessidades básicas da
subsistência, ao sector FIRE sobretudo para o serviço da
dívida mas também para pagar o seguro obrigatório e, mais
recentemente, o fardo fiscal que as finanças e a propriedade removeram
de si próprias.
A característica que distingue a escravidão
(peonage)
é a falta de opção. É a antítese dos
mercados livres. Como mencionei a cima, muitas famílias hoje
encontram-se presas a casas que têm património líquido
negativo. Sua dívida hipotecária excede o preço de
mercado. Estas casas não podem ser vendidas a menos que a
família possa pagar a diferença ao banqueiro que efectuou o mau
empréstimo hipotecário. O fosso pode exceder todo o rendimento
familiar num ano inteiro o mesmo que fazer no papel um ganho de
preço maior do que o seu salário líquido anual.
Mas o que importa tudo isto, em retrospectiva, se a casa era para viver,
não para comprar e vender? Esta dimensão do valor de uso foi
abandonada ao enfatizar a riqueza em papel.
Em resumo, escravidão pela dívida é o outro lado da moeda
numa economia rentista. O saldo líquido negativo que estamos a ver hoje
é uma componente chave da escravidão pela dívida. Ele
força os escravos da dívida a passarem as suas vidas a tentar
cavar o seu caminho para fora da dívida. Quanto mais desesperados eles
ficam, mais riscos eles assumem, e mais profundamente afundam. Em Kansas City,
um dos meus estudantes escreveu seu trabalho de classe sobre como a causa
imediata de muitos incumprimentos de hipotecas é o jogo da
dívida. O Missouri tem um bocado de cristãos fundamentalistas os
quais pensam que Deus está a observá-los cuidadosamente. Sendo
boas pessoas, eles querem dar a Deus uma oportunidade para premiá-los
por viverem uma vida honesta. De modo que eles vão jogar nos barcos que
estão atracados ao longo do rio. Mas as probabilidades estão
contra eles, e isto parece como se Einstein estivesse errado quando disse que
Deus não joga aos dados. O jogo e grande parte da
especulação financeira tem tudo a ver com probabilidades,
e estas são em grande parte contra os jogadores assim como estão
contra os devedores. Sendo leis da natureza, as leis das probabilidades
são como o privilégio do proprietário da terra: uma
licença de jogo proporciona a casa com uma oportunidade para arrecadar
renda económica da mesma.
A deflação da dívida e a comutação fiscal
das finanças e da propriedade para o trabalho
No curto prazo, aparentemente o crescimento lento e a deflação
serão problemas maiores do que a inflação. As
commodities, incluindo o ouro e o petróleo, estão a cair quase
diariamente, enquanto os activos bancários estão ser
constantemente degradados, os arrestos estão a subir e o mercado de
acções está a cambalear. A crise financeira que
começou no mercado imobiliário desencadeou um boicote dos
produtos estruturados e agora está a difundir-se através do
conjunto da economia.
O Federal Reserve já reduziu as taxas de juros em 3,5 por cento e
utilizou a metade do seu balanço (US$450 mil milhões) para
escorar o vacilante sistema bancário. Mas a situação
continua a ficar pior. Os bancos restringiram a concessão de
empréstimos, e os gastos do consumidor estão prejudicados em
quase todas as áreas. Aparentemente o Fed está falto de
munição. É tempo de considerar alternativas fiscais para
a queda actual, tal como cortar impostos sobre folhas de pagamentos para dar
mais dinheiro às famílias a fim de aumentar a procura, ou iniciar
projectos maciços de infraestruturas?
Hudson: Por "deflação" suponho que você queira
dizer deflação da dívida drenagem de poder compra
devido ao aumento do serviço da dívida e do seguro
obrigatório, mais o esmagamento salarial que o governo louva para
"aumentar a produtividade" a fim de "criar riqueza" para os
administradores pagarem-se o que cortaram dos cheques de pagamentos do
trabalho. Haverá menos gastos do consumidor mas mesmo assim os
preços no consumidor podem não se reduzir se o dólar
retomar a sua queda, especialmente se o apreçamento de monopólio
continuar a ser permitido.
Sua solução é na verdade a necessária, e o sr.
Obama prometeu elevar os salários e o limite salarial sujeito à
retenção do FICA. Penso que uma ideia melhor seria voltar ao
imposto sobre o rendimento original de 1913 e isentar salários que
simplesmente cubram a subsistência. Eu restauraria um ponto de corte nos
US$102 mil em dólares de hoje, correspondente aos termos do imposto
sobre o rendimento de 1913. As pessoas que ganham menos não teriam de
preencher um formulário para declarar rendimentos.
Esta ideia realmente tradicional libertaria rendimento a ser gasto na melhoria
dos padrões de vida. Ao invés disso, altos escalões de
rendimento e de propriedade estão a ser hoje isentos de impostos, e as
suas poupanças fiscais estão a ser gastas principalmente em fazer
empréstimos que são utilizados para aumentar o preço da
riqueza e dos bens de luxo.
Foi contra isto que advertiram os economistas clássicos, mas a
comutação dos impostos para fora da propriedade e em
direcção ao trabalho está a ser feita hipocritamente em
seu nome. Para conseguir a espécie de mercados livres que eles advogam,
os impostos deveriam cair sobre o sector FIRE (finanças, seguros e
imobiliário) e os monopólios, não sobre salários ou
lucros industriais
bona fide
resultantes de investimento em capital tangível e emprego.
MW: Em Junho ultimo você escreveu um documento pioneiro para uma
conferência pós-keynesiana na Universidade de Missouri, em Kansas
City. O título era "Como a bolha imobiliária conduz os
compradors de casas à escravidão pela dívida".
Anteriormente você escrevera um agora famoso artigo de capa na
Harpers
sobre a escravidão pela dívida. O seu documento de Kansas City
apresentava gráficos a mostrar como o favoritismo fiscal para o
imobiliário e outros clientes da banca e do sector financeiro estimula a
inflação de activos, levando a bolhas maciças na
situação líquida tais como aquelas que estamos actualmente
a experimentar no Mercado habitacional. Poderia dar um resumo breve da sua
tese?
Hudson: Meu documento explicava como aquele dinheiro de que o cobrador de
impostos desiste é "libertado" para ser pago aos bancos como
juros. Esta é a palavra-de-ordem dos investidores imobiliários:
"Renda é para pagar juro". O sector FIRE adoptou uma
retórica populista para induzir os proprietários de casas a
acreditarem que baixar o imposto sobre a proriedade acabará por lhes dar
mais dinheiro. Parece à primeira vista que isto aconteceria. Mas na
prática, novos compradors e especuladores vêm ao
Mercado e comprometem os cortes fiscais em ainda mais aumentos dos
preços da habitação. O vencedor neste novo Mercado
anti-fiscal é o comprador que se compromete a pagar o corte fiscal aos
bancos como juros num empréstimo hipotecário para comprar
propriedade.
Como descreve o meu documento:
"O favoritismo fiscal para o imobiliário, piratas corporativos e no
final das contas para os banqueiros libertou rendimento a ser comprometido para
arcar com cada vez mais dívida, o qual tem sido utilizado para alimentar
a inflação dos preços dos activos que ascende os
preços de casas, acções e títulos corporativos
mas não aumentam a produção.
Moldar o
Mercado para favorecer as finanças e a propriedade em
relação à indústria e ao trabalho não cria
um "mercado livre". Favorece a compra e venda alavancada pela
dívida de imóveis, acções e títulos,
distorcendo mercados por caminhos que des-industrializam a economia. [E]
eliminar impostos da propriedade e das finanças é mais uma
distorção do que uma virtude, a menos que a alavancagem da
dívida seja considerada virtuosa.
"Esta é a tragédia da nossa economia hoje. A
criação de crédito, poupança e investimento
não está a ser mobilizada para aumentar novos investimentos
directos ou elevar padrões de vida, mas para subir preços para o
imobiliário e outros activos já existents e para títulos
financeiros (acções e títulos) já emitidos. Isto
carrega a economia com dívida sem proporcionar os meios para
pagá-la, excepto por nova e ainda mais rápida
inflação dos preços dos activos.
Isto é em grande medida o resultado da renúncia ao planeamento e
a estruturação dos mercados para os grandes bancos e outras
instituições financeiras. Lobbyistas políticos
reescreveram a maior parte das leis fiscais de hoje e patrocinaram a
desregulamentação geral dos controles e contrapesos que vigoravam
desde o fim do século XIX. Naquele tempo, há apenas uma centena
de anos atrás, parecia que a riqueza e a banca estava a
ser industrializada, ao passo que a riqueza da terra e dos monopólios
tornar-se-ia mais socializada e as suas rendas plenamente tributadas. Ao
invés de preços imobiliários em ascensão, o
"almoço gratuito" das rendas proporcionaria a fonte
básica das finanças públicas. A tecnologia e
produtividade aumentaria a formação de capital industrial e
elevaria os padrões de vida do trabalho. Estas políticas
libertariam os mercados da extracção de rendas e também de
impostos pois o fardo fiscal era comutado para a propriedade.
Mas não foi isto que aconteceu. O sistema financeira utilizou o seu
poder para extrair favores fiscais para o imobiliário e pressionar pela
desregulamentação de monopólios como a principal fonte dos
seus juros e de colateral para os eus empréstimos".
MW: O que pensa dos efeitos positivos que haveria em tributar a
propriedade ao invés do rendimento e do lucro industrial?
Hudson: Haveria dois importantes efeitos positivos. Primeiro, libertaria o
trabalho e a indústria do fardo fiscal. E analogamente exigiria que a
renda económica actualmente utilizada para pagar juros e
depreciação fosse paga ao invés como renda fiscal da
propriedade. Isto libertaria uma soma equivalente de ter elevada na forma de
rendimento e imposto sobre vendas. Isto era a ideia clássica de
mercados livres. Tal como está hoje a questão, o subsídio
fiscal para o imobiliário e as finanças deixa mais rendimento de
rendas líquido para ser capitalizado nos empréstimos
bancários. Isto é um travesti dos "mercados livres"
que os lobbystas para os bancos e os ricos em geral afirmam advogar.
Substituir impostos sobre rendimento e vendas por um imposto sobre a renda da
terra tornaria os preços imobiliários mais comportáveis,
porque o juro agora "liberto" será pago aos bancos para
suportar um alto encargo com dívida seria ao invés disso
colectado e utilizado para baixar o fardo fiscal sobre o trabalho e a
indústria. Isto reduziria o custo da produção e o custo
de vida, que estimo em cerca de 16 por cento do rendimento nacional.
Proprietários e arrendatários de casas pagariam a mesma quantia
que pagam agora, mas o sector público recuperaria o custo de construir
transportes e outras infraestruturas básicas devido ao mais alto valor
de rendas que esta despesa cria. O sistema fiscal seria baseado sobre direitos
de uso da propriedade, incidindo sobre os proprietários de um modo que
recupera o valor ascendente da sua propriedade resultante da
locação da renda, potenciada pelos transportes públicos e
outras infraestruturas, e a partir do nível geral de prosperidade, pelos
quais os senhorios não são responsáveis e sim simplesmente
os beneficiários passivos na prática actual.
Uma política fiscal neo-progressista objectivaria recapturar o valor de
localização da terra criado por despesas em infraestrutura
pública, escolas e o nível geral de prosperidade. A
pirâmide da dívida seria muito mais pequena, e as poupanças
poderia assumir a forma de investimento no património outra vez. O
crescimento mais lento da dívida, habitação e
preços de escritórios, e impostos mais baixos sobre rendimento e
vendas tornariam a economia mais competitiva internacionalmente.
MW: Gostaria de ampliar o que disse no seu artigo e corrija-me se eu estiver
errado. Diz você que o código fiscal de hoje coloca um
obstáculo à mudança política progressista, e coloca
cada vez mais poder nas mãos de banqueiros e especuladores que lucram
com os ciclos de crescimento e queda. Por outras palavras, retrabalhar o
sistema fiscal tem de ser a pedra angular de qualquer plataforma progressista?
Será este o principal ponto que tenta provar?
Hudson: É certamente o ponto fiscal que quero mostrar. Mas penso que o
meu ponto mais importante é a análise de como a matemática
do juro composto intromete-se cada vez mais na economia. A
ligação fiscal é que quando as finanças esvaziam
cada vez mais riqueza, a Wall Street converte seu poder económico em
poder político. Seu objectivo principal é libertar-se do fisco
comutando o fardo para o trabalho.
Um meio de alcançar esta comutação fiscal tem sido
redefinir impostos como um "utilizador de comissões"
("user fee"). Foi o que fez a Comissão Greenspan em 1983
quando impôs pesada tributação regressiva sobre o trabalho
atgravés das retenções salariais do FICA para a
Segurança Social e o Medicare ao invés de financiar estes
programas a partir do orçamento geral, para ser pago pelos
escalões mais elevados. O Trust Fund da Segurança Social gerou
um pesados excedente fiscal, o qual foi utilizado para cortar taxas nos
impostos dos escalões mais elevados de riqueza.
As "letras pequenas" do código fiscal tornaram o
imobiliário comercial livre de ter de pagar imposto de rendimento ao
pretender que os senhorios estavam a perder dinheiro sobre a sua propriedade
com a depreciação dos edifícios como se o aumento
do valor de localização da terra não fizesse mais do que
compensar. O mais importante, o juro era tratado como despesas fiscalmente
dedutível. Isto encorajou a alavancagem da dívida ao
invés do investimento em património, criando um enorme mercado
para banqueiros criarem crédito e colectarem juros sobre ele.
MW: Diz você no seu artigo que há "um simbiose entre
finanças, seguros e imobiliário", a qual está no
núcleo da Bolha Económica. E que isto cria uma
"retro-alimentação entre crédito bancário e
preços de activos. O caminho mais rápido e mais fácil
para a riqueza não é ganhar lucros investindo na
indústria, mas entrar em dívidas para cavalgar a onda de
inflação do preço dos activos. O resultado é uma
comutação da riqueza procurando afastar-se da indústria
para manobras financeiras com crédito para aproveitar a onda da
inflação do preço dos activos".
Será esta financiariação uma tendência
irreversível, ou haverá um meio que possamos revitalizar a base
industrial da América? Deveríamos considerar a
nacionalização da decadente indústria
automobilística e por pessoas a trabalhar enquanto construímos
veículos para o futuro?
Hudson: A nacionalização pode não ser a resposta à
medida que os interesses financeiros substituíram o governo como os
novos planeadores centrais da sociedade. Temo que a
nacionalização sob as condições políticas de
hoje significaria "socializar as perdas", tendo o governo de arcar
com elas e então liquidar as companhias ao habitual preço de
concessão para novos compradores a crédito, tudo em
benefício da Wall Street.
Se há algum sector a ser nacionalizado, deveria ser o FIRE
finanças, seguros e imobiliário juntamente com a tomada da
infraestrutura básica de volta para o domínio público,
desprivatizando-a. O plano da Era Progressista que tornou a América um
país rico e dominante era o governo fornecer serviços
básicos tais como caminhos de ferro, correios e estradas ou canais ao
preço de custo ou subsidiado. Isto baixava o preço de estrutura
por todo o espectro económico, capacitando os Estados Unidos a vender a
preços baixos a outras economias.
Estamos agora no Ano 2 da chamada crise do crédito, que a Bloomberg News
chama "a pior crise financeira desde a Depressão". Cada vez
mais peritos estão a destacar as políticas monetárias do
Fed como a fonte das perturbações. Surpreendentemente, mesmo o
New York Times
aderiu admitindo que Greenspan desempenhou um papel central na bolha
habitacional.
Aqui está o que o
New York Times
disse recentemente: "A quem culpar? Na estimação de
muitos economista, principia pelo Federal Reserve. O banco central baixou as
taxas de juro a seguir ao fim calamitoso da bolha tecnologia em 2000, baixou-as
mais após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, e a seguir
manteve-as baixas, mesmo quando especuladores começaram a comerciar
casas como acções dot-com. Enquanto isso, o Fed sentou e
observou como os magos financeiros da Wall Street engendraram investimentos
diabolicamente complicados ligados a hipotecas, gerando enormes quantias de
capital especulativo que tornaram o imobiliário uma
conflagração".
MW: Como caracterizaria a actuação de Greenspan na crise actual?
Hudson: Ele foi o seu animador
(cheerleader),
com apoio da Universidade de Chicago e uma grande quantidade de think tanks da
extrema direita. O sr. Greenspan deu a toda esta teoria económica do
gotejamento uma patina de racionalidade e também uma retórica
pretendendo que a bolha financeira estava a ajudar os proprietários das
casas ao invés dos prestamistas e da Wall Street. O seu papel foi
traduzir a propaganda da Ayn Rand em eufemismos populistas.
O papel de um animador financeiro é confundir as questões
económicas, acima de tudo ao descrever incidir na dívida como
"alavancagem da dívida" para acelerar a
"criação de riqueza". Ao olhar para trás,
podemos ver agora que isto era realmente criação de
dívida. Quando o sr. Greenspan falava acerca de riqueza, ele não
queria dizer a daquela espécie a que se referia Adam Smith em
A riqueza das nações
meios de produção tangíveis. O sr. Greenspan
queria dizer obrigações de pagamento nos balanços sobre
esta riqueza na forma de acções, títulos e direitos de
propriedade. Adam Smith dizia que para contar estas formas monetárias
de riqueza juntamente com a terra e o capital real da Grã-Bretanha seria
duplicar a contagem. Para Greenspan, o lado do passivo do balanço da
economia o que os produtores devem às finanças e aos donos
da propriedade tornam-se a única espécie de riqueza
realmente lhe importa.
Esta perspectiva de dentro para fora foi em grande medida responsável
pela des-industrialização, pelo downsizing e pelo outsourcing da
economia dos EUA. A ideia do sr. Greenspan de "mercados livres" era
simplesmente desregulamentá-los de forma encoberta, com certeza,
pela nomeação de não regulamentadores para as
posições regulamentadoras chave do governo. Isto resultou na
venda de activos, os quais criaram alguns bilionários visíveis
(atacantes corporativos, rebaptizados nestes dias como "activistas
possuidores de acções) e portanto ganharam o louvor do sr.
Greenspan por ostensivamente desempenharem um papel positivo na
"criação de riqueza".
No final das contas o vocabulário económico transmutou-se em
duplicidade
A dimensão política
Não tenho bases em teoria económica, e nunca tive qualquer
interesse particular neste tópico. Minha frustração com a
direcção do país particularmente na guerra do
Iraque e no desmantelamento de liberdades civis levou-se a procurar
respostas em lugares em que normalmente não teria olhado. Agora estou
convencido de que a guerra no Iraque e a rápida mudança rumo
à polícia de Estado aqui na América são
corolários lógicos da polarização económica
que tem suas raízes em políticas que são fundamentalmente
enviesadas e servem os estreitos interesses de corporatistas, banqueiros e
outros interesses escusos.
Hudson: Em relação à sua repugnância à
teoria económica, alguns dos meus melhores estudantes na New School
afastaram-se da disciplina quando descobriram que ela não estava a
tratar os problemas que os preocupavam. O campo foi esterilizado por mais do
que uma geração de intolerância da Escola de Chicago.
A profissão da ciência económica não parece ser
receptiva à reforma de acordo com as linhas que o interessariam. Ela
tornou-se principalmente uma retórica brilhante para descrever a
oligarquia financeira como se esta fosse democracia económica populista.
Muitas pessoas tentaram expandir o seu âmbito , e fracassaram.
Thorstein Veblen fez uma tentativa um século atrás, sua
análise basicamente, economia política clássica
foi exilada para a sub-cave académica da sociologia. Os
economistas preferiram colocar viseiras quando chega o momento de olhar a
distribuição da riqueza e a distinção
clássica entre rendimento "ganho" e "não
ganho" (isto, parasita). Exactamente quando o sexo estava a tornar-se
não reprimido, a distribuição da riqueza tornou-se o novo
tópico de discussão politicamente incorrecto.
Nos velhos filmes acerca de invasores do espaço, tal como The Thing,
havia geralmente um cientista dotado de visão que dizia: "Vamos
tentar entender-nos com isto. Ele é mais inteligente do que nós,
porque veio num disco voador com toda aquela grande tecnologia". O
monstro do espaço exterior golpeava o homem, matando-o brutalmente.
É como o Terminator do futuro. "Ele não sente
compaixão. Ele não sente dor. Você não pode
entender-se com ele", diz o herói do filme. "Tudo o que ele
faz é matar".
Esta é a tarefa que os Chicago Boys tomaram sobre si, a defesa de
mercados financiarizados como sendo "livres". Você não
pode raciocinar com eles. A razão não é a tarefa. Eles
não estão ali para serem justos.
Mas para alcançar este papel censor, a ortodoxia económica de
hoje pretende que os mercados trabalham de um modo justo para proporcionar
oportunidades a toda a gente alguma coisa como um esperma com uma
probabilidade de herdar mil milhões de dólares de um cleptocrata
russo ou de um magnata americano do imobiliário ou de um operador da
Wall Street. Para promover esta visão, é preciso carpinteirar
uma retórica pretendendo que os mercados são "livres",
não conduzindo à servidão. É preciso pretender que
é a regulamentação do governo dos cleptocratas que
está a conduzir à servidão ao invés de proteger a
população das finanças predatórias.
Quanto à sua preocupação com a polícia de Estado,
em última análise a agressão militar que é
necessária para promover "mercados livres" a ponta de
revólver, estilo Pinochet, a construção do império
sempre foi a par com o empobrecimento da população do centro
imperial assim como da sua periferia. Para começar, impérios e
guerras não compensam, pelo menos nos tempos modernos. Na melhor das
hipóteses, é como a guerra no Iraque um veículo
para a administração Bush canalizar milhares de milhões de
dólares "faltantes" para os seus apoiantes de campanha, a
reciclar novamente em novos fundos de campanhas republicanas. A economia
à solta chama-se em imperialismo e transforma-se no despojamento de
activos.
Uma segunda e mais puramente política dimensão da guerra imperial
é afastar a atenção dos eleitores para longe das
questões económicas, apelando ao seu nacionalismo e chauvinismo.
A teoria de Hobson do imperialismo era que à população
interna falta o rendimento para consumir o que produzia, de modo que os
produtores tinham de procurar mercados externos. Isto levava à guerra.
Mas hoje, o modo "pós industrial" de imperialismo é
mais acerca da reciclagem da riqueza para produzir ganhos de capital,
principalmente globalizando e privatizando a Economia da Bolha. Os mercados
mais importantes para a "criação de riqueza" não
são de bens e serviços, mas de imóveis e activos
financeiros. Assim, somos trazidos de volta às suas perguntas iniciais
de hoje, acerca de como a Fannie Mae e o Freddie Mac patrocinarão mais
vendas de títulos apoiados por hipotecas.
MW: Penso que o seu artigo apresenta um caminho cristalino para evitar o
desastre e transformar a sociedade pela mudança do código fiscal
de modo a que ele fortaleça a classe média e nivele o campo de
jogo "os que têm e os que não têm". Mas como se
pode atingir isto sem partir as suas ideias em bocados incisivos e construir um
vasto movimento baseado no povo dedicado às questões da classe
trabalhadora e à justiça económica? Haverá um meio
de efectuar estas mudanças sociais transformativas sem arrancar com um
terceiro partido político, um Partido Trabalhista Americano, talvez?
Hudson: Se a próxima administração democrata demonstrar
ser mais do mesmo, a pressão para criar um novo partido na verdade
aumentará. Mais frequentemente a reforma económica tem vindo do
topo, mas não vejo isto da parte dos republicanos, dada a sua
corrupção. Dentro do Partido Democrata a questão é
se o Wall Street Democratic Leadership Committee (que nos deu Gore e Lieberman
após os Clintons) continuará a impor o seu sufocamento.
Qualquer melhoria real precisará de uma campanha educativa para preparar
o terreno para fazer da reforma económica a peça central de
eleições importantes. Este papel educativo muitas vezes foi
preenchido por terceiros partidos. Na década de 1890, por exemplo, a
principal campanha da Era Progressista verificou-se fora do democratas e em
grande medida também fora dos republicanos.
08/Setembro/2008
[*]
Michael Hudson:
Antigo economista da Wall Street especializado em balança de pagamentos
e imobiliário no Chase Manhattan Bank (agora JPMorgan Chase & Co.),
Arthur Anderson, e posteriormente no Hudson Institute (nenhum parentesco). Em
1990 ajudou a estabelecer o primeiro fundo de dívida soberana do mundo
para a Scudder Stevens & Clark. Foi Conselheiro Económico Chefe de
Dennis Kucinich
na recente campanha primária presidencial dos democratas, e aconselhou
os governos americano, canadiano, mexicano e lituano, bem como o United
Nations Institute for Training and Research (UNITAR). Professor
Investigador Emérito da Universidade do Missouri Kansas City
(UMKC), autor de muitos livros, incluindo
Super Imperialism: The Origin and Fundamentals of U.S. World Dominance
. Email:
mh@michael-hudson.com
[**]
Mike Whitney: vive no estado de Washington. Email:
fergiewhitney@msn.com
O original encontra-se em
http://www.counterpunch.org/whitney09082008.html
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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